sábado, 28 de agosto de 2010

DUARTE LIMA: UMA ENTREVISTA FALHADA



APERTA-SE O CERCO

Se Judite de Sousa supunha que com a entrevista de quinta-feira prestava um favor a Duarte Lima, permitindo-lhe reverter a seu favor o clima de desconfiança que a pouco e pouco se foi instalando na opinião pública sobre o caso “Rosalina Ribeiro” enganou-se redondamente.
As explicações pouco ou nada convincentes de Duarte Lima sobre o seu papel na noite do crime deram lugar a uma nova investida da comunicação social, nomeadamente das televisões, SIC, TVI e RTP, mas também dos jornais, que não se poupou a esforços para através de vários testemunhos, principalmente colhidos no Brasil, deixar claro a natureza inusitada de alguns dos comportamentos daquela noite.
Para quem não queira alimentar o clima de suspeição, nem tão-pouco aduzir argumentos absolutórios do comportamento de Duarte Lima, o mínimo que se poderá dizer é que, para uma advocacia de milhões, se usaram processos típicos de uma advocacia de “vão de escada”.
Em primeiro lugar, é de “vão de escada” a advocacia de um advogado que ganha milhões e que numa causa de muitos milhões se propõe viajar de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro num carro alugado, para um encontro nocturno, sem que alguns meses depois se recorde do nome da empresa a que alugou o carro. Se não é exigível que se desloque em jacto privado - apesar da urgência da reunião…já que, se não fosse urgente, poderia ser realizada em Portugal três dias depois, data em que Rosalina tinha viagem marcada para Portugal - poderia e deveria, no mínimo, ter-se deslocado no avião de carreira que em poucas dezenas de minutos liga as duas cidades muitas vezes por dia, como se de uma verdadeira “ponte aérea” se tratasse.
Advocacia de “vão de escada”, em segundo lugar, já que só a natureza do aluguer pode justificar o esquecimento do nome da empresa locadora. Esquecimento, ou mais do que isso, desconhecimento perfeitamente normal, se o aluguer tiver sido feito a uma daquelas empresas “sem nome” que proliferam nas grandes cidades brasileiras, que recebem à cabeça o preço do aluguer e do qual não fica qualquer rasto…se tudo correr bem (isto é, se não houver acidentes). Obviamente, que se o aluguer tivesse sido feito numa multinacional ou numa grande empresa brasileira, presente em todos os estados, como a Localiza ou a Unidas, já seria muito mais difícil, para não dizer impossível, esquecer o nome da empresa com a qual contratou o aluguer.
Mas também é de “vão de escada” uma advocacia que trata de assuntos tão importantes depois das oito da noite numa “lanchonete” do Flamengo. E mais ainda o será se se propõe levar de noite a sua cliente para um encontro nos arredores do Rio de Janeiro, deixando-a só com um desconhecido…tão desconhecido que, mais de oito meses volvidos, ainda ninguém conhece! Aqui, a advocacia sem deixar de ser de “vão de escada” como que se transforma também numa espécie de “advocacia clandestina”… em que o advogado deixa o seu cliente, de noite, entregue à sua sorte nos arredores de uma cidade como o Rio de Janeiro. Então, há algum advogado que, não querendo esconder o seu patrocínio, se refugie na “clandestinidade” no exacto momento em que o seu cliente se prepara para fazer um dos mais importantes negócios relacionado com os bens da “herança em litígio”?
Como advogado, o comportamento de Duarte Lima deixou muito a desejar neste triste episódio. E a dúvida que resta é saber se actua sempre assim ou se só actuou assim com Rosalina Ribeiro. E é igualmente de estranhar que a Ordem dos Advogados, com base nas notícias vindas a público, ainda não tenha aberto um inquérito para, no puro plano deontológico, avaliar o comportamento de Duarte Lima. Marinho e Pinto, sempre tão presente nos casos que envolvem membros do governo ou tão rigoroso e exigente com as magistraturas, ainda não viu certamente no presente caso nada que justifique a intervenção da Ordem…

