terça-feira, 12 de outubro de 2010

O DEBATE ENTRE OS TRÊS EX-PRESIDENTES DA REPÚBLICA



TRÊS ESTILOS, TRÊS HISTÓRIAS DE VIDA POLÍTICA

O debate desta noite sobre a situação política portuguesa entre os três ex-Presidentes da República, posteriores à Constituição de 1976, no programa Prós e Contras, é um espelho relativamente fiel daquilo que tem sido a política portuguesa dominante posterior ao primeiro governo constitucional (1976, Mário Soares).
Eanes continua generoso e sério na busca de uma solução que não encontra. Quanto mais a situação política, social e económica do país se afasta do objectivo por ele almejado, feito de ideias solidárias e firmeza de comando, quase sempre alicerçadas em bases ingénuas, mais ele tende a encontrar fora da política a solução que nela não consegue alcançar. Eanes, ao manter esta tónica no seu discurso político, parece não aprendido nada com a história nem com a sua própria experiência política. De facto, a política fora da política é uma ideia salazarista que infelizmente perdura numa boa parte da sociedade portuguesa actual, apesar de ela ser hoje consideravelmente mais educada que a de 1926, ou, para ser mais exacto, que a de 1928. Fora deste contexto, a política feita por gente que não é da política só pode ter como consequência a ambiguidade fatal que congenitamente matou o PRD.
Mário Soares é o político típico de uma era, quase diria, anterior à Revolução Industrial, se não mesmo pré-maquiavélico, para quem o conflito é o resultado de intrigas superáveis pelo entendimento circunstancial entre os oponentes de ocasião. Mesmo quando fala na mudança de paradigma – tema que aliás não desenvolve, apenas aflora, apesar de fazer recorrentemente parte do seu discurso político – a ideia que tem em mente é da social-democracia europeia do tempo da Guerra Fria. Não se interroga sobre as razões que, por toda a parte, a fazem declinar, porque tem sobre o assunto uma explicação clara e simples: os políticos que nos governam de há anos a esta parte são todos oriundos de “más colheitas”. Mesmo Obama, de quem tanto se esperava, também está sendo atacado pela filoxera…ou, pelo menos, deixou que ela crescesse à sua volta.
As injustiças, as desigualdades gritantes entre os diversos cidadãos e o modo como o Governo os perfila perante a crise, não será uma coisa por aí além muito agradável, mas pode ser atenuada com umas greves (orgânicas) e umas “passeatas” pela Avenida da Liberdade abaixo que permitam a cada um “desabafar” a sua indignação.
E depois voltar-se-á à “política” entre os que alternam entre si o poder. De passagem, vai adulando Passos Coelho na esperança de melhor o seduzir e “enganar”; e também não perde nenhuma oportunidade de exibir o seu afecto pela sua nova paixão: Aníbal Cavaco Silva! Ódio, a quanto obrigas…
Jorge Sampaio, oriundo de uma “fornada” muito diferente, tendo politicamente vivido várias fases que vão desde a unidade democrática antifascista, passando pelo radicalismo democrático da primeira metade do PREC, até à aproximação, já com a situação política “normalizada”, à matriz empírica do PS, para a ele aderir e pouco depois se situar num posicionamento que lhe permitiu conquistar o poder aos históricos do partido de feição soarista, é, porventura facilitado por nunca ter exercido funções executivas de âmbito nacional, aquilo a que se pode chamar o típico socialista de “esquerda”.
A situação começa por ser analisada com algum realismo, mas, na hora de optar, aceita-se a solução sibilinamente criticada por ser a que menos conflitualidade pode trazer a quem está “por cima” e mesmo quando parece, nos casos mais escandalosos, que não tem pejo em advogar a solução justa, sente a incomodidade do vibrante aplauso que tal opção suscita a quem está “por baixo”, e logo contemporiza para tentar agradar a ambos: “É um escândalo que fiquem fora das medidas de austeridade as chorudas pensões de quem pouco ou quase nada contribuiu para as receber”. Aplausos entusiásticos da multidão de ouvintes. Correcção: “Atenção não estou a atacar direitos adquiridos. Refiro-me ao futuro!”.
O mesmo relativamente à União Europeia e ao euro. Reconhece-se que há um problema, mas não é altura de o afrontar. Primeiro vamos resolver ou ladear o nosso…e quando estivermos “para lá do muro”, então se verá como encarar o “problema europeu”.
A moderadora é também o exemplo acabado do jornalismo português dominante. Ela quer saber como se alcança a solução amanhã. A natureza da solução e as causas que criaram o problema que agora exige uma solução são questões demasiado exigentes para serem tratadas em televisão.
E ainda outra coisa: não haverá ninguém na RTP ou fora dela que explique à Senhora o que é um regime presidencialista?

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