OS FACTOS E A EFABULAÇÃO
Há trinta e cinco anos, por esta hora, estava decidida a favor das forças progressistas a sorte do golpe capitaneado por Spínola com o apoio das forças reaccionárias e dos militares spinolistas, que não se resignavam com o papel que a Revolução lhes reservava e, pelo contrário, aspiravam a um desempenho determinante em toda a evolução posterior a 25 de Abril.
De então até hoje a mistificação sobre o que se passou não deixou de frequentar variadíssimos sectores da sociedade portuguesa, desde os mais eruditos, a começar pela universidade, passando pela intriga jornalística, até aos mais populares, que normalmente se dão bem com efabulações conspirativas pela nota de mistério e de segredo que necessariamente as envolve para terem êxito.
E, todavia, o que se passou esteve à vista de toda a gente. Pelo meio da manhã os helicópteros começaram a sobrevoar Lisboa, atacaram o RAL 1 (depois “baptizado” RALIS) e passado pouco tempo um batalhão (ou companhia, já não me recordo bem) de pára-quedistas cercou aquele quartel e exigiu a rendição da guarnição. A televisão, então ali por perto, com Adelino Gomes ao microfone, registou em directo o feito para a posteridade
Diniz de Almeida com um categórico e impressivo gesto de cabeça recusa a rendição enquanto o comandante das forças sitiantes, oficial pára-quedista da Força Aérea, insiste em a obter, sem êxito. Costa Correia, oficial de marinha, militar de Abril, comandante que dirigiu a tomada da António Maria Cardoso, presente no local, apela aos sitiantes para que deponham as armas, pede calma aos sitiados e diz: “Isto não é uma república das bananas. Derrubámos o fascismo, comandei a tomada da PIDE e não fizemos tudo isso para agora andarmos aos tiros uns aos outros!”
Passado algum tempo, os militares das forças sitiantes perante a firmeza dos militares do RAL1 e convencidos da falsidade das razões que os fizeram “saltar” do quartel desistem dos seus intentos e caem nos braços dos soldados cercados aos gritos de “MFA”, o “Povo está com o MFA” e o “Povo Unido jamais será vencido”.
A manifestação da tarde assinala a vitória das forças progressistas e exige que se retirem consequências do golpe falhado. Os discursos que assinalaram, no Rossio, o termo da manifestação deixam perceber as posições diferenciadas dos que estão com a vitória e dos que não podem deixar de estar.
Derrotado o golpe, Spínola foge para Espanha, vários militares são presos e Costa Gomes, à noite, em directo na TV, retira as consequências militares do golpe falhado. As políticas ocorreriam nos dias subsequentes.
Mais tarde, começaram as efabulações, a principal das quais é a que imputa aos serviços secretos soviéticos, KGB, uma prodigiosa manobra de contra-informação, que faz passar através de fonte insuspeita aos serviços secretos da RFA, como informação absolutamente fidedigna, a notícia de que os comunistas e os seus aliados militares, em dificuldades nos quartéis, se preparavam para fazer uma gigantesca “matança da Páscoa” na qual seriam imolados dezenas de militares descontentes com o curso da Revolução.
Os serviços secretos da RFA, cientes da autenticidade da informação, pela credibilidade que a fonte lhes merecia, passam-na aos spinolistas e a outras forças aliadas, que, movidas por um justíssimo receio de se tornarem vítimas inocentes de uma “revolução” que tinham por sua, antecipam-se e são apanhadas na armadilha!
Hoje, os mais novos não sabem, mas naquela altura, na maior parte do país, ainda se matava o porco em casa. E que a matança tinha épocas, sob pena de a carne se estragar por acção da indesejada varejeira.
De então até hoje a mistificação sobre o que se passou não deixou de frequentar variadíssimos sectores da sociedade portuguesa, desde os mais eruditos, a começar pela universidade, passando pela intriga jornalística, até aos mais populares, que normalmente se dão bem com efabulações conspirativas pela nota de mistério e de segredo que necessariamente as envolve para terem êxito.
E, todavia, o que se passou esteve à vista de toda a gente. Pelo meio da manhã os helicópteros começaram a sobrevoar Lisboa, atacaram o RAL 1 (depois “baptizado” RALIS) e passado pouco tempo um batalhão (ou companhia, já não me recordo bem) de pára-quedistas cercou aquele quartel e exigiu a rendição da guarnição. A televisão, então ali por perto, com Adelino Gomes ao microfone, registou em directo o feito para a posteridade
Diniz de Almeida com um categórico e impressivo gesto de cabeça recusa a rendição enquanto o comandante das forças sitiantes, oficial pára-quedista da Força Aérea, insiste em a obter, sem êxito. Costa Correia, oficial de marinha, militar de Abril, comandante que dirigiu a tomada da António Maria Cardoso, presente no local, apela aos sitiantes para que deponham as armas, pede calma aos sitiados e diz: “Isto não é uma república das bananas. Derrubámos o fascismo, comandei a tomada da PIDE e não fizemos tudo isso para agora andarmos aos tiros uns aos outros!”
