quarta-feira, 18 de outubro de 2017

MARCELO DÁ GÁS À DIREITA


OS INCÊNDIOS DE OUTUBRO
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Como era de prever, a intervenção do Presidente da República reforça as teses da direita, que se prevalece das mortes causadas pelos incêndios para tentar criar uma linha de contestação ao Governo que o condicione na sua acção, que o fragilize politicamente, mediante uma orquestrada campanha que tem na comunicação social o meio julgado suficiente para atingir o fim em vista.

E o fim em vista não tem nada a ver com a floresta, nem com os fogos florestais e muito menos com a tragédia dos que perderam a vida nos incêndios.

O objectivo da campanha assenta num pressuposto   vigente neste país há quase um século, com excepção de uma interrupção de 18 meses na década de 70 do século passado e da que actualmente está em curso desde 26 de Novembro de 2015, embora estruturalmente diferente da anterior, que consiste muito simplesmente no seguinte: Portugal só pode ser governado à direita, pela direita ou por quem inequivocamente faça uma política de direita. Quem defender outras soluções, seja com apoio na legitimidade revolucionária, seja com apoio no voto popular, não pode governar.

Cavaco, quer como Presidente da República quer como reformado político, disse-o de forma clara e inequívoca. E o que Cavaco diz destemperadamente, é o que a direita, com mais ou menos manha, com mais ou menos dissimulação, pensa e quer pôr em prática.

Derrotada no plano da governação, nomeadamente se confrontada com as soluções apocalípticas por ela postas em práticas durante quatro anos, a direita busca em factos humanos completamente alheios à governação, ou em fenómenos naturais imprevisíveis (alguns) e inevitáveis (quase todos), encontrar argumentos que possam inverter o rumo político em curso, quer estimulando divisões na força política dominante, quer intrigando - toscamente, diga-se – as  demais forças que no Parlamento apoiam politicamente o Governo.

Marcelo alinhando, como alinhou, nesta culpabilização absurda de considerar politicamente responsável quem tenta no quadro existente – que tem limitações de toda a ordem, desde os meios que são finitos, até à própria situação sobre que incidem, passando pela excepcionalidade das condições atmosféricas – minimizar os prejuízos materiais e humanos, sabe que está a dar alento à direita, tentando projectá-la para um patamar político que ela não está em condições de alcançar pelos seus próprios meios.

Portugal não pode mobilizar-se contra os incêndios como se mobilizaria para combater uma guerra de agressão, do mesmo modo que também se não mobiliza para combater certas doenças que matam muitíssimo mais portugueses do que os que morrem nos incêndios ou para combater os acidentes de viação que continuam todos os anos a matar centenas de vítimas inocentes.

Tem de haver a medida das proporções e não ceder à demagogia. Marcelo, pelo seu passado, pela sua ideologia política, pela sua grande experiência como comentador político, pelo papel que agora desempenha como Presidente que quer permanentemente manter em alta as quotas de popularidade, sabe que o argumento demagógico em certos contextos emocionais pode resultar. Julgando ir ao encontro do sentimento popular (no que acho que se engana redondamente) e sabendo que esta é uma boa altura para “fazer as pazes” com a sua direita (que agora se prepara para iniciar um novo ciclo), Marcelo, qual catavento, deu gás à direita para ver no que dá.

A resposta é simples: há que cerrar fileiras e continuar sem desfalecimentos nem desânimos. E ainda mais: é sempre de má política elogiar alguém da direita, seja o que for que esse alguém tenha feito, porque breve virá o dia em que esse elogio fica desmentido pelo comportamento do elogiado. A política não é um “chá dançante”, nem um concurso de beleza. A política é algo entre nós e eles. E eles tem projectos e propostas muito diferentes das nossas!

4 comentários:

  1. ...quanto a mim, o PS só não continuará a governar se não quiser... ( e prossigo com uma passagem deste seu texto)

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  2. Texto maravilhoso. Concordo com tudo!

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  3. Revejo-me inteiramente neste artigo. É lúcido, claro e inteligente.

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