sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

A PROPÓSITO LATERALMENTE DA UCRÂNIA


 

A DETURPAÇÃO DOS FACTOS
 
 

Apesar de fazer parte da luta ideológica, não há nada mais revoltante do que a deturpação dos factos. Uma coisa são as declarações de ciência, outra os juízos de valor. Cada um faz os juízos de valor que entender, pelo menos, enquanto não for proibido, mas os factos são factos e não adianta deturpá-los porque eles continuam lá tal como aconteceram quando ocorreram.

Depois há ainda uma categoria mista de situações em que a carga valorativa que as qualifica está intrinsecamente ligada a um passado que não pode deixar de ser tido em conta e que ao ser atendido acaba por influenciar a qualificação do próprio facto.

Por exemplo, nós dizemos: “Os aliados desembarcaram na Normandia em 1944” e chamámos à respectiva operação com o nome de código Overlord o “Desembarque da Normandia”. Mas os nazis e os revanchistas alemães de ontem e de hoje dizem: “Os aliados invadiram a Normandia em 6 de Junho de 1944”.

É claro, que os aliados não invadiram a França. Quem invadiu a França foi Hitler.

Também dizemos: “Os liberais com D. Pedro desembarcaram no Mindelo em 8 de Julho de 1832”. Não dizemos que invadiram o Mindelo…porque vinham reestabelecer a ordem democrática violada pelo usurpador D. Miguel.

Também não dizemos que a URSS invadiu a Alemanha em 1945 ou que invadiu Berlim em Abril de 1945…porque quem invadiu a URSS foi Hitler em 22 de Junho de 1941.

Do mesmo modo, também não dizemos que os ingleses, comandados por Arthur Wesllesley, mais tarde duque de Wellington, invadiram Portugal para combater as tropas napoleónicas…porque quem invadiu Portugal foi Napoleão.

Os exemplos poderiam multiplicar-se.

Então, por que razão é que Luís Amado e os jornalistas pertencentes à matilha de comentadores a soldo dizem agora, a propósito da Ucrânia, que a Rússia invadiu a Geórgia em 2008? Os jornalistas até podem ser ignorantes apesar de os factos serem recentes, mas Amado era Ministro dos Negócios Estrangeiros, portanto, ao qualificar o que se passou daquela maneira comporta-se como um vulgar militante do Tea Party mais do que como um reconhecido simpatizante do GOP que sempre foi.

Na realidade, a Rússia não invadiu a Geórgia. Saakashvili é que invadiu a Ossétia do Sul violando os acordos de 1992 que concediam à região uma ampla autonomia. Claro, depois apanhou uma tareia dos russos, apesar de tudo uma tareia que se manteve dentro do permitido pelo Direito Internacional já que os russos limitaram a sua acção a um raio de 80 quilómetros a partir da fronteira quando poderiam perfeitamente ter feito o que Israel e os americanos seguramente fariam na mesma situação a avaliar pelo que já fizeram noutras: ter tomado Tbilisi e mandado o sr. Saakashvili para a sua terra…que é a América.

Agora tenham em conta o seguinte: depois do que fizeram em Kiev não se queixem do que possa acontecer na Crimeia…




 

A UNIÃO EUROPEIA E A DEMOCRACIA


INCOMPATIBILIDADE ENTRE NEOLIBERALISMO E DEMOCRACIA


No artigo sucinto escrito há dias sobre a Ucrânia o estilo usado e as afirmações proclamatórias sobre o comportamento político e o papel da União Europeia na crise ucraniana bem como o dos governos das principais potências da União, assim como o dos Estados Unidos, além, obviamente, do das instituições financeiras internacionais, como o FMI, são propositadamente provocatórias, por ausência de fundamentação, mas nem por isso deixam de ser menos assertivas como no presente texto se tentará demonstrar.

Há um caminho que vem sendo meticulosamente percorrido desde há mais de trinta anos que não se manifesta simultaneamente em todos os países com a mesma intensidade, atingindo uns mais do que outros, embora o objectivo, desde há muito traçado, esteja em vias de ser alcançado: a destruição pura e simples do pacto social saído da II Guerra Mundial cuja aplicação durante várias décadas fez crer mesmo aos mais avisados que o capitalismo era compatível com a democracia e que era exactamente por via dele que mais eficazmente se poderia garantir a liberdade e assegurar uma justiça distributiva que embora privilegiasse, como não poderia deixar de ser, o capital, garantiria também pela via da retribuição directa (salários) e indirecta (despesas socais) uma relativa igualdade que tornava o sistema para a generalidade das pessoas, pelas facilidades de acesso ao consumo que proporcionava e pela mobilidade social que propiciava, indiscutivelmente muito mais aliciante do que o socialismo real.

Tudo isto, porém, está em profunda transformação desde meados da década de setenta do século passado. A transformação começou por ser lenta, cautelosa, mas sofreu uma considerável aceleração depois da implosão da URSS e mais recentemente com a chamada crise da “dívida soberana” que, no fundo, mais não é do que a inevitável consequência da profunda alteração dos critérios de distribuição do rendimento que desde há muito vinham sendo postos em prática, apesar de a política de crédito barato, resultante de uma acumulação de capital sem precedentes nos tempos mais recentes, ter atenuado consideravelmente, numa primeira fase, os efeitos mais visíveis da desigualdade.

