ESTÁ EM EXECUÇÃO UM
GOLPE DE ESTADO DE TIPO NOVO
A direita tem em curso duas campanhas – a revisão da
Constituição e a insustentabilidade do Estado social – que estão sendo levadas
a cabo intensamente com recurso a todos os meios do aparelho ideológico ao seu
serviço com vista à subversão ou mesmo destruição dos mais elementares princípios
em que se fundamenta o Estado de direito democrático, o mesmo é dizer a
democracia tal como a conhecemos e praticamos, mesmo com as limitações que em
geral lhe são apontadas.
O pano de fundo que serve de contexto à campanha é a crise económico-financeira
que o pais atravessa, a qual é quase sempre apresentada, expressa ou
subliminarmente, como algo da responsabilidade do povo. Ou seja, do povo que
não tem meios nem recursos para provocar uma crise financeira e que, pelo
contrário, sofre as consequências dos que dela tiraram e continuam a tirar todas
as vantagens.
Se este é contexto que serve de pano de fundo à campanha, o
pretexto é, no que toca à revisão da Constituição, a decisão do Tribunal Constitucional,
e no que respeita à insustentabilidade do Estado social, a incapacidade de
apresentação de um orçamento credível, em consequência de uma política
deliberada de destruição da economia.
Passando em revista as declarações dos representantes desta
direita plutocrática que quer destruir a democracia, e que conta – é bom não
esquecê-lo – com o apoio do Governo e dos partidos da maioria que o suporta (e
veremos brevemente de mais quem…), todos eles são categóricos no ataque à
Constituição tido como o obstáculo fundamental e decisivo à superação da crise.
Vale a pena relembrar algumas dessas declarações: Pires de Lima
disse que com esta Constituição não seria possível cumprir as metas a que
Portugal se obrigou internacionalmente, apelando à Troika para que imponha ao Estado
português a sua revisão como condição indispensável à superação da crise. Para
este alto dirigente do CDS a Constituição constitui um obstáculo porque impõe
ou permite decisões como a que o TC tomou a propósito do “corte” dos salários
dos funcionários públicos e das pensões dos reformados.
Mas se este clamor já tinha muito eco nos órgãos de
comunicação social, principalmente a partir do momento em que Medina Carreira começou
a enfatizar o anacronismo de uma Constituição redigida num tempo muito
diferente do que agora se vive (que dirá Medina da Lei Fundamental da República
Federal da Alemanha – 1949 – ou da Constituição americana – 1787…), ele tem
vindo nos últimos tempos a ser amplificado por alguns dos principais
representantes da plutocracia e simultaneamente máximos beneficiários da situação criada pela crise, como é o caso de Fernando Ulrich, presidente do BPI, Nuno Amado,
presidente do BCP, António Mexia, presidente da EDP, Eduardo Catroga,
presidente do Conselho Geral de Supervisão da EDP, Feraz da Costa, membro do
trio de terroristas económicos que assessora o Governo, defendendo sem reservas
a revisão da Constituição para que o país possa finalmente progredir e
livrar-se de decisões como a que o TC recentemente tomou a propósito do “corte”
de salários e pensões.
Como toda a gente sabe, foi em nome do princípio da igualdade,
consagrado no artigo 13.º da Constituição da República, que o Tribunal decidiu
pela inconstitucionalidade da norma que permitia aqueles “cortes”. Com ou sem
norma expressa tal princípio sempre decorreria do conceito de Estado de Direito
Democrático consagrado no artigo 2.º da Constituição.
As conhecidas personalidades que vem fazendo esta campanha
contra a Constituição podem não saber nada de direito, mas sabem muito bem o
que querem. E o que eles querem, o que a direita realmente quer, é
institucionalizar um sistema que não só promova e aprofunde a desigualdade em benefício
de um número cada vez mais restrito de privilegiados, mas simultaneamente
impeça qualquer tipo de controlo jurídico sobre as arbitrariedades do poder. No
fundo, é a nostalgia de um salazarismo com pide, ou mesmo sem pide, que povoa
as mentes daquelas criaturas. Por esta simples amostra se vê o tipo de
Constituição que eles gostariam de ver entrar em vigor.
