É PRECISO RESTAURAR A
DEMOCRACIA
O caso dos “swaps” nas suas múltiplas facetas – quem os
contratou e com quem, quem os fiscalizou, quem destruiu a documentação
pertinente e porquê, etc. – é apenas um caso, entre muitos, que demonstra à
evidência a corrupção dos princípios democráticos a partir de uma legitimidade
pretensamente democrática decorrente dos resultados eleitorais.
Independentemente da questão já de si muito grave de saber
como podem os gestores de empresas públicas por sua livre iniciativa contratar
com grandes potentados financeiros seguros de crédito (CDS – credit default swaps) – de que os “swaps
de taxa de juro” são uma variante desse produto financeiro inventado em 1994 pelo
JP Morgan -, mais grave ainda é estar hoje generalizada a ideia, comprovada por
múltiplos factos, de que Administração Pública não exerce ou não tem capacidade
para exercer uma verdadeira acção fiscalizadora, não apenas preventiva, como
seria desejável, mas, no mínimo, a
posteriori, necessariamente repressiva, dos actos praticados pelo governo e
seus agentes em nome do Estado português.
A ausência desse papel fiscalizador, resultante da perda de
independência da Administração Pública, hoje transformada numa correia de
transmissão do governo, leva a que princípios fundamentais do Estado de Direito
democrático sejam persistentemente violados e corrompidos, com gravíssimos
prejuízos não apenas para o futuro do país mas também, e desde logo, para os
cidadãos que no momento em que os danos ocorrem tem de arcar com a
responsabilidade de os reparar sem qualquer garantia de que situações idênticas
se não repitam no futuro.
A triste “novela” dos swaps da taxa de juro contratados
pelas empresas públicas de transporte com os tais grandes potentados
financeiros, vendedores de falsos seguros de crédito, é bem um exemplo do que
acaba de ser dito. Podem lançar a areia que quiserem sobre os olhos dos portugueses,
mas o que eles não deixarão de saber, por maior que seja a contra-informação
que sobre o caso se faça, é que tais contratos são “filhos legítimos” dos
partidos do Bloco Central que se revezam no poder e simultaneamente se protegem
no sector público empresarial cujos lugares vão distribuindo entre si, por
vezes até na ordem inversa dos respectivos resultados eleitorais.
É certo que tudo se pode aparentemente complicar e dar a
falsa ideia de uma profunda oposição entre eles quando uma neófita, recém-chegada
às benesses do poder, ao tentar induzir no público a ideia da exclusiva
responsabilidade dos que saíram, acaba por provocar uma incrível cena que a
todos enreda, a começar por ela própria, exactamente por se ter esquecido que também
ela é filha dessa mesma promiscuidade que corrompe a vida pública portuguesa e
impede o Estado de ter institucionalmente quem o defenda contra os abusos
daqueles que agem em seu nome.
A destruição de documentos relacionados com esta “novela dos
swaps” é apenas mais um episódio desse clima hoje reinante na Administração
Pública mais directamente relacionada com o mundo dos negócios onde tudo parece
ser permitido desde que contribua para a irresponsabilização daqueles que nela
actuem contra a lei para salvaguarda de interesses inconfessáveis que em última
instância acabam sempre por estar intimamente relacionados com essa complexa
teia que hoje enleia a vida pública portuguesa – negócios e partidos no poder.
A opacidade, as mentiras, as meias verdades que tem
acompanhado este negócio ruinoso para os contribuintes portugueses mas
altamente rentável para o grande capital financeiro é hoje a imagem de marca
dos Estados mais fracos, como o nosso, completamente subjugados e rendidos ao
domínio do capital financeiro.
Este episódio ilustrativo do que é hoje a condução política
do Estado levanta um problema grave que mais tarde ou mais cedo não poderá
deixar de ser enfrentado e afrontado com a coragem que a situação exige – a
restauração dos valores democráticos, subvertidos e corrompidos por uma vivência
política circular que faz com que quem regressa ao poder acabe sempre por
chegar ao mesmo ponto daqueles que acabaram de partir, exige uma acção que vá
muito para além ou vá mesmo contra a pretensa legitimidade eleitoral, ela
própria degenerada e corrompida até ao grau zero da política como alguns
tristes episódios da pré-campanha autárquica eloquentemente demonstram.
Meu caro Costa Pinto
ResponderEliminarEstou totalmente de acordo com a sua tese. Este desgraçado país, governado por uma turpe de politicos nascidos na mesma alcofa partidária, não terá solução enquanto esta pretensa democracia permanecer. Tenho para mim que chegou o tempo de se questionar tudo. Chegou o tempo de se pôr em causa o regime que nos tem enredado nesta teia imensa de corrupção e compadrio.
Obrigado pela sua lúcida atenção sobre este país submerso.
Carlos da Gama
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderEliminarAbsolutamente de acordo..
ResponderEliminarEsta sórdida trampolinice, esta "democracia" reduzida a uns actos eleitorais ritualísticos, eles próprios já despidos da sua elementar e essencial dignidade, conduz-nos ao império dos a-democratas, quando não ao dos anti-democratas.
Inteiramente de acordo!!
ResponderEliminarNão foi só o governo português que entrou nesta trapaça montada pela finança internacional. Há pouco dias a TVI24transmitiu um programa que, apesar da perspectiva dos autores não ser propriamente critica do Sistema, era bastante esclarecedora da génese e desenvolvimento destes "produtos". Tevve ainda a vantagem de poder ouvir testemunhos e confrontar alguns altos responsáveis. A cidade de Cassino (perto de Roma)foi um exemplo dissecado e esclarecedor.
Numa coisa penso que se engana o autor: a de que os portuueses estão indignados e prontos a ajustar contas com os fautores de tais actos!
lg
Dois pormenores: nem os IRS são variantes dos CDS nem os swaps problemáticos que temos ouvido são uns ou outros!
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