É claro – e isso tem sido frequentemente referido neste blogue – que a dissolução da União Soviética e o fim da Guerra Fria, como competição entre dois sistemas, favoreceram o desenvolvimento e a concretização da estratégia capitalista neoliberal, embora haja entre os dois fenómenos uma relação dialéctica que não pode nem deve ser menosprezada. A verdade, porém, é que o “guião” já estava há muito escrito e somente precisava que as condições objectivas necessárias à sua execução se verificassem para começar a ser aplicado em toda a linha. É também certo que o capitalismo nunca precisou de grande elaboração teórica para prosseguir o lucro máximo, apenas de condições políticas que o permitam.

Durante décadas, mais concretamente desde a Grande Depressão de 1929 e, principalmente, depois da vitória das forças democráticas e proletárias na II Guerra Mundial, o capitalismo não teve condições objectivas para pôr em prática aquilo que é a sua verdadeira matriz: o lucro máximo e a ausência de qualquer intervenção estadual que o impeça.

As doutrinas keynesianas em prática desde a crise de 29 nas grandes potências capitalistas do Ocidente e o seu êxito democrático e popular na economia social de mercado inviabilizavam durante muito tempo qualquer tentativa de retorno às teses da economia clássica. Somente muitos anos mais tarde, na sequência da primeira crise petrolífera, em 1973, quando a inflação, o desemprego e a estagnação (como fenómenos simultâneos) puseram em causa os “dogmas” keynesianos, passou a haver campo aberto para um regresso às teses clássicas, agora vestidas com novas roupagens, com o objectivo fundamental de pôr o Estado, o mesmo é dizer, a democracia, fora da economia. Para o capital o Estado só interessa como garante do património e da liberdade económica.

As teorizações de Hayek, que à época em que foram escritas (antes e durante a guerra) não tiveram qualquer repercussão fora dos meios académicos e mesmo nestes, apesar do relativo entusiasmo com que foram recebidas pelos anti-keynesianos da London School of Economics e de um círculo restrito de Cambridge, não lograram pôr em causa a estrela ascendente de Keynes que então já dominava o mundo académico com as suas teses inovadoras, começaram a ser muito mais tarde adoptadas em fins da década de setenta e início da de oitenta pelos governos reaccionários de Thatcher e Reagan com o êxito político que se conhece.

O primeiro ataque à democracia tanto na América como na Inglaterra incidiu sobre a desarticulação do movimento sindical, depois na progressiva expulsão do Estado da economia e na gradual desregulamentação dos diversos sectores económicos e, finalmente, na privatização das principais empresas públicas.

Todavia, estávamos apenas no começo. A justificação para as novas políticas assentava, filosoficamente, na ideia de que o Estado oprime e de que a sua intervenção na economia é sempre o primeiro passo para o caminho da servidão e, economicamente, na ideia, sempre muito presente e acriticamente aceite, de que o Estado não tem “vocação” para intervir nas actividades económicas e empresariais, acrescentando alguns que a natureza colectiva dos bens leva à sua degradação – a chamada tragédia dos bens comuns – pela manifesta ausência de racionalidade da sua exploração.

Curiosamente, o grande defensor e teorizador destes princípios – Friedrich Hayek - havia sido brindado em 1974 com o prémio Nobel da Economia. Mais de trinta anos depois dos seus escritos na Inglaterra, este ilustre nome da Escola de Viena, à época na Universidade de Chicago, foi galardoado com um prémio que passou despercebido à maior parte das pessoas muito mais preocupadas com a situação em Portugal, na Espanha e na Grécia, com a garantia de que se manteriam integrados no “mundo ocidental”, do que com o hipotético e imprevisível retorno às teses da economia clássica. Obviamente, não há nas decisões de Oslo coincidências…

E é exactamente deste autor um texto menos conhecido que analisado à distância de 75 anos se pode hoje dizer que tem servido de “bíblia” à integração europeia e à caminhada aparentemente imparável da União Europeia rumo a uma sociedade neoliberal “quimicamente pura” dominada pelas forças do mercado sem intervenção do Estado na economia e sem qualquer controlo democrático do mercado.

Esse artigo de 1939, publicado na revista New Commonwealth Quarterly, “The Economic Conditions of Interstate Federalism”, tem vindo depois da década de 80 do século passado a constituir o roteiro da integração europeia. Hayek, partindo da ideia kantiana de que somente a federação de Estados pode assegurar a paz, faz todavia depender o êxito da federação da liberalização das ordens económicas dos Estados federados bem como, evidentemente, da concepção da federação como uma ordem económica liberal já que somente por esta via se poderiam superar os dois perigos que ameaçam a paz: o nacionalismo e o socialismo. Desta liberalização da ordem económica federal resultaria um estado de direito assente numa democracia rigorosamente liberal, isto é, uma democracia que respeite a liberdade dos mercados e não interfira na actividade económica.

