O BANCO DE PORTUGAL E A EDP
Os casos do Banco de Portugal e da EDP são paradigmáticos.
O Governador do Banco de Portugal com a impunidade própria de quem representa na ordem interna o capital financeiro credor do Estado português exige austeridade, protege os bancos, advoga para o ano em curso medidas ainda mais austeras, exige sacrifícios sem conta a quem já quase mal tem para comer e faz exactamente o contrário na instituição que dirige.
Normal, perfeitamente normal. A austeridade é uma monstruosa transferência de recursos, sob a forma de saque, dos salários de quem trabalha para o grande capital.
O que se passa na EDP é gravíssimo, embora seja também algo que vai pôr à prova a capacidade de resignação dos portugueses. Se depois do que aconteceu na EDP, se depois dos protestos que acompanharam as nomeações tudo continuar na mesma e for esquecido como algo que incomoda mas que faz parte da lei da vida, então isso significa que o povo português está preparado para mais um longo período de tirania, que não deixará de ser aproveitado pelos “novos tiranos”, muito mais perigosos e perversos que os antigos.
De facto, o que é revoltante na EDP não são tanto as nomeações feitas pelos accionistas em conluio com o governo. Embora sob esse ponto de vista até sejam mais perversas do que as habituais nomeações de boys, onde quem nomeia, pelo menos, tem de assumir a responsabilidade da nomeação, ao contrário do que aqui acontece onde os boys e os recompensados ficam formalmente cobertos pela decisão do accionista, as nomeações da EDP pelas pessoas sobre que recaíram constituem o melhor exemplo do que realmente está em jogo na presente política de austeridade.
Além de constituírem para todos os nomeados o segundo ou o terceiro emprego milionário a juntar a reformas (algumas delas obtidas escandalosamente, que o Estado, a partir deste ano, vai ter de pagar…) e a empregos também milionários, elas respeitam, pelo menos algumas delas, a pessoas que, em programas regulares de televisão e em outro tipo de intervenções públicas, têm tido um papel muito activo na presente crise e na sua doutrinação.
Pessoas que nunca hesitaram na defesa da austeridade levada a limites jamais atingidos; pessoas que consideraram brandas as medidas iniciais propostas pela Troika; pessoas que não se cansaram de afirmar que os portugueses viviam acima das suas possibilidades; que o Estado tinha de emagrecer, deixando de prestar serviços essenciais à esmagadora maioria da população; que as empresas pagavam custos salariais directos e indirectos altamente prejudiciais para a sua competitividade; pessoas que fustigaram no plano moral e político, principalmente com imputações morais torpes, anteriores governantes pelo endividamento do país, aceitem agora, no auge da crise, juntar aos seus milionários salários ou pensões, ou a ambas as coisas, novos rendimentos milionários pelo desempenho de funções pouco mais que decorativas, pagos por uma das empresas mais endividadas de Portugal, com um rácio de dívida muito superior ao do Estado português.
Uma empresa que actua em Portugal praticamente em regime de monopólio ou, no máximo, em oligopólio, se se entrar em linha de conta com outros intervenientes quase insignificantes no mercado, que aumentou drasticamente o endividamento externo de Portugal, que vende a energia mais cara da Europa, que tem beneficiado do vultoso apoio dos contribuintes que subsidiam com os seus impostos uma parte da sua produção energética, e que, não obstante o seu altíssimo endividamento, continua a distribuir dividendos e a pagar bónus elevadíssimos.
Agora compreende-se melhor por que alguns dos agora integram as nomeações da EDP reagiram tão negativamente à invocação do conceito de equidade – um conceito de múltiplos e dúbios sentidos, segundo eles – quando confrontados com as críticas de Cavaco ao orçamento e se dele se distanciaram por as “suas posições não contribuírem em nada para a resolução dos graves problemas com que Portugal se debate, antes pelo contrário”.
O que está em causa nestas nomeações não é apenas o grau zero da moralidade pública. É muito mais do que isso – é um exemplo prático do saque que por via da austeridade se opera para manter intocados os rendimentos dos grandes responsáveis pela crise à custa de quem é espoliado dos seus honestos salários ou pensões; enfim, uma situação que apenas tem de novo relativamente ao que já se conhecia o facto de ter sido evidenciada com total despudor.
Depois de tudo isto o que sobra para o fanatismo ideológico que parecia estar por detrás de tantas das decisões tomadas e a tomar? Muito pouco. Sem negar que haja quem piamente continue acreditar numa mirífica resposta das medidas propostas, a verdade é que esta direita portuguesa, incapaz de produzir riqueza e de criar um país próspero, que vive acoitada no Estado e privilegia a exploração como permanente “inovação tecnológica”, serve-se hoje do neoliberalismo e das políticas restritivas como ontem se serviu da pide.
Mas uma vez subscrevo na integra e a discordância vai para detalhes. Julgo que a passagem "pessoas que não se cansaram de afirmar que os portugueses gastavam mais do que produziam" não me parece ter sido exactamente assim... o verbo "produzir" é um verbo não usado e até proscrito... o que se afirmava é que "vivíamos acima das nossas possibilidades" slogan bastante acusatório da culpa generalizada...
