Uma das matérias que a matilha de comentadores tem abocanhado
com indesmentível prazer é o episódio “Sócrates/Teixeira dos Santos” a
propósito do recurso à chamada “ajuda externa”.
Diz a matilha que Sócrates está a distorcer a realidade sobre
a vinda da Troika e sobre a sua divergência com Teixeira dos Santos a propósito
deste assunto.
Talvez convenha recordar como a história se passou. Sócrates
não queria o FMI em Portugal, disse-o várias vezes, até chegou a dizer que não
estava disponível para governar com o FMI. Acreditava, talvez ingenuamente,
numa solução como aquela que mais tarde veio a ser adoptada para Espanha. Mas
com o chumbo do PEC IV, os juros altíssimos e sem fontes de financiamento a que
recorrer, acabou por pedir, já em governo de gestão, o resgate.
O contexto em que isto aconteceu foi o seguinte: Sócrates
ainda estava resistindo, apesar da euforia da direita que clamava pela
intervenção estrangeira (ver, ouvir e ler declarações da época de Passos
Coelho, Frasquilho, Moedas e Eduardo Catroga, entre vários outros), da pressão
dos banqueiros assustados com a falta de liquidez (eufemismo para evidenciar a falência
por cessação de pagamentos), quando Teixeira dos Santos, depois de umas prévias
declarações “desalinhadas” e comprometedoras, decidiu (ou melhor, obedeceu)
declarar inevitável a “ajuda externa” na sequência de uma reunião em Frankfurt.
Posto perante o facto consumado de Teixeira dos Santos, Sócrates já nada
poderia fazer.
Claro que Sócrates não apresentou assim os factos, mas
compreende-se que o não tenha feito, qualquer que tenha sido a razão
determinante por que o fez. Ou por querer manter a solidariedade governamental
e não querer imputar ao seu Ministro das Finanças a responsabilidade exclusiva
pela decisão; ou porque sendo ele o PM, posto que já então muito fragilizado,
lhe ficaria mal declarar-se publicamente ultrapassado por um ministro seu.
Esta não é uma daquelas mentiras políticas que deslustre.
Muito mais grave, muitíssimo mais, é ter havido em Portugal quem publicamente
tudo tivesse feito para ter a Troika cá. Em qualquer outro país, a começar aqui
pela vizinha Espanha, quem se vangloriasse ou, mesmo sem se vangloriar, tivesse
solicitado a intervenção estrangeira nunca mais lá teria qualquer futuro
político.
Em Portugal, isso infelizmente não conta ou conta muito
pouco…
Sócrates depois desta longa entrevista deve dar por encerrado
o passado e tratar apenas e só do futuro. Hoje os portugueses acharam graça,
mas a partir de amanhã o que querem é saber se ele tem algo diferente a dizer e
a propor para o futuro do país. E tem de ser mais específico. Se disser: "Esta
austeridade é uma loucura que nos está a desgraçar", toda a gente concordará,
mas o que a seguir terá de acrescentar é o que fazer caso os seus “amigos” da
Europa discordem da ideia…que é o que seguramente farão. Que fazer nesse caso?
Se Sócrates não vier para responder a esta pergunta, as coisas não lhe vão
correr como ele pensa…
Se a seguir acrescentar outra das suas, digamos, memórias: "Para pequenos países como Portugal e Espanha, pagar a dívida é uma ideia de criança.", continuará mitómano e pior,... com fervorosos seguidores.
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