O socialismo e as suas intervenções arbitrárias na economia bem como o nacionalismo e a sua defesa de interesses económicos nacionais são, para Hayek, incompatíveis com a federação. A defesa de pontos de vista particulares, sejam eles nacionais ou de classe, são incompatíveis com a ideia federal. Somente a liberdade incondicionada dos mercados, colocando todos, sem distinções, no mesmo plano, asseguraria a paz e a viabilidade da federação.

A União Europeia, melhor dizendo, a integração europeia, quando nasceu, depois da II Guerra Mundial, assentava em ideias bem diferentes daquelas acima enunciadas. Ou dito de um modo mais correcto: quando a ideia de uma Europa integrada começou a germinar no pensamento político ocidental do pós Guerra como meio de assegurar a paz, mantendo e garantindo um relativo equilíbrio económico entre os Estados, eram as ideias keynesianas que então hegemonizavam a política económica, embora o Mercado Comum tivesse na sua génese, quase se poderia dizer, no seu ADN, ínsito um princípio de ordem económica liberal. A verdade, porém, é que durante os primeiros anos da integração europeia a ideia de paz estava não somente associada ao princípio (político) federativo como também ao princípio (económico) da coesão social, tentando-se por esta via assegurar uma “justiça social” que contrariasse ou corrigisse a “justiça do mercado”.

Contudo, à medida que a integração foi avançando, foi-se assistindo a partir de fins dos anos 70 e muito mais decididamente com Maastricht à progressiva neutralização económica das instituições democráticas. Os Estados membros foram sendo arredados da possibilidade de corrigir os mercados – distorcer o mercado, dizem os puristas liberais – tendo sido pura e simplesmente proibidos de perturbar o livre jogo da concorrência, ficando, de início, as consequências daí resultantes, no plano dos Estados, pretensamente atenuadas pela via dos fundos de coesão e no plano individual pela via das políticas sociais que os vários Estados iam implementando na sua ordem interna.

Com o tempo, esta ordem económica levou a um brutal endividamento privado e também público já que os Estados para acudir às necessidades sociais e outras careciam de receitas que não cobravam, tendo, para colmatar essa falta, de recorrer aos mercados, tanto mais que, entretanto, por imposição do “princípio da independência” dos bancos centrais, ficaram privados da faculdade de cunhar moeda e de por essa via poderem financiar-se. Mas não só: os Estados para acudirem ao endividamento privado e ao consequente colapso dos bancos tiveram também que assumir eles próprios as dívidas destes ou de refinanciá-los, expondo-se à lógica infernal de terem de se endividar junto do capital financeiro …para salvar o capital financeiro.

Assim, os Estados impedidos de corrigir a economia e deixando o processo de acumulação capitalista a salvo de qualquer tipo de intervenção politica não têm mais condições para assegurar a justiça social, o mesmo é dizer, para garantir a democracia. A União Europeia é hoje uma verdadeira fábrica de produção neoliberal e de desdemocratização da economia. Cada vez mais a decisão democrática fica limitada a um reduto sem importância, incapaz de contrariar ou corrigir o que verdadeiramente interessa e o quadro tenderá a ficar completo quando o ataque ao estado social estiver consumado, o que está em vias de acontecer em virtude da asfixia financeira imposta pelo endividamento.

Não é apenas a concepção institucional do funcionamento da União Europeia ou do euro que são profundamente antidemocráticos. É muito mais do que isso: é a impossibilidade de intervenção política, seja a nível federal (comunitário) ou nacional, em áreas vastíssimas do domínio económico e as óbvias consequências que essa impossibilidade gera no plano da distribuição directa e indirecta do rendimento que elimina completamente o conceito democrático e a sua vivência em áreas essenciais à vida em sociedade as quais ficando a coberto da intervenção politica amputam a democracia da sua mais importante componente. 

A impossibilidade de a “justiça social” se sobrepor à eufemisticamente chamada “justiça dos mercados” leva necessariamente ao despotismo por a ordem assim criada assentar numa pretensa legitimidade que torna as próprias vítimas cúmplices do sistema assegurando-lhe uma legitimidade formal que lhe garante uma continuidade relativamente tranquila (até ver…).

Como a União Europeia é hoje o principal obstáculo à democratização da vida política na sua plenitude e é absolutamente irreformável enquanto tal, tudo o que possa contrariar o processo de integração, o mesmo é dizer a instauração de uma ordem liberal sem fissuras, deve ser apoiado, qualquer que seja o lado donde isso venha. A União Europeia e o capital financeiro que ela acima de tudo representa no quadro da instauração da ordem neoliberal são hoje o grande inimigo da democracia. Por isso, as propostas internas que assentam numa ilusória reforma do sistema – uma reforma que institucionalmente ninguém defende e que além do mais é impossível por pressupor a destruição do próprio conceito em que ele assenta – devem ser repudiadas sem qualquer hesitação como fazendo parte do próprio jogo de criação de uma realidade ilusória cujo objectivo não poderá deixar de ser, como desde há muito vem sendo, o reforço do próprio sistema antidemocrático.

