QUEM GANHA,
QUEM PERDE
As opiniões sobre o recente “namoro”
entre Rio e Costa, que mais frequentemente se têm ouvido, são muito convergentes:
Costa tem tudo a ganhar, Rio, tudo a perder.
Lobo Xavier, que é voz mais
autorizada do lado do CDS no comentário político, foi peremptório na última
Quadratura do Círculo – considera incompreensível que, a cerca de um ano de
eleições legislativas, Rio se preste a este espectáculo com Costa, subscrevendo
um acordo sem conteúdo, mas cheio de valor simbólico; é ainda de opinião que,
tendo o CDS tudo a ganhar com este posicionamento do PSD, Rio tenha tudo a
perder com este aval que concede a Costa do qual se não percebe quais possam
ser as contrapartidas.
Do lado da direita do PS, o acordo
é aplaudido com entusiasmo. Jorge Coelho, cuja paixão socialista rejuvenesceu com
o seu reingresso na administração da Mota-Engil, foi categórico: tudo o que é
bom para o país, é bom para o PS e também para o PSD.
Do lado de comentadores, ditos
independentes, enaltece-se a habilidade política de Costa, capaz de conseguir
acordos à direita e à esquerda, qual mago da política.
Analisando com mais atenção o que
se está a passar talvez as coisas não sejam bem assim.
Costa chegou ao poder com uma
votação minoritária, mercê do apoio concedido pela esquerda - Bloco, PCP e
Verdes. O Governo, embora sempre tenha sido um Governo PS, com tudo o que esta
expressão encerra, era tido interna e internacionalmente como um governo à
esquerda. Um governo que tinha uma orientação de esquerda, não apenas em
consequência da execução das medidas que constam das posições comuns acordadas
entre o PS e cada um dos partidos que no Parlamento o apoiam, mas também – e principalmente
– por essas medidas terem sido negociadas com partidos de esquerda. Partidos
que no seio da UE estão em todo lado arredados da área do poder. Era este
simbolismo que conferia ao governo do PS a novidade de um governo à esquerda
liderado por uma força do establishment
da União Europeia.
O acordo com os partidos de
esquerda que o apoiam representava muito mais do que o simples cumprimento das
medidas acordadas, tão óbvias elas seriam há uns anos atrás - representava simbolicamente
um rumo e uma escolha relativamente à ortodoxia dominante e era uma fonte
inspiradora de novos percursos no seio da União Europeia.
E tanto assim era que nas recentes
eleições do PSD para a liderança do partido este assunto foi amplamente
debatido entre os concorrentes e ponto de fractura entre as duas correntes em
confronto. Uma, a de Santana Lopes, na esteira de Passos e do exemplo do seu
governo, entendia que o PS tinha feito a sua escolha e com ela deveria ficar,
posicionando-se o PSD no bloco de direita, aliado ao CDS, como alternativa
frontal àquelas políticas e acima de tudo àquele simbolismo que o Governo PS
representava. A outra, a de Rui Rio, com um entendimento diametralmente oposto:
conhecedor da natureza de PS, Rio sempre defendeu que o PSD tudo deveria fazer,
apesar de ser oposição ao PS, para o retirar da dependência das forças de
esquerda. A sua opção era igualmente muito clara, embora oposta à de Santana.
Tal clara que até Ferreira Leite, tributária do pensamento cavaquista e por
isso pouco dada a entendimentos com quer que seja, considerava que no actual
contexto o mais importante era desatrelar o PS da esquerda, nem que para isso
fosse necessário “vender a alma ao diabo”!
Portanto, depois deste debate o PS
não poderia deixar de perceber e de antecipar o que significariam os seus
entendimentos à direita por maior ou menor que fosse conteúdo prático dessa
convergência. Eles teriam sempre a grande carga simbólica de representarem a
vitória da linha vencedora no seio do PSD relativamente ao que era necessário
fazer para retirar o PS da órbita da esquerda.
Por outro lado, enganam-se os que supõem
que Rio sacrificou às suas mais arreigadas convicções ideológicas o eventual
sucesso de um próximo resultado eleitoral. Não parece ser essa a intenção de
Rio, bem pelo contrário. Rio somou às suas convicções ideológicas a esperança
de um resultado eleitoral bem melhor do que aqueles que o PSD tem tido em
últimas eleições.
O raciocínio de Rio parece fácil de
compreender. Rio entende que se criar no eleitorado a ideia, fundada em factos,
de que existe uma boa relação com o PS e de que essa relação pode dar frutos a
curto prazo, será de esperar que uma parte do seu eleitorado oscilante, de centro
– e que nas últimas eleições abandonou completamente o partido – volte a votar
PSD, deixando o PS e que, por força desses mesmos sinais de entendimento com o
PS, aquele outro eleitorado que se situa à esquerda do PS deixe de votar nele,
e vá a votar nos partidos à sua esquerda, nomeadamente no Bloco já que este
tem sido o partido que com mais facilidade absorve o descontentamento ou a
desconfiança de um certo eleitorado PS.
Ou seja, a ideia de Rio é a de que
o PS perca votos à direita e à esquerda, fragilizando assim o seu peso
eleitoral. Rio conta ainda com a influência da direita do PS e do seu peso
tanto dentro do partido como no apoio que essa mesma direita dará publicamente
aos resultados imediatos da sua proposta (entendimento ao centro).
E, por outro lado, não será difícil
antecipar que a Esquerda sentindo-se traída por Costa, não precise de muito
tempo para vir a terreiro reivindicar o que de mais positivo para a vida das
pessoas se fez nestes últimos dois anos, atribuindo esses êxitos à sua
persistente e perseverante influência na governação PS, sem a qual teríamos um
PS absorvido (como parece já estar) pela obsessão do défice, pelo zeloso
cumprimento das regras europeias à custa dos mesmos de sempre, pela continuação
da desregulamentação laboral, da perda de direitos e garantias sociais e por
outras e mais perigosas manobras, aliás muito possibilitadas pelo facto de
muitos dos intervenientes nesta governação, directa e indirectamente, já terem
participado noutras com os resultados que se conhecem.
É difícil neste momento dizer se
Costa já deu passos irreversíveis no sentido de um entendimento ao centro ou se
apenas quis exibir publicamente a facilidade com que pode mudar de parceiro,
pressionando os seus actuais companheiros de percurso com vista a amenizar as
suas reivindicações. Seja uma coisa ou outra é um caminho perigoso que frauda a
confiança de quem, não sendo do seu partido, o apoia dentro e fora do
Parlamento.
"E, por outro lado, não será difícil antecipar que a Esquerda sentindo-se traída por Costa, não precise de muito tempo para vir a terreiro reivindicar o que de mais positivo para a vida das pessoas se fez nestes últimos dois anos, atribuindo esses êxitos à sua persistente e perseverante influência na governação PS..."
ResponderEliminarSou militante do PCP e desde já declaro que nunca me sentirei traído por Costa.
Primeiro: Se olhar ao programa com que o PS concorreu às legislativas, dê-me uma só (basta uma) medida, das tomadas e decorrentes do acordo de convergência, que lá conste.
Segundo: O PS sabe que governa com uma maioria parlamentar, que será firme e sólida, enquanto o PS respeitar o que está acordado. Depois disso, o PS será o que Deus ou o Diabo determinarem que seja...
O resto? Os jogos, os amanhos... ainda a procissão vai na praça...