sábado, 26 de maio de 2012

A UNIÃO EUROPEIA NA ENCRUZILHADA




OU MUDA OU ACABA

Neste mais de meio século de existência que leva esta Europa, hoje chamada União Europeia, nunca houve uma situação tão vantajosa para a Alemanha como a actual. Ela não só tem tido a última palavra sobre todos os assuntos importantes como ainda passou a ter, nestes últimos tempos, a primeira e indicadora palavra sobre o que nela se discute e como se discute. Esta primazia política que a Alemanha tem exuberante demonstrado assenta numa prosperidade económica sem precedentes potenciada pelo mercado único e pelo euro. De facto, as vantagens da criação do mercado único reverteram desproporcionadamente a favor da Alemanha: a balança comercial é excedentária relativamente a todos os países da União Europeia e as transacções no mercado de capitais não lhe poderiam correr melhor: financia-se a custo zero ou quase (depende do prazo) e empresta a juro várias vezes superior. Além do mais, continua a cobrar regularmente todos os seus créditos apesar da crise.

É por isso perfeitamente compreensível que não queira mudar…

Esta Europa construída ao longo de meio século e acelerada no seu desenvolvimento institucional a partir da criação do mercado único e da adopção da moeda única (Maastricht) não gerou os equilíbrios internos que ainda há cerca de vinte anos se supunha estarem em franco desenvolvimento nem tão pouco assentou a sua prosperidade numa base sólida capaz de consolidar a progressiva repartição equitativa do crescimento não apenas entre os seus membros mas também entre os seus cidadãos. Pelo contrário, na primeira grande dificuldade que surgiu rapidamente se percebeu que o progresso daqueles que tinham partido atrás era apenas aparente e que ao crescimento global correspondia uma cada vez maior desigualdade não apenas entre os seus membros como também entre os seus cidadãos.

Houve, portanto, um duplo falhanço: um falhanço na progressiva harmonização económica e social dos Estados que a compõem e um outro falhanço não menos importante na progressiva repartição equitativa dos rendimentos entre os seus cidadãos.

Embora ambas as consequências estejam intimamente ligadas às políticas neoliberais que a União Europeia inscreveu na sua “matriz constitucional” a partir de Maastricht, acabou por ser a sua política monetária a trazer dramaticamente à luz do dia uma realidade que permaneceu encoberta até à crise financeira internacional que em finais de 2007 rebentou na América.

Por força dos desenvolvimentos da própria crise na Europa, nomeadamente do estancamento do fluxo de capitais, tornando-os escassos e caros, evidenciou-se um conjunto de situações assentes num endividamento excessivo que se foi sucessivamente agravando em consequências de políticas radicais de austeridade económica impostas pela Alemanha numa base simultaneamente moral e ideológica – era, por um lado, necessário punir os que “viveram acima das suas possibilidades” e, por outro, aproveitar a crise para impor um modelo de sociedade moldado sobre os princípios do neoliberalismo.

Acontece que a situação da Grécia ao cabo de três anos de privações e restrições de toda a ordem acabou por se impor não somente aos próprios gregos, mas também um a um número cada vez maior de europeus como uma irracionalidade que não poderia continuar. Mas não é somente na Grécia que a situação é dramática: ela é-o também em Espanha pelo número brutal de desempregados e pela grave crise do sistema financeiro, insusceptível de ser resolvida pelo Estado, impossibilitado de se financiar no mercado de capitais em virtude da exorbitância dos juros, não obstante as duras medidas restritivas que têm sido adoptadas; é-o igualmente em Portugal pelas razões por todos conhecidos e tende a todo o momento a agravar-se na Itália se nada for feito para alterar a situação dos países em crise.

Se a bancarrota de qualquer destes países tende a inviabilizar a manutenção do euro, não é difícil imaginar o que seria uma reacção em cadeia ditada pela falência de qualquer deles.

Está-se portanto chegado a uma situação que ou se atalha ou a prazo não muito distante vai ter consequências irreversíveis.

Atalhar a situação significa baixar drasticamente os juros da dívida pública dos países que hoje se financiam no mercado a preços usurários; recapitalizar os bancos a juros igualmente baixos; acabar com as políticas de austeridade; pôr rapidamente em prática políticas de crescimento económico dirigidas pelo Estado; e estabelecer prazos para a redução do défice condizentes com as taxas de crescimento.

Estas medidas são indispensáveis para pôr termo à actual situação, mas não são suficientes para combater o desequilíbrio existente no seio da União Europeia, que é em última instância o grande responsável pela situação a que se chegou.

Se para as medidas de emergência bastará alterar a natureza do banco central e, preferencialmente, mutualizar as dívidas, para corrigir consistentemente os desequilíbrios causadores da actual situação vai ser necessário um trabalho muito mais profundo que levará anos a concluir e terá necessariamente de apontar para a refundação da União Europeia em domínios que até agora têm constituído a sua imagem de marca.

É certamente por força da gravidade do contexto que envolve uma parte significativa do Estados da União Europeia e pela sua mais que provável propagação a outros países que se começaram a ouvir na Europa vozes diferentes daquelas que ainda há bem pouco tempo falavam em uníssono uma linguagem que a encaminhava para a catástrofe.

Como a situação é muito grave e desencadeará certamente consequências irreversíveis se não for rapidamente atalhada, é provável que haja mudanças significativas na política da União Europeia. Obviamente que todos aqueles para os quais a presente situação constituía uma oportunidade ímpar para implantar um novo tipo de sociedade, como é o caso do governo português, não deixarão de se unir à Alemanha numa política de resistência, embora tudo indique que tendem a ficar cada vez mais isolados.

De facto, não deixa de ser significativa a mudança que nestes últimos dias se operou em Espanha. Rajoy, que começou por marcar as suas distâncias em relação a Hollande, muito provavelmente por força de um mal entendido sobre a recapitalização dos bancos, e de tentar consolidar uma aliança com Merkel, depois do almoço no Eliseu e do Conselho Europeu de Bruxelas, passou a manifestar uma clara preferência pelas propostas de Hollande por servirem directamente os interesses de Espanha. O mesmo se passou com Monti, não obstante o pendor conservador da sua formação política.

Face a este quadro era muito importante que o PS, não obstante as incríveis concessões que já fez, repudiasse a sua ligação ao Memorandum da Troika, deixando o governo completamente isolado nas políticas de austeridade e a braços com uma aliança antipatriótica.

2 comentários:

Anónimo disse...

Não vale a pena insistir com o PS. Não tem conserto. Qualquer que seja o rumo dos acontecimentos, com estes dirigentes acontece-lhe o mesmo que ao PASOK.
V

Anónimo disse...

O PS é o problema, sempre foi,não a solução...
Não adianta nem chorar, nem ter ilusões sobre isso.

A.M.