sábado, 13 de setembro de 2008

TRIBUNALCONSTITUCIONAL ESPANHOL "CHUMBA" CONSULTA SOBERANISTA DE IBARRETXE

O BLOQUEIO DA QUESTÃO BASCA

O nacionalismo é um dos males da era contemporânea. Um mal com que teremos de conviver ainda durante muito tempo. Impossível prever quanto. Mas nem tudo o que está ligado ao nacionalismo é mau. O princípio da autodeterminação, inspirado no nacionalismo, permitiu acabar com os impérios coloniais e com tudo o que a eles estava ligado de degradante para o género humano.
Os nacionalismos actuais são, porém, de outro tipo, embora continuem a inspirar-se nesse desejo de libertação de um poder estranho exercido sobre comunidades étnica e culturalmente diferentes.
A Espanha debate-se com este fenómeno centrífugo em algumas áreas do seu território constitucionalmente fixado, nomeadamente na Catalunha e no País Basco.
Na Catalunha, à parte algumas manifestações anarquistas, não se recorre à força há vários séculos para o resolver. Dito de outro modo, os nacionalistas catalães não tem recorrido à força para impor a autodeterminação, embora o poder central, principalmente a ditadura franquista, tenha recorrido a violências sem conta para combater as manifestações nacionalistas de qualquer tipo. Não assim no País Basco. No estertor do franquismo, constitui-se um grupo armado que luta pela independência de Euskadi por todos os meios ao seu alcance. De início, as acções da ETA foram saudadas pelas forças democráticas espanholas como um valioso contributo para a queda do regime. É neste contexto que o atentado contra Carrero Blanco é tido como um marco significativo na luta contra a ditadura e como um momento de viragem na estabilidade do regime. O apoio dos democratas está expresso no slogan que então ecoava em toda a Espanha: “Arriba Franco, más alto que Carrero Blanco”.
Mais de trinta anos volvidos, a Espanha é hoje um Estado de democracia representativa, amplamente descentralizado em regiões com autonomia administrativa e legislativa. Subsiste, porém, o problema territorial. A Catalunha vai progressivamente fazendo o seu caminho numa lógica mais virada para a construção, económico-financeiramente falando, de um Estado dentro de outro Estado, sem, contudo, desprezar nenhum dos elementos simbólicos do nacionalismo, enquanto o País Basco, onde a luta armada convive com as fortes manifestações nacionalistas legais e institucionais, é claramente partidário de uma independência sem subterfúgios. Há, nas correntes nacionalistas do País Basco, duas teses que simultaneamente se defrontam e se complementam. A que defende que a independência só pode ser alcançada através da luta armada e a que, actuando no quadro da legalidade democrática, advoga um caminho de acumulação progressiva e sucessiva de poderes que acabará, mais tarde ou mais cedo, por levar à independência. Ambas as correntes se alimentam uma da outra, posto que a retórica usada por cada uma delas aparentemente as afaste.
Do lado das forças centrípetas passa-se, com as necessárias adaptações, mais ou menos o mesmo. Há quem advogue uma via repressiva contra as manifestações nacionalistas de qualquer tipo e o isolamento institucional dos respectivos governos autónomos e há quem advogue uma via dialogada com os nacionalismos moderados, se não mesmo com o nacionalismo armado, para, no quadro de uma mais ampla autonomia, porventura com admissibilidade da relação federal (sem reconhecimento, contudo, do direito de separar), manter a integridade do Estado.
Com Ibarretxe na chefia do governo basco, acentuou-se a luta no quadro democrático pela auto-determinação. Como prometido na campanha eleitoral, Ibarretxe, baseado num texto constitucional, fez aprovar no parlamento basco uma proposta de referendo, que, em última instância, se viesse a ser respondida afirmativamente pelo eleitorado, permitiria ao povo basco decidir sobre o seu futuro, sem prejuízo de se saber através de que meios esta decisão poderia depois ser tomada.
Como se esperava, inclusive nos meios nacionalistas bascos, o tribunal constitucional considerou por unanimidade a consulta inconstitucional. Com vista a esgotar os meios legais ao dispor, Ibarretxe, a título meramente individual (e certamente muitos outros bascos farão o mesmo) recorrerá da decisão para o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Não sendo muito crível que este tribunal venha a desautorizar o tribunal espanhol, ficará demonstrada a tese que a ETA desde há muito defende: a de que não há solução para o País Basco dentro do quadro institucional existente e que somente pela via da luta armada será possível alcançar a auto-determinação.

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