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

DUARTE LIMA: O SENTIDO DE UMA ENTREVISTA



MAIS UMA VEZ JUDITE DE SOUSA

Nas entrevistas de Judite de Sousa é possível prever com relativa segurança o que se pretende com elas. A atitude da entrevistadora varia tanto em função dos entrevistados, que o espectador quando conhece o entrevistado ou, quando não o conhece, depois de feitas as primeiras perguntas, logo percebe que a entrevista ou tem por objectivo dar ao entrevistado uma oportunidade para se explicar perante o grande público, ou colocá-lo perante um conjunto de questões difíceis quase sempre alicerçadas numa tese que por via da entrevista se pretende demonstrar, ou – muito raramente – contribuir para o esclarecimento de um assunto.
A entrevista de hoje, a Duarte Lima, não fugiu à regra. A convicção com que se fica é a de que a entrevistadora pretendeu dar a Duarte Lima, num espaço de grande audiência, oportunidade para apresentar a sua própria versão sobre um tema que nas últimas semanas tem ocupado grande espaço na comunicação social.
As três grandes mensagens que Duarte Lima pretendeu deixar aos espectadores podem resumir-se assim:
Primeira: As pessoas seguramente mais interessadas na vida de Rosalina Ribeiro eram os seus advogados, em Portugal e no Brasil;
Segunda: Há uma campanha na comunicação social contra ele, montada por pessoas que o querem destruir, que ele recusa sequer dizer que suspeita quem sejam, embora o espectador fique com a convicção de que ele sabe quem são;
Terceira: O valor mais importante para Duarte Lima é a vida humana, causa a que se tem dedicado, empenhadamente, nos últimos anos.
Não tendo as três mensagens a mesma consistência lógica – a primeira mensagem não é logicamente sustentável – havia no caso Rosalina Ribeiro pessoas mais interessadas na sua vida do que os seus advogados, nem podendo o espectador aferir da veracidade das restantes, já que elas valem mais pela capacidade de persuasão de quem as profere do que propriamente pelo seu conteúdo probatório, restava a Duarte Lima explicar-se melhor nas demais matérias. Infelizmente, não o fez, já que por via de alegados deveres deontológicos e processuais se recusou a responder à generalidade das questões colocadas pela jornalista em tom afável e amigável, senão mesmo cúmplice.
Como acontecerá com a imensa maioria das pessoas que, de perto ou de longe, têm acompanhado o caso de “Rosalina Ribeiro”, também eu não tenho nenhum conhecimento directo do processo, nem estou de posse de quaisquer elementos que me permitam sequer compreender com rigor o móbil do crime.
Acontece que conheço o Brasil e até talvez possa dizer que, para estrangeiro, o conheça relativamente bem. Talvez por essa razão não tenha compreendido a justificação apresentada por Duarte Lima para vir de carro alugado de Belo Horizonte ao Rio de Janeiro (não se sabe se dia, se de noite ou se de dia e de noite) – segundo ele, a mesma que o leva a viajar de carro de Lisboa para Madrid ou para Barcelona: maior segurança na estrada do que nos voos internos. E menos ainda compreendi que, depois das oito da noite, Duarte Lima tenha levado Rosalina de carro do Flamengo a Maricá, passando por Niterói e outras terras, para a levar a um encontro com uma desconhecida (dele) e a tenha deixado nesse local sem se preocupar com o seu regresso – ele que até tinha vindo de Belo Horizonte ao Rio, de carro, para se encontrar com a sua cliente.
Mas isto digo eu que conheço o Brasil. Duarte Lima, como seguramente o não conhece tão bem, dirá outra coisa e será muito mais ousado do que eu, predispondo-se a viajar de carro de Belo Horizonte ao Rio, com a mesma tranquilidade com que vai de Lisboa a Barcelona; e do Flamengo até Maricá, de noite, para aí deixar, com uma desconhecida, a pessoa por quem tinha estima e apreço com a mesma tranquilidade com que a levaria de Lisboa a Sintra para a deixar numa residencial.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O MASSACRE DE SÃO BARTOLOMEU


A NOITE DE 24 DE AGOSTO DE 1572

Por muito que continuem por esclarecer as responsabilidades próximas no desencadeamento do massacre dos protestantes franceses (huguenotes) na noite de São Bartolomeu, não resta a menor dúvida de que somente o contexto fanático das guerras religiosas entre a cristandade, nomeadamente o fanatismo dos católicos, permite compreender o que se passou naquela sangrenta noite em Paris e nos dias subsequentes nas mais diversas regiões de França. Dezenas de milhares (os números ainda hoje variam, consoante as preferências de quem escreve) de franceses de credo religioso minoritário foram impiedosamente massacrados em todo o país.
Aqui evoca-se, hoje, a data para celebrar a liberdade religiosa, de quem tem e de quem não tem religião, a tolerância e a convivência étnica contra todas as formas de fundamentalismo religioso e contra todas as manifestações de racismo ambos filhos da intolerância e da verdade absoluta!
Infelizmente, no mundo em que hoje vivemos, quase quatro séculos e meio depois daquele infausto acontecimento, poucos são os que não padecem deste mal atávico que tem acompanhado a humanidade desde as suas mais remotas origens.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A "IMPARCIALIDADE" DA RTP




BOM DIA PORTUGAL”

No programa da manhã da RTP, “Bom dia Portugal”, o locutor de serviço noticia a resposta de Sócrates à proposta do PSD sobre o fim da progressividade dos impostos. Para esclarecimento do assunto, o locutor convidou o dr. Fulano de tal (cujo nome desconheço), “especialista” na matéria.
Então, o tal dr., um jovem de tenra idade, começa por responder à pergunta do locutor, esclarecendo os conceitos de progressividade e de proporcionalidade fiscal, mas logo acrescenta com toda a convicção: não se percebe porque existe todo este alarido à volta da proporcionalidade dos impostos (a proposta do PSD), já que se trata de um assunto “estudadíssimo” e com excelentes resultados nos países do Leste da Europa que aplicaram este sistema. Estes países, que eram paupérrimos, estão hoje todos à frente de Portugal e isso deve-se ao sistema fiscal em vigor que premeia quem mais trabalha e promove o desenvolvimento.
Ao ouvir este comentário lembrei-me de Castrim e daquele seu sentimento dividido sobre a RTP: gosta-se da RTP porque é uma estação pública que não está sujeita às imposições do capital privado e à férrea lógica do lucro e detesta-se a RTP porque é uma “velha prostituta” capaz de todas as baixezas e de se vender ao primeiro figurão que lhe “cheire” a poder.
Mas este episódio serve também para demonstrar como é verdadeira a tese de que a generalidade dos nossos comentadores, “especialistas” e aparentados é absolutamente incapaz de se pronunciar sobre qualquer questão sem ser numa perspectiva puramente ideológica. Mesmo aqueles que são chamados a esclarecer um assunto, imediatamente deturpam os elementos de facto ou os desprezam, para fazerem vingar a posição que ideologicamente defendem como se uma verdade científica se tratasse. Mas a RTP sabe muito bem quem escolhe…

