AS LIMITAÇÕES DOS ECONOMISTAS
Um economista é sempre um ser limitado se apenas souber economia. Que, por essa mesma razão, também não sabe. Porque quem souber apenas economia, não sabe economia.
O que se diz a propósito dos economistas pode dizer-se a propósito de qualquer outro ramo instrumental do saber. Mas é conveniente sublinhá-lo a propósito dos economistas por estar generalizada a ideia de que é a economia que comanda hoje a vida em sociedade, de todos os povos, dos mais pobres aos mais ricos, e a destes muito mais de que a daqueles.
O Presidente da República discursou ontem na sessão comemorativa do 160.º aniversário do Tribunal de Contas. E para homenagear verdadeiramente o aniversariante deu às suas palavras um tom e um sentido que estão muito para além das palavras de circunstâncias.
Se bem compreendi o que foi dito, o discurso versou sobre três questões.
Na primeira, a pretexto da carga institucional do Tribunal de Contas, a intervenção do Presidente da República incidiu sobre o famoso princípio neoliberal ”Building institutions for market” a que o Banco Mundial tem dedicado na última década uma parcela muito importante da sua inteligência criativa. É certo que a utilização de um ou outro conceito parece infirmar a defesa do princípio na sua “pureza original”, como acontece quando se diz que as instituições eficientes defendem e delimitam o funcionamento do mercado. Mal seria que a conjuntura não impusesse algum remendo a um "princípio" em que tanto se investiu politicamente durante tantos anos. Só que o problema não se resolve com remendos. Resolve-se pondo as coisas ao contrário. Ninguem pode negar a importância da eficiência das instituições. A questão não está aí. A questão está em saber ao serviço do quê e de quem essa eficiência funciona. De facto, o problema é mais complexo do que a simples eficiencia e a actual crise financeira, económica, social e política desmentiu o mito, que começava a ser construído, de que o verdadeiro desenvolvimento pressupunha um constante aperfeiçoamento da componente institucional. Pois foi exactamente nos países cujas instituições serviam de paradigma aos demais e nos quais era suposto funcionarem bem que a crise eclodiu em força sem que esse funcionamento quase perfeito da componente institucional tivesse tido alguma hipótese de a evitar. É que tais instituições, na verdade, estavam exclusivamente viradas para o mercado tal como ele funcionava. Elas tinham por função potenciar o seu funcionamento e não controlá-lo. Daí que o controlo do mercado não seja uma questão que se resolva tecnicamente com base no bom funcionamento das instituições, mas politicamente pondo as instituições a funcionar ao serviço de um objectivo político claro.
Na segunda, elogia o papel controlador e fiscalizador do Tribunal de Contas. Elogio a todos os títulos merecido, que além o mais tem a virtude de retirar a vetusta instituição das denominadas “Forças de bloqueio”, de que já fez parte nos tempos em que Sousa Franco o presidia.
Finalmente, a propósito da boa gestão das finanças públicas e da contenção do défice, o Presidente da República diz que Portugal enfrenta um problema grave nas suas finanças públicas, cuja responsabilidade se encontra mais do lado da despesa do que da receita. E, embora distinga entre as entidades de aprovação, execução e controlo da despesa, o PR considera que a defesa dos direitos dos contribuintes vai hoje muito para além da equidade fiscal, exigindo uma avaliação rigorosa sobre a forma como o seu dinheiro é gerido e repartido, ou seja, sobre a transparência, os benefícios, a justiça e a equidade dos gastos do Estado. E conclui afirmando que a missão do TC ganha neste contexto uma relevância e responsabilidade acrescidas, garantindo a sua existência centenária a sabedoria e a experiência necessárias para estar à altura deste desafio.
Aparentemente a abordagem deste tema fica-se pelo “politicamente correcto”. Mas trata-se apenas de uma aparência. Antes de mais, a despesa e a receita públicas não são neutras. São, mais uma vez, o resultado de opções políticas. Por isso, quando se afirma que o problema das finanças públicas portuguesas está do lado da despesa, ou não se acrescenta rigorosamente nada ao que toda a gente sabe – i.e., que o Estado gasta mais em cada ano do que aquilo que recebe – ou se pretende dizer que o Estado tem de gastar menos. Mas neste caso, os eleitores têm o direito de saber quais as despesas cujo corte o Presidente advoga para pôr os gastos equilibrados com a receita.
Também a afirmação de que o problema está mais do lado da despesa do que da receita parece significar que o país já atingiu o máximo de receita fiscal possível. O que também está muito longe de ser uma questão técnica.
Por outro lado, o problema do controlo das contas públicas não é uma questão apenas dos contribuintes. É uma questão dos cidadãos. De todos os cidadãos, tanto dos que votam como dos que não votam; tanto dos que contribuem como dos que não contribuem. E menos ainda se pode aceitar que a avaliação desse controlo, em todos os domínios referidos no discurso, bem como os resultados dessa avaliação decorram de simples pressupostos técnicos formulados por ”especialistas” que sob a capa da neutralidade política e da pretensa competência técnica ditam as soluções “tecnicamente” necessárias. Esta visão tecnocrática da organização da sociedade, pretensamente alheada da política, além de servir para impor soluções que decorrem de opções políticas muito claras, permanentemente escamoteadas, para evitar o debate, a sanção popular e tudo mais que caracteriza ou deveria caracterizar a tomada de opções políticas de fundo, é também a grande responsável pelo estado a que chegou a economia mundial.
Por outro lado, o problema do controlo das contas públicas não é uma questão apenas dos contribuintes. É uma questão dos cidadãos. De todos os cidadãos, tanto dos que votam como dos que não votam; tanto dos que contribuem como dos que não contribuem. E menos ainda se pode aceitar que a avaliação desse controlo, em todos os domínios referidos no discurso, bem como os resultados dessa avaliação decorram de simples pressupostos técnicos formulados por ”especialistas” que sob a capa da neutralidade política e da pretensa competência técnica ditam as soluções “tecnicamente” necessárias. Esta visão tecnocrática da organização da sociedade, pretensamente alheada da política, além de servir para impor soluções que decorrem de opções políticas muito claras, permanentemente escamoteadas, para evitar o debate, a sanção popular e tudo mais que caracteriza ou deveria caracterizar a tomada de opções políticas de fundo, é também a grande responsável pelo estado a que chegou a economia mundial.
Na sequência do que vem de ser dito é igualmente inadmissível que o Tribunal de Contas faça o controlo das opções políticas do Governo. O que o Tribunal de Contas tem de fazer é fiscalizar a legalidade e regularidade das receitas e das despesas públicas, além de apreciar a boa gestão financeira e efectivar a responsabilidade por infracções fiscais, mas sem nunca questionar as opções políticas de quem governa. Essa função não compete ao tribunal. Nem a este nem a qualquer outro.
Muito bem. Este e os outros artigos. Agora só de longe em longe venho aos blogs. E como está isto de audiências? .
ResponderEliminarAbraço.