EM BREVE, TUDO MESMA
Está para ai meio mundo preocupado com as eleições italianas,
o meio mundo dos ricos, não deixando muitos dos seus mais conhecidos representantes
de insinuar uma espécie de censura por os italianos não terem sabido escolher
como deveriam ou então, ainda pior, fazendo inequívocas pressões para que se
entendam, com sacrifício dos seus próprios interesses, custe o que custar.
E nesta exemplar demonstração de democracia que, pelos vistos,
nada incomoda Francisco Assis, nem António Costa, nem tão pouco Santos Silva, todos
eles muito mais preocupados em assegurar a liberdade de expressão do Relvas
contra as “manifestações totalitárias” dos estudantes do ISCTE, verifica-se,
para além deste eloquente silêncio, a inaudita situação de a preocupação pela
situação italiana parecer tão genuinamente sentida por aqueles que são
verdadeiramente a causa de tudo o que se está a passar na Europa como pelos que
são, em grande medida, as suas vítimas.
De facto, as eleições italianas exprimem com razoável clareza
a rejeição da política europeia através de um conjunto de manifestações
variadas, por meio das quais os eleitores tentaram encontrar um caminho
alternativo que ponha definitivamente termo àquilo que inequivocamente não
querem. Elas representam, por outras palavras, a derrota inequívoca das políticas
impostas por Berlim, com o subserviente apoio do Banco Central Europeu e da Comissão
Europeia, além naturalmente da do grande representante do capital financeiro no
plano mundial - o Fundo Monetário Internacional.
A derrota de Monti, imposto como primeiro-ministro pelas
entidades acima referidas, e depois “levado ao colo” durante meses a fio por
aqueles mesmos interesses não tem duas explicações possíveis. Os eleitores não
querem ser governados pela longa manus
da Goldman Sachs, nem aceitam que sejam os estrangeiros a ditar as políticas do
seu país.
E tendo presente esse objectivo reagem como sabem ou podem sem nunca perderem de vista
o contexto em que todo este grande drama se está a desenrolar. Há eleitores que
têm fundadas razões para desacreditarem dos políticos e os associarem às mais
variadas formas de corrupção, supondo que o meio mais eficaz para ultrapassar essa
degradação moral que corrói hoje a maior parte das classes políticas é
entregarem o poder a não políticos. E depois são esses mesmos políticos e os comparsas
que diariamente os defendem nos media,
tentando sempre encontrar uma boa justificação para comportamentos reprováveis,
que apodam de populistas aqueles que os rejeitam em vez de imputarem a esses políticos
e a essa degradação da política o resultado a que se chegou.
Mas a derrota de Monti está ainda muito presente na votação
daqueles que abertamente se opuseram às políticas de austeridade e recusam que a
Itália seja conduzida a partir de fora com receitas que os italianos recusam. É
inegável que a votação de Berlusconi só pode ser entendida em toda a sua dimensão
se se entrar em linha de conta com estes novos factores, que nunca estiveram
presentes em campanhas anteriores.
Dai as dificuldades que Bersani vai ter para formar governo.
Ele não vai ter apoio nas câmaras para uma simples actuação cosmética
relativamente às políticas de Bruxelas, o mesmo é dizer, impostas por Berlim.
Isto não quer dizer que não existam problemas graves na
Itália. Existem problemas graves na Itália, como existem em muitos outros
países. Agora, o que se sabe – e o hoje já só não sabe quem, além de não ser
capaz aprender com os erros alheios, também se revela incapaz de aprender com
os próprios – é que o caminho que tem sido seguido na Europa por imposição de
Berlim não resolve, antes agrava, os múltiplos problemas com que a generalidade
dos europeus se defronta.
E a prova de que o "edifício" está preso por arames é que à menor
oscilação tudo fica de novo imediatamente posto em causa. Essa instabilidade,
ao contrário do que se possa pensar, pode ser positiva e benéfica, apesar do agravamento
momentâneo da situação de alguns (bastantes) países. Será esse desequilíbrio
que porventura irá permitir que algum país se predisponha a fazer frente à
Alemanha, ameaçando-a com a única arma que realmente a pode fazer tremer – a rotura
do equilíbrio monetário.
Os europeus, os que estão a sofrer na pele as dramáticas
consequências das políticas de austeridade, têm de se convencer que isto por
que estão a passar não é o resultado de um desajustamento que possa ser
corrigido, com mais ou menos sacrifício, com vista ao retorno a uma equilibrada
situação anterior. Não, o ajustamento que está sendo feito em nome do desajustamento
existente visa consolidar posições de hegemonia, agravar e fortalecer desigualdades
sociais e entre países, de modo a garantir a permanência de situações de
domínio.