Por outro lado, e ao contrário do que frequentemente se pretende fazer crer, as brechas que no plano nacional forem sendo abertas no sistema são feridas insanáveis para o próprio sistema comunitário que ficará tanto mais debilitado quantas mais brechas sofrer. Essa aliás a razão por que a União Europeia e aqueles cujos interesses ela representa se opõem tenazmente à saída do euro de qualquer Estado (embora por vezes façam crer o contrário) e mais ainda à saída da União já que tanto uma como outra seriam provas inequívocas de falência de um sistema que aspira à completa globalização e integração para se tornar mais forte e inatacável.



VI ANIVERSÁRIO DO POLITEIA


MANTENDO COMO LEMA A LUTA CONTRA A DEGRADAÇÃO DA DEMOCRACIA





No passado dia 22 de Fevereiro o Politeia fez seis anos. Desde a ilusão de Obama, à crise da dívida, passando pela instauração de uma ordem neoliberal que na Europa a União Europeia se esforça por impor sem fissuras, até à incapacidade de as forças democráticas retomarem o campo de onde foram expulsas pelos mercados, o mesmo é dizer pelo capitalismo, que volta neste princípio de século aos tempos eufóricos de há 100 anos, eliminando quase completamente o conceito democrático e a sua vivência dos sectores mais relevantes da vida em sociedade, enfim, de tudo isto se tem dado conta neste blogue com mais ou menos êxito, embora tentando sempre fugir aos lugares comuns, às falsas ideias feitas num esforço de desconstrução e de inovação nem sempre bem sucedido, antes de mais por ter de se lutar contra uma feroz concorrência que em nome de uma ideologia destruidora da dignidade humana se esforça por demonstrar que hoje se não faz política mas apenas se aplica uma racionalidade económica ditada pela própria natureza das coisas.

É exactamente no quadro desta luta pela democracia e contra os seus principais inimigos – o capitalismo e a União Europeia como seu lídimo e feroz representante – que se comemora o aniversário com o post a seguir transcrito.




quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

MÁRIO COLUNA


UMA GLÓRIA DO BENFICA E DA SELECÇÃO NACIONAL


Mário Coluna é um nome incontornável da história do Benfica. Vindo de Moçambique, do Desportivo de Lourenço Marques, na longínqua época de 1954/55, com dezanove anos, Mário Coluna iniciou a sua carreira no Benfica no mesmo ano em que o célebre treinador Otto Glória chegava ao clube e com ele a primeira grande modernização do futebol português.

Logo no primeiro ano, Coluna foi campeão nacional e venceu a Taça de Portugal. Foi na sua primeira época no Benfica que, em 1 de Dezembro de 1954, se inaugurou o Estádio da Luz, obra para sempre associada ao nome desse grande benfiquista, símbolo da matriz popular e democrática do clube – Joaquim Bogalho.

Foi também na primeira época de Coluna no Benfica que teve lugar a primeira grande digressão de um clube português ao Brasil – Rio de Janeiro e S. Paulo – tendo as exibições de Coluna e Costa Pereira, no Maracanã e no Pacaembu, impressionado fortemente a exigente crítica desportiva brasileira.

Durante a sua longa carreira de dezasseis épocas no SLB, Coluna ganhou 10 campeonatos nacionais, 7 Taças de Portugal, 2 Taças dos Campeões Europeus, tendo participado em mais três finais. Numa delas, em 1963, contra o Milan, em Wembley, quando o Benfica ganhava por 1-0, Coluna foi propositadamente lesionado por um adversário, tendo estado fora do campo a receber assistência durante vinte minutos numa época em que não havia substituições. A inferioridade física de Coluna - um jogador que nunca se queixava e que nunca se deixava ficar por terra depois de um choque com um adversário, salvo quando algo de muito grave se passava – acabou por ditar a derrota do Benfica por 2-1. Muito provavelmente, sem essa lesão, o Benfica teria somado a terceira vitória consecutiva na Taça dos Campeões Europeus.

Na selecção nacional envergou a camisola das quinas por 57 vezes e fez parte da equipa que obteve a melhor classificação de sempre do futebol português em provas de selecção - terceiro lugar, no Campeonato de Mundo de 1966, em Inglaterra.


Mário Coluna o grande capitão do Benfica e da selecção é uma das maiores glórias da história do Benfica e da selecção nacional. O Benfica deve-lhe parte da sua grandeza e Coluna merece que o seu nome seja para sempre lembrado como um dos grandes obreiros da história do Sport Lisboa e Benfica.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

UCRÂNIA


 IMPORTANTE É IDENTIFICAR O INIMIGO


Estava longe, muito longe, quando os últimos, e até agora mais significativos, episódios da batalha de Kiev pela conquista da Ucrânia tiveram lugar e nem sequer tive oportunidade de participar no debate que por cá se ia fazendo.

