AS ELEIÇÕES NA FRANÇA E NA GRÉCIA
Nos últimos dias, principalmente
depois de conhecidos os resultados das presidenciais francesas, tem-se
assistido a uma falsa polémica entre o PS e o PSD sobre a política económica
europeia no actual contexto da crise do euro.
O PS, que não se opôs ao “Tratado
Orçamental”, e se propunha fazer-lhe uns inócuos aditamentos sem qualquer
eficácia prática no contexto da actual “arquitectura” institucional do euro e
da própria concepção do Banco Central Europeu, para parecer que não se mantém
completamente fiel ao “Memorando de Entendimento” assinado com a Troika, bem
como às consequências económicas e sociais que dele resultam, voltou a insistir
na mesma tecla, agora com a proposta de uma resolução autónoma que não altera
rigorosamente nada a política em curso, já que não há qualquer hipótese de
conciliar a presente politica de austeridade com uma política
desenvolvimentista capaz de inverter a actual situação económica.
Não há qualquer possibilidade
prática nem teórica. Sabendo isso, o PSD depois de ter assegurado o essencial –
reforço das políticas neoliberais por força da inevitável austeridade decorrente
da aprovação do “Tratado orçamental” - resolveu trocar as voltas ao PS e
apresentar autonomamente um projecto de resolução idêntico ou quase idêntico ao
dos socialistas.
Mário Soares tendo bem presente o
que se está a passar na Europa, principalmente na Grécia, acha que o PS para
sobreviver à hecatombe que ai vem tem que ser – isto é, parecer – um partido de
esquerda quando está na oposição. E como isso só é possível rompendo com a
Troika aconselha o partido a rasgar o Memorandum para capitalizar
eleitoralmente o descontentamento popular e não permitir que os votos dos descontentes
do PS vão cair nas mãos da esquerda. Depois, quando o PS voltar ao Governo logo
se verá, ou seja, ver-se-á certamente algo de semelhante ao que se passou com o
próprio Soares quando se opôs, pela esquerda, à Aliança Democrática de Balsemão
e aos governos de iniciativa presidencial para, uma vez no poder, se coligar
com a direita e aplicar o programa do FMI!
De facto, nem da actual posição
do PS sobre a Europa – de resto igual à que sempre teve – se pode esperar nada
de verdadeiramente positivo no combate à crise, nem tão-pouco se percebe o que outros
socialistas, como Hollande, querem fazer de inovador em política económica e
monetária.
Convém recordar muito brevemente
o “pré- Maastricht” para se perceber o que está em jogo. O euro, é bom
recordá-lo, é uma invenção dos franceses. Para Mitterrand, bem como, antes
dele, para Giscard, a única forma de quebrar a hegemonia económica alemã era
acabar com a “tirania” do Bundesbank. A reunificação alemã, ocorrida no quadro
da desagregação da União Soviética contra a vontade da Inglaterra e da França,
praticamente assegurada depois de a América ter recebido garantias de que a
Alemanha não abandonaria a NATO, acabou por ter no plano europeu como moeda de
troca a aceitação de uma moeda comum europeia.
A Alemanha, forçada a abandonar o
marco para garantir a reunificação e, mais do que isso, para não criar um clima
de crispação na Europa (Helmut Kohl chegou a dizer internamente que a moeda
única era uma questão de guerra e paz), acabou por aceitar a nova moeda
contanto que o Banco Central Europeu não passasse de uma réplica do Bundesbank.
Com esta exigência, a Alemanha
não apenas punha cobro à pretensão francesa de comandar politicamente o Banco,
como na prática acabava por estender a toda a Europa a concepção de banco
central perfilhada pela República Federal. Daí que o tratado de Maastricht afirme
que o principal objectivo do banco central é “manter a estabilidade dos
preços”, o mesmo é dizer, a segurança da moeda. Contudo, por pressão do Governo
francês, completou-se a definição da competência do banco com a seguinte frase:
“sem prejuízo da estabilidade dos preços”, o banco “deve apoiar as políticas
económicas gerais da Comunidade”.
Este aditamento era do ponto de
vista dos franceses o “cavalo de Tróia” por meio do qual se procuraria
subverter a estrita concepção monetarista imposta pela RFA.
E é isto que, com crise ou sem
crise, continua a separar as duas concepções em confronto sobre a natureza do BCE.
Sem crise, a Alemanha acabou por impor, praticamente sem objecções, a sua
concepção sobre o papel do Banco, tendo sido no essencial de acordo com a
sua concepção que ele foi gerido tanto sob a presidência do holandês Win
Duisenberg como do francês Jean-Claude Trichet (que, como se sabe, ascendeu à
presidência no quadro de um compromisso político ao mais alto nível que previa o
afastamento “voluntário” de Duisenberg a meio do mandato).
Durante este período, a balança
comercial alemã que era deficitária relativamente à EU tornou-se largamente
excedentária, o que só prova que a tal “tirania” do marco de que falavam os
franceses não só se manteve com o euro como se agravou drasticamente em relação
a todos os países da zona euro.