sábado, 21 de agosto de 2010

MÁRIO SOARES E FIDEL




AS PARTIDAS DA MEMÓRIA

Só hoje tomei conhecimento do último artigo que Mário Soares escreveu no DN. Não será de estranhar que tenha olhado com especial atenção o “capítulo” que dedicou a Fidel.
Depois de descrever a recente intervenção do Comandante no Congresso dos Deputados do Povo, segundo a avaliação político-pessoal que dela faz, Soares recorda a sua primeira visita a Cuba, nos idos de 60, e deixa-nos o testemunho da impressão com que ficou do regime que então se estava construindo na ilha.
No relato que faz do longo mês que lá passou, Soares esqueceu-se de referir que iniciou a sua estadia em Havana no melhor hotel da cidade, equipado com ar condicionado e todas as demais comodidades. Soares estava feliz e sentia-se em férias nas Caraíbas.
Dias mais tarde chegaria a delegação do PCP, chefiada por Álvaro Cunhal, e só então os cubanos se aperceberam de que tinha havido um engano na instalação dos hóspedes. Os aposentos que estavam sendo ocupados por Soares e Fernandes Fafe destinavam-se aos representantes do PCP. Então, com toda a naturalidade, os cubanos, ao que parece com gentil ironia, mudaram Soares e Fafe de hotel, dando-lhes a entender que estariam melhor noutro lado, não obstante os reiterados protestos dos “desalojados” que insistiam em fazer ver aos seus anfitriões que não precisavam de se incomodar com eles…porque estavam muito bem onde se encontravam.
Este “down grade” com que Soares não contava, ainda por cima para um hotel sem ar condicionado, marcou decisivamente a sua estadia em Cuba…
Muitos anos mais tarde, numa Cimeira Ibero-Americana numa cidade da América Latina, depois de Soares já se ter desforrado nos jornais daquela terrível desfeita com epítetos como o de “dinossauro” e outras “pérolas” do género, Fidel, imponente no seu metro e noventa, desceu a pé a escadaria que ligava os salões do primeiro andar ao “lobby” do hotel. Cá em baixo, Soares falava com alguém. Fidel, olhando-o de alto, pára por momentos ao cruzar-se com ele, e detém-se em algo que Soares ostentava na aba do casaco. Puxa-lhe levemente a aba, com ar simultaneamente familiar e sobranceiro, e diz-lhe: “Chiquitito, chiquitito”. Soares, surpreendido e afável, balbucia um qualquer som seguido de “Comandante”, mas já Fidel se afastava em direcção ao destino que o esperava…
Os anos continuaram a passar sem que Soares tivesse retribuído a "hospitalidade" cubana, nem como Presidente nem a título pessoal. Provavelmente, não terá havido muitas ocasiões para o fazer, embora o mais certo seja Soares não as ter proporcionado pelas razões que se conhecem. Fidel não era seguramente a sua "praia". Outros, que não ele, tiveram mais sorte, como aconteceu com Mobutu, democraticamente recebido no Algarve, na casa do Vau...

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

MAIS FANTASIAS NEOLIBERAIS



A PRESSÃO FISCAL EM PORTUGAL

Uma das mais conhecidas fantasias neoliberais assenta na falsa ideia de que a diminuição da carga fiscal contribuirá decisivamente para o crescimento da economia.
Já aqui se demonstrou que tal “teoria” é falsa, como normalmente são a maior parte das “teorias” económicas…exactamente porque não são teorias.
Em Portugal, a diminuição da carga fiscal teria por consequência inevitável o aumento da dívida. Esta conclusão é segura. A maior parte das demais conclusões antecipadas pelos neoliberais estão por demonstrar. São simples propostas de programas políticos disfarçadas de “verdades” económicas.
Mas também já é verdadeira a conclusão de que a diminuição da carga fiscal favorece principalmente os detentores dos mais altos rendimentos, não resultando dessa diminuição, no plano macroeconómico, qualquer efeito positivo para a economia nacional.
Os últimos dados publicados pelo Eurostat sobre a pressão fiscal na Europa mostram que a pressão fiscal média da União Europeia a 27 (isto é, compreendendo as selvagens políticas neoliberais das Estónias, Letónias, Lituânias, Eslováquias, etc…) é de 38,7%do PIB, entendendo-se por pressão fiscal os impostos e as quotizações sociais. Pois bem, Portugal, que quase não cresce há dez anos, está abaixo dessa média com 36,7% enquanto a Alemanha, o país que mais crescerá este ano, regista uma média de 39,3%.
A Dinamarca e a Suécia, cujo nível de vida nenhum cidadão de com senso em qualquer parte o mundo desdenharia possuir, andam pelos 48,2% e 47,1%, respectivamente.
Portanto, ao contrário do que para aí vão dizendo os Portas e os Coelhos, a conclusão que destes dados se pode retirar é a de que a carga fiscal em Portugal é baixa, sem que de tal conclusão se possa inferir que é justa. Seguramente não é: há quem pague demasiado relativamente aos rendimentos auferidos e há quem não pague nada ou pague muito pouco relativamente ao que seria justo pagar, entendendo-se por justiça para este efeito a progressividade da carga fiscal em função dos rendimentos auferidos.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

NOTÍCIAS DO MUNDO EM TEMPO DE FÉRIAS (5)




A ESPOSA INFIEL

Contra as barbaridades do Islão, no Irão, no Afeganistão, em qualquer lugar. La Casada Infiel, de Federico Garcia Lorca.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

RECUPERAÇÃO DA ZONA EURO?