Limitei-me a acompanhar o desfile, em uníssono, das declarações que as televisões do “mundo ocidental” iam registando de Cristina Lagarde, de Durão Barroso, de John Kerry, de Obama, de Merkel, do secretário geral da NATO, do primeiro ministro polaco, dos “investidores de Wall Street, das agências de rating, enfim, da “Família”. E se por acaso não soubesse o que se passava teria ficado elucidado. Só estranhei que naquele coro de aplausos faltasse a voz do “Lampião” tanto mais que a “Maria Bonita” também andava feita tonta pelas praças de Kiev a falar de democracia…

Concluindo: a grande ameaça à democracia na Europa vem da União Europeia, ponta de lança do capital plutocrático, que não hesita em aliar-se aos herdeiros dos colaboracionistas de Hitler e a bandidos de profissão para integrar no domínio plutocrático dos seus mandantes mais uns milhares de quilómetros quadrados.


Por isso, hoje, perante a fragilidade das forças de esquerda, incapazes de se recompor da derrota sofrida nas últimas décadas do século passado, tudo o que se oponha ao neoliberalismo e à plutocracia do capital financeiro é estrategicamente positivo, mesmo quando protagonizado por forças de direita, pela razão muito simples de o dano causado por estas forças conservadoras aos ideais de esquerda ser incomparavelmente menos grave e muito menos duradoiro que o infligido pela forças que a União Europeia (e, obviamente, os Estados Unidos) representam, já que estas forças encerram no seu bojo a destruição por muitos, muitos anos, da ideia de democracia…como todos os dias se comprova e infelizmente se consolida apesar de esse inexorável movimento nem sempre ser compreendido pela generalidade das pessoas.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

GASPAR CONFESSA-SE


TENDO EM CONTA OS RESUMOS DA IMPRENSA

O livro de Vítor Gaspar é escrito pela jornalista Maria João Avillez


Embora pudesse ser interessante conhecer o que pensa o principal responsável pela política económico-financeira deste país, tenho de reconhecer que o facto de esse responsável ser Vítor Gaspar e o livro ter sido escrito por Maria João Avilez constituiria uma dose dupla muito difícil de suportar por um cidadão indefeso, fustigado por sucessivos “cortes” salariais. Por isso me contento com os resumos de imprensa.

E é tendo em conta esses resumos que agora acho oportuno dizer aquilo que sempre me pareceu óbvio, mas que nunca disse para não destoar da “maioria da esquerda” e não abrir brechas numa interpretação que, curiosamente, também nunca foi refutada pela direita.

Depois de publicada a célebre carta de Gaspar, a Esquerda viu nela a confissão de um fracasso, uma auto-crítica à política que até então tinha sido prosseguida no país sob a direcção incontestada e incontestável do Ministro das Finanças.

Li e reli a carta e nunca vi nela o mais pequeno arrependimento pela política seguida, nem nunca sequer vi nela a confissão tácita ou implícita de um fracasso, salvo aqui ou ali uma pequena surpresa pelo crescimento excessivo de certos indicadores económicos, como era o caso do desemprego. Mas mesmo essa surpresa, que o FMI igualmente partilhava, era pelas piores razões. Tanto Gaspar como o FMI supunham que a criação de uma reserva estrutural de desempregados faria a curto prazo baixar o custo do trabalho e estancar o desemprego, em virtude de os novos desempregados passarem a partir de determinada altura a  ser compensados pelos novos empregados contratados a custo mais baixo. 

Aparte isso, as duas únicas críticas, aliás muito contundentes, que eu vi na carta foram dirigidas, uma, ao funcionamento da coligação, isto é, uma crítica a Paulo Portas, e outra à liderança de Passos Coelho que não tinha – até então – tido a força suficiente para se opor aos ziguezagues de Portas. Tanto assim, que a carta, no estilo proclamatório que em muitas partes a caracteriza, termina com um apelo. Um apelo a que o PM exerça uma forte liderança que permita levar a bom porto as políticas a que ele, Gaspar, meteu ombros.

E hoje Gaspar pode dar-se por satisfeito. Portas foi metido na ordem e reduzido à sua insignificância política (não apenas por mérito de Passos Coelho, mas também por carreirismo do CDS que não aceitou ver fugir-lhe das mãos aquele pedaço de poder que detinha por algo que, no entender do partido, não passava de um simples capricho de Portas). E pode dar-se acima de tudo por satisfeito por a sua política estar agora a ser conduzida sem sobressaltos por Maria Luiz Albuquerque com o completo apoio de Passos Coelho, que, entretanto, tendo-se apercebido da fragilidade do CDS, lidera a coligação com total autoridade.

Por último, a direita nunca contrariou a interpretação que a esquerda fez da carta de Gaspar, porque essa era a via mais adequada para a continuar a aplicar a mesma receita…


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

MIRÓ E A CONVERGÊNCIA


SOBRE AS VICISSITUDES DE UMA CERTA “ESQUERDA”



Não é tanto sobre o desconseguimento da venda em leilão pela Christie, nem mesmo sobre a frustacional acção do valido de Moedas que aceita desempenhar o triste papel que lhe distribuíram como Secretário de Estado da Cultura que importa hoje falar. Sobre esse lamentável episódio já quase tudo se disse para vergonha dos intervenientes.

