domingo, 5 de julho de 2015

AS FRASES FEITAS E O SEU SENTIDO


MAIS UM BREVE APONTAMENTO

A imprensa espanhola, principalmente a próxima do PSOE, como, de resto, a portuguesa próxima do PS, não se cansa de dar lições de moral aos gregos e de criticar o Syriza pela sua actuação. São raríssimas as excepções, mas não é das excepções que queremos falar, mas sim do que é normal e corrente.

Diz o El Pais de hoje que o “Não” ameaçará a irreversibilidade da moeda única e minará a credibilidade da União Europeia numa época de crescente euro-cepticismo. Mas logo acrescenta que a factura será ainda pior para a Grécia, cujo primeiro-ministro Alexis Tsipras, promotor da consulta e da ruptura de pontes com a Europa, queimou em seis meses o seu capital político. E traça a seguir um cenário apocalíptico sobre o futuro da Grécia.

É sobre a parte sublinhada em itálico que gostaríamos de dizer alguma coisa. Em primeiro lugar, por que razão se afirma que Tsipras rompeu as pontes com a Europa? Por que não o contrário, conhecidos que são os relatos das reuniões havidas entre as partes? Porque para os jornalistas desta corrente quem “rompe as pontes” é quem não aceita os diktats da Europa. E com que legitimidade se afirma que Tsipras “queimou em seis meses o seu capital político”? Para responder a esta segunda questão convém demorar mais algum tempo.

A chegada do Syriza ao poder foi saudada pela esquerda europeia, foi também saudada por uma direita nacionalista que não aceita a subserviência a Bruxelas e foi ainda saudada, com algumas reticências, por alguns partidos socialistas e social-democratas do sul que se encontram na oposição e que vislumbraram na chegada ao poder do Syriza a possibilidade de os patrões da Europa fazerem certas concessões aos críticos da austeridade. Logo, porém, que se começou a ter a certeza de que as exigências dos credores não abrandavam, pelo contrário, cresciam de tom e de intensidade, e que as promessas eleitorais do Syriza não eram “papel molhado”, mas para levar, tanto quanto possível, a sério, a posição dos ditos partidos socialistas e social-democratas alterou-se radicalmente. Da vaga e interesseira simpatia inicial rapidamente se passou ao distanciamento e à crítica ao “radicalismo” do Syriza para daí partirem para a conclusão inevitável: “Tinham razão, mas perderam-na; destruíram em seis meses o capital de simpatia com que partiram”.

Não pode haver maior hipocrisia, nem pior covardia e servilismo políticos do que os daqueles que se abrigam sob a falsa capa de uma moral comportamental. De facto, o que os partidos socialistas, social-democratas e seus acólitos criticam é que o Syriza tenha tentado pôr em prática as suas ideias e promessas eleitorais e o que eles escondem é que, como sempre, nunca estiveram dispostos a lutar por uma via diferente para a Europa e a arcar com as consequências dessa luta, mas antes esperavam, como normalmente espera quem não tem a coragem de lutar, que sejam os “senhores” a satisfazer os seus interesses. E aqui reside a razão da tal “queima do capital político” com que partiram. Queimou-se, porque confrontaram corajosamente os patrões e os credores da Europa com as suas propostas não se aninhando perante as suas exigências. Romperam as pontes, porque restituíram ao povo o direito de se pronunciar e de decidir sobre o sentido desse confronto.

Para os socialistas normal e coerente seria aceitar o que vem de cima e esperar, depois dessa manifestação de boa vontade, que no regaço lhes caia a generosidade de uma migalha magnanimamente prodigalizada pelos "senhores da Europa"

Perguntar-se-á, porquê este ataque aos socialistas e nem uma palavra sobre a direita? A razão é simples. Quanto à direita, o chamado “povo de esquerda” não tem qualquer ilusão: sabe que é uma direita servil e antipatriótica que ataca os pobres, os velhos, os desempregados, os doentes, as crianças carenciadas, o estado social e que defende os ricos e os poderosos depois de servidos os credores. Quanto a estes não há equívocos, nem enganos. O perigo vem de outro lado…


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