sexta-feira, 15 de abril de 2011

PEC IV - AFINAL O QUE SE PASSOU?


FUNDADAS SUSPEITAS


Embora com PEC IV ou sem PEC IV a situação económico-financeira do país seja grave, muito grave, e nenhuma das soluções até agora encaradas permita olhar o futuro com um mínimo de optimismo, pode ter interesse, quanto mais não seja para desfazer certos mitos, tentar perceber o que se passou em Portugal nas 48 horas que antecederam a apresentação daquele programa em Bruxelas.

A convicção que inicialmente se generalizou com base nos factos que então vieram a lume e outros que tinham ocorrido nas semanas que antecederam o anúncio daquele PEC foi a de que técnicos da Comissão Europeia, eventualmente acompanhados por gente do FMI e do BCE, tinham estado em Lisboa, no Ministério das Finanças, a preparar com o Ministro um novo programa de austeridade, chamado de estabilidade e crescimento, semelhante ao apresentado pela Espanha uns meses antes, numa derradeira tentativa de, por via da sua aceitação em Bruxelas, se convencerem os “mercados” de que Portugal poderia passar sem o pedido de resgate.

Gizado o programa nas suas linhas essenciais, o Primeiro Ministro foi a Berlim apresentá-lo a Merkel e solicitar o seu “agrément”para a aprovação do dito no Conselho Europeu. Embora sem grande entusiasmo, parece que Merkel acedeu em aconselhar a sua aprovação, não sem antes ter obtido de Sócrates a garantia de que se o programa não obtivesse os efeitos esperados Portugal se obrigaria a pedir o resgate.

De regresso a Portugal, Sócrates deu conta a Passos Coelho, na véspera do Conselho Europeu, do programa que nele iria apresentar.

De acordo com o que então veio a público, ficou a saber-se que Sócrates teria feito telefonicamente esta diligência junto de Passos Coelho. Nada então se disse sobre se Coelho havia dado o seu acordo de princípio ao dito programa, ou se Sócrates lhe havia relatado os antecedentes da sua elaboração.

Sabe-se apenas, e este é um dado certo, que Cavaco fora mantido à margem do que se estava a passar e do que se iria passar. E toda a gente percebeu porquê: depois do discurso investidura que Cavaco fizera no Parlamento uns dias antes, ele deixara de ser um parceiro fiável para o Governo. Daí a sua marginalização.

Todavia, com o andar dos dias, e depois de tudo o que entretanto se passou – reprovação do PEC na AR, reunião do Conselho de Estado, dissolução do parlamento, pedido de resgate – ficou a saber-se que afinal Passos Coelho esteve em São Bento a falar com Sócrates sobre o assunto. Houve, portanto, um contacto pessoal e não telefónico.

E ontem soube-se mais: soube-se que todos os deputados do PSD receberam um SMS intimando-os a não falar sobre o PEC que estava a ser apresentado em Bruxelas…para não prejudicar as negociações.

Logo a seguir, de um momento para o outro tudo mudou. Passos Coelho comunicou ao país, a partir da São Caetano, que não o PSD não aprovaria o programa. E a partir daí, foi o que se conhece…

O que determinou este súbito volte-face? Aparentemente, a pressão das “bases” (entendendo-se por bases os que estão no topo) do partido, há muito ansiosas por “ir ao pote”. Daí o dilema perante o qual Passos Coelho terá sido colocado: ou há eleições no país, ou no PSD.

Só que esta tese por muita força emocional que possa ter não convence. Os dirigentes do PSD sabiam que ainda não estava criada no país uma onda que irresistivelmente os lançasse para uma maioria absoluta e simultaneamente empurrasse Sócrates para uma derrota histórica. Por isso, haviam combinado entre si, que o momento em princípio escolhido para derrubar o Governo seria lá mais para o fim do ano aquando da apresentação do orçamento. Ou seja, acreditavam que com a passagem do tempo as sucessivas medidas de austeridade do Governo acabariam por produzir no eleitorado o efeito que tão ansiosamente esperavam.

Há, portanto, todas as razões para supor que as pressões sofridas por Passos Coelho vieram de outro lado. E factos posteriores importantes apontam nesse sentido.

Primeiro facto – É sintomático que o discurso de fundo do PSD na sessão do “chumbo” do PEC tenha sido feito por Manuela Ferreira Leite, que nutre um significativo desdém por Passos Coelho, de que a todo o momento dá provas, como ainda recentemente, ao recusar encabeçar a lista do partido por Lisboa;

Segundo facto – O Presidente da República manteve o mais completo silêncio enquanto a crise se desencadeava, nada tendo feito, absolutamente nada, para a tentar evitar; falou depois da reunião do Conselho de Estado para anunciar a dissolução do Parlamento e mais tarde para apresentar uma rematada asneira quando propôs a concessão de um empréstimo intercalar pela UE…exactamente para que a negociação do resgate fosse feita, mais tarde, pelo novo governo saído das eleições;

Terceiro facto – Passos Coelho nas conversas que entretanto está tendo com o Governo sobre “esqueletos no armário” e “gato com rabo de fora”, na base de questionários mais completos do que os exigidos pelos serviços de emigração dos EUA, está sendo assessorado por próximos, muito próximos, de Cavaco Silva.

Em conclusão: Cavaco calado? Já lá dizia Kant ao considerar como fórmula transcendental dos poderes públicos o princípio segundo o qual: “Todas as acções relativas ao direito de outros homens cuja máxima não é conciliável com a publicidade são injustas”.

4 comentários:

  1. É uma boa leitura dos fatos. Realmente, já nada surpreende. Neste jogo, em que comunicação social tem um papel crucial, quem a sabe utilizar, tem uma vantagem acrescida. Quem manipula melhor que o outro?

    ResponderEliminar
  2. Parabens Dr Correia Pinto, fiquei bem esclarecido como sempre-A+ Um Abraco

    ResponderEliminar
  3. e sinceramente que interessam essas minúcias e análises picuinhas

    170 ou 100 mil milhões tanto faz

    virá sempre um VI e um VII

    isto se chegarem os trocos

    ResponderEliminar