Este post constitui uma resposta ao comentário do meu Amigo Rui Namorado aposto no meu post “Freeport: E agora, José?” e em certa medida ao que ele escreveu no seu blogue “O Grande Zoo” sobre os últimos desenvolvimentos do caso Freeport.
Insisto: é com amargura que volto a este assunto. Mas de certa forma fui solicitado. E a primeira coisa que me ocorre dizer é que não se pode confundir a árvore com a floresta. Tentarei não o fazer.
A segunda é que ninguém pode negar que existe um problema jurídico-político chamado Freeport. Qualquer que tenha sido a sua génese, as imputações hoje fidedignamente conhecidas, sejam verdadeiras ou falsas, e outros eventuais indícios (que desconhecemos se realmente existem), agravaram substancialmente o problema jurídico-político relacionado com o licenciamento do Freeport.
O problema é grave, em primeiro lugar, porque justa ou injustamente, falsa ou verdadeiramente, anda associado a ele o nome do primeiro-ministro português. É grave, em segundo lugar, porque – sabe-se hoje – o modo como o processo se iniciou revela a podridão e a instrumentalização que se pode fazer de uma investigação judicial para fins político-partidários. É grave, em terceiro lugar, porque o Ministério Público tem somado uma série considerável de inêxitos em processos mediáticos e começa a generalizar-se a convicção na opinião pública de que os seus magistrados falam muito, queixam-se ainda mais, estão muito preocupados com assuntos corporativos e acabam por não investigar consistentemente os assuntos que têm entre mãos (qualquer que seja a verdadeira razão por que isso acontece).
Infelizmente, nem todas as questões que o caso Freeport levanta estarão em condições de ser resolvidas pela justiça, a menos que ela revelasse uma eficácia que lhe tem faltado na maior parte dos casos conhecidos. E quanto menos a justiça resolve, mais problemas políticos cria.
Veio a público muito material relacionado com o caso Freeport. Material de toda a espécie. Parece, porém, possível, mesmo sem consultar o processo, separar alguma verdade da mentira; a má-fé e a calúnia gratuita ou até estúpida da fria crueza dos factos; a propaganda e as campanhas do problema que realmente existe.
Nunca nos posts que escrevi sobre este assunto fiz a mais leve insinuação. Pelo contrário, critiquei severamente a incompetência jornalística (é difícil enumerar as dezenas de disparates que disseram sobre o assunto) e a má fé, nos casos em que ela era notória e evidente. Também nunca defendi a inocência de qualquer alegado interveniente.
Como se sabe, sobre o caso Freeport existem dois processos paralelos, com episódios relevantes distintos, que correm independentemente um do outro e que só muito recentemente se cruzaram. Um em Portugal, outro em Inglaterra.
O modo como o processo português se iniciou já foi corajosamente analisado por Marinho e Pinto num artigo publicado na revista da ordem dos advogados; o modo como o processo a partir daí tem prosseguido, antes e depois da sua avocação por Lisboa, quer quanto aos timings da investigação, quer quanto aos resultados já alcançados, deixa lugar a muitas interrogações e tem permitido todo o tipo e especulações. A generalidade das pessoas com opinião relevante não considera aceitável que um processo desta natureza tenha estado anos a fio sem qualquer audição das pessoas com indícios de envolvimento no caso, como dificilmente aceitará, após tantos anos de investigação, que somente há pouco mais de um mês tenham sido constituídos arguidos. E a própria constituição de arguidos, nos termos em que ocorreu, apenas serve para levantar mais dúvidas e incompreensões na opinião pública.
Do processo inglês conhece-se pouco, salvo o que foi contado por Cândida Almeida em entrevistas televisivas, a carta rogatória dirigida às autoridades portuguesas publicada nos jornais e o recente vídeo difundido na sexta-feira passada pela TVI. De tudo o que se conhece do processo inglês, este último é sem dúvida o facto mais relevante. Ele acaba por dar ao caso uma natureza completamente diferente da que antes ele poderia ter, independentemente do valor jurídico probatório da peça em questão.
