OS EXEMPLOS DA ESPANHA
E DA GRÉCIA
Pode parecer estranho o subtítulo deste post, mas há mais
semelhanças do que diferenças nas posições da Grécia e da Espanha nesta fase da crise do euro. Cada uma
tenta à sua maneira e com estilos diferentes vergar a Alemanha.
(Um parênteses: alguns leitores ficam manifestamente
irritados quando aqui se fala na Alemanha e não no capital financeiro ou quando
se toma como referência de análise o quadro nacional. A primeira coisa
importante que todos nós aprendemos com Maquiavel, o primeiro grande pensador
político moderno, é que em política desprezar a realidade é fatal. Obviamente
que não se trata de negar o importante papel que nesta crise está sendo
desempenhado pelo capital financeiro nem as alianças que ele tem conseguido
fazer nos Estados mais prejudicados por ela, umas facilitadas pelas convicções
ideológicas dos governates, outras pela promiscuidade de interesses. Trata-se apenas de
sublinhar que as consequências desta crise não se repartem indo todas as vantagens para o capital financeiro, seus aliados e acólitos e as desvantagens para os demais. Não:
elas têm, umas e outras, uma incidência fortemente desigual no quadro nacional
de tal modo que há países onde todos, globalmente, tiram vantagem
das manobras do capital financeiro, a ponto de os seus eleitores não quererem
mudar nada e há outros onde todos ou quase todos sofrem as desvantagens dessas
manobras, embora cada qual à sua escala.)
Regressando à Espanha e à Grécia. A Espanha reduziu drasticamente
a despesa pública em todas as áreas, mesmo nas socialmente mais sensíveis, e pôs
em prática uma reforma laboral altamente penalizadora para os trabalhadores. Está
a braços com uma gravíssima crise do sistema financeiro – aliás, na origem do défice excessivo e do aumento vertiginoso da dívida pública – e tem manifesta dificuldade, para não dizer
impossibilidade, de o refinanciar pelos seus exclusivos meios. Todavia, e isto
é que é importante sublinhar, recusa-se a pedir dinheiro ao fundo de resgate
para evitar ser intervencionada, pugnando antes por uma actuação do BCE destinada a refinanciar,
indirectamente, a dívida pública e a recapitalizar os bancos, embora com a
garantia do Estado espanhol. A Alemanha, pelo contrário, mantendo o BCE “inactivo”
desde Janeiro, tudo tem feito para empurrar a Espanha para a intervenção. Um
Estado sob intervenção é um Estado-vassalo e esse é o objectivo político da
Alemanha!
Por que actua a Espanha deste modo? Antes de mais por orgulho
nacional. Esta direita que está no poder, tributária em larga escala do
franquismo, soberanista, orgulhosa do seu passado imperial, recusa a
intervenção com base num sentimento nacional muito forte que antepõe a outras
considerações. E faz conscientemente uma política financeira à beira do abismo ciente
de que quanto mais elevada for a parada maior será o seu peso negocial, numa
luta surda contra a Alemanha, que se recusa a ceder para não perder nenhuma das
vantagens conquistadas desde a criação do mercado único e, principalmente,
desde a introdução da moeda única. E o governo espanhol sabe que tem pelo seu
lado a adesão expressa do PSOE, dos partidos nacionalistas de direita e o assentimento
tácito da esquerda parlamentar, nacionalista e espanhola.
A Grécia sabe hoje por experiência própria o que é um
estado vassalo. Sem um sentimento nacional tão forte e homogéneo como o
espanhol, com um sentimento patriótico mais forjado nas ideias do que num
imaginário de grandeza nacional construído com base no domínio e na subjugação,
foi mais por via da acção da esquerda, da sua luta corajosa contra a submissão
ao capital e ao poder estrangeiro genericamente considerado, embora fortemente corporizado
na Alemanha, por força das suas múltiplas intervenções anteriores em território
grego, que se foi criando e crescendo um sentimento de rejeição à actual
política que não mais poderá deixar de ser tido em conta ganhe quem ganhar as próximas
eleições. Obviamente que se vitória pertencer ao Syriza, a Grécia tal como
Espanha, embora de forma mais directa, conduzirá igualmente uma política financeira
à beira do abismo certa de que o receio infundido por uma hipotética reacção
em cadeia acabará por contribuir para uma mudança significativa da política
europeia.
Entretanto, o BCE, manietado pela Alemanha e
agindo no interesse desta, continua, contrariamente ao que se
ouve dizer, a desrespeitar os estatutos e a fazer uma política monetária anti-solidária,
contrária ao interesse geral da União Europeia. Para não alongar este post, procurar-se-ã fazer amanhã a
demostração da conclusão acima enunciada.
Pois é. Uma das coisas que nos distingue dos espanhois é que a nossa direita não tem um resquício de patriotismo, seja ele fundado em boas ou em discutíveis razão.
ResponderEliminarV
...razões.
ResponderEliminarV
“Um Estado sob intervenção é um Estado-vassalo e esse é o objectivo político da Alemanha!”
ResponderEliminarTambém estou de acordo com essa análise. A União Europeia não é nenhuma confederação de facto, sendo visivelmente secundarizada pela Alemanha quando esta muito bem entende. É a Alemanha que mexe os cordelinhos conforme o seu interesse, depositando-o no BCE. Cada Estado é visto como um Estado-Nação, estigmatizado quando convém. Um estigma que já veio de muito longe, que passa pelos PIIGS, e que agora se vai focar individualmente em cada um deles. Para além da sua configuração política - uma democracia mitigada (veja-se a ratificação dos tratados), houve e há diferenças significativas na economia que não foram acauteladas na fase da construção europeia. Por isso emerge o egoísmo, por isso a Alemanha (e o Passos Coelho, vá lá saber-se porquê!) não quer sequer ouvir falar de eurobonds. Vamos ver até onde chega a resistência na Espanha e na Grécia.
Caro Correia Pinto,
ResponderEliminaro meu e-mail: miguelserraspereira@sapo.pt
Abraço
msp
Caro Serras Pereira
ResponderEliminarHá qualquer coisa errado. Já lhe enviei dois e-mails para o endereço que me indicou e vieram ambos devolvidos. Vou tentar pela primeira via
Abraço
CP