UMA PURA FICÇÃO

De acordo como os dados preliminares do Eurostat a economia da zona euro cresceu 1% no segundo trimestre deste ano por referência ao trimestre anterior. Portugal ficou-se pelos 0,2% e a Alemanha atingiu a cifra recorde de 2,2%, a maior desde a reunificação.
Se as médias já são na generalidade dos casos uma ficção, apenas descodificáveis pelo recurso sistemático a outros elementos, as da zona euro correm o risco, se tomadas à letra, de representarem uma pura mentira.
De facto, faz tanto ou tão pouco sentido juntar a economia da Alemanha à de Portugal para se obter uma média, como faz a junção da economia da Alemanha à do Gana ou da Nigéria, por muito estranha que esta afirmação possa parecer. Mas já faz todo o sentido dizer que a economia da Alemanha cresceu ao ritmo de 2,2% enquanto a portuguesa se ficou por um crescimento dez vezes menor. E o que se diz de Portugal, pode dizer-se da Espanha, da Irlanda e da Grécia, esta com uma divergência muitíssimo mais acentuada.
Ou seja, estas cifras apenas confirmam a tendência para uma divergência estrutural entre as economias mais competitivas da zona euro ou da própria UE e as dos países menos competitivos. De facto, o crescimento da Alemanha deveu-se fundamentalmente a um aumento das exportações, que retomaram a situação anterior à crise, e não a um aumento da procura interna, nem, consequentemente, a um aumento das importações, o que a ter-se verificado, poderia ter tido um efeito positivo nas demais economias europeias, na medida em que tal aumento decorresse de um aumento das exportações destes para a Alemanha.
Como não é esse o caso, nem tem sido nos últimos quinze anos, a razão primeira e fundamental do fraquíssimo crescimento dos países periféricos da zona euro ou, do seu mais que provável crescimento negativo nos próximos anos, tal como hoje já está a acontecer com a Grécia, deve-se ao modo como a zona euro e a própria UE estão estruturadas. Os planos de austeridade e as demais medidas restritivas em vigor e a implementar nos próximos anos não são a verdadeira causa dos resultados obtidos, mas antes uma consequência daquela estruturação. Ou, se se preferir, a causa próxima de outras causas mais remotas.
Podem dar as voltas que derem, podem, inclusive, derrubar o Estado Providência – ou o que dele resta – como o PSD se prepara para fazer, se for eleito, mas enquanto a zona euro e a própria União Europeia não forem profundamente reestruturadas no sentido de aproximar o seu funcionamento, em todos os domínios, às consequências das regras básicas que neste momento a dominam - liberdade de mercadorias, pessoas e capitais –, de modo a equilibrar os efeitos da liberalização num espaço económico altamente heterogéneo, os resultados, no plano macroeconómico, continuarão a ser os mesmos.
Quem prosseguir com esta política sem a questionar, nem modificar ou tentar modificar, buscando as alianças necessárias para o conseguir, o mais que poderá fazer é “empurrar” os desequilíbrios existentes para os mais numerosos, o mesmo é dizer, para os detentores dos rendimentos mais baixos, política que, de resto, já está a ser seguida, sem que, contudo, daí resulte qualquer tipo de equilíbrio futuro.
Quando os nossos “economistas” dizem que temos de fazer “dieta”, que temos de “emagrecer” e outras tretas do género, não estão, como se sabe, a referir-se ao emagrecimento dos “pançudos”, mas exigir que se tornem esqueléticos aqueles que já estão à beira da inanição!

"É UMA TORTURA VIVER NA ABUNDÂNCIA SEM ACESSO A ELA"



DEPOIMENTO DE UMA EMIGRANTE CUBANA

Yaquelin Lugo, emigrante cubana em Espanha, caixa num supermercado do norte de Madrid, tece várias considerações sobre a vida de um emigrante num país em crise.
Ver artigo na última página do El Pais de hoje, dedicado ao drama do desemprego.

DOIS EXCELENTES ARTIGOS DE ECONOMIA



OPÇÕES EM TEMPO DE CRISE

Vale a pena ler os dois artigos a seguir citados: um de Paul Krugman, EE UU se sume en la oscuridad, em que mais uma vez defende uma política económica contrária à que está sendo seguida no seu país e põe a nu as consequências das opções económicas que apenas se preocupam com a redução do défice.
O outro, John Stuart Mill contra el BCE, é de J. Bradford Delong, ex-secretário adjunto do Tesouro dos Estados Unidos e professor na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e nele se demonstra que os “princípios económicos” a que os economistas frequentemente recorrem são uma fraude, já que não existe, em economia, uma verdadeira “teoria económica”, contrariamente ao que se passa com as demais ciências.
Enfim, nada que seja muito novo, a não ser o facto de ser dito por renomados académicos, já que todos sabemos, por experiência, que o raciocínio dos economistas nada tem de científico, sendo frequentemente prejudicado pelos pressupostos ideológicos de que partem os seus autores.

domingo, 15 de agosto de 2010

NOTÍCIAS DO MUNDO EM TEMPO DE FÉRIAS (3)



