QUAL O PAPEL DO ESTADO?
Vale a pena insistir, apesar de toda a gente saber, que a actual crise económica tem a sua origem numa aguda crise financeira da responsabilidade do capital financeiro nas suas múltiplas vertentes. Mas também é conveniente sublinhar que o capital financeiro não lançou o mundo no caos em que se encontra sem a complacência e a conivência de todos os governos, nomeadadamente os dos países economicamente mais desenvolvidos.
Passado que foi o momento inicial de desnorte, em que as falências bancárias e de outras instituições financeiras se sucediam, primeiramente nos Estados Unidos e depois um pouco por todo o mundo desenvolvido, os Estados traçaram uma estratégia que, embora com algumas nuances e outras tantas especifidades nacionais ditadas pelas características das respectivas economias, começou por, no plano financeiro, acudir aos bancos em dificuldades, quer pela via das nacionalizações, nos casos mais graves, quer pela via da entrada de capital fresco, seja através da concessão de empréstimos, seja pela participação no capital social, quer ainda pela concessão de garantias para angariação de crédito nos mercados financeiros nacionais e internacionais. Simultaneamente, os bancos centrais, principalmente a Reserva Federal, o Banco Central Europeu e o Banco de Inglaterra, foram sucessivamente reduzindo as taxas de juro de referência para facilitar o acesso ao crédito, primeiro com o objectivo de evitar a recessão, depois, tornada esta efectiva, de relançar a economia.
A verdade é que, não obstante todas estas medidas, o crédito não só não se manteve, como, pelo contrário, se restringiu e ameaça restringir cada vez mais.
Passada uma primeira fase de incompreensão face ao que se estava a passar - alguns governos chegaram a fazer ameaças ao capital financeiro renitente na concessão de crédito, outros optaram por uma fiscalização das denegações através da criação da figura do intermediário do crédito encarregado de julgar do seu fundamento - entrou-se decididamente na aprovação de programas autónomos de apoio e estímulo à economia directamente financiados pelo Estado ou na abertura de linhas de crédito às empresas em dificuldades igualmente da responsabilidade do Estado. Todavia, o problema persiste. O crédito bancário continua escasso e insuficiente para promover o consumo ou financiar o investimento. E o que é concedido, não obstante as acentuadíssimas quebras da taxa de juro dos bancos centrais, é caro e raro.
Perante este quadro, o problema que por todo o lado se põe é que papel pode o Estado desempenhar nesta conjuntura.
Antes de mais é necessário sublinhar o óbvio: os bancos existem para emprestar dinheiro. É esse o seu negócio. Se o não fazem não será certamente por uma razão perversa, mas por desconfianças muito sérias nas capacidades creditícias dos mutuários na actual conjuntura económica. E quanto menos emprestam, mais a economia cai e quanto mais a economia cai, mais os bancos perdem ou deixam de ganhar. Perante este quadro é uma ilusão supor que os Estados, através de programas autónomos de apoio directo às empresas, estão em condições de se substituir aos bancos e de desempenhar por aquela via o papel que a estes cabe numa economia de mercado.
O Estado pode certamente promover e financiar programas de estímulo à economia de outra natureza, como os investimento público, tanto os de efeito multiplicador a médio prazo, como os de efeito praticamente imediato. Agora, o que não pode é desempenhar o papel de banqueiro sem o ser. Também não pode nos países em que o Estado é titular de uma instituição de crédito relativamente poderosa, como é o nosso caso, fazer recair sobre essa instituição todo o peso da crise, descapitalizando-a e arruinando-a em puro benefício do capital financeiro (ou outro) privado.
A questão está em saber até onde pode ir a limitação do crédito pelos bancos e o que fazer se este limite for ultrapassado. Pensar que o Estado pode resolver o problema assegurando as garantias que os bancos não conseguem encontrar juntos dos que lhe solicitam crédito, seria igualmente uma má solução. Seria fazer recair sobre o contribuinte todo o risco de uma actividade que o Estado não domina e isentar dele os titulares do capital privado, cuja actividade, por definição, pressupõe o risco.
Por isso, a solução que por toda a parte vai fazendo o seu caminho é a que aponta para a nacionalização da banca. Com os ouvidos ainda muito fustigados pela ideologia neoliberal, é natural que os políticos de centro e de centro esquerda encarem com muitas reservas esta solução.
É bom, todavia, que não se esqueçam que esta crise que começou por ser financeira, já é económica e passará em breve a social com o agravamento daquela, transformando-se depois, inevitavelmente, em crise política. E tanto maior quanto mais grave quanto maior for a desestruturação social causada pela crise económica.
Numa situação destas, que é uma situação que o sistema capitalista nunca viveu, quem não se adiantar à crise será inevitavelmente vencido por ela. Já aqui dissemos várias vezes: num contexto de grave crise económica, a direita tem vantagem. Sempre teve, mas hoje mais do que nunca dada a inexistência de forças alternativas organizadas à escala mundial ou, ao menos, guiadas por um pensamento comum. E engana-se também quem supuser que os actuais paradigmas políticos se podem manter intocados. Essa será a surpresa mais grave…
Caro Amigo, Grande abraço.
ResponderEliminarSigo com grande atenção o "POLITEIA",que está ao excelente nível do autor.
Acabo de fazer um link e não foi o primeiro, a partir do "Praça Stephens",um blogue despretensioso...
Abraço.
OC
Caro amigo,
ResponderEliminarA luta contra a crise, que tem de ser vencida onde começou, na américa requer esse investimento público. Mas o acordo de ontem tem uma vida periclitante pela frente até Sexta. Analiso em http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/02/fragilidade-do-acordo-de-sexta-o.html