Que o euro está perto do fim parece não haver dúvidas.
Ninguém vai arriscar mais um cêntimo do seu dinheiro para salvar a Espanha, nem
a Alemanha parece minimamente disposta a permitir que o BCE injecte biliões de
euros na economia. Não é que uma ou outra no actual contexto resolvesse o
problema de fundo, mas sempre permitiria algum alívio e atenuaria por mais uns
tempos a pressão, sempre na esperança de que algo de positivo pudesse suceder
depois, embora não se saiba bem como, nem por que meios.
De facto, o que a Espanha espera e quer não é um resgate
verdadeiro e próprio, aliás quase impossível dada a dimensão do “buraco”
espanhol; o que a Espanha quer é uma intervenção massiva do BCE no mercado
secundário da dívida, facto que, mesmo a verificar-se, não resolveria substancialmente nada dentro da lógica de funcionamento do euro. Apenas adiaria por mais um tempo um problema que aumenta tanto
mais quanto mais adiamentos desta natureza vai tendo. E é por isso que a Merkel
diz que a crise actual é uma crise para ser resolvida numa década e não em
meses. Ou seja, é uma crise sem solução como qualquer pessoa minimamente
esclarecida já percebeu há muito tempo.
Na Espanha a situação é dramática. É objectivamente dramática
e é subjectivamente agravada por um governo que perdeu completamente o rumo e
já não sabe o que mais há-de fazer para inverter ou, no mínimo, suster a
situação. É óbvio que com os juros acima de sete por cento em empréstimos a
dez anos para pagar dívidas contraídas com juros inferiores a 2% por cento ao ano não
há finanças que se aguentem para mais num contexto francamente recessivo em que
todos os dias decresce a receita esperada, se multiplicam as falências e se vai
instalando inelutavelmente a bancarrota de entes públicos de grande envergadura
como é o caso de várias regiões autónomas.
O ministro das Relações Exteriores, referindo-se ao BCE, diz
que na Europa há um banco clandestino que não actua; a jovem vice-presidente do
Conselho, que ainda há meses transpirava optimismo por todos os poros, fala
regularmente sem dizer nada, lamenta-se em público e “dá graxa a Schäubler três
vezes por dia” na esperança de que da Alemanha possa finalmente chegar a
notícia redentora; o ministro da Fazenda diz que não há dinheiro nos cofres
públicos e que se as coisas continuam assim nem os ordenados poderá pagar; o
ministro da Economia participa nas múltiplas reuniões do euro grupo e
“encosta-se” a Jean Claude Junker convencido de que da sua influência junto dos
“ortodoxos” poderá resultar a salvação de Espanha; enquanto Rajoy, deprimido e
envergonhado, se esconde sempre que pode e participa publicamente no mínimo
possível para dar a ideia de que está 24 por dia afanosamente em busca de uma
solução que há-de chegar.
Entretanto, a Espanha vai-se extremando. A deputada Andrea Fabra,
filha de um influente político do PP em Valência, para sublinhar a situação em que vão ficar os desempregados depois do corte no subsídio de desemprego que Rajoy acabava de anunciar, soltou nas Cortes um
sonoro “que se jodan!”.
Simultaneamente, o povo em manifestações com forte presença sindical mas onde é
também possível descortinar um profundo sentimento anti-políticos vai tomando
conta das ruas e das praças das principais cidades de Espanha com palavras de
ordem cada vez mais contundentes.
A crise espanhola é tão grave que muito provavelmente já não
contagiará mais ninguém. Acaba ali o contágio e um outro tempo começará. Qual
seja, é difícil dizê-lo, mas se o povo mantiver a presença na rua e
intensificar a luta por todos os meios ao seu alcance a probabilidade de conseguir
um resultado mais próximo dos seus interesses será incomparavelmente maior do
que se deixar a solução do problema àqueles que o causaram.
E é exactamente por
este lado que pairam sobre Portugal as piores perspectivas. Malandros de todos
os matizes debitam diariamente nas televisões e nos jornais as soluções que o
povo deve seguir para que os seus interesses - os dos grandes responsáveis por
tudo isto – continuem totalmente salvaguardados durante a catástrofe à custa do
sacrifício dos demais. E o povo na sua maioria continua infelizmente a dar-lhes
ouvidos.
Alguns exemplos para além daqueles que resultam das
intervenções políticas dos que exercem funções representativas, como Cavaco,
Passos Coelho, Álvaro, Portas C.ª.
Regularmente Medina Carreira através da TVI e com a colaboração da Madame
Judite de Sousa, agoirando sobre o país, intoxica e assusta os portugueses com
toda a espécie de patranhas. Franzindo o olho esquerdo e dando ao fácies um ar facínora,
diz com toda a naturalidade a propósito do acórdão do TC contra o qual
obviamente está: o Tribunal ainda não
percebeu que o que consta desta Constituição não tem valor. Ela foi feita numa
altura em que fazíamos moeda, agora não fazemos. Mas não se fica por aí, se
lhe perguntam pelas rendas do sector energético ou pelas parcerias volta a
franzir o sobrolho, diz que foram negócios mal feitos, mas que o Estado português
tem de manter a sua credibilidade na ordem jurídica interna e internacional. E
se em vez deste se ouve um outro “pardalão” muito solicitado nestas ocasiões a
dificuldade está em perceber como é possível ter lata para dizer coisas como
esta: Nós envidámo-nos, entre outras
razões, porque as pessoas se puseram a comprar casas num frenesim sem sentido,
toda a gente queria ter uma casa e o resultado agora é este. Ou ainda: o Estado não está a endividar-se para apoiar
ou salvar os bancos; os accionistas estão com as acções nos mínimos e assim vão
continuar. O dinheiro é para garantir o reembolso dos depositantes; é para
salvar os depósitos. Quem assim fala é o sr. João Salgueiro, ex-membro de
um governo de Marcelo Caetano; ex-ministro das Finanças, ex-presidente do Banco
de Fomento; ex-presidente da CGD, ex-presidente da Associação de Bancos, um dos
grandes responsáveis pelo estado a que o país chegou, sempre pago com salários
e reformas milionárias porque o “sector
financeiro é muito rentável”, como disse com toda a convicção aqui há cerca
de dois anos, para justificar porque uns eram atingidos mais do que outros, quando
Sócrates decretou as primeiras medidas de austeridade sobre a
função pública e as pensões.
São apenas dois das dezenas de exemplos que semanalmente se
poderiam colher nas televisões, rádios e jornais.
Uma coisa parece certa: não obstante a relativa e aparente calma
da sociedade portuguesa perante o que se está a passar, isto vai mudar, e muito,
dentro de relativamente pouco tempo. Como vai mudar na Grécia e em Espanha. A
questão está em saber para que lado. Mas também é óbvio que só mudará para o
lado deles se nós deixarmos. É que nós somos incomparavelmente mais. Portanto….
Esqueceste-te de mencionar um outro grande FP que teve a pouca vergonha de ainda hoje dizer que a decisão do Tribunal Constitucional foi "um enorme erro"! E estes gajos vão continuar impunes?
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