A PROPÓSITO DO PROGRAMA FINANCEIRO APROVADO PELA TROIKA
Marcelo Rebelo de Sousa desta vez tem razão. A comunicação de Cavaco é um veemente apelo à substituição de José Sócrates. A insistência na mudança só pode ser interpretada nesse sentido: se continuarmos na mesma – isto é, se continuarmos com Sócrates – ficaremos pior.
O mais grave, porém, é que a comunicação de Cavaco revela as suas limitações e a sua incapacidade para analisar a situação portuguesa em toda a sua complexidade. Ela não constitui uma análise serena e objectiva da situação. É antes a intervenção de um líder partidário, apenas capaz de analisar as coisas pelo prisma estreito dos interesses que defende e da limitada visão do mundo que o cerca.
E como tal não escapa à demagogia, por vezes ofensiva para os portugueses de parcos recursos que, com os seus sacrifícios, têm suportado o essencial da crise. Não é todavia claro que este pendor demagógico de muitas das intervenções de Cavaco, mais do que as razões eleitoralistas de curto prazo, que ele não dispensa, não seja acima de tudo seja ditado pelas suas limitações. Limitações políticas, nomeadamente na área da política externa, limitações de análise económico-financeira e até limitações de mundividência.
Cavaco não questiona o status quo, por mais aberrante que ele seja. A zona euro tal como foi concebida, os seus desenvolvimentos posteriores, a crise financeira internacional, as grandes manobras do capital financeiro e especulativo, coadjuvadas pela acção intrusiva das agências de rating, constituem para Cavaco um contexto inquestionável e indiscutível. As coisas são assim, porque alguém mais poderoso e mais forte do que nós assim o decidiu. Questionar tal contexto apenas servirá para atiçar ainda mais a acção daqueles que devemos respeitar …e se possível imitar.
Esta típica atitude pequeno-burguesa, de inveja e respeito pelo mais forte, esta profunda convicção de que pela discrição do nosso comportamento e pelo respeito pelos poderosos poderemos alcançar os nossos objectivos e até concitar a sua simpatia, leva Cavaco a subestimar a complexidade da situação em que o país se encontra, reconduzindo-a ou reduzindo-a quase a uma questão de carácter e de competência de quem governa.
Com uma pessoa parecida com Cavaco, que defenda as mesmas ideias, que possa por ele ser permanentemente acompanhada na governação – e Cavaco tem essa pessoa, aliás já em franca actividade – tudo seria diferente e seria então possível encaminhar o país na senda do desendividamento e do progresso.
E é aqui – nas “receitas” - que intervém a demagogia, por vezes injuriosa, de Cavaco. Como sair, então, da presente situação? Cavaco responde com a aparente simplicidade do homem comum para tornar a sua mensagem mais atractiva: “Não podemos gastar acima das nossas possibilidades”.
Mas quem é que gasta acima das suas posses: são aqueles que ganham pouco e sucumbem, muitas vezes por necessidade, aos apelos da sociedade neoliberal de consumo que, depois de instaurar uma grande desigualdade na distribuição dos rendimentos, teve de baratear o crédito para garantir a sua própria subsistência e o seu permanente desenvolvimento ou aqueles que ganham muito acima daquilo que o seu trabalho realmente produz, ou os que recebem reformas milionárias por trabalho que não prestaram e descontos que não fizeram, ou os que, actuando no negócio do dinheiro, se endividam no estrangeiro para o emprestarem internamente a quem muitas vezes não está em condições de pagar tudo o que pede emprestado, ou ainda aqueles que constroem por todo o lado grandes superfícies, verdadeiros templos de despesismo e de consumo, que, na profusão com que existem, apenas servem para aumentar o endividamento, as importações e eliminar por completo qualquer hipótese de poupança interna?
A quem se refere Cavaco? A estes últimos não, certamente, pois são empresas, dirá Cavaco com um P bem labial, que concorrem para a prosperidade nacional.
Depois vem a conhecida conversa das exportações, como se os países, estejam ou não integrados em grandes espaços de comércio livre, pudessem viver fundamentalmente de exportações e como se a faculdade de exportar fosse independente dos múltiplos factores que a condicionam, entre os quais o próprio valor da moeda.
E daqui, de toda esta conversa que a prática cavaquista se encarregaria de pôr em obra, resultaria, como recompensa atribuída a quem se porta bem, a reconquista da “confiança dos mercados”. Quase valeria a pena perguntar: Mas confiança dos mercados para quê, se as “receitas” apresentadas visam exactamente acabar com o endividamento?
O mais grave, porém, é que a comunicação de Cavaco revela as suas limitações e a sua incapacidade para analisar a situação portuguesa em toda a sua complexidade. Ela não constitui uma análise serena e objectiva da situação. É antes a intervenção de um líder partidário, apenas capaz de analisar as coisas pelo prisma estreito dos interesses que defende e da limitada visão do mundo que o cerca.
E como tal não escapa à demagogia, por vezes ofensiva para os portugueses de parcos recursos que, com os seus sacrifícios, têm suportado o essencial da crise. Não é todavia claro que este pendor demagógico de muitas das intervenções de Cavaco, mais do que as razões eleitoralistas de curto prazo, que ele não dispensa, não seja acima de tudo seja ditado pelas suas limitações. Limitações políticas, nomeadamente na área da política externa, limitações de análise económico-financeira e até limitações de mundividência.
Cavaco não questiona o status quo, por mais aberrante que ele seja. A zona euro tal como foi concebida, os seus desenvolvimentos posteriores, a crise financeira internacional, as grandes manobras do capital financeiro e especulativo, coadjuvadas pela acção intrusiva das agências de rating, constituem para Cavaco um contexto inquestionável e indiscutível. As coisas são assim, porque alguém mais poderoso e mais forte do que nós assim o decidiu. Questionar tal contexto apenas servirá para atiçar ainda mais a acção daqueles que devemos respeitar …e se possível imitar.