Passado algum tempo, os militares das forças sitiantes perante a firmeza dos militares do RAL1 e convencidos da falsidade das razões que os fizeram “saltar” do quartel desistem dos seus intentos e caem nos braços dos soldados cercados aos gritos de “MFA”, o “Povo está com o MFA” e o “Povo Unido jamais será vencido”.
A manifestação da tarde assinala a vitória das forças progressistas e exige que se retirem consequências do golpe falhado. Os discursos que assinalaram, no Rossio, o termo da manifestação deixam perceber as posições diferenciadas dos que estão com a vitória e dos que não podem deixar de estar.
Derrotado o golpe, Spínola foge para Espanha, vários militares são presos e Costa Gomes, à noite, em directo na TV, retira as consequências militares do golpe falhado. As políticas ocorreriam nos dias subsequentes.
Mais tarde, começaram as efabulações, a principal das quais é a que imputa aos serviços secretos soviéticos, KGB, uma prodigiosa manobra de contra-informação, que faz passar através de fonte insuspeita aos serviços secretos da RFA, como informação absolutamente fidedigna, a notícia de que os comunistas e os seus aliados militares, em dificuldades nos quartéis, se preparavam para fazer uma gigantesca “matança da Páscoa” na qual seriam imolados dezenas de militares descontentes com o curso da Revolução.
Os serviços secretos da RFA, cientes da autenticidade da informação, pela credibilidade que a fonte lhes merecia, passam-na aos spinolistas e a outras forças aliadas, que, movidas por um justíssimo receio de se tornarem vítimas inocentes de uma “revolução” que tinham por sua, antecipam-se e são apanhadas na armadilha!
Hoje, os mais novos não sabem, mas naquela altura, na maior parte do país, ainda se matava o porco em casa. E que a matança tinha épocas, sob pena de a carne se estragar por acção da indesejada varejeira.
No litoral ninguém arriscaria uma matança da Páscoa em fins de Março…
Não consigo encontrar, na internet, as imagens do encontro entre Dinis de Almeida e o chefe dos "paras".
ResponderEliminarJá as vi em emissão de TV, e sempre achei surreal tudo aquilo. Só visto, contado ninguém acredita. Especialmente o encontro, filmado em directo pela TV, em que Dinis de Almeida pergunta ao outro o que se passa, e que o outro diz que teve ordens para cercar e invadir o RALIS, Dinis de Almeida a invocar o COPCON e a Cadeia de Comando, uma confusão dos diabos, ao ar livre ... Andaram aos tiros, um quartel bombardeado, para, no fim, um dizer que teve ordens para a acção que fez, e o outro dizer que nada sabia do assunto, que não lhe chegou ordem nenhuma.
Só não dá para rir porque aquelas eram as Forças Armadas Portuguesas após o 25 de Abril, quando ainda havia tropas no Ultramar.
Boa evocação. Por ironia da vida, comecei o dia em contacto com um quartel, no Campo Grande, onde hoje ensino! Depois fui um pouco mais para cima, para a RTP, então no Lumiar, com o dia a terminar com a demissão do presidente, o Eanes.
ResponderEliminarNo entanto, faço dois comentários menores ao teu "post".
1. Não me parece que hoje haja qualquer dúvida sobre o que foi o 11 de março. Sei que o que dizes foi muito boatado na época, mas creio que ninguém hoje se atreve a tal atentado à verdade histórica. Também devemos recordar que, por coisas que já vinham de trás, Mário Soares tentou sempre dar cobertura ao Spínola, mas depois deixou-o cair, quando já tinha na mão muita gente do 25 de novembro.
2. Lembro-me da intervenção importante do comandante Costa Correia, junto do Dinis de Almeida e do pateta capitão para-quedista, mas não estou certo de que ele tenha comandado a ocupação da PIDE. Eu estava fora no 25 de abril, mas a ideia que tenho é de essa ocupação ter sido feita por um pequeno pelotão de fuzileiros, comandado por um 2º tenente anónimo. Já agora, era bom que deixasse de ser anónimo.
Meu Caro JVC
ResponderEliminarNos últimos "testemunhos" que li sobre o 11 de Março, ainda nem sequer há um ano, defende-se a tese que exponho no texto. De resto, como sabes, logo a seguir ao 25 de Novembro as "forças vencedoras" fizeram um inquérito (ou uma espécie de investigação) sobre o 11 de Março, que foi entregue a Eanes. Eforam defendidas teses que nada têm a ver com o que se passou.
Quanto ao outro assunto, sim, é verdade que os fuzileiros tomaram a PIDE, mas o Costa Correia está directamente relacionado com a ocupação.
abraço
CP