quinta-feira, 12 de outubro de 2017

CATALUNHA - AS CORTES DE MADRID

O DEBATE DESTA TARDE


Articulo 155

Rajoy passou de novo a bola a Puigdemont. Pediu uma aclaração como se faz nos tribunais quando se pretende ganhar tempo e obrigar o juiz a explicar-se melhor. Se não erro a "aclaração", em Portugal, já levou uma "machadada" na última revisão do CPC, mas em Espanha continua a valer até na alta política.
Do debate desta tarde, que segui em directo, realço o tom de Rajoy, muito distante do tom que se ouve nos escritos de Aznar e Gonzalez, dos seus sequazes e bem como do tom verdadeiramente bélico da imprensa de Madrid. Rajoy manteve-se dentro da linha que tem traçado, fazendo depender a aplicação do art.º 155.º da Constituição (o tal que suspende a autonomia e permite aplicar pela força o que não for voluntariamente acatado, recorrendo às forças policiais e militares) das explicações pedidas a Puigdemont. A intervenção do PP (do PP em que Rajoy manda) foi escrita e lida por um deputado que se manteve dentro do tom usado e da linha seguida pelo Presidente.
O PSOE terá conseguido, a troco do apoio que dará a Rajoy na aplicação do art.º 155.º, a promessa de uma revisão constitucional. Parece-me um acordo desigual. O PSOE deu tudo o que tinha para dar, ficou sem margem de manobra na Catalunha (a posição do PSC é mais matizada e continua a privilegiar o diálogo) e apenas ganhou a promessa de desencadeamento de um processo de revisão constitucional, o que é muito pouco, se não houver alterações profundas na regulação da questão territorial e da própria natureza do Estado. O PSOE desta cedência corre o risco de, mesmo com Sanchez, ser tido como uma muleta de Rajoy ou, o que talvez até seja pior, uma simples extensão do PSOE de Suzana Diaz.
O Podemos para espanto da Câmara começou por elogiar Rajoy, dizendo expressamente que havia duas coisas na intervenção do Presidente de que tinha gostado: do tom (é óbvio que Rajoy, perante a grande plateia internacional que acompanha em directo a questão catalã, teria de replicar a Puigdemont num tom semelhante ao deste, sem exaltações nem ameaças) e da reprodução de uma frase de Manuel Azaña, proferida em 1938 (durante a Guerra Civil) como Presidente da República. Depois, pediu a Rajoy que fosse corajoso e que seguisse o exemplo de Adolfo Suàrez, mudando as leis que impedem a convivência. Por fim, responsabilizou o PP pela crise da Catalunha, por ter impugnado perante um tribunal politicamente dominado as disposições do Estatuto da Catalunha que representavam um progresso   no relacionamento entre espanhóis e catalães. Insistiu na ideia de que só mudando a lei se pode obter a paz.
Seguidamente falou Rivera dos Ciudadanos. Uma intervenção medíocre e fascista. Um falangista não teria feito diferente. Hoje, no plano institucional, a extrema direita está neste novo partido. A intervenção foi de tal natureza que até Rajoy a criticou.
Finalmente, os discursos da Esquerda Republicana, dialogante, mas firme na defesa das posições do governo da Catalunha e de um outro partido catalão que chamou falangista a Rivera e insistiu com Rajoy para que aceitasse a proposta de diálogo que lhe foi feita. Por seu turno, o PNV também insistiu no diálogo, reprovou o uso da força e insistiu com Rajoy para que promova a alteração das leis contestadas, porque disse: “Se não há democracia sem leis, também há muitas leis que não são democráticas”.
Como nota marginal, o autoritarismo com que a Presidente do Parlamento, Ana Pastor, dirige o plenário,  autoritarismo institucionalmente consagrado que vai ao ponto de a Presidente poder retirar do diário das sessões frases ou palavras proferidas por um deputado, como aconteceu com a intervenção de um deputado catalão. Enfim, qualquer semelhança com o funcionamento de um parlamento democrático é pura coincidência. Os exemplos que poderiam apontar-se são muitos e variados, mas não vem ao caso fazê-lo agora.
A ideia com que se fica é que de uma parte e de outra a vontade de negociar é pouca. Ambas estão a jogar o mesmo jogo, ou seja, cada uma espera que outro pratique um facto por que possa ser responsabilizada aos olhos do “grande auditório”. De facto, já nem Rajoy nem Puigdemont estão a actuar tendo especificamente em conta a parte que representam. Ambos estão a actuar tendo fundamentalmente em conta a comunidade internacional.
Se Rajoy insiste no princípio de que somente negoceia no marco da lei e Puigdemont não abdica da declaração de independência não poderá chegar-se a entendimento algum. Somente um começo de negociações sem condições prévias poderia abrir a porta ao diálogo.  
Acho difícil que isso aconteça.


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