GUANTÁNAMO E FIDEL

Enquanto Obama se mostra incapaz de fazer respeitar as promessas eleitorais, dando mais um triste exemplo de uma presidência que se deixa dominar pelos lobbies e pelos múltiplos poderes fácticos que ele prometeu combater, Fidel, um pouco mais a sul, avisa o mundo que “está totalmente recuperado” e que se pode continuar a contar com ele na luta contra o imperialismo americano.
Criticado pelos seus apoiantes e pelos advogados que o próprio Pentágono escolheu para defender os “raptados” de Guantánamo, Obama, com o regresso às “comissões militares”, travestidas de tribunais, patenteia a sua incapacidade para pôr termo a essa vergonha que é Guantánamo e retoma o caminho de Bush mandando julgar, sem as garantias comuns, os muitos presos que ainda se encontram naquela base americana.
Com esta atitude de impotência institucional, fica claro que o “Império” tem as suas regras inapeláveis, governe quem governar. Por isso, Fidel continua em guarda e ri-se da democracia americana…

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

AS SEQUELAS DO CASO "FREEPORT" E AS SUAS ANALOGIAS



AS PARTICULARIDADES DA JUSTIÇA PORTUGUESA

Só mesmo aqueles que estavam dispostos a colocar o mais rapidamente possível uma pedra sobre o caso Freeport podem ter acreditado que o assunto se encerrou com o recente despacho que ordenou a prossecução do processo relativamente a dois dos arguidos, mediaticamente irrelevantes, e o seu arquivamento em relação aos demais arguidos e suspeitos.
O que o caso Freeport tem de especial não é tanto a sua conclusão, mas o modo como a ela se chegou. De facto, o resultado não é em si muito diferente do que teria ocorrido noutro qualquer país. O que o torna tão mediático são, como sempre, as “particularidades” portuguesas da investigação judicial…
Realmente, é preciso não acalentar grandes ilusões quanto à possibilidade de altos responsáveis políticos, no exercício de funções, serem processados com base em factos semelhantes àqueles que se suspeitava terem ocorrido no licenciamento do Freeport. Essa dificuldade não é apenas portuguesa. É comum a todos os regimes. As democracias é que na divulgação ideológica das suas vantagens fizeram muita gente acreditar que nelas vigorava em toda a linha aquilo a que vulgarmente se chama o Estado de Direito, assente no pressuposto de que a lei é igual para todos, que a todos obriga e que todos são igualmente responsáveis perante ela.
É óbvio que isto é uma falsidade. Deixando de parte a complexa questão de saber quem é o soberano, não restam dúvidas de que quem exerce poderes soberanos se não encontra na mesma situação de quem está sujeito ao exercício desses poderes.
Quem exerce poderes soberanos pode mudar a lei e até pode sujeitar as condutas passadas ao regime de leis que não se encontravam em vigor à data da ocorrência dos factos, com excepção de alguns raros casos. E também por vezes acontece que a actuação contrária a uma lei em vigor, por parte de quem exerce poderes soberanos, não constitui uma violação… mas uma modificação, contanto que esse comportamento transgressor/modificativo seja imputável ao exercício daqueles poderes.
Já por várias vezes neste blogue se deixou insinuado que o Poder olha o Direito de cima para baixo, enquanto o povo está obrigado a encará-lo de baixo para cima. As relações entre o Direito e o Poder são filosoficamente muito complexas e só por pura hipocrisia ou falsificação ideológica se pode fazer de conta que o Poder já está hoje no mesmo nível dos destinatários das normas e pode ser completamente regulado pelo Direito. Não está. Pelo contrário, é o poder que frequentemente “regula” o direito e não o inverso.
Normalmente, custa muito analisar esta questão despojada dos preconceitos valorativos que, em regra, a rodeiam. Fazê-lo, porém, não significa ter uma visão puramente cínica dos fenómenos sociais do Poder na sua relação com o Direito, nem, muito menos, encará-los numa perspectiva puramente amoral, mas antes contribuir para o seu gradual (mas ainda muito distante) aperfeiçoamento mediante uma análise fria e puramente factual do que realmente se passa
É claro que, em rigor, o caso Freeport não tem nada a ver com esta problemática, salvo o facto de, para a comunicação social - e também para o processo – alguns dos suspeitos exercerem poderes soberanos. E então aí é que entra a confusão: às “situações pessoais” de quem exerce o Poder acaba por ser aplicado o mesmo "regime" das “situações institucionais” ocorridas no exercício daqueles poderes.
Isto pode acontecer por cobardia política, por obstrução da justiça por parte de quem tem por missão contribuir para a sua aplicação ou até por impotência jurídico-política fáctica dos investigadores. Mas acontece. E apesar de tanto um caso (as tais situações pessoais) como outro (as institucionais) estarem teoricamente subordinados ao império da lei, raramente a lei se lhes aplica. De facto, a lei se lhes não aplica, salvo em casos muito contados que a história regista, quase sempre depois de perdido o poder.
Portanto, um longo e muito difícil caminho tem que ser percorrido até que a prática se comece a aproximar daqueles lindos princípios.
Regressando ao caso Freeport como paradigma, pode ainda dizer-se que as coisas poderiam ter tido um percurso diferente e eventualmente um resultado diferente se um poder com legitimidade idêntica ou superior à do poder investigado tivesse tido a seu cargo a condução do processo para efeitos imediatos de natureza exclusivamente política, sem prejuízo de depois se poderem seguir outros, se fosse o caso. Mas isso entre nós não acontece ou quando se pretende fazer crer que acontece algo de parecido o que realmente acontece não passa de uma caricatura daquilo que, noutras circunstâncias, poderia acontecer.
Se é verdade que as coisas se passam de forma substancialmente idêntica em todo o lado, há todavia particularidades no modo português de agir, em sede de investigação criminal, que fazem com que as coisas por cá nos pareçam diferentes do que teriam sido lá fora, se lá tivessem ocorrido. É o modo “atamancado” e com total falta de jeito com que estas questões são entre nós resolvidas que nos faz erradamente supor que estas coisas só se passam em Portugal. O Freeport não passa de um triste exemplo disso mesmo.
Senão vejamos: os magistrados encarregados da condução do processo tiveram todo o tempo do mundo para ouvir José Sócrates, Silva Pereira e quem mais quisessem, mas apenas se lembraram de o fazer depois de a hierarquia lhes ter marcado um prazo limite para a conclusão do processo, sem esquecer que prazos semelhantes já tinham antes sido desrespeitados ou prorrogados várias vezes. Mesmo tendo em conta o facto de os magistrados que profeririam o famoso despacho só terem tomado conta da investigação há pouco mais de dois anos, teria havido tempo mais do que suficiente para ouvir as personalidades referidas no despacho e fazer-lhes as perguntas que nele se formulam.
Por outro lado, a hierarquia do MP, que teve prévio conhecimento do despacho de arquivamento relativamente a certos arguidos e suspeitos, e que com ele terá concordado, tendo podido, antes de assegurada a sua eficácia, formular todas as objecções julgadas convenientes, só depois de aquele ter sido tornado público veio publicamente criticá-lo em termos que apenas desprestigiam quem os usa.
A ideia com que se fica, depois de toda esta trapalhada e de outras conexas, é a de quem tinha o processo a seu cargo parecia interessado em manter na dúvida e na incerteza pelo máximo tempo possível as questões mediaticamente mais candentes que dele resultavam. E da actuação da hierarquia fica-se com a ideia de que o seu interesse, por deformação profissional, ignorância política e “respeito pelo Poder”, era ver-se juridicamente livre da possibilidade de certas pessoas serem judicialmente perseguidas, independentemente de as suspeitas que sobre elas impendem se manterem, aceitando qualquer formulação do despacho de arquivamento desde que ela tivesse por efeito a consecução daquele objectivo.
Este modo “atamancado” de resolver estes assuntos vai fazer com que as sequelas do Freeport se mantenham por muito tempo ainda, mesmo que apenas sussurradas, o que politicamente é bem pior do que um desfecho assente numa solução mais “escorreita”.