O que se está a passar é uma guerra de tipo novo em que por
via da economia se pretendem alcançar posições que antes só poderiam ser
garantidas pela força das armas. E numa guerra só pode ganhar quem tiver a
coragem de lutar.
É por isso que Churchill ficará para sempre na História, sendo
com a passagem do tempo cada vez mais irrelevante que ele tivesse sido
considerado um grande reaccionário, colonialista, causador de um dos maiores
massacres da I Guerra Mundial e que inclusive tenha recusado render-se
porventura por razões hoje muito pouco louváveis. O que conta, o que sempre
ficará na História, é que ele lutou sozinho durante cerca de dois anos num
tempo em que a derrota parecia inevitável.
É o que hoje faz falta!
De facto, mais uma vez se tornou evidente que o "edifício" está preso por arames. Independentemente do que se pense das regras do sistema monetário, nomeadamente as fixadas pelo T.Maastrich, o seu cumprimento, ou a sua substituição seriam a única forma de toda a Zona (centenas de milhões)não estar permanentemente refém dos humores de um qualquer cómico/humorista/chichiolina/Berlusconi - a Srª Merkell várias vezes se afirmou como defensora do Tratados, portanto, não há alternativa a que cada um vá à sua vida. Também me parece que este "ajustamento" não é tanto imposto pela Europa rica e do "rigor" mas pela situação da Europa e do "Ocidente" perante o resto do Mundo. É excessivo culpar a Alemanha pelo endividamento junto dos asiáticos e, sobretudo, dos progressistas Sheiks e Ayatollas. O domínio da máfia financeira não é apenas do interesse do capitalismo e hegemonismo germânicos.
ResponderEliminarFinalmente, permita-me que ache o que diz no último parágrafo altamente discutível
lg
Certamente que existe um desequilíbrio entre os países ricos (com ricos muito mais ricos e com muito mais pobres) do Ocidente e os países emergentes. Esse desequilíbrio, porém, não é inevitável e já poderia há muito ter começado a ser atenuado. Assim não acontece porque os interesses ocidentais que prevalecem não são "conformes ao interesse geral", mas apenas de um sector que ganha com esta globalização.
ResponderEliminarMas mesmo dando como incontornável esse facto, o problema com que a Europa se debate, de resolução ou atenuação das suas dificuldades, não está a ser encarado, desde há mais de duas décadas, numa perspectiva que atenda ao interesse de todos, mas segundo uma lógica que privilegia uma minoria e prejudica a imensa maioria.
A Europa não encara a globalização como um problema a que importa dar resposta no interesse de todos. Pelo contrário, é nesse domínio onde verdadeiramente a hegemonia está mais evidente. Quem tem poder avança na defesa dos seus interesses e não quer saber dos demais.
Se a União em que estamos metidos é isto, como resolver o problema sem lutar, sem afrontar quem tem o poder? Como se pode ser insensível ao drama social vivido em tantos países da Europa, a começar pelo nosso? Como aceitar politicas que manifestamente nos prejudicam, fazendo de conta que se trata de inevitabilidades da história?
Claro que há por cá quem contribua para que as coisas se passem assim. Mas esses não passam de um alvo intermédio que é preciso atingir para alcançar o alvo principal.
Acreditar na racionalidade alemã não parece um bom princípio e menos ainda nas suas virtudes. A Alemanha tem muita dificuldade em aceitar mudar de rumo, mesmo quando se torna evidente que o caminho escolhido não leva a bom porto. A Alemanha só muda de rumo forçada. E eu continuo convencido que mais tarde ou mais cedo isso vai acontecer, sem meias palavras.
Não percebi qual o parágrafo que levanta a discordância se é mesmo o último ou o que se refere a Churchill.
Obrigado pelo comentário.
Era ao penúltimo parágragafo a que queria referir-me. Pelo que me pareceu dá por válido o aforismo populat de que "dos fracos não reza a História" ou dito de outro modo "a História é escrita pelos vencedores"
ResponderEliminarlg
Não, não era bem essa a minha ideia. O que eu verdadeiramente queria dizer, tendo por quadro de fundo o assunto de que estava a tratar, é que a reacção contra a Alemnha pode vir de quem menos se espera, inclusive de um político cheio de defeitos...
ResponderEliminarTalvez tenha sido excessivamente subtil a ponto de só eu me ter compreendido. Ou seja, não me expliquei bem.
Não, não era bem essa a minha ideia. O que eu verdadeiramente queria dizer, tendo por quadro de fundo o assunto de que estava a tratar, é que a reacção contra a Alemnha pode vir de quem menos se espera, inclusive de um político cheio de defeitos...
ResponderEliminarTalvez tenha sido excessivamente subtil a ponto de só eu me ter compreendido. Ou seja, não me expliquei bem.