OS FACTOS
1 - O segredo de justiça à guarda
do Ministério Público é em Portugal frequentemente violado em todos os
processos com interesse mediático, sendo essa violação tanto mais extensa
quanto maior é o impacto mediático do processo.
2 – Quando a violação prejudica
os interesses da investigação – o que raramente acontece – a quebra do segredo
é rapidamente descoberta, sendo os seus autores imediatamente processados.
3 – Sempre que a violação
favorece os interesses da investigação – o acontece em mais de 99% dos casos –
ela não somente fica impune como a sua reiteração se mantém muito activa.
4 – A experiência demonstra
igualmente que quanto mais atrasada está a acusação, quanto mais frágeis ou
inexistentes são os meios de prova, mais intensa e documentada é a violação do
segredo de justiça.
AS CONCLUSÕES
Colocados perante estes factos,
analisado este reiterado comportamento em diversos processos, os vários matizes
do seu desenvolvimento bem como as suas consequências, somos logicamente
levados a concluir que essa repetida violação do segredo de justiça,
amplificada por um estrito número – sempre o mesmo – de órgãos de comunicação
social, tem as seguintes consequências:
Primeiro – Fragiliza o arguido,
desmoralizando-o, mediante a inversão social do ónus da prova – em vez de ser a
autoridade que tem de provar a culpa do investigado, passa a ser este que tem
de provar a sua inocência;
Segundo – Em consequência daquela
inversão, promove o julgamento e subsequente condenação do investigado na
praça pública;
Terceiro – Fomenta a deserção
ou o afastamento dos amigos e apoiantes do investigado que, sendo muitos deles,
incapazes de arrostar com uma atitude contrária à hipocrisia do politicamente
correcto, soçobram ante a avalanche das notícias, abrindo assim a divisão nas
fileiras do investigado;
Quarto – Condiciona objectivamente a magistratura judicial que colocada perante a unanimidade de um
sector da sociedade – a que tem voz por estar em sintonia com a estratégia da
investigação – tem cada vez mais dificuldade em proferir uma decisão objectiva,
fundada numa vigorosa avaliação dos factos.
MORAL DA HISTÓRIA
Esta é uma situação democraticamente
perigosa. A inversão de valores fundamentais consagrados na Constituição não
pode trazer nada de bom. Se esta praga se propagar à magistratura, teremos aqui,
em Portugal, o “Fado Tropical” ao invés!
Lapidar!
ResponderEliminarÈ isso mesmo!
ResponderEliminarInteressante. Considerações coloridas
ResponderEliminarVisão parcialmente acertada,mas que deixa um rabão de fora do tamanho do problema.
ResponderEliminarA visão, parcial, serve a desideratos do eixo do bloco central, que visa contolar a investigação.
Campo perigoso senão for analisado na globalidade.
Qual é a parte do rabo que fica de fora? É a da violação do segredo de justiça no interesse do investigador?
ResponderEliminarNão, meu Caro, o processo penal é a magna carta das liberdades. ou seja, é no processo penal que se vê como o Estado lida com a questão das liberdades. Realmente ninguém impede o MP de fazer as investigações que entender, no segredo dos deuses, desde respeite os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos investigados, salvo quando, devidamente ponderados pelo juiz de instrução, outros valores fundamentas exijam o sacrifício momentâneo (isto é, não pode ser um sacrifício permanente) daqueles direitos. Feita esta investigação - que para respeitar aqueles valores até deveria, como acontece nos países mais civilizados, haver um advogado, nomeado pelo Estado, sem o investigado saber) - feita a investigação, dizíamos,o investigador deveria ser obrigado a fazer uma acusação provisória - invocando os factos e, subsumindo-os na lei, indicando os tipos legais de crime por que o investigado está sendo acusado - ou. não tendo elementos para sustentar a acusação, arquivar processo.
Continuo a concordar consigo, tão evidente, claro e com respaldo constitucional nos parece o que escreveu.
ResponderEliminarQuando se disse " deixou de fora.." pretende-se dizer que omitiu algo que poderia ter dito.
Infelizmente, para nós, a sua conclusão n.º4 é redutora, pois exclui dessa "peregrinatio ad loca infecta", a magistratura judicial. Esta, porém, através dos ilustres juízes de instrução criminal, o dito juíz das liberdades e garantias, dos juizes de Tribunais superiores, nomeadamente, em recursos, não têm tomado posição ao contexto em que as provas foram produzidas, sendo certo, além disso, que algumas dessas fugas se deram quando os processos se achavam na sua esfera de acção e têm feito declarações, a latere do proceso, em desfavor dos arguidos, em nosso modesto entendimento, com violação manifesta do art. 6.1 da CEDH.
Quando se fala de justiça, e é disso que se fala, analise-se toda a questão e não parte da mesma. Ainda sustentaria o seguinte,não nos achariamos ,em certos casos, face a uma parcialidade do operador judiciário, e tal não poderia acarretar uma nulidade, cf.Revue de science criminelle et droit pénal comparé n.º 3 an0 2008, 'pag. 631?
Muito haveria a dizer, porém, finalizaria com uma pequena advertência metodógica.
Era bom que o direito penal não fosse mais referenciado como o vector de normatividade melhor colocado para servir de remédio para a quebra das relações sociais, numa sociedade carente de valores identitários, com manifestações de anomia, que se sublinham na medida em que expõem a sociedade a um pan-legalismo penalizante, que é preciso questionar.
Se o simbólico no âmbito penal pode, utilmente, contribuir para reintegrar o agente na sociedade e pacificar as relações que tiveram origem na infracção cometida, uma sociedade, porém, tem de ter outros vectores de instauração/restauração normativa. A intervenção penal deve continuar a ser a ultima ratio de intervenção sobre o agente com vista à sua reintegração. O trabalho de qualquer politica penal supõe uma politica não penal, de vivência social contra as condições sociais produtoras do desvio.
A política social deve preceder, em princípio, o exercício da acção penal, e uma crise social não gera crises na justiça, ou como tal chamadas,
O direito, nomeadamente o direito penal deve continuar a ser a última tábua de salvação, para manter o equilíbrio num espaço de geometria estabilizada, para assegurar os embaraços que surgem na luta pela vida, de que falava Darwin.
Mais do que legislar era saudável, nesta área, que se tornasse o direito menos penalizante, como entende Roxin quando, e citamos:
“ …. da desmesurada criminalização antecipada com a qual o legislador procura fazer frente aos riscos sociais derivados da moderna tecnologia .
(………………………………………………………….).
É essencial dar visibilidade à norma penal. A legibilidade do interdito torna-se um desafio maior numa sociedade democrática. É preciso que as palavras “crime”, “responsabilidade” e “garantia” tenham um uso jurídico mais próximo do seu sentido comum.