terça-feira, 17 de junho de 2008

AS "SOLUÇÕES" PARA O NÃO DA IRLANDA

DA PURA CHANTAGEM ÀS SOLUÇÕES PRETENSAMENTE DEMOCRÁTICAS

Certos sectores da União Europeia não encontram outra forma de lidar com o Não da Irlanda que não seja, em última instância, através da chantagem. Os que têm menos força e bom espírito de aluno bem-comportado (ou seja, que pretendem através da “nota” atribuída à conduta disciplinada compensar a baixa média das matérias substantivas), como é o nosso caso, propõem pressurosamente que a Irlanda faça um segundo referendo, se possível já amanhã. É claro, que esta proposta só poderia ter algum efeito prático se fosse acompanhada de uma séria ameaça, que eles obviamente não estão em condições de fazer por falta de força. Caso contrário, submeter a referendo o mesmo tratado, teria o mesmo ou pior resultado.
E na hipótese de um segundo referendo, nem sequer desta vez o problema poderia ser resolvido com uma solução como a adoptada para a Dinamarca em 1992, ou para a própria Irlanda em 2001. Não vai ser com declarações interpretativas anexas ao Tratado nem com protocolos consubstanciando reservas que o problema se resolve. O problema só se resolve mudando o Tratado. E isso é o que a UE não quer fazer.
A UE teme que o exemplo da Irlanda se propague ao Reino Unido (nesse caso, o tratado não teria qualquer hipóteses) e à República Checa, eventualmente à Polónia e, quem sabe, à Itália. Relativamente ao RU, os governantes europeus nada podem fazer, que não seja aguardar serenamente o resultado do debate político em curso, dada a envergadura do interlocutor. Já quanto à República Checa, o hiperactivo Presidente francês, que ontem a visitou, por baixo das mansas palavras com que disse compreender as hesitações checas, deixou uma ameaça muito clara: “Sem tratado de Lisboa, não haverá adesão da Croácia”. Sabendo-se da importância que a adesão da Croácia tem para os países do Grupo de Visegrado, a ameaça de Sarkozy é mais uma pressão no sentido da ratificação.
Por cá, não deixa de ser interessante sublinhar a defesa que os intelectuais do PS, defensores do “socialismo neo-liberal”, fazem de uma Europa a duas velocidades. De uma Europa da qual, na prática, a Irlanda seria expulsa ou, no mínimo, reconduzida à condição de simples observador relativamente à maior parte das matérias. Confrontando estas posições, de grande arrogância e de manifesto desprezo pelo voto popular, com as de Angela Merkel, que já fez saber que a Alemanha não aceita uma Europa a duas velocidades, devendo antes trabalhar-se com os irlandeses com vista à procura de uma solução conjunta, a gente compreende melhor o fosso democrático que separa aqueles intelectuais da Chanceler alemã!

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