ResponderEliminarCorigi o sentido indicado. Muito mais fiel ao que foi dito.
ResponderEliminarObrigado pela lembrança.
CP
Eu se me chamasse A. de Almeida ex-presidente arredada do lugar não gostava, especialmente se estes outros fossem ganhar o mesmo que eu (ele) ou mesmo mais.
ResponderEliminarVi indicado para o CG o antigo governador de Macau, pessoa certamente respeitável para os Chineses e desejada e certamente indicada por eles e chegado a este ponto, pergunto:
quem nomeou ou indicou esses sortalhaços, foi o Governo português ou o PSD?
Tem toda a razão quando malha e bem sobre a privatização da parte do Estado e sobre a importância da edp e do que faz e que é estratégico.
Mas se privatiza estamos à espera de quê?
E que me diz de a Alemanha ter emitido dívida que, no final, vai pagar menos do que, agora, recebe?
Não é verdade que os capitalistas estão com medo de perder o dinheiro que emprestam e até já pagam para o guardar?
E aquilo de os EEUU porem a rotativa a emitir notas de d´lar e pagarem/amortizarem obrigações de mais de 2 biliões! Não é uma afronta para países como Portugal que querem pagar com suor?
E este sistema capitalista está para durar?
Obrigada pelas suas sempre esclarecidas opiniões.
Água mole em pedra dura...
ResponderEliminarA.M.
Não concordo com a vozearia da mediocridade e inveja nacional!!
ResponderEliminarFalo apenas da EDP por razões de economia de página: Ora bem, se os chineses e vizinhos ficam a pé até às tantas e o R. Madrid e Barcelona fazem jogos com os atletas ainda a dormir para que aqueles possam apreciar craques como Ronaldo, Messi etc. iam os tais chineses perder a possibilidade de contratar craques da mesmos valia para os seus negócios? Há quanto tempo que os homens das três gargantas ansiariam poder contar com o génio do direito que é Celeste Cardona? Quanto a Catroga, bom.. nem vale a pena falar! E andam por aí e por aqui a insinuar que houve "caldinho" na venda da EDP!!! Não briquem comigo!!
A todos os que andam a levantar suspeitas maldosas sugiro que contribuam para as finanças públicas como eles vão contribuir, dariam um contributo decisivo para a solução dos nossos problemas colectivos.
lt
Mas a ideologia que, veladamente, V. Exa. parece advogar, ainda é pior que a que apresenta no seu artigo. O panorama que representa, cuja veracidade é plausível, não difere muito do que se passava na ex-URSS ou ex-RDA, onde não havia PIDE mas o seu equivalente. Só neste ultimo estado a liberdade era tanta que por cada sessenta e sete cidadãos havia um polícia político e para adquirir, por exemplo, um frigorífico tinha que se inscrever e podia recebê-lo, só passados dez ou doze anos! Facilmente se percebe que o neoliberalismo persegue a “sovietização” das sociedades, “mutatis mutandis”. Portanto, maniqueísmos tipo esquerda é que é bom e direita mau ou vice-versa é o melhor caminho, estou em crer, para não se resolver nada.
ResponderEliminarO Senhor Dr. já há muito tempo que está para mostrar como se ataca a crise, mas nunca mais diz tal. É estranho verificar que para o Senhor Dr. só agora é que está tudo mal, pois, no tempo dos governos do PS, quando, de facto, a corrupção, o tráfico de influências, ou as nomeações atingiram o extremo, nunca viu nada! Até parece que os males do País começaram só há seis meses. Há bem pouco tempo houve uma greve geral e manifestações. Todavia, essas mobilizações não foram para exigir do poder o julgamento dos responsáveis pelo estado a que o País chegou. Nada disso. A preocupação era pedir mais dinheiro, utilizando, por vezes, uma linguagem a resvalar para o insultuoso.
Mas nos, e eu como portugues, nao estou a pedir nem um governo da esquerda, nem da direita, nem um do centro. O que eu pesso e um governo que porteja os seus cidadoes, que estableca um teto salarial universal, pelo menos "agora" e que nao tire o pao da mesa dos pobres enquanto "outros"usam a sua "intelegencia" para acumular 60 mil Euros poe mes! Mas e assim que vamos pagar a divida? Somos todos obrigados..ou temos que comecar so por todos aqueles que para alem da pouca intelegencia ainda tem que morrer a fome? Onde esta entao a destribuicao justa e os deveres de cada um de nos?Mas quem esta por de traz de tudo isto? Mas que pouca vergonha se vem desenrolando depois do 25 de Abril. Sera que o primeiro ministro foi posto la so para fazer o que esta a fazer? Mas afinal quem manda em Por-
ResponderEliminartugal? Quais sao as "seitas" por detraz de tudo isto,nunca visto. Ven de fora? Estao ca dentro? Podera quem sabe ou pensa dizer-me?
A pergunta, com o devido respeito vai para o comentador da 1.37
Linkei o seu artigo
ResponderEliminarAinda havemos de ver estes gajos todos na cadeia.
ResponderEliminarMais depressa do que eles pensam.
Na cadeia, sim, mas têm de pagar a estadia...com dinheiro.
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