O PODER SEM FANTASIAS
Não contava escrever sobre esta entrevista. Tudo me pareceu tão
fácil de interpretar …mas afinal não foi. Tenho ouvido e lido as mais díspares
interpretações sobre a entrevista. E pior do que isso tenho pressentido estados
de alma com que também não contava, que vão desde a indisfarçável depressão à
euforia de quem afirma “eu não dizia…”.
Há até quem cite filósofos, um dos mais importantes nomes da
filosofia política, para a partir daí concluir que Jerónimo não está à altura
das circunstâncias. Uns dizem que lhe falta a Virtu outros a Fortuna que Maquiavel tanto enfatizou.
Como Maquiavel, o primeiro grande nome da modernidade, me é
bastante caro por tudo o que lhe devemos na compreensão da política, achei que
não deveria manter-me à margem deste debate, apesar, como já disse, de tudo me
ter parecido demasiado óbvio e justificável.
O que Jerónimo ontem disse foi o que outros, que nem ao
Partido Comunista pertencem, se não têm cansado de dizer. A saber: o que está
em discussão com o PS é a negociação de um programa
mínimo que incide fundamentalmente sobre os rendimentos.
A negociação e futura aplicação de um programa desta natureza
tem consequências macroeconómicas que ninguém pode negar. Mas Jerónimo não
acalenta ilusões. Sabe que há constrangimentos que pesam negativamente sobre a
economia portuguesa e o futuro do país como Estado soberano. Jerónimo não aceita
que esses constrangimentos se traduzam na limitação do Estado social, no corte
das pensões nem na diminuição dos rendimentos do trabalho.
O PS também não quer estas consequências. Essa é aliás a
essência da sua crítica à governação de Passos Coelho. Esse foi sempre o
discurso de António Costa. Logo, algo de novo surgirá…
O que Maquiavel trouxe de novo à política foi o realismo.
Encarar o poder como ele realmente é. Sem fantasias nem moralidades. E além
disso a crença na vitória do novo sobre o velho.
Só quem não compreendeu a entrevista pode ter ficado
decepcionado ou, pior ainda, ter considerado que Jerónimo não esteve à altura
do que as circunstâncias exigiam.
Quem esperava foguetes e champagne continua a olhar a política
numa perspectiva pré-maquiavélica.
O que de certa forma não admira porque
estamos todos, uns mais outros menos, muito contaminados pela mediocridade do
comentário político que por ai se vai fazendo.
Experimentem perguntar a Passos Coelho onde está a Social-Democracia do PSD ou a Paulo Portas onde se encontra o Humanismo Social-Cristão do CDS, a que estes por vezes gostam de puxar lustro... Todos os Partidos do dito Arco da Governação há muito que abdicaram dos seus Princípios a bem do dito Governo. No caso do PCP e do BE, nem sequer é disso que se trata, somente de, dentro dos constrangimentos presentes, proporcionar ao seu eleitorado uma Governação melhor do que aquela providenciada pela Direita. Não, não temo de todo que as diferentes Ideologias de cada Partido tornem impossível a Governação de Esquerda. Gostaria aliás, como Euro-cético de Centro (que nos tempos que correm passa algures pelo meio do PS, por mais que Francisco Assis ou Eurico Brilhante Dias insistam no contrário), que o BE e o PCP convencessem o PS que não seria mau estudar a saída do Euro, porque nos pode cair em cima, mesmo que não a queiramos. O que temo, isso sim é que as dificuldades no dia-a-dia da Governação rapidamente gerem forças centrífugas numa Esquerda que sempre viveu de costas voltadas. Não tenham dúvidas, se querem que um Governo das Esquerdas dure para além de 2016, o PS, o PCP e o BE vão cada um ter que engolir a sua quota de sapos, com condimentos cortesia de Berlim e Bruxelas...
ResponderEliminarMas Jerónimo de Sousa fez uma afirmação peremptória acerca do dia da apresentação do programa da esquerda. Quando Ana Lourenço lhe perguntou "...é no dia 9?", ele respondeu sem hesitar "é no dia 9"!
ResponderEliminarIsto significa que o acordo já existe, apesar dos silêncios e reservas de JS (por ele já várias vezes justificadas com a seriedade do assunto e lealdade devida aos outros).
Na vida já vi pássaros que não gostam do chão
ResponderEliminaroutros de asas curtas que voam mais alto
e até alguns que gostariam ter asas
Jerónimo inteligente pensou
deixa-os poisar
Que bom ler sensatez... a partir de quem ouviu o outro. O outro que é o outro e também sou eu, o que o ouve. E parece tão claro, não é?
ResponderEliminarNesta nossa curva histórica e convocando histerismos, é reconfortante. E ajuda, dá força para explicar, pacientemente, a quem tem nas mãos, como sempre na História, a chave do caminho que vai seguir-se, depois da curva. E caminhando.
Desejo não estar a enganar-me. Na leitura e no comentário.