FANTASIAS NEOLIBERAIS



MENOS IMPOSTOS, MAIS DÍVIDA

Uma das mais badaladas fantasias neoliberais é a propalada descida de impostos como factor dinamizador da economia, nomeadamente em tempo de crise. A história de experiências semelhantes, ensaiadas em vários países, nomeadamente nos Estados Unidos, está longe de confirmar aquela tese.
Em tempo de crise, a descida generalizada de impostos tanto das empresas como das famílias, não tem contribuído para relançar a procura, já que a insegurança reinante na economia leva umas e outras a comportamentos diametralmente opostos aos pretendidos. As famílias ou porque estão muito endividadas ou porque receiam o futuro tendem a aforrar em vez de gastar e as empresas tendem a não investir porque temem a estagnação da procura.
Quando a descida de impostos beneficia apenas os mais ricos, sejam beneficiários as empresas ou os cidadãos, a consequência que esta política regista, como foi o caso da política económica de Bush, é a sua nula contribuição para o combate ao desemprego e a criação de um fosso cada vez mais profundo entre ricos e pobres ou entre os ricos e os outros.
Em Portugal, este elixir da felicidade começou a ser divulgado por Passos Coelho, por razões puramente ideológicas, e vem sendo também apoiado por Paulo Portas, por motivos puramente demagógicos.
Pois bem, se nas grandes economias tal política nada tem resolvido, antes tem agravado a possibilidade de manter um nível adequado de estímulos à actividade económica, no caso concreto de Portugal, tal política, se viesse a ser posta em prática, teria efeitos verdadeiramente catastróficos.
Em primeiro lugar, no plano empresarial, esta política apenas beneficiaria as grandes empresas, as quais pagando algumas delas já hoje impostos bem inferiores aos que deveriam pagar, como é o caso dos bancos e das que se dedicam à especulação financeira em geral, ficariam numa situação bem mais vantajosa do que a que já têm, sem que daí resultasse, como agora também não resulta, qualquer contributo para a solução da crise nem qualquer benefício para a economia nacional. Relativamente às pequenas e médias empresas, o efeito, a verificar-se, seria apenas o de aumentar os lucros dos seus proprietários. De qualquer modo, um efeito menor, porque a maior parte delas, como se sabe, ou não paga impostos ou, quando paga, a sua tributação nada tem a ver com o seu verdadeiro volume de negócios. Portanto, se agora não investem, também não o iriam fazer por passarem a registar um acréscimo dos lucros.
No que respeita às famílias, é óbvio que a preocupação dos neoliberais vai inteirinha para a diminuição da tributação dos mais altos rendimentos. De qualquer modo, será sempre nestes que se repercutirão mais intensamente as vantagens daquela descida. Sendo, assim, certo que essa baixa de impostos beneficiaria mais os estratos sociais menos endividados, na medida em que lhes deixava mais dinheiro livre para gastar, tornar-se-ia provável que esse aumento de rendimentos se traduzisse num aumento do consumo, logo da despesa. Só que, dada a estrutura da economia portuguesa e os hábitos de consumo das classes mais abastadas, esse aumento da procura implicaria necessariamente um aumento da dívida externa, por via do aumento das importações.
Ou seja: pagar menos impostos fica mais caro aos portugueses – àqueles que com o seu sacrifício mais tem contribuído para o “combate ao défice”, seja pelo aumento da carga fiscal, seja, principalmente, pelo agravamento das condições de vida (redução das prestações sociais, congelamento salarial ou diminuição do salário real), porque a dívida continuaria a aumentar, suscitando o seu aumento, sem o crescimento correspondente da economia, um aumento da desconfiança do capital financeiro, que tenderia a exigir juros ainda mais altos pelos empréstimos concedidos…

