segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

O CRIME NO PORTO

NÁPOLES OU PORTO?

Não temos no Porto um problema irresolúvel de detritos sólidos, domésticos e de outras origens potencialmente perigosas, mas temos no Porto um grave problema de justiça cujos contornos são igualmente potencialmente perigosos. O crime no Porto passa pela noite (tráfico de mulheres, lenocínio, droga, extorsão, comércio da segurança privada, etc.) e pelo dia (futebol com todo o seu cortejo de ilegalidades: tráfico de influência, lavagem de dinheiro, corrupção, violação de segredo, ofensas corporais graves, atentados à liberdade de imprensa, ameaças, etc., etc.).
A primeira coisa que um Estado digno desse nome deveria fazer era actuar e fazer justiça, investigando as ligações entre o “dia” e a “noite”. O que fez o Estado de há 25 anos até hoje? Praticamente nada. Primeiro, porque o fenómeno se circunscrevia ao campo desportivo: agressão a jornalistas (em directo na TV ou em “off” através de jagunços especialmente contratados), suborno de árbitros (que depois do primeiro suborno ficavam completamente reféns dos subornadores), tudo isto acompanhado de uma sábia política de penetração na comunicação social (primeiro a do Porto, inicialmente à força, depois por outros métodos; em seguida a de Lisboa, embora com uma dimensão mais reduzida) e nas áreas sensíveis do aparelho de Estado (magistratura, ministério público, polícias e muita complacência por parte de alguns parlamentares).
Depois o “polvo” foi crescendo, crescendo a ponto de se sentir suficientemente forte para montar os seus negócios paralelos, lícitos e ilícitos, a coberto de uma total impunidade. Até que, supondo-se - porventura correctamente - intocável, começou a matar. A partir daí o Estado, posto violentamente em xeque perante uma opinião pública que não tem qualquer espécie de dúvidas sobre o que se passa no Porto há muito tempo, foi obrigado a actuar. O Ministério Público criou uma equipa especial, com gente de fora de Porto (no velho e saudável estilo do juiz-de-fora), liderada por uma procuradora geral adjunta especializada na luta contra a banditagem desportiva e outras e a polícia judiciária, rodeada de televisões e jornalistas e com visita, à noite, do Ministro às suas instalações, montou uma operação “com hora marcada”, na qual prendeu alguns personagens que, inclusive, já se tinham vangloriado das suas façanhas através de meios audiovisuais profusamente difundidos.
Os mais cépticos não acreditaram que as medidas tomadas produzissem algum efeito. Nada resultaria da equipa do Ministério Público, porque, além de se defrontar com a hostilidade do MP do Porto, tinha de trabalhar com base em inquéritos e investigações defeituosamente instaurados. Nada igualmente seria de esperar da Polícia Judiciária, porque sempre que a Polícia Judiciária, no Porto, tentou trabalhar de forma profissionalmente competente foi boicotada, internamente ou superiormente. Internamente, através da filtragem dos pontos sensíveis da investigação para os próprios investigados; superiormente, através da substituição dos polícias que estavam a caminhar no sentido certo.
Não constituiu, por isso, qualquer surpresa a recente nomeação do responsável pela polícia judiciária no Porto. Está conforme com o que tem sido a prática de todos os Executivos desde há 25 anos. Aliás, para quem estivesse atento e saiba ler os sinais (mesmo sem ter de recorrer aos augúrios), perceberia que algo de importante estaria para acontecer relativamente ao crime no Porto (tanto ao da noite como ao do dia).

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