Porque, se é inegável, que o processo português se iniciou sob o signo da conspiração e da instrumentalização para fins político-partidários da parca investigação judicial então existente, o processo inglês obedeceu a uma lógica completamente diferente, é alheio a todo o tipo de cabalas e procura dar resposta a uma questão deveras inquietante: qual o destino de vultosas verbas enviadas de Londres para a empresa encarregada em Portugal de promover o licenciamento do empreendimento? Este problema pôs-se em Inglaterra porque não há, nas contas da empresa proprietária do Freeport, uma explicação plausível e juridicamente aceitável para essas transferências.
Quaisquer que sejam os vícios e as torpezas que inquinam na sua génese o processo português e qualquer que seja o seu desfecho, passou a haver em Portugal um problema político grave a partir do momento em que inequivocamente se sabe que existe no processo inglês um vídeo que envolve directamente o actual primeiro-ministro português. Um envolvimento feito por aqueles que tinham por missão assegurar o licenciamento do empreendimento e que foram em Portugal os destinatários das verbas sob investigação.
Claro que o foi dito e gravado (sem autorização) numa reunião informal pode posteriormente ser negado. Pode ser negado que tenha sido dito – o que não aconteceu; e pode ser negado que sejam verdadeiras as imputações feitas – o que já aconteceu.
Todavia, mesmo que as imputações se mantivessem, elas poderiam ser falsas: o dinheiro em questão poderia ter tido outro destino. Poderia ter ficado com os destinatários das transferências; poderia ter sido distribuído por alguém que tivesse estado na origem das transferências, não passando estas de uma maquinação destinada a fraudar a empresa com a cumplicidade dos agentes que actuavam em Portugal. Poderia. Tudo é possível. Tudo. E esse é que é o problema novo que o vídeo trouxe a este processo.
A partir daqui nada mais será como dantes. O problema atingiu uma dimensão política praticamente insusceptível de resolução pela via judicial. É que toda a gente percebe que aquelas declarações foram prestadas numa altura em que ninguém falava do Freeport e num contexto que nada tem a ver com o que foi criado a partir da notícia do recomeço das investigações em Portugal. Enfim, são declarações, verdadeiras ou falsas, insusceptíveis de ser qualificadas como cabalísticas ou de se integrarem numa “campanha negra”.
É apenas isto que eu quis dizer no post. Nada mais. A convicção que eu tenho é a de que houve uma alteração qualitativa do problema depois daquele vídeo. Cabe ao PS analisar o problema e resolvê-lo …ou deixar que seja o povo português a fazê-lo. A minha convicção é que o PS, se for verdadeiramente livre, estaria em melhores condições para o fazer!
Insisto: é com amargura que volto a este assunto. Mas de certa forma fui solicitado. E a primeira coisa que me ocorre dizer é que não se pode confundir a árvore com a floresta. Tentarei não o fazer.
A segunda é que ninguém pode negar que existe um problema jurídico-político chamado Freeport. Qualquer que tenha sido a sua génese, as imputações hoje fidedignamente conhecidas, sejam verdadeiras ou falsas, e outros eventuais indícios (que desconhecemos se realmente existem), agravaram substancialmente o problema jurídico-político relacionado com o licenciamento do Freeport.
O problema é grave, em primeiro lugar, porque justa ou injustamente, falsa ou verdadeiramente, anda associado a ele o nome do primeiro-ministro português. É grave, em segundo lugar, porque – sabe-se hoje – o modo como o processo se iniciou revela a podridão e a instrumentalização que se pode fazer de uma investigação judicial para fins político-partidários. É grave, em terceiro lugar, porque o Ministério Público tem somado uma série considerável de inêxitos em processos mediáticos e começa a generalizar-se a convicção na opinião pública de que os seus magistrados falam muito, queixam-se ainda mais, estão muito preocupados com assuntos corporativos e acabam por não investigar consistentemente os assuntos que têm entre mãos (qualquer que seja a verdadeira razão por que isso acontece).
