quarta-feira, 17 de março de 2010

A EUROPA NA ENCRUZILHADA



PROBLEMA ECONÓMICO OU POLÍTICO?

Começando pelas evidências: nem a América nem a Europa conseguem regular o capital financeiro e especulativo. Nem sequer conseguem estabelecer uma disciplina para os fundos de alto risco (hegde funds), medida que qualquer mente minimamente sensata exigiria como “começo de conversa” quanto mais não seja como imposição inelutável daquilo que se passou.
Mas já se viu que não. Este novo capitalismo financeiro, assente no movimento especulativo de capitais, tem tanta força que consegue impor-se com êxito a qualquer tentativa para o domar. Ainda ontem Zapatero teve de ordenar à Ministra Elena Salgado, que presidia a um Conselho de Economia da UE, que adiasse a votação de uma directiva, cuja aprovação já estava assegurada por maioria qualificada, porque Brown…quer juntar-se ao consenso, mas precisa de tempo.
Ou seja, a City de Londres, irmã gémea de Wall Street, disse não e todo o mundo obedeceu. Li algures que Teixeira dos Santos terá dito: “Não percebo por que se adiou a votação”. Nós também não percebemos por que razão Teixeira dos Santos não percebeu o que se passou.
Entretanto, continua sem solução à vista a crise grega. A União Europeia vai adiando de reunião para reunião uma resposta minimamente satisfatória e a Grécia continua a sofrer as consequências sem que verdadeiramente ninguém lhe acuda.
A questão da Grécia é exactamente igual à anterior: é uma imposição do capital financeiro. Tudo o resto são conversas para enganar os incautos.
O que quer a Grécia depois de ser ter comprometido a pôr em prática um Programa de Estabilidade e Crescimento, que não é mais nem menos fiável do que os outros? Apenas quer refinanciar a sua dívida em condições normais de mercado e não em condições excepcionais, com taxas de juro elevadíssimas, como está acontecendo com os últimos empréstimos que contraiu.
E Alemanha opõe-se a isto. A Alemanha acha que os mercados “devem funcionar”, que não se deve conceder um “estímulo ao infractor”, enquanto demagogicamente os jornais alemães ligados aos liberais e ao capital financeiro vão espalhando a notícia de que querem pôr os contribuintes alemães a pagar os “desmandos gregos”, ou seja, a irresponsabilidade mediterrânica.
É neste contexto de conflito aberto entre duas perspectivas bem diferentes de encarar a zona euro que a Ministra das Finanças francesa vem dizer, por outras palavras, que o superávide comercial alemão é conseguido à custa dos elevados défices do sul, portanto a Alemanha deve aumentar os salários e fomentar a procura interna para reduzir os défices comerciais dos seus parceiros da zona euro.
Embora estas palavras encerrem uma verdade evidente, elas foram estigmatizadas na Alemanha com todos os argumentos que estavam à mão. E alguns são mesmo irrespondíveis, o que não significa que o resultado final pretendido pela Ministra francesa esteja errado, embora possa estar – e está - o método, o meio defendido para o alcançar.
De facto, a Alemanha sendo à partida a economia mais competitiva da zona euro reforçou-se nos últimos dez anos em consequência da acção conjugada de dois factores: um interno, compressão salarial e redução (ténue) das despesas sociais; outro externo, imutabilidade da taxa de câmbio, obviamente em consequência da moeda única. Não podendo os seus parceiros atenuar as diferenças competitivas mediante a desvalorização da moeda, a economia alemã, que já estava à frente de todas as outras, reforçou a sua liderança e aumentou consideravelmente as suas exportações para toda a Europa.
É claro que não se pode pedir à Alemanha que suba os salários ou que aumente a procura interna, porque essas medidas podem nem depender directamente do Governo. Mas já se pode pedir ou exigir à Alemanha que na zona euro o BCE, moldado à imagem e semelhança do Bundesbank, não esteja apenas preocupado com a estabilidade monetária e o controlo da inflação (continua célebre, em plena crise financeira, a subida da taxa de juro!), mas que à semelhança dos bancos centrais de outras grandes zonas monetárias se preocupe com o crescimento e o emprego e que, além disso – muito mais importante – haja um verdadeiro orçamento comunitário e várias outras políticas comuns capazes de assegurar, dentro do sistema, um mínimo de coesão para todas as partes componentes.
Além de que o exemplo da Alemanha muito baseado na procura externa lembra aquela anedota de um conhecido dirigente desportivo que possuído de uma verdadeira fúria anti-sulista e de uma não menor sanha anti-moura dizia: “Nós só devíamos jogar contra gente do Norte!” , esquecendo-se que, se levasse o seu objectivo à risca, ele é que passaria a ser do sul!
Com o modelo alemão passa-se o mesmo. Se todos na Europa o imitassem, deixaria de haver modelo alemão. Mais razoável portanto é ser a Alemanha a aproximar-se dos outros modelos.

2 comentários:

V disse...

O pior é que a Alemanha é como o FCP: ganha sempre e só para o campeonato não acabar é que,de vez em quando, oferece uma pipoca ao (teu) Benfica.
V

Ana Paula Fitas disse...

Reitero, meu caro amigo, o que, há pouco, intuíra: será um Leituras Cruzadas sobre economia e com links só para o Politeia...
Obrigado :)