CONDUZIDA POR TERESA DE SOUSA
Teresa de Sousa tem manifestamente em Luís Amado a sua alma-gémea política. Dificilmente se poderia encontrar mais sintonia de pontos de vista entre entrevistado e entrevistador. Daí as entrevistas que regularmente se sucedem no Público.
Na entrevista do passado domingo, Luís Amado fala longamente sobre o papel de Portugal no mundo, mas, feitas as contas, tudo se resume a bem pouco. Para começar, uma ideia muito antiga: Portugal será na Europa o que conseguir ser fora dela.
É de facto uma ideia muito velha, regularmente defendida por quem acha que a Europa, para nós, só existe na medida em que “existamos” noutras partes do mundo. Tradicionalmente em África e agora, no imaginário de Amado, também no Brasil e nos Estados Unidos. É o mito do Império sem território adicionado à necessidade de protecção do mais forte. Uma complicação!
Não deixa de ser estranho que exactamente na altura em que a Europa se diversifica e multiplica com a adesão de uma dezena de países de pequena e média dimensão, a que se pretendem juntar mais uns quantos, quase todos de dimensão equivalente à nossa, se diga que a nossa integração terminou. Evidentemente que está fora de causa a relação de Portugal com África e até com o Brasil, embora esta, fora do quadro tradicional, se afigure muito mais difícil do que normalmente se pensa. Mas a verdade é que todos os países da dimensão de Portugal que na União Europeia têm alguma importância – e na Europa só tem importância quem for rico – a têm pelo que são dentro da Europa e não pelo que são fora.
Por outro lado, a relação de um pequeno país, como o nosso, com os países da África que nos são próximos, pela língua, pela história, pela cultura e, principalmente, pelos laços de proximidade estabelecidos entre as pessoas, não precisa de grandes teorizações, nem excessivos enquadramentos. As vantagens comparativas dos portugueses nestes países ainda são relevantes, à nossa dimensão, relativamente às dos nacionais de outros países. Mas é bom que não haja a este respeito excessivas ilusões. Estaremos tanto melhor em África quanto melhor formos na Europa e não o contrário, salvo para quem for para lá com a intenção de ficar e de se integrar completamente na vida local.
No Brasil, contrariamente ao que muitos podem supor, não houve uma melhoria das relações entre os dos países em consequência dos vários investimentos que por lá se fizeram a partir de 1995. Pelo contrário, passou a haver problemas que antes nunca existiram. Já a comunidade portuguesa lá radicada, completamente integrada na vida local, alguma com posições económicas de grande relevo, nunca conheceu problemas de nenhuma espécie no seu relacionamento com as autoridades brasileiras. Sempre foi tratada sem discriminações, como se de brasileiros se tratasse.
Isto no que respeita aos investimentos, sem sequer aprofundar a complexa questão da sua avaliação na situação geral portuguesa. Que tais investimentos sejam vantajosos para os países onde se situam, tanto pelo emprego que geram e como pelas receitas fiscais que proporcionam, parece não haver dúvida. Já as mesma certeza se não poderá ter relativamente a investimentos realizados à custa de capitais exportados, como é regra, com grande peso na dívida pública nacional, apesar de tal ónus estar teoricamente compensado com o retorno de uma parte dos lucros. Mas só teoricamente, já que na prática os lucros acabam mais por melhorar a posição accionista dos investidores do que por beneficiar a economia no seu conjunto.
Todavia, se em vez de investimentos, estivéssemos a falar da capacidade exportadora, tanto de bens como de serviços, ou mesmo da capacidade de os portugueses em geral, empresas naturalmente incluídas, se candidatarem com êxito a concursos de prestação de serviços, de obras ou de fornecimentos, já a conversa seria outra. Só que nestes domínios os êxitos, em África, ficam aquém do que seria desejável, apesar dos progressos havidos em regiões onde antes se não entrava, como o Magreb, e no Brasil, ou mais latamente na América Latina, são praticamente inexistentes. Daí a nossa insistência: os êxitos económicos em África e nos grandes países emergentes serão tanto mais significativos quanto mais competentes formos na Europa!
Amado fala ainda na necessidade de o país se integrar na economia global. O conceito é, porém, vago. Entre nós, sempre que o governo ou patrões utilizam o chavão já se sabe o que querem dizer. Para eles a participação na globalização passa pela desregulamentação ou a pela flexibilização das relações de trabalho. Entrar na economia global, sem outras explicações, tem sido sinónimo de degradação do trabalho como factor de produção e da dignidade de quem o presta. E essa não é a melhor forma de o país se desenvolver, mesmo que porventura crescesse, o que está muito longe de estar provado.
Finalmente, lá vem as outras “prioridades”: a relação com os EUA (uma obsessão…), a NATO (outra…) e o Afeganistão. Mas já estão à porta o Yemén e a franja do Sahel que separa o norte de África da África negra…
Por favor, não nos envolvam em mais trapalhadas, nem “peçam” para se meterem connosco! A diplomacia de um pequeno país só tem interesse se for autónoma, sem amos, nem senhores. Mas isto fica para “outras núpcias”…
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