Com a crise, o BCE, tanto por
intermédio de Trichet, como agora de Mario Draghi, tem ido um pouco além
daquilo que os alemães gostariam que fosse. Mas, mesmo assim, tem sido a
Alemanha a controlar a política monetária da União, quer apelando
frequentemente para a entendimento “constitucional” do BCE, quer recorrendo ao
seu poderio económico para inviabilizar financeiramente políticas que tendam a
“desvirtuar” o essencial daquele “entendimento constitucional”.
Portanto, o que Hollande pretende
é o que todos os presidentes franceses desde Giscard já tentaram sem êxito. De
facto, ninguém acredita que Hollande esteja politicamente na disposição protagonizar
um confronto com a Alemanha. É um risco que certamente não correrá. Portanto,
por esse lado tudo vai continuar, no essencial, na mesma com mais ou menos
cosmética. Mais difícil, muito mais difícil, vai ser gerir internamente as
expectativas…
Novidades poderiam vir da Grécia se
a “conversa” resultante das eleições do passado domingo fosse outra. De facto,
não basta pugnar pela formação de um governo composto por partidos que se
oponham aos programas de austeridade impostos pela Troika. Isso é importante,
mesmo indispensável, mas não basta. O que realmente está em jogo na Europa vai
muito para além disso. O dilema com que a Europa se confronta já não é apenas o
de saber como pagar a dívida, mas como evitar que ela continue a crescer e com
ela a aumentar a desigualdade entre os respectivos países membros.
Como se está agora a ver, a
introdução de uma moeda única como meio de combater a supremacia alemã
evidenciou-se com o tempo não apenas uma aposta completamente falhada, mas
também capaz de perversamente produzir um resultado bem pior do que existia ao
tempo da coexistência das respectivas moedas nacionais.
Por isso, qualquer tentativa de
combate à presente situação que tenha como pressuposto inalterável a manutenção
no euro é à partida uma aposta falhada. Isto não significa que quem está em dificuldades
- e maior parte está nessa situação – admita sair do euro. Significa antes fazer
perceber à Alemanha e seus aliados que essa é uma possibilidade que se não
rejeita, se não houver respostas viáveis para a saída da crise, com todas as
consequências que daí resultam não apenas no quadro da união monetária, mas
também da própria União Europeia.
Não parece que o segundo partido
mais votado na Grécia, Syriza, esteja em posição de defender tais pontos de
vista, tal como acontece com o seu congénere português. Ao fazer a defesa
acrisolada do euro, como faz entre nós Louçã (ver Dividadura), só resta a essas forças políticas uma de duas soluções:
ou continuar de fora a contestar as políticas da Troika ou estar dentro e
aceitar as políticas de austeridade para defender o euro…
A Merkell disse há uns meses que "apenas pretende o cumprimento dos Tratados". Os tugas e aparentados quando se lhes perguntava, Maastricht? Sim, com certeza, como agora com as regras orçamentais, sempre com a ideia que enquanto pau ia e vinha folgavam as costas. A construção da Casa da Música no Porto teve uma "derrapagem" de 300%!!!!!!(parece um exagero, mas não, é o nosso fado/índole), a gigantesca reconstrução em Berlim dos edifícios governamentais ficou ligeiramente abaixo do orçamento...
ResponderEliminarEm Berlim demite-se o presidente por causa de acusações, em Portugal reelegem-se indivíduos condenados (e sabe-se como isso está dificultado pela teia) por roubo, peculato, corrupção. Portugal convive bem com a situação do BPN e adjacências ....
As leis/perversões do capitalismo não explicam tudo... E casamentos destes não poder perdurar. Assim, é melhor irmo-nos preparando para deixar o pequeno almoço e voltar ao "café" da manhã.
Até que enfim!
ResponderEliminarV
Dizia-se por aqui, e não só, em sentido depreciativo, que a Alemanha era a China da Europa. Afinal eles, alemães, limitaram-se a jogar bem as regras do jogo onde já não um papel decisivo, um dia destes serão apenas a quinta economia. Há umas um sindicato alemão oferecia 350 milhões de euros para manter uma fábrica da Opel. Goste-se, ou não, deste sindicalismo, pertence a um Universo que obedece a leis diferentes. Agora fala-se na ameaça da jogada da cartada balcânica dos gregos. Se pensam isso, devem estar a dormir desde a Perestroica. O Putin é um mero fornecedor de matérias primas. Sim, se URSS existisse outro galo cantaria. No fim, muito provavelmente, serão os Yanques que vão "dizer" a solução para a Grécia e para a "U"E através do seu avatar R.U.. On vera.
ResponderEliminarLG
Obrigado por ter voltado. Já tinha saudades do Politeia.
ResponderEliminarConcordo com o que escreveu, absolutamente. Deixo só uma reflexão: e se o SPD ganhar as eleições do próximo ano?
A ditadora bancária Merkel vai ter de viver um ano e meio com esse fantasma, ou não?
falsas mesmo.
ResponderEliminarhá uma "condenação" ao entendimento.