terça-feira, 6 de julho de 2010

OS PRESSUPOSTOS IDEOLÓGICOS DO NEOLIBERALISMO



A PROPÓSITO DE UM ARTIGO DO EL PAÍS

Para se ficar com uma ideia bem precisa do modo como os pressupostos ideológicos do neoliberalismo penetraram em amplas camadas sociais e são veiculados pelos grandes órgãos de informação, inclusive pelos considerados de centro-esquerda, basta ler o artigo de hoje do El País, sobre o “Patrioteirismo económico à custa do accionista”.
O mais interessante é que estes mesmos órgãos de informação no chamado discurso abstracto sobre o capitalismo dos nossos dias dizem-se defensores da regulação capitalista, combatem a omnipotência do mercado, enfim, fazem um discurso na aparência anti-neoliberal. Todavia, quando o problema se põe a propósito de um caso concreto (que não envolva interesses nacionais do Estado a que esses dito órgão pertence), é certo e sabido que o que prevalece na análise são as teses neoliberais.
A isto se chama hegemonia ideológica. A hegemonia ideológica é o “cimento” que garante o consenso e permite que numa dada sociedade (e hoje a sociedade tende a ser global) os titulares dos interesses contrapostos ou até antagónicos, sejam eles políticos ou económicos, vivam normalmente em sociedade sem questionar o status quo ou, pelo menos, sem o pôr seriamente em causa.
O neoliberalismo assenta em pressupostos ideológicos muito simples que uma particular conjuntura histórica, muito facilitada por falhadas experiências de profundas e ambiciosas transformações sociais, ajudou a difundir. É ainda este falhanço que historicamente explica que o neoliberalismo esteja a conseguir pôr em causa, com êxito, tanto as conquistas sociais anteriores àquelas experiências como as que lhes são contemporâneas e se desenvolveram num processo emulativo de procura de caminhos alternativos.
O neoliberalismo assenta na ideia de que o interesse privado é superior ao interesse público; que do livre jogo das forças do mercado, com vista à satisfação de interesses particulares, resulta satisfeito o interesse de todos; que, assegurada a igualdade do cidadão perante a lei, o princípio da liberdade contratual actuado livremente e sem constrangimentos legais (salvo, obviamente os que decorrem do respeito pelas “regras do jogo”, como a capacidade das partes, a licitude do objecto, a prestação livre do consentimento, etc. etc.) é o que melhor defende o interesse de todos, porque ninguém actua contra os seus próprios interesses; finalmente, o Estado é um mal necessário, que deve limitar a sua intervenção à defesa das “regras do jogo” (e nestas está, obviamente, a defesa da propriedade) e à garantia das chamadas liberdades negativas.
É evidente que tudo isto não passa de uma falácia e de um gigantesco embuste, porque, embora as ciências sociais não sejam experimentáveis, as experiências históricas conhecidas já demonstraram as terríveis consequências que decorrem da aplicação deste modelo e as profundas desigualdades sociais e entre países que ele necessariamente gera.

4 comentários:

  1. Passei por este blog e, como noutros sítios com outros opinadores, quem não responde entusiasticamente à convocatória patrioteira socretina faz parte do do enorme rebanho, consciente ou inconscientemente, apologista das ideias neo-liberais. Não é o meu caso e não o será de muita gente. Não respondo à "convocatória" porque se me afigura, no essencial, uma manobra populista, faz parte da coreografia. Quem não tenha nascido ontem já tem experiência nestas representações para as poder "desmontar".

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  2. Vou ter que responder, apesar da "convocatória patrioteira".
    Com toda a franqueza, a questão é bem mais complexa e não tem nada a ver com Sócrates. Com o estar a favor ou contra. Essa é uma visão muito microscópica com a qual me não deixo enredar.
    A questão que eu levanto tem a ver com a natureza da União Europeia. A UE ou é uma federação ou não será. E não vindo a sê-lo, como muito provavelmente acontecerá, será um dos grandes "embustes do nosso tempo".
    O problema é este meu Caro Anónimo
    CP

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  3. Do anónimo anterior

    Dr. JMC Pinto, não me referia à sua "convocatória". Quanto ao comentário com que teve amabilidade de responder, digo-lhe que concordo inteira e absolutamente. Eu gosto é das coisas frontais e claras, embora admita que esta minha visão seja inviável na política. Por exemplo, é clara a posição do PCP e BE sobre estas questões, ainda hoje o foi pela voz de Agostinho Lopes.

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  4. Caro amigo,
    Vou fazer link deste post e do que se refere à revisão constitucional.
    Obrigado.
    Abraço.

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