sábado, 7 de agosto de 2010

OS CONTRATOS QUE A "ESTRADAS DE PORTUGAL" NÃO FEZ



POR VIA DA ACÇÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS

Diz um Público desta semana, primeira página, a quatro colunas, que os “chumbos” do TC aos contratos, sujeitos a visto prévio, celebrados pela empresa “Estradas de Portugal” com as grandes construtoras e exploradoras de auto-estradas permitiram poupar ao Estado 575 milhões de euros.
Conhecendo nós a “roubalheira” que as parcerias público-privadas representam, não constitui qualquer surpresa a notícia do Público. A espoliação de que o Estado tem sido vítima por força da acção da acção daqueles que têm por função representá-lo é conhecida de todos e tem uma triste história na democracia portuguesa. Não é por acaso que já aqui dissemos várias vezes que uma das mais nobres tarefas dos funcionários públicos é defender o Estado da acção do governo, deste ou qualquer outro - infelizmente um dos grandes inimigos do Estado.
Mas o que não deixa de ser espantoso é que o dirigente máximo das Estradas de Portugal, certamente com um salário milionário, tristemente famoso por ter votado a sua própria reforma na CGD, não tenha a dignidade de apresentar a sua demissão depois do que aconteceu.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

AFEGANISTÃO: UM ARTIGO SINGULAR




UM BECO COM UMA ÚNICA SAÍDA…O REGRESSO A CASA QUANTO ANTES


Já há muito tempo que aqui se não aborda o “dossier” Afeganistão, como o Dr. Mário Soares gostava de se referir aos assuntos que não tinha tempo para estudar quando era primeiro-ministro.
E a razão é simples: o tempo tem confirmado tudo quanto aqui se disse sobre essa guerra de desfecho inevitável. Tudo o que lá tem sido feito, desde as várias estratégias que desde o seu início têm sido gizadas até às acções que repetidamente as infirmam e que cada vez mais vão estreitando a porta de saída, é o exemplo perfeito de uma guerra de quem nunca verdadeiramente compreendeu o que era o Afeganistão.
Mas o que não deixa de ser espantoso é que andando os americanos em guerra praticamente desde o fim da Segunda Guerra Mundial, intervindo nos mais diversos locais do planeta, continuem a cometer tantos e tantos erros como se de simples principiantes se tratasse. Houve uma época em que se chegou a supor que tinham aprendido algo com a história, quando Colin Powell aplicou na Guerra do Golfo – a primeira guerra do Iraque – a famosa doutrina do “bate e foge. Mas pouco tempo depois logo se concluiu que afinal continuavam na mesma. A fazer asneiras…
No Afeganistão o exemplo está mais uma vez à vista de todos. Pois não obstante esta triste constatação, há um investigador do ICS, especialista em contra-insurgência (especialidade a que a CIA se dedicou durante largos anos), coordenador de trabalhos nesta área com Carlos Gaspar, entre outros, que entende ”Por estranho que pareça” que há “também boas notícias do Afeganistão, que consistem essencialmente no facto de ser altamente improvável um completo triunfo dos talibans e da Al Qaeda”. E depois prossegue: “Até porque um triunfo dos talibans/Al Qaeda é contrário à segurança do Ocidente, mas também da Rússia, da China e da Índia, que enfrentam igualmente terroristas islamistas
Esta simples citação é suficiente para demonstrar o grau de sofisticação argumentativa do nosso investigador. O triunfo completo dos taliban é improvável…porque é contrário à segurança do Ocidente. Se não fosse contrário já poderia ser completo e se a guerra estivesse sendo levada a cabo por puro divertimento ou como treino de aquecimento para preparação de novos feitos também se poderia admitir um triunfo das tribos afegãs. Como não é, não pode…
E o mais interessante é que o artigo que vem no Público de hoje está todo ele estrito neste tom. É certo que o dito investigador tem a cautela de nos avisar que “Os pontos de vista defendidos no texto são inteiramente pessoais”. Mesmo assim, é um bom artigo sobre o nível de decadência a que já chegou a guerra do Afeganistão…

O PROGRESSO DO LIVRO ELECTRÓNICO



AS GRANDES LIVRARIAS EM CRISE

Sem esquecer as vantagens das pequenas livrarias, que existem um pouco por todo o mundo, não haverá muita gente que goste de livros que não fique fascinada com a extraordinária oferta das duas grandes livrarias americanas de cadeia – a Barnes & Noble e a Borders -, existentes por toda a América, nas grandes cidades e também nas pequenas cidades de província. Não é apenas a oferta de títulos que fascina, mas os próprios locais, pelo ambiente que proporcionam a quem gosta de consultar comodamente os livros antes de os comprar. Bem sentado, de preferência com um café quente
Pois agora chega a notícia de que a Barnes & Noble com suas 720 lojas atravessa uma grave crise, que alguns consideram irreversível, motivada pelo crescimento em flecha do livro electrónico. Ao que se diz a empresa vale hoje menos de um terço do que valia há uma década. E a Borders, mais pequena, estará mesmo em vias de anunciar uma suspensão de pagamentos.
Como é possível que quem gosta de livros prefira o livro electrónico?