Simultaneamente e com o mesmo sentido, uma legião de comentadores
e analistas políticos, “cientificamente” apoiados nos “Duques” e “Cantigas” que
pululam nas nossas televisões, vai dando corpo à campanha da “insustentabilidade
do Estado social”. Aqui o raciocínio ainda é mais simplista: se as nossas
receitas, mesmo com os sacrifícios “colossais” que se avizinham, não são
suficientes para pagar as nossas despesas é porque nós estamos a fazer despesas
para as quais não temos dinheiro. Logo, é preciso “cortar” nessas despesas, etc.,
etc…
Do lado do Governo, Gaspar, naquele jeito manso e frio de
quem substituiu as pessoas pelos números, reconduzindo-as à mera existência
estatística, também já entrou na campanha, antevendo o mais que certo fracasso
do orçamento que perversamente preparou para aprovação pelo Parlamento.
Mesmo que os argumentos sejam diferentes dos apresentados
pelo inteligentíssimo Pulido Valente, que vê no actual Estado um conjunto de “funções”
que só beneficiam os “funcionários” ou de “serviços sociais” que se autojustificam
- é caso para perguntar a que serviços recorreu ele para se tratar de doenças
contraídas culposamente ou não … - ninguém pode esquecer que as actuais
dificuldades de financiamento do Estado Social resultam directamente de uma
política propositadamente prosseguida com vista à destruição de uma parte
significativa da economia, com as consequentes falências e desemprego em massa,
dos efeitos altamente recessivos dessa política, da consequente ausência de
crescimento económico e do inevitável aumento da dívida pública e seus
encargos. Ou seja, chegou-se ao ponto em que estamos antes de mais porque nos
obrigaram a pagar uma dívida contraída em benefício dos bancos e do grande capital,
porque nos envolvemos numa perigosa aventura cujas consequências os dirigentes
não foram capazes de antecipar e da qual vamos ter de sair sem renegar a
essência do Estado que construímos mas antes postergando para tempo oportuno os
encargos que agora nos sufocam.
Seguir a outra via, seguir a via da destruição do Estado
social, independentemente das óbvias vantagens que daí resultariam para
plutocracia que manobra e fomenta a campanha, seria acabar com a democracia. Participar
nesse debate num estilo colaborante, ainda que reticente quanto à sua
amplitude, será ser cúmplice daquela destruição. Que o Partido Socialista tenha
isso bem presente. É de um verdadeiro golpe de Estado que estamos a falar. De um golpe de Estado de tipo novo, inquivocamente apoiado ou mesmo fomentado pela União Europeia sob o pretexto de que é precisio cumprir as "metas do défice".
Com a perspectiva da "refundação do memorando de ajustamento" (!!!???), o PS vai ser convidado a integrar o "golpe de estado de tipo novo" - será mais um passo (definitivo?) a dar-se na concretização da "profecia" de Brecht: uma nova constituição, simples, inovadora, e que deixaria "os mercados" em total e divino êxtase - Artigo Único: "O Governo elege o povo"?
ResponderEliminarSubscrevo.
ResponderEliminarAinda recentemente um grupo de jovens economistas a estudar na Holanda fizeram um trabalho exaustivo sobre o estado social e os contribuintes, nas ultimas decadas para concluirem que os contribuintes não devem nada ao estado no que se refere ao estado social pois as suas contribuições sempre foram suficientes para pagar o estado social que se tem Se foram introduzidos factores externos a este estado de vcoisas foram as decisões politicas, como esta ultima de integrarem os pensionistas bancarios no regime geral sem provisionarem o sistema com os valores necessários para esta afectação, desviando os recursos financeiros desta integração para outros fins. Uma outra situação e que se tem vindo a acentuar e subfinanciarem as actividades do estado social tornando por isso insustentável, verificando com mais evidência na saude, onde por exemplo as cirurgias efectuadas, são subfinanciadas não dando por vezes para o material utilizado.
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