Só que quando eles já estavam completamente encostados à parede, um (o Secretário de Estado) a meter os pés pelas mãos e o outro (o Primeiro Ministro) enredado num ridículo jogo de empurra com a leiloeira sobre quem tem a culpa do que se passou, eis que um recém-ardente defensor da convergência de esquerda vem dar uma mãozinha ao Governo, advogando a venda dos quadros por bom preço.

Ou seja, sobre um tema em que a esquerda não poderia estar mais convergente, desde o PS ao PCP, passando pelo Bloco, toda a esquerda reprova a venda dos quadros e tenta judicialmente impedi-la com o apoio do Ministério Público como defensor da legalidade democrática e de primeiro advogado de defesa dos interesses do Estado, eis que surge alguém que, tendo ultimamente falado várias vezes em nome de uma parcela da esquerda, vem agora defender com  nuances de ocasião uma posição semelhante à do Governo,  fazendo completa tábua rasa da posição unanimemente defendida pela esquerda.

Nada pior para o futuro da quase falida intenção do 3 D em pugna pela convergência de alguma esquerda do que ter no seu seio quem objectivamente se ponha do lado do Governo ou quem numa exacerbação ególatra típica dos partidos de direita se suponha detentor de uma solução muito criativa e venha propor uma espécie de terceira via para os quadros de Miró com completo desprezo pelo combate que sobre o tema está em curso. Uma terceira via que, tal como a outra, a de Guiddens, acaba sempre, na prática, por fazer o jogo do adversário quer por situar o problema no campo por ele escolhido e quer por buscar uma solução no contexto por ele defendido, mesmo que com pequenas especificidades de ocasião.

É esta incapacidade de aceitar a posição da maioria, em muitos casos acentuada por vedetismos fugazes típicos da sociedade comunicacional dos nossos dias, que torna, de facto, muito difícil qualquer espécie de unidade de acção naquele espaço situado entre o PS e o PCP em virtude de cada um dos intervenientes mais conhecidos desse espaço exigir uma quota de protagonismo nem que seja para dizer ou fazer aquilo que num concreto momento não pode ser dito nem feito, seja por razões tácticas ou não, sob pena de o desrespeito dessa unidade, por mais inventiva que possa parecer a posição defendida, fortalecer o adversário que se está combatendo.

A propósito da disciplina em política não posso deixar de me recordar daquelas conversas que durante a longa noite cavaquista íamos tendo nos quatro cantos do mundo com António Russo Dias e Seixas da Costa sobre a nossa comum participação nessa extraordinária festa colectiva que foi o PREC. Tendo cada um de nós sido actor em cenários diferentes naqueles extraordinários dezoito meses que vão do 25 de Abril de 74 ao 25 de Novembro de 75, a narrativa dessas diversas experiências, quanto mais não fosse pelo desconhecimento que cada um de nós tinha da acção dos outros, tornava a conversa muito interessante e interminável. E é a propósito dessas conversas que não posso deixar de recordar algumas das tiradas com que António Dias ilustrava “as palavras de ordem e os ensinamentos” recebidos do Grande Timoneiro (nacional) que, sempre atento às tentações pequeno-burguesas dos militantes do seu partido, se não cansava de lhes lembrar que “A Revolução não é propriamente um chá dançante!”

É este desconhecimento das “máximas revolucionárias”, esta tentação pequeno-burguesa de dar nas vistas, ou, como, ironicamente, diria Seixas da Costa, citando outro grande clássico, “esse cosmopolitismo reaccionário”, que acaba por ser fatal a uma parte da esquerda. A uma esquerda que prodigaliza princípios …para os outros mas que encontra sempre uma boa razão para que o comportamento individual de cada um dos seus componentes seja diferente do dos demais. Bem andava o António Dias quando sintetizava essa mentalidade nas palavras de um desses chefes de ocasião: “A luta é dura…mas vós não vergais!”.


terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

A PRAXE…PELA ÚLTIMA VEZ



A FRAGILIDADE ARGUMENTATIVA DOS PRAXISTAS


Em primeiro lugar, foi importante discutir por que razão a praxe académica está hoje, quanto a práticas e comportamentos, na situação em que se encontra e que é do conhecimento geral.

Foram emitidas muitas opiniões, outras tantas explicações desigualmente fundamentadas, mas sobre esta questão o debate está de certa forma encerrado. Nem todos terão tirado as mesmas conclusões, sendo algumas delas manifestamente insuficientes como explicação do que se está a passar: umas, porque quem as tira somente é capaz de alcançar as mais simplistas, outras porque quem as enuncia quer manifestamente deixar ficar tudo na mesma apesar de manifestar uma falsa indignação.

Chegado o debate a este ponto, o que agora é importante saber é o que se deve fazer.

A indignação manifestada por muita gente e apoiada maioritariamente pelos media é muito importante mas não chega. O que se deveria fazer continua a ser óbvio para muita gente: deveriam ser os estudantes, a grande maioria dos estudantes, a expurgar a praxe do seio das universidades como algo arcaico e retrógrado que deixou de corresponder às reais necessidades de quem nos dias de hoje frequenta a universidade seja no plano lúdico, seja no plano das chamadas actividades circum-escolares.