Infelizmente, nem todas as questões que o caso Freeport levanta estarão em condições de ser resolvidas pela justiça, a menos que ela revelasse uma eficácia que lhe tem faltado na maior parte dos casos conhecidos. E quanto menos a justiça resolve, mais problemas políticos cria.
Veio a público muito material relacionado com o caso Freeport. Material de toda a espécie. Parece, porém, possível, mesmo sem consultar o processo, separar alguma verdade da mentira; a má-fé e a calúnia gratuita ou até estúpida da fria crueza dos factos; a propaganda e as campanhas do problema que realmente existe.
Nunca nos posts que escrevi sobre este assunto fiz a mais leve insinuação. Pelo contrário, critiquei severamente a incompetência jornalística (é difícil enumerar as dezenas de disparates que disseram sobre o assunto) e a má fé, nos casos em que ela era notória e evidente. Também nunca defendi a inocência de qualquer alegado interveniente.
Como se sabe, sobre o caso Freeport existem dois processos paralelos, com episódios relevantes distintos, que correm independentemente um do outro e que só muito recentemente se cruzaram. Um em Portugal, outro em Inglaterra.
O modo como o processo português se iniciou já foi corajosamente analisado por Marinho e Pinto num artigo publicado na revista da ordem dos advogados; o modo como o processo a partir daí tem prosseguido, antes e depois da sua avocação por Lisboa, quer quanto aos timings da investigação, quer quanto aos resultados já alcançados, deixa lugar a muitas interrogações e tem permitido todo o tipo e especulações. A generalidade das pessoas com opinião relevante não considera aceitável que um processo desta natureza tenha estado anos a fio sem qualquer audição das pessoas com indícios de envolvimento no caso, como dificilmente aceitará, após tantos anos de investigação, que somente há pouco mais de um mês tenham sido constituídos arguidos. E a própria constituição de arguidos, nos termos em que ocorreu, apenas serve para levantar mais dúvidas e incompreensões na opinião pública.
Do processo inglês conhece-se pouco, salvo o que foi contado por Cândida Almeida em entrevistas televisivas, a carta rogatória dirigida às autoridades portuguesas publicada nos jornais e o recente vídeo difundido na sexta-feira passada pela TVI. De tudo o que se conhece do processo inglês, este último é sem dúvida o facto mais relevante. Ele acaba por dar ao caso uma natureza completamente diferente da que antes ele poderia ter, independentemente do valor jurídico probatório da peça em questão.
Porque, se é inegável, que o processo português se iniciou sob o signo da conspiração e da instrumentalização para fins político-partidários da parca investigação judicial então existente, o processo inglês obedeceu a uma lógica completamente diferente, é alheio a todo o tipo de cabalas e procura dar resposta a uma questão deveras inquietante: qual o destino de vultosas verbas enviadas de Londres para a empresa encarregada em Portugal de promover o licenciamento do empreendimento? Este problema pôs-se em Inglaterra porque não há, nas contas da empresa proprietária do Freeport, uma explicação plausível e juridicamente aceitável para essas transferências.
Quaisquer que sejam os vícios e as torpezas que inquinam na sua génese o processo português e qualquer que seja o seu desfecho, passou a haver em Portugal um problema político grave a partir do momento em que inequivocamente se sabe que existe no processo inglês um vídeo que envolve directamente o actual primeiro-ministro português. Um envolvimento feito por aqueles que tinham por missão assegurar o licenciamento do empreendimento e que foram em Portugal os destinatários das verbas sob investigação.
Claro que o foi dito e gravado (sem autorização) numa reunião informal pode posteriormente ser negado. Pode ser negado que tenha sido dito – o que não aconteceu; e pode ser negado que sejam verdadeiras as imputações feitas – o que já aconteceu.
