sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

SÓCRATES EM BERLIM


CONVOCADO OU CONVIDADO?

Qualquer que seja o status com que Sócrates se desloca a Berlim – convidado ou convocado –, a capital alemã é hoje, no ponto em que as coisas estão, a única capital europeia onde Sócrates não deveria ir.
Merkel e os alemães espalham por toda a parte a ideia de que há por ai, principalmente no sul, muita gente a viver à sua custa, muitas vezes com a estúpida colaboração de alguns indígenas que acreditam piamente naquilo que os alemães dizem, quando o que na realidade se passa é a consequência de um profundo desequilíbrio na zona euro que não tem qualquer hipótese de se reparar enquanto se mantiverem intactas as políticas que o geraram.
Cientes de que esse desequilíbrio existe, os alemães conjunturalmente muito animados com os bons resultados obtidos pelo seu comércio externo fora da zona euro, tentam, recorrendo a todo o tipo de coacções, que os seus bancos saiam incólumes da grave situação criada por aquele desequilíbrio.
Por outras palavras, o que a Alemanha pretende é que a reestruturação da dívida dos países mais endividados, que inevitavelmente se terá de fazer, seja feita segundo os interesses dos credores, mediante submissão dos devedores.
Neste contexto, qualquer viagem do Primeiro Ministro português a Berlim é mais um passo no caminho da consumação daquela submissão. O que a diplomacia portuguesa deveria fazer, sem medo, publicamente, era concertar-se o mais possível com quem está na mesma situação e com quem tem fundados ressentimentos do histórico comportamento alemão, de modo a que a solução a encontrar fosse o mais possível influenciada pela situação dos devedores e pudesse, por via dela, caminhar-se para uma nova situação que sustente um verdadeiro reequilíbrio dentro da zona euro, decorrente de novas políticas de crescimento e de emprego, susceptíveis de libertar de imediato os devedores dos efeitos mais gravosos das políticas recessivas que lhes foram impostas.

7 comentários:

jvcosta disse...

Zé, sabes muito bem que alinho inteiramente, que mais não seja por via de favas e polvo, mas há uma coisa que não percebo. Concertar-se com quem? Claro que deve ser a fronteira da luta, mas quem (Sócrates?) E com quem? Com Zapatero? Daí o grande problema que muita gente não está a ver. Sócrates é peão de brega, não adianta estarmos a discutir a "política nacional".

Vou mais pelo nosso amigo V. O alinhamento vai-se fazer, talvez tarde, aliás como em todas as revoluções que saem sempre depois do que devia ser a data do parto, quando portugueses, espanhois, gregos, italianos, também os irlandeses que são simpáticos e copofónicos, sairem ao mesmo tempo "a la calle".

anamar disse...

Em Berlim... só para comprar bolas...
Veremos o que vai parir a montanha.
Bfs
:))abraço
Ana

MFerrer disse...

Estaria completamente de acordo caso se referisse a Alemanha como a "actual Alemanha" controlada na sua maioria por interesses neo-liberais e expansionistas...
Mas virar as costas a Berlim corresponde a um suicídio sem assistência e, convenhamos, sem glória...
A ideia de aceitar duas ou três "divisões" na UE é isentar a mesma Alemanha das suas responsabilidades.
É que dentro em pouco o próprio "mercado" europeu, de que também depende, estará tão esfarrapado que nem pode comprar um hot-dog!
Cumps.

MFerrer disse...

Caro JVC,
Desculpe, mas acha mesmo que a presente Alemanha se coloca de rastos perante as passeatas nas calles del sur?
A ideia de um mini-clube de pobres o que é que nos aporta?
Sinceramente mais me parece um peditório de que resultará uma esmola, ou pior, se nos soltam os cães?...

Anónimo disse...

Oportuno POST!
P.Rufino

Nuno Sotto Mayor Ferrao disse...

Caríssimo José Manuel Correia Pinto,

Felicito-o pela lucidez desta sua argumentação que subscrevo.

Na verdade, na aparência os problemas residem nas dividas soberanas, mas de facto as questões essenciais radicam no sistema financeiro excessivamente opaco e na ausência de uma estratégia Europeia política e monetária para garantir o futuro do Euro e a tão almejada coesão social do velho continente. Assim, a Europa está à deriva e os empertigados alemães estão a virar-se, decisivamente, para velhas políticas de teor nacionalista.

Muitos parabéns, também, pelo aniversário deste blogue de referência na análise política.

Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt

Anónimo disse...

O "post" está certo quanto ao que são os objectivos dos alemães (como principais credores)- querem defender os interesses dos seus, os dos seus banqueiros também, à boleia, vão-se afirmando como país "normal", 1945 está a ficar muito distante. Mas o autor cai no erro dos tais indígenas, que é omitir parte importante das causas, esquece que o gigantesco endividamento não foi imposto pela Alemanha, foram os portugueses que tiveram mais olhos que barriga. As tais relações desiguais eram conhecidas e era conhecida a impotência para as alterar, ou estavam à espera de agigantar a dívida e numa frente de devedores impor novas regras? Agitar o espantalho de germanismo ressurgente duvido que leve a alguma coisa de útil, aliás, como o autor sabe, a Alemanha precisa cada vez menos do mercado do Sul, pode não ser consistente, mas o seu comércio com o exterior à zona euro tem vindo a ganhar uma pujança inesperada, além disso já não estão encostados ao Muro, um pormenor importante!
NG