HOLLANDE DESAFIA BERLIM
E BRUXELAS
Merkel na entrevista que ontem concedeu à cadeia pública de
televisão alemã - ARD – deixou muito claro qual a sua ideia para o futuro da
Europa. Disse que a Europa não precisa apenas de União Monetária, mas também de
mais união política e fiscal de modo a que haja políticas orçamentais comuns. E
simultaneamente deixou um aviso: tem que se admitir que se vá abrir ainda mais
a forquilha entre os dois grupos de uma Europa a duas velocidades. Quem não
quiser avançar não pode impedir que outros o façam, citando como exemplo a
eurozona. Por fim, reiterou o princípio que desde o início da crise tem
norteado o seu ideário político: crescimento e consolidação das finanças
públicas são as duas faces da mesma moeda. Não
pode haver crescimento sem consolidação das finanças públicas, embora esta não
baste para assegurar aquele: é preciso também pensar na competitividade.
E aqui está em poucas palavras o credo político da Alemanha
na União Europeia. Da Alemanha e não apenas da coligação no poder em Berlim, já
que estas ideias são no essencial sufragadas pelo SPD.
Quando Merkel reclama mais união política e fiscal no fundo o
que está a dizer é que as regras ditadas pela Alemanha devem aplicar-se a todos
os países que fazem parte da zona euro. Ela não tem uma única palavra nem
apresenta qualquer proposta no sentido de assegurar maior democraticidade às decisões
da União Europeia. Merkel sempre se sentiu confortável com o pseudo-directório
que constituiu com Sarkozy no qual ela gizava as grandes diretrizes de política
económica e financeira, deixando a Sarkozy o encargo de as defender e explicar.
Por outro lado, a ameaça que decorre das suas palavras também só pode ser
entendida numa perspectiva anti-democrática. Quem não quiser mais integração, deverá
abandonar a zona euro, contanto que se mantenha no mercado único. Por outras
palavras, quem não aceitar mais integração pode sair da União Monetária desde
que mantenha as fronteiras abertas para a entrada dos produtos alemães.
Entretanto, do outro lado do Reno, Hollande adopta algumas
medidas emblemáticas manifestamente destinadas a desafiar o essencial da política
germânica para a União Europeia. Uma dessas medidas tem a ver com a prometida
revisão da política de segurança social posta em prática por Sarkozy. A partir do
próximo 1 de Novembro os franceses que tenham descontado 41,5 anuidades para a
segurança social podem reformar-se aos sessenta. Ainda no mesmo sentido, a ministra
da Segurança Social anunciou que o novo sistema vai oferecer vantagens
especiais às mulheres que tenham sido mães e aos desempregados de longa duração.
A ideia do governo francês, a concretizar por via de outras políticas, é a de
que se pode caminhar no sentido da consolidação orçamental sem renunciar a nenhuma
das conquistas do estado social. Equilíbrio orçamental sem austeridade,
portanto. Evidentemente que vai ser necessário repor a justiça fiscal pondo os
ricos a pagar a crise e não o contrário que é exactamente o que está
acontecendo nos demais países da zona euro. Para se compreender o que isto quer
dizer: em França, Sarkozy com as isenções fiscais que concedeu aos ricos deixou
de cobrar entre 70 mil milhões e 110 mil milhões de euros (números do Tribunal
de Contas francês). Há, portanto, muita margem fiscal para ir buscar dinheiro
onde ele existe sem necessidade de onerar brutalmente os rendimentos mais
baixos como se está a fazer por todo o lado.
Aliás, e para terminar, quem conhece as políticas do New Deal
sabe que foi isto que Roosevelt fez na América depois de 1932, onde os
rendimentos mais elevados chegaram a ser tributados com taxas de 90%!
No fundo é luta, sempre presente, entre uma Europa para todos os cidadãos europeus, trabalhadores, comerciantes, profissões liberais, isto é, do cidadão comum e uma Europa para os bancos, banqueiros e para o capital. Em suma, Europa dos cidadãos comuns versus Europa dos ricos...
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