Todavia, mesmo que as imputações se mantivessem, elas poderiam ser falsas: o dinheiro em questão poderia ter tido outro destino. Poderia ter ficado com os destinatários das transferências; poderia ter sido distribuído por alguém que tivesse estado na origem das transferências, não passando estas de uma maquinação destinada a fraudar a empresa com a cumplicidade dos agentes que actuavam em Portugal. Poderia. Tudo é possível. Tudo. E esse é que é o problema novo que o vídeo trouxe a este processo.
A partir daqui nada mais será como dantes. O problema atingiu uma dimensão política praticamente insusceptível de resolução pela via judicial. É que toda a gente percebe que aquelas declarações foram prestadas numa altura em que ninguém falava do Freeport e num contexto que nada tem a ver com o que foi criado a partir da notícia do recomeço das investigações em Portugal. Enfim, são declarações, verdadeiras ou falsas, insusceptíveis de ser qualificadas como cabalísticas ou de se integrarem numa “campanha negra”.
É apenas isto que eu quis dizer no post. Nada mais. A convicção que eu tenho é a de que houve uma alteração qualitativa do problema depois daquele vídeo. Cabe ao PS analisar o problema e resolvê-lo …ou deixar que seja o povo português a fazê-lo. A minha convicção é que o PS, se for verdadeiramente livre, estaria em melhores condições para o fazer!
Caro Correia Pinto:
ResponderEliminarO teu texto não contém , no essencial, nada de que discorde significativamente, no campo da descrição dos factos. O que aliás se deixa antever, a partir de uma avaliação coincidente do recente texto do António Marinho, que ambos avaliamos positivamente.
Mas o teu discurso, a meu ver, suporta melhor as minhas conclusões do que as tuas, o que só se compreende pela diferente avaliação que fazemos da gravação recentemente difundida. Para ti, ela tem uma importância grande; para mim, foi uma tentativa apressada de responder ao A.Marinho.Uma tentativa rodeada dos mesmos métodos rasteiros que têm conduzido a diversas outras "revelações".
Aliás,o tipo de lógica que te conduz a imputar as consequências que imputas ao referido evento, pode parecer identificado com a ideia de que alguém a quem terceiros numa conversa em que o próprio não participa imputem um crime, deva ter que provar a sua inocência.
Como me parece que assim não pode ser, pelas razões que conheces, bem claras no que tenho escrito em "O Grande Zoo", o que me parece que é central neste caso é a provável existência de uma conspiração para prejudicar politicamente um partido e para dificultar ilegitimamente o exercício de um poder que se exerce democraticamente.
Como tem sido dito, nem o primeiro-ministro, nem qualquer actual ou antigo dirigente de qualquer partido está acima da lei. Se cometer crimes deve pagar como qualquer outro cidadão. Mas, do mesmo modo, nenhum deles pode estar sujeito a ser enxovalhado na praça pública sem que se possa e deva defender.
Como pode constatar quem se der ao trabalho de ler o meu blog,embora seja militante do PS, estou muito longe de apoiar muitas das políticas conduzidas por este governo, mas neste caso estou profundamente convencido de que estamos perante uma lamentáveltentativa de instrumentalização do aparelho judicial para atingir objectivos políticos. Instrumentalização, para mim especialmente visível, não tanto no modo como o processo em si próprio tem sido conduzido, mas pela mistura de fugas ilrgais de informação com estratégias de exposição mediática cirurgicamente doseadas e praticadas.
Portanto, se faço votos, como todos nós, para que todos os culpados no Processo Freeport sofram um justo castigo, sejam eles quem forem. Também, sustento que os culpados da utilização conspirativa do Processo Freeport sejam igualmente descobertos e punidos com justiça, sejam eles quem forem.
Cordiais saudações do
Rui Namorado