quarta-feira, 11 de setembro de 2013

11 DE SETEMBRO



HÁ QUARENTA ANOS

Há 40 anos o governo de Salvador Allende foi derrubado por um golpe de estado perpetrado pelas Forças Armadas chilenas com o apoio e a instigação dos Estados Unidos da América. Seguiu-se, como se sabe, um regime de terror durante 17 anos liderado por Augusto Pinochet, um dos mais ferozes ditadores da América Latina de todos os tempos, não apenas pelo número de vítimas que pesam sobre o seu regime mas acima de tudo pelo extremo desprezo com que lidava com a vida humana dos seus opositores políticos de esquerda.

Internamente, o golpe teve o apoio da direita chilena – a mesma que hoje está no poder e se recusa tanto semântica como politicamente a reconhecer a barbárie daquele período – e contou também com a conivência da democracia cristã que, apesar de avisada no dia anterior ao desencadeamento do golpe, se recusou a do facto dar notícia a Allende.

Para além da barbárie que ditadura de Pinochet representa no plano propriamente político pelo espezinhamento dos mais elementares direitos, como o direito à vida e à integridade física, o golpe de Pinochet e as quase duas décadas em que esteve à frente dos destinos do Chile constitui também uma experiência inovadora no plano económico e social.

Mais de meia década antes da contra-revolução neoliberal de Thatcher e Reagan, o Chile tornou-se o primeiro país a pôr em prática uma política económica radical de matriz neoliberal, apadrinhada e assessorada pelos “rapazes de Chicago”, sob a égide de Milton Friedman, para quem a questão das liberdades políticas, a começar pela liberdade de escolha, também hoje tão presentes na pseudo-democracia de qualquer “crato” de ocasião, não representavam absolutamente nada.

O Chile sobre o qual ainda hoje pesa densamente o “fantasma vivo” de Pinochet em toda a sua dimensão (política, económica, social e militar) continua sendo um caso que não pode ser esquecido pela actualidade do seu exemplo nos aspectos que mais interessam nos dias que correm.

Mais do que ingenuidade de Allende quanto à fidelidade das Forças Armadas ao regime democrático e aos juramentos constitucionais, mais do que a depreciação da importância da Guerra Fria na concreta situação geoestratégica em que actuava, mais ainda do que a conclusão tão rapidamente tirada pelo euro-comunismo de Enrico Berlinguer que passou desde então a reclamar uma ampla base social de apoio para que a construção do socialismo em liberdade pudesse ter êxito, a grande lição que se tira do golpe de 11 de Setembro de 1973 é a de que o capitalismo, seja na feição marcadamente imperialista de defesa da sua zona de influência, seja sob o domínio hegemónico do capital financeiro e especulativo, não hesita em utilizar os meios necessários ao seu dispor para defender o status quo quaisquer que sejam as consequências dessa defesa e quaisquer que tenham dce ser os meios para o conseguir.

A retórica hoje amplamente divulgada de defesa das “liberdades e da democracia” não passa de um mero expediente político conjuntural favorecido nas últimas duas décadas pela ausência de alternativa política consistentemente organizada capaz de pôr efectivamente em causa o modo de produção capitalista, pois como a realidade amplamente demonstra qualquer pretexto é bom para que o capitalismo logo despreze os direitos e as liberdades que diz defender.

Um imenso, incomensurável, “big brother” pesa hoje sobre os cidadãos nacionais e estrangeiros, sobre os Estados aliados, amigos ou simplesmente integrantes da comunidade internacional, sobre as empresas concorrentes, sobre as organizações sociais e políticas, a pretexto da defesa contra as acções, falsas ou verdadeiras, perpetradas pelo “jihadismo”, esse aliado objectivo do moderno capitalismo neoliberal, com o qual convive numa teia de cumplicidades e de retribuições ainda muito difícil de perceber em toda a sua extensão nos tempos que correm e mais difícil ainda de ser apreendido pela consciência universal dos que efectivamente lutam por uma real alternativa ao actual sistema capitalista fomentador da desigualdade em grande escala, da marginalização política e social, da eliminação dos direitos sociais, enfim, da destruição dos valores democráticos universais.

3 comentários:

  1. Mais tarde, em 74, foi quando tive mais consciência do terror vivido, pelos testemunhos de vítimas que eram passados na rádio, Horrores...
    Noites de insónia.

    Nos anos 80, tive um grande enamoramento por Renato Pavel, refugiado em Portugal,cujas histórias de vida e tortura ouvi na 1ª pessoa.

    Orgulho máximo. Foi ele que em 88 ou 89 do séc. passado foi com o seu velho OPEL para cima do carro de Pinochet, quando da sua visita a Portugal, instalado no Estoril Sol.

    Foi preso mas logo solto e nesse ano todos os chilenos refugiados tiveram o seu passaporte.

    Renato morreu brutalmente num acidente na marginal nos anos 90.

    Viva a vida e a liberdade.

    Abtaço, Zé Manel.

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  2. Como tenho escrito nos últimos tempos, no Moleskineacabou-se definitivamente, com a junção da crise e da hegemonia político-ideológica do neoliberalismo, a era social-democrata da gestão progressista do capitalismo.

    Hoje, é a revolução que nos deve fazer reflectir e mover, mesmo que com quadros de pensamento muito diferentes, como o que dizes em relação à tese de Berlinguer.

    Tudo se decide pensando na estrutura de classes (ainda!...), na propriedade, na soberania nacional, na restauração da democracia real e no papel do Estado. Com PS ou sem PS!

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