Esta típica atitude pequeno-burguesa, de inveja e respeito pelo mais forte, esta profunda convicção de que pela discrição do nosso comportamento e pelo respeito pelos poderosos poderemos alcançar os nossos objectivos e até concitar a sua simpatia, leva Cavaco a subestimar a complexidade da situação em que o país se encontra, reconduzindo-a ou reduzindo-a quase a uma questão de carácter e de competência de quem governa.
Com uma pessoa parecida com Cavaco, que defenda as mesmas ideias, que possa por ele ser permanentemente acompanhada na governação – e Cavaco tem essa pessoa, aliás já em franca actividade – tudo seria diferente e seria então possível encaminhar o país na senda do desendividamento e do progresso.
E é aqui – nas “receitas” - que intervém a demagogia, por vezes injuriosa, de Cavaco. Como sair, então, da presente situação? Cavaco responde com a aparente simplicidade do homem comum para tornar a sua mensagem mais atractiva: “Não podemos gastar acima das nossas possibilidades”.
Mas quem é que gasta acima das suas posses: são aqueles que ganham pouco e sucumbem, muitas vezes por necessidade, aos apelos da sociedade neoliberal de consumo que, depois de instaurar uma grande desigualdade na distribuição dos rendimentos, teve de baratear o crédito para garantir a sua própria subsistência e o seu permanente desenvolvimento ou aqueles que ganham muito acima daquilo que o seu trabalho realmente produz, ou os que recebem reformas milionárias por trabalho que não prestaram e descontos que não fizeram, ou os que, actuando no negócio do dinheiro, se endividam no estrangeiro para o emprestarem internamente a quem muitas vezes não está em condições de pagar tudo o que pede emprestado, ou ainda aqueles que constroem por todo o lado grandes superfícies, verdadeiros templos de despesismo e de consumo, que, na profusão com que existem, apenas servem para aumentar o endividamento, as importações e eliminar por completo qualquer hipótese de poupança interna?
A quem se refere Cavaco? A estes últimos não, certamente, pois são empresas, dirá Cavaco com um P bem labial, que concorrem para a prosperidade nacional.
Depois vem a conhecida conversa das exportações, como se os países, estejam ou não integrados em grandes espaços de comércio livre, pudessem viver fundamentalmente de exportações e como se a faculdade de exportar fosse independente dos múltiplos factores que a condicionam, entre os quais o próprio valor da moeda.
E daqui, de toda esta conversa que a prática cavaquista se encarregaria de pôr em obra, resultaria, como recompensa atribuída a quem se porta bem, a reconquista da “confiança dos mercados”. Quase valeria a pena perguntar: Mas confiança dos mercados para quê, se as “receitas” apresentadas visam exactamente acabar com o endividamento?
Cada uma das suas frases constitui um atentado à livre escolha dos portugueses e é um reles exercício conspiratório contra a democracia e a livre escolha dos cidadãos.
ResponderEliminarSe o PSD perder as eleições quem tem de mudar é ele. De emprego e de casa.
Excelente...
ResponderEliminarCom seis ou sete parágrafos, não fica à mostra apenas o 'rabo', fica à mostra o 'gato' todo!
A.M.
Caro JMCorreia Pinto,
ResponderEliminarNotável!... Obrigado.
Faço link!
Um abraço.
Caríssimo JMCorreia Pinto,
ResponderEliminarSubscrevo a sua análise expressa neste notável artigo, como diz a Ana Paula Fitas.
O partidarismo do Presidente da República em todo este contexto de aflição nacional não escapou a ninguém, embora na comemoração original do 25 de Abril tenha mostrado vontade em apelar a convergências indispensáveis.
Concordo inteiramente que a substituição de José Sócrates por Pedro Passos Coelho, não obstante os condicionalismos impostos pelo memorando de acordo com a troika, é uma receita com uma dosagem muito acrescida de neoliberalismo que resultará em maiores desequilíbrios sociais.
A resignação face à "economia de casino" por parte do Presidente da República é uma demonstração da sua mundividência neoliberal que agravará desigualdades sociais.
Saudações cordiais, Nuno Sotto Mayor Ferrão
www.cronicasdoprofessorferrao.blogs.sapo.pt
A desfaçatez não tem limites na política. Neste caso, S.EXª parece esquecer que as suas políticas (dos fantásticos anos de ouro!) nada fizeram para minorar os desequilíbrios quase ancestrais da economia. Quem não se lembra da euforia pelos postos de trabalho "criados" nas grandes mercearias das famílias Azevedo e Soares dos Santos? E a sementeira de mega-centros comerciais apresentada como prova da nossa modernidade? Pois esta beberragem foi preparada e começada a servir nesses anso do início da nossa "prosperidade".
ResponderEliminarps
Que dizer do "independente" governador do Banco de Portugal? Como é possível chegar a este estado?
LG
Ter uma mula velha !? Nao... Dai-nos uma nova mas que nao seja mula!
ResponderEliminarUm abraco Dr. Correia Pinto e comentario merece um A+
(…) Esta típica atitude pequeno-burguesa, de inveja e respeito pelo mais forte, esta profunda convicção de que pela discrição do nosso comportamento(…) pois é, a tal do bom aluno que com orgulho naife diz que fomos!
ResponderEliminarGrande dissecação! Cavaco nunca fica em bom estado quando decide escrever sobre ele: fica exposto. O que torna mais espantoso haver quem não consiga ver o óbvio.