domingo, 24 de agosto de 2008

A IMPARCIALIDADE DOS MEDIA OCIDENTAIS


A RÚSSIA NA GEÓRGIA E OS EUA NO IRAQUE: SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS

Depois de, em vão, ter tentado intervir no Iraque ao abrigo de um mandato do Conselho de Segurança, com base no argumento de que Saddam possuía armas de destruição massiva, os Estados Unidos, juntamente com o Reino Unido e mais alguns (poucos) incondicionais apoiantes, invadiu e ocupou o Iraque. Para justificar a agressão, a América fabricou uma série de mentiras, que o tempo se encarregou de trazer à superfície.
A invasão do Iraque, a subsequente ocupação e a agressão que tal acto consubstancia, constitui uma das mais graves violações ocorridas depois da segunda guerra mundial. Meio-mundo, literalmente meio-mundo, lavrou nas ruas dos cinco continentes o seu protesto. Saddam vivia à época num regime de soberania limitada em consequência das sanções que lhe foram impostas pela ONU, depois da tentativa de anexação do Kuwait. Não obstante aquele generalizado protesto, a acção de George Bush passou a gozar, se não com o apoio, pelo menos, da compreensão da imprensa ocidental. No fundo, Bush tinha como objectivo promover o Bem: livrar o Iraque de um ditador e implantar a democracia no país. Os resultados são os que se conhecem: Bush mergulhou o país no caos, fomentou o terrorismo, deu novo alento à Al Qaeda e transformou o Iraque num enorme atoleiro para os Estados Unidos, apesar das vantagens materiais que a ocupação trouxe a sectores empresariais próximos da Casa Branca, nomeadamente no plano energético.
Ninguém na imprensa pede hoje a retirada dos americanos; o candidato às presidenciais americanas que começou por a advogar foi considerado insensato, os jornalistas acham-na normal e a NATO, fiel ao carácter belicista da organização, nem lhe passa pela cabeça qualquer recriminação aos americanos.
Depois da desagregação da URSS e da retoma da soberania das repúblicas que a integravam, a Geórgia não conseguiu assegurar de facto a sua soberania sobre duas regiões que recusaram a integração no novel Estado. Houve guerra e acordos de paz, garantidos pelos russos. Desde então essas duas regiões – Ossétia do Sul e Abekázia -, que já manifestaram por mais de uma vez, em referendo, que querem ser independentes ou integrar-se na Federação Russa, têm vivido com autonomia absoluta face a Tblissi. A maior parte dos seus habitantes tem passaporte russo.
Na noite de sete de Agosto deste ano, o Presidente da Geórgia, aliado incondicional dos Estados Unidos (tinha 2 mil homens no Iraque), interveio militarmente na Ossétia do Sul, praticando violências sem conta contra a população civil.
A Rússia, face à violação dos acordos de 1992, interveio militarmente com toda a força. Derrotou o exército georgiano nas regiões autonomistas e ocupou parcialmente a Geórgia. Os apelos da imprensa ocidental para que a Rússia abandone a Geórgia são diários e cada vez mais contundentes. Ninguém nomeia as causas da intervenção russa e toda comunicação social de ampla difusão tende a mostrar a Rússia como potência ocupante.
Também quase ninguém contextualiza com rigor a situação. O cerco militar que a NATO, por iniciativa e impulso dos Estados Unidos, montou à Rússia é tido como normal e a sua ampliação a áreas de tradicional influência da Rússia é deixada sem comentários, embora toda essa mesma imprensa tivesse achado plenamente justificado que os Estados Unidos se tivessem proposto agir pela força para desmontar um cerco parcialmente semelhante, como o que aconteceu com a instalação das plataformas para o lançamento de mísseis em Cuba, nos idos de 1962!
Hoje é cada vez mais claro que as palavras de parceria e de boas relações que a América usou para com a Rússia, depois da desintegração da URSS e da derrota do socialismo real, não passam de uma profunda hipocrisia. Certamente que a América aceitava essa parceria com uma Rússia dependente, humilhada e derrotada, mas não com uma Rússia verdadeiramente independente. Basta recordar o que se passou nas duas últimas administrações americanas. Com Clinton, foi a intervenção na Jugoslávia à margem do direito internacional e a constituição de um protectorado sobre o Kosovo; com W. Bush, foi a denúncia do tratado sobre a limitação de mísseis; a não ratificação do tratado de proibição de ensaios nucleares e das alterações de SALT II com vista ao desarmamento atómico; o alargamento da NATO a leste e a instalação de radares e de escudo anti - mísseis junto às fronteiras da Rússia.
Na última reunião da NATO, terça-feira passada, os Estados Unidos, sempre apoiados pelos países Bálticos, pela Polónia e pelo Reino Unido, foram os que mais pugnaram por um endurecimento das relações com a Rússia. O jogo está assim cada vez mais claro: aos Estados Unidos interessa manter um clima de alta tensão internacional no quadro de um hipotético conflito de altíssima intensidade justificador das enormes despesas militares insaciavelmente reclamadas pelo complexo militar industrial representado elo Pentágono. Além deste objectivo, os EUA com esta posição (e ai coincidem com os ancestrais interesses britânicos) dividem a Europa e dificultam, ou inviabilizam mesmo a consolidação da democracia na Rússia, tornando muito mais fácil no plano ideológico a defesa das suas posições. O próximo presidente americano, seja ele quem for, herdará esta pesada herança…

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