QUE FAZER COM ESTA VITÓRIA?
Parafraseando Carlos Drummond de Andrade e, mais tarde, Cardoso Pires, é caso para perguntar: E agora, José?
Das palavras de Sócrates nada se depreende, excepto a interiorização, bem visível no rosto, de que tinha perdido a maioria absoluta. O Sócrates da campanha eleitoral e da pré-campanha, mesmo quando as sondagens ainda o davam empatado com MFL, ainda era o Sócrates da maioria absoluta. Só hoje, contados todos os votos, é que Sócrates deu consigo a perceber o que é uma maioria relativa. A felicidade que raiava em muitos rostos do PS, seguramente genuína pelo que para muitos deles significa continuar o partido no poder, estava longe de ser partilhada por Sócrates, não obstante as exaltantes palavras de vitória e a indiscutível dificuldade de que ela se revestiu.
Sócrates ficou também em pior posição do que se chegou a admitir nos últimos dias da campanha por se ter frustrado a possibilidade de fazer maioria com qualquer partido, situação que lhe daria uma margem negocial muito mais folgada. Apurados os resultados, essa hipótese apenas se pode concretizar com o PSD ou com o CDS. À esquerda precisa sempre do voto dos dois partidos. E se já era difícil negociar com um, sê-lo-á muito mais com dois.
A ideia que alguns notáveis do PS vêm defendendo dos “acordos pontuais” no parlamento não tem grande viabilidade e nem sequer o PS pode partir para esse tipo de governação a pensar numa qualquer “estratégia de vitimização”, de que não está em condições de beneficiar, com vista a um futuro acto eleitoral. O PS está no poder há quatro anos e meio, antes disso esteve lá mais seis, com um pequeno interregno de dois anos e meio, tendo durante todo esse tempo, principalmente nos últimos quatro, criado muitos anti-corpos na sociedade portuguesa, para que uma estratégia do género “queríamos governar e não nos deixaram” possa vir a ter qualquer espécie de êxito. Tal estratégia poderia ser adoptada pelo PSD, que tem andado arredado do poder, se tivesse alcançado uma maioria relativa, mas do lado do PS seria completamente desajustada.
Mas as dificuldades de Sócrates não acabam aqui. Enquanto com maioria absoluta ele estava em condições de ditar ao Partido a política que queria fazer, com maioria relativa vai ter de ouvir muita mais gente. Gente que já hoje se pronunciou contraditoriamente e que sempre fará algum ruído se os seus pontos de vista forem postergados. Não obstante todas as divergências, a hipótese que, do lado do PS, parece mais provável é uma coligação com o CDS, já que a situação interna do PSD não faz dele um partido fiável, mesmo admitindo a hipótese de substituição a curto prazo de MFL.
A dificuldade poderá vir do lado do CDS, onde, apesar do indiscutível peso de Portas, principalmente depois desta vitória, já houve declarações dos sectores mais à direita, se assim me posso exprimir, manifestamente destinadas a condicionar o seu espaço de manobra.
Nada como esperar pelos próximos dias para se ver como será…
3 comentários:
Pergunto-me se Sócrates, com o seu feitio e depois do hábito da maioria absoluta, vai ser capaz de manter com sucesso hábitos novos de coligação ou de entendimentos parlamenteraes.
E agora José … Manuel?! (digo eu)
Que chatice! O PS lá ganhou outra vez! Mesmo depois de 4 anos de governo, com os desgastes que sempre acarreta; mesmo depois dos Freeports, das habilitações, das TVIs, dos Públicos, etc, etc, lá ganhou de novo! Apesar da crise e das grandes dificuldades porque está a passar uma grande parte da população - realidades tradicionalmente favorecedoras de outros sectores do espectro partidário dito de esquerda - o PS lá conseguiu ganhar e com uma votação superior à vaticinada pelos habituais opinion leaders/makers.
Não vi, certamente, os mesmos “filmes” que viu, pois não vi a insatisfação de Sócrates. Aliás, se não tivesse lido o seu post até ao fim, teria ficado com a certeza de que o ZM nem teria visto os resultados do apuramento final. Não só se constata não “… se ter frustrado a possibilidade de fazer maioria com qualquer partido”, como, felizmente, não depende do BE ou do PC para governar pois, neste caso, não governaria mesmo. A este propósito, permita-me que o recorde do meu comentário de 17 de Agosto.
Sem dúvida que, para Sócrates, como para qualquer outro líder nas mesmas circunstâncias, as coisas estão mais dificultadas com a maioria relativa do que o estariam com maioria absoluta. Isso é o óbvio, nomeadamente numa sociedade como a nossa onde as coligações dignas desse nome ainda são vistas como traição ao eleitorado. Sem dúvida que os tiques de autoritarismo e autismo de que, por vezes demais, se revestiu o seu comportamento, não poderão ter lugar. Sem dúvida que terá que ouvir outras opiniões e reorientar alguns dos seus percursos. Só lhe fará bem. A ele e a nós!
Não reconhecer a importante vitória eleitoral do PS – goste-se ou não -, obtida nas condições em que a obteve, e querer transformá-la em derrota com o pretexto da maioria absoluta não conseguida, só se pode entender como corolário analítico vindo de sectores onde todas as derrotas se transformam miraculosa e permanentemente em vitórias.
JR
Meu Caro JR
Agradeço o comentário, mas não vejo que algumas das coisas que diz me possam ser dirigidas. Eu não escamoteei a dificuldade da voitória do PS, nem as condições difíceis em que foi obtida.
E reafirmo que para Sócrates era preferível poder fazer maioria com qualquer partido. Isso dava-lhe à esquerda uma margem de manobra que hoje, como é óbvio, não tem.
Quanto ao resto, mantenho as apreciações "fisionómicas", certamente decorrentes do conhecimento político da personalidade...
Abraço
JMC Pinto
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