Deveria…mas não será, já que tão cedo os tempos não estão para aí virados. Pelo contrário, não obstante as recentes contrariedades, alicerçadas em factos de extrema gravidade, tudo aponta para um reforço das praxes se nada de impositivo for feito.

Acontece, porém, que a argumentação dos praxistas em defesa da praxe é extremamente frágil, ou não fossem eles academicamente, nomeadamente os do topo da hierarquia, os menos capazes e os piores exemplos da frequência universitária. Basta lembrar que a escolha do famoso Dux Veteranorum recai preferencialmente sobre o estudante com mais matrículas, o que do ponto de vista estritamente estudantil não pode deixar de considera-se a pior das credenciais. Mas não é menos verdade que todos os demais que na Universidade ou fora dela a defendem também não primam pela argúcia argumentativa.

Os argumentos de toda esta gente situam-se entre dois parâmetros muito fáceis de enunciar: negam ou escamoteiam os factos e comportamentos que maior repulsa social provocam ou pura e simplesmente dizem que esses factos – aqueles que vemos todos os dias – não fazem parte da praxe. São abusos, são excessos, são actos praticados por pessoas mal formadas, etc.   

Ora este é um bom argumento para proibir as praxes. Como se sabe, embora os juristas talvez possam explicar isto melhor, nem todas as relações da vida social são reguladas pelo direito. O direito regula a maior parte dos nossos comportamentos em sociedade, mas não regula todos. Há os chamados “espaços livres de direito”, espaços onde o direito não entra por opção do legislador. E estes espaços exactamente por serem livres de direito só podem ser preenchidos pelo legislador. Ou seja, não se trata de lacunas legais, lacunas que o intérprete, em última instancia, os tribunais possam integrar, actuando de forma semelhante à que actuam quando há uma lacuna da lei, exactamente porque foi uma opção do legislador deixá-los à margem do direito. E se o legislador assim decidiu não pode o tribunal decidir de outro modo sob pena de violação do princípio da separação de poderes. O tribunal não faz normas, o tribunal aplica normas.

Não confundir espaço livre de direito com a faculdade reconhecida às pessoas de regularem, de acordo com a sua vontade, juridicamente as relações em que intervêm. Aqui, o que prevalece é chamado princípio da autonomia da vontade, que é um princípio jurídico balizado na sua extensão por normas imperativas.

Pois bem, quando o legislador deixa certas matérias à margem do direito, como acontece com a praxe, mas há muitas outras, isso quer dizer que não lhe cabe a ele interferir nesse domínio, salvo obviamente quando as práticas ocorridas nesse campo violarem princípios e regras que a todos vinculam.

Mas não haja ilusões, esses espaços são deixados à margem do direito porque as práticas que no seu interior têm lugar não são na esmagadora maioria dos casos merecedoras de qualquer tutela jurídica nem levantam problemas de conformidade com as leis gerais do país. Se porém este pressuposto desaparecer, se cada vez forem mais frequentes os comportamentos censuráveis, então o mais normal é que o legislador seja levado a intervir.

De facto, se a ideia subjacente à orientação legislativa de não interferência vier a ser infirmada e gravemente posta em causa pelo exemplo reiterado de práticas ilícitas ocorridas no interior desse “espaço livre de direito”, então o que qualquer legislador responsável deve fazer é rever rapidamente a sua posição e trazer esse espaço para o domínio do jurídico.

E isso faz-se praticamente por duas formas: ou regulando os comportamentos que até então estavam a salvo de qualquer cobertura jurídica, eliminando o tal espaço livre de direito, ou pura e simplesmente proibindo as actividades que no interior desse espaço têm lugar quaisquer que elas sejam.

Se os estudantes praxistas e todos aqueles que apoiam as praxes reconhecem que os actos que causam maior indignação social não fazem parte da praxe e se esses actos são cada vez mais numerosos, a ponto de para qualquer observador se terem tornado na matriz da própria praxe, então isso significa que a praxe está sendo usada para fins ilícitos que os seus responsáveis são incapazes de controlar. Se os seus responsáveis e defensores, bem como as universidades onde tais práticas têm lugar, são incapazes de controlar o que no interior da praxe se pratica, a ponto de tais comportamentos porem gravemente em risco ou atingirem mesmo a integridade física e moral dos estudantes, então o que o legislador tem de fazer, o que qualquer legislador responsável deve fazer, é proibir a praxe já que não é ética nem socialmente aceitável que uma “prática lícita” esteja recorrentemente a ser utilizada para fins ilícitos.


sábado, 1 de fevereiro de 2014

A DIVERGÊNCIA DE ESQUERDA


AFINAL, O QUE SE PRETENDE?




O essencial do que, pela nossa parte, havia a dizer sobre o 3 D (Convergência de Esquerda) e o Livre já foi dito neste blogue. O que desde então se passou até hoje apenas confirma o que se escreveu. Pode parecer arrogância dizer as coisas assim, mas os factos são como são e não permitem outra interpretação.

Os desiludidos do Bloco de Esquerda e mais uns tantos, porventura muitos, que sempre mantiveram uma prudente e relativa equidistância entre o PS e o BE, acham que, se não se criar uma força convergente e aglutinadora constituída essencialmente por eles, o PS está tragicamente condenado a lançar-se nas mãos da direita. 

