quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

MARCELO REBELO DE SOUSA



NUNCA SE VIU TANTO EMPENHO
 

 

Que Marcelo é um dos nomes fortes e mais influentes da direita já todos sabemos há muito tempo. O que desconhecíamos no seu trajecto político, apesar de todo o seu habitual intervencionismo nas lides político-partidárias, era a sua disponibilidade para se envolver tão intensamente na defesa de um governo, como está a fazer com este governo de Passos Coelho. Pode mesmo dizer-se, sem ironia, que a sua envolvência com o governo em funções é maior do que a que ele tinha consigo próprio quando era líder do PSD.

Se bem nos recordarmos, Marcelo tem, desde o 25 de Abril, por razões diversas, mantido uma atitude crítica relativamente a todos os governos de direita, sem prejuízo de os ter apoiado, mas nunca com o fervor com que agora defende o actual, desde as coisas mais comezinhas até às mais importantes.

Com Sá Carneiro na chefia do governo, Marcelo embora reconhecendo, como toda a direita, quão importante era a chegada do PSD ao poder quatro anos depois da Revolução, nem por isso deixou de marcar algumas distâncias relativamente ao "líder fundador", a ponto de, juntamente com mais dois conhecidos políticos de direita, ter apresentado uma espécie de alternativa chamada, salvo erro, “Jovem Esperança”.

Depois, por morte de Sá Carneiro, veio Balsemão. E os ataques de Marcelo, como subdiretor do Expresso (propriedade de Balsemão), ao governo e ao Primeiro Ministro foram de tal ordem que Balsemão para se livrar da perversidade do seu empregado jornalista o convidou para Ministro, para o ter mais próximo e controlado. Mas sem qualquer sucesso, já que foi exactamente nesse lugar desse atarantado governo da “AD dois” que Marcelo mais conspirou contra o Primeiro Ministro.

Mais tarde veio Cavaco por dez anos e apesar de toda a força e influência de Cavaco apenas terá mudado o tom das críticas e às vezes a falta de oportunidade para as fazer. Mas sempre que essa oportunidade aparecia lá estava Marcelo a deixar a sua ferroada na nova e indiscutível liderança.

Passou-se uma boa meia dúzia de anos até que a direita voltasse ao poder com Barroso como Primeiro Ministro. Pois apesar de Marcelo estar psicologicamente em baixo – tinha perdido a liderança do partido para o actual presidente da comissão europeia – nem por isso a sua veia crítica perdeu entusiasmo ou esmoreceu. Depois seguiu-se Santana Lopes e então foi um verdadeiro “fartar vilanagem” como nunca se tinha visto antes, a ponto de alguns terem interpretado aquela cruzada contra o antigo companheiro da “Jovem Esperança” como um acto de indisfarçável despeito por Santana ter chegado, embora nas específicas condições em que chegou, às funções que Marcelo, desde outro Marcello, tanto ansiava para si.

Tem que haver, portanto, uma explicação para esta defesa tão intransigente e tão militante do Governo de Passos Coelho. Com excepção das críticas a Relvas – mas Relvas não conta porque realmente não há quem o possa defender – tudo o mais Marcelo defende desde o que tem pouca importância até ao que realmente é muito importante. Marcelo defende as privatizações – as escandalosas privatizações da RTP, da ANA, da TAP assim como defendeu a da EDP -, defende a subserviência de Passos perante a Europa, defende o Orçamento, como antes defendeu todas as medidas que nele estão inscritas ou que Passos gostaria de lá inscrever, defende a descaracterização do Estado social, justifica os maiores disparates do Governo como “falhas de comunicação”, enfim, desempenha o papel de um porta-voz de luxo reinterpretando e recriando as mais incríveis decisões do governo com vista a fazê-las passar como actos razoáveis e necessários face à “grave situação que o país atravessa”.

E tudo isto porquê? Tem de haver uma explicação. Nos dias que correm a explicação mais corrente para compreender fenómenos como este assenta na ideia de que “não há almoços grátis” ou de que “ninguém corre de graça”. Não parece todavia que seja o caso, nem mesmo na hipótese de a recompensa (ou a “contraprestação”) consistir num futuro apoio a uma candidatura a Presidente da República. Pela razão simples de que muita água daqui até lá passará por baixo das pontes, não sendo nada seguro saber-se a esta distância quem nessa altura “mandará” no PSD”. Embora esta questão da Presidência da República não esteja ausente das suas preocupações, a verdadeira razão para o entusiasmo com que Marcelo quase todos os dias aparece a defender o governo parece ser outra.

Marcelo percebeu, como toda a gente, que este é, desde o 25 de Abril, o governo mais à direita que Portugal teve. Um governo que está levar à prática aquilo com que a direita sempre sonhou desde o 25 de Abril mas que nunca até hoje tinha tido condições para concretizar: a desforra. E é essa desforra, esse desmantelamento do que de mais importante foi conquistado com a Revolução, que entusiasma verdadeiramente Marcelo.

Marcelo também sabe que essa desforra não pode incidir, pelo menos para já, sobre as chamadas “liberdades formais” da democracia representativa, mas sabe também que se os direitos económicos e sociais de quem trabalha forem verdadeiramente atacados, precarizados, fragilizados estarão criadas as condições para que “em democracia” a direita possa fazer quase tudo o que fazia em ditadura. Essa a razão do entusiasmo de Marcelo.

Enganam-se aqueles que pensam que Marcelo tinha tudo para uma grande carreira política mas que por força das suas “traquinices” e perversidades tudo tem deitado a perder. Sim, Marcelo aspirava, na sequência e na continuidade do marcelismo, a uma grande carreira política que o 25 de Abril traumaticamente impossibilitou. Hoje, ao ver parcialmente recriadas aquelas condições, Marcelo voltou a acreditar que tem hipóteses. Mas para isso é preciso reforçar quotidianamente a defesa do governo para que este possa concluir a tarefa a que meteu mãos.  

5 comentários:

  1. Aplaudo, sem reservas. Sempre considerei Marcelo Rebelo de Sousa um dos políticos mais malfazejos e viperinos do país.

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  2. claro que vai ser tramado, sem hipóteses de suceder a Cavaco, como tanto deve desejar...

    a vingança vai ser servida com gelo.

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  3. Acredito piamente que se Marcelo Rebelo de Sousa ler este texto, dirá a voz alta: este gajo, conhece-me como ninguém. Só ele, só ele.
    Excelente análise a uma pessoa que sempre ficará ás portas de um enorme cargo governativo.

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