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

UM ARTIGO DE GEORGE SOROS



VALE A PENA LER

Para se perceber o que se passa na zona euro, diria até na União Europeia, não é preciso ser economista. É apenas necessário fazer um esforço de compreensão do que se está a passar. E a experiência diz que ser economista só poderá prejudicar a compreensão do que está acontecendo…
Qualquer pessoa habituada a lidar com a interpretação de factos, logo percebe que o facto de os critérios de Maastricht terem sido tão frequente e flagrantemente violados apenas significa que a “arquitectura” do euro, tal como foi concebida, tem de ser radicalmente substituída. Perseverar estupidamente no status quo, além das graves consequências que quase seguramente recairão sobre os “perseverantes”, só poderá ter como desfecho o abandono do euro e da própria União Europeia por alguns países mais afectados pela “crise”. E quando alguém tiver que sair por força das circunstâncias, acabará por vir tudo abaixo, mais dia, menos dia.
Em termos muito simples – e é em termos muito simples que temos de falar para combater a falsa complexidade do que está a acontecer – as coisas passam-se assim: em consequência do desenvolvimento acelerado dos grandes países emergentes e da perda de competitividade da Europa em relação a eles, agravada pela liberalização do comércio internacional sempre que ela vai ao encontro dos interesses do grande capital, a balança comercial dos países da Europa mais desenvolvidos passou a registar alterações muito preocupantes fundamentalmente traduzidas na diminuição das exportações e no aumento das importações. Para manter os anteriores equilíbrios, estes países “empurraram” estes desequilíbrios para os países menos competitivos – os países periféricos, principalmente do sul da Europa, mas não só -, compensando aquele decréscimo de exportações com um aumento correspondente das importações destes países, muito facilitadas pela “fartura” de “dinheiro barato”. Como esta situação não é por definição sustentável, tanto mais que ninguém pode permanentemente viver acima das suas posses por mais barato que o crédito seja, haveria de chegar o dia em que aqueles desequilíbrios se tornassem insustentáveis A crise do sistema financeiro acelerou a chegada desse dia. E o problema que agora se põe é como resolver a questão dentro dos países endividados. Ora, a via que está sendo seguida pela generalidade dos governos, seja por convicção ideológica, seja também por imposição do grande capital financeiro, é “empurrar” esses desequilíbrios para as classes trabalhadoras mais numerosas (logo de menores rendimentos) a fim de que sejam por elas pagos. Só que isto, como se verá, tem um limite temporal e espacial que não pode ser ultrapassado nem transposto…
O artigo de George Soros, no New Yorker Revue of Books, obviamente noutra linguagem, ajuda a compreender isto.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA CONFESSA A SUA IMPOTÊNCIA




O QUE FAZ FALTA...

Verdadeiramente, Portugal só teve, desde o 25 de Abril, um Procurador Geral da República. Todos os demais são um triste exemplo do que é o exercício de um cargo por pessoas que não estão minimamente habilitadas para o desempenhar, por mais respeitáveis que sejam os seus méritos para o desempenho de outras funções.
O Procurador Geral da República deverá, em princípio, ser alguém licenciado em direito, mas por aí se deveria ficar a sua ligação com o Direito. Tem de ser alguém politicamente capaz. Alguém que saiba assumir e impor a autonomia que a função exige, norteando o seu comportamento por critérios aceitáveis e compreensíveis pela opinião pública esclarecida. Para desempenhar o cargo com competência não são necessárias novas leis nem alterações na estrutura da magistratura que dirige. O que é preciso é ser inteligente, é saber dar vida às leis que regem a função e acima de tudo ter uma ideia muito clara do modo como ela deve ser desempenhada.
Numa estrutura hierárquica, o comportamento de quem está “por baixo” depende muito mais da capacidade de direcção de quem está “por cima” do que de eventuais poderes fácticos existentes no seio dessa estrutura.
Se a justiça já estava pelas ruas da amargura por todas as razões que se conhecem e, principalmente, pelo enraizado sentimento popular de que as leis apenas têm de ser respeitadas pelos mais fracos, mais desacreditada fica quando o vértice da pirâmide do Ministério Público vem publicamente confessar a sua impotência e a sua incapacidade para se fazer respeitar por toda a estrutura que hierarquicamente dele depende.
Depois desta constatação, ao PGR, para ser coerente as declarações proferidas, só lhe resta apresentar a demissão. E o Governo se realmente estivesse interessado na autonomia e no prestígio da instituição – atributos que certamente não valoriza, nem este nem qualquer outro – deveria propor, na ausência daquele pedido de demissão, a sua substituição.
Infelizmente, tudo vai continuar na mesma, porque esta é a situação que mais convém a todos os poderes do establishment. Só uma forte reacção vinda de outros quadrantes, dos que só têm a ganhar com uma justiça isenta, poderá contribuir para uma alteração da actual situação, muito degradada pelos sucessivos eventos que ao longo do tempo a têm corrompido.