Portanto, a Convergência de Esquerda que tem na sua génese essa visão salvífica, quase redentora, acha ou deixa subentender que, se não fizer tudo o que está ao seu alcance para tentar salvar o PS dos braços acolhedores da direita, irá por toda a vida carregar uma culpa inexpiável de não ter feito o que devia para salvar a esquerda. 

Evidentemente, o “êxito” desta estratégia passava pela inclusão do Bloco. Mas como o Bloco não é tonto, embora tenha as suas limitações, nomeadamente na “Questão Europeia” por herança sempre presente de Louçã, jamais poderia dar o seu aval a uma estratégia como a defendida pelo 3 D e pelo Livre, sob pena de se dissolver ou desintegrar.

Bem podem uns e outros dizer, e até jurar, que o seu objectivo não é o de servir de bengala ao PS, mas o de obrigar o PS a governar à esquerda, mas a verdade crua e nua é que tendo uns e outros como principal objectivo governar – “ninguém nos poderá acusar de não querermos governar nem nenhum eleitor do PS poderá duvidar da nossa vontade de governar, contrariamente ao que se passa com o PCP e o BE” – acaba essa finalidade por estrategicamente se sobrepor a todas as demais considerações uma vez que, depois de erigida esta máxima em princípio eleitoral, pouco mais resta.

Governar é em si um objectivo? E governar como membro ultraminoritário ou mesmo minoritário de uma coligação dominada pelo PS é em si um objectivo? Ou o objectivo é antes alcançar algo, realizar algo sendo a governação, o poder, o meio adequado e necessário para o conseguir?

Ninguém de seu perfeito juízo acredita que o PCP ou o Bloco não queiram governar. Isso não passa de uma tirada demagógica à Paulo Portas, aproveitada pela propaganda do PS e agora adoptada, ou já adoptada, por alguns dos seus oferecidos aliados.

Do Livre não haveria muito a esperar salvo aquilo a que o próprio movimento se propõe: eleger Rui Tavares para o Parlamento Europeu …que é, como se sabe, o local ideal para defender e tornar exequíveis políticas de esquerda. Se o vai conseguir ou não logo se verá, embora do ponto de vista da esquerda pouco haja a esperar. Infelizmente, Rui Tavares não é politicamente confiável depois de ter feito o que fez ao partido em cujas listas foi eleito. De facto, esta esquerda atomizada por múltiplas sensibilidades, que de vez em quando se reúne em grupetos com vista a certos objectivos muito circunscritos, não oferece confiança ao eleitor em geral, nem sequer ao eleitor experimentado de esquerda. São tantas as divergências quantos os protagonistas.

A Convergência de Esquerda ou 3 D, de que tanto se tem falado pela boca de Daniel Oliveira em artigos de promoção em que o “Eu” está mais presente do que o programa, parece ter ficado num beco sem saída depois da recusa do Bloco.  E, agora, vai convergir com quem?

Esta esquerda que tão altruisticamente quer ajudar o PS a passar para a margem esquerda, com um empenhamento que só encontra paralelo na parábola da “velhinha e do escuteiro”, parece não ter ainda percebido que o grande problema dos nosso tempo é este divórcio consumado, de que o PS também é vítima, embora cúmplice ou mesmo em co-autor moral, entre capitalismo e democracia.

Toda a ideologia da social-democracia depois da separação das águas com os comunistas e muito especialmente depois da Segunda Guerra Mundial e da vitória das ideias keynesianas assentava na ideia de que era possível simultaneamente ter um modo de produção capitalista e um modo de distribuição tendencialmente socialista.

E assim foi de facto nos países ricos europeus e até na América até meados da década de 70 do século passado. Depois tudo se começou a complicar. Primeiro foi a inflação, depois o endividamento público, a seguir ou simultaneamente a concessão de crédito às pessoas para compensar a desigual distribuição de rendimentos e, finalmente, a austeridade como meio de consolidação de um novo modelo de sociedade. Uma sociedade da qual a democracia vem sendo gradativa mas consistentemente expulsa.

O que todos os dias ouvimos dos governos, dos comentadores, das organizações económicas e financeiras internacionais é a imposição da lei dos mercados com completa marginalização dos processos e procedimentos democráticos.  

Não há forma de sair disto evolutivamente. O PS está enredado nesta teia do pescoço até aos pés. Toda a social-democracia está, como ainda agora se viu com Hollande. Somente através de uma ruptura – que em algum lado se há-de dar – se poderá sair disto. Sair no sentido de iniciar uma longa e dura luta, onde certamente vai haver, como em todas as lutas de longo alcance, avanços e recuos.

E, muito francamente, para esta questão o contributo da Convergência, 3 D, é nulo. A Convergência, independentemente das intenções de alguns ou muitos dos seus membros, com a estratégia que pôs em campo o mais que poderia conseguir seria subtrair apoios à esquerda para os enredar na teia de que o PS está prisioneiro. Mas nem isso vai alcançar, porque o PS, tal como a “velhinha”, não quer atravessar a rua…