quinta-feira, 28 de junho de 2012

A ILUSÃO DO EURO




SOBRE A CIMEIRA EUROPEIA



Por esta hora os dados já estão lançados, apesar de ainda se não conhecerem os resultados oficiais do Conselho Europeu que hoje e amanhã se realiza em Bruxelas.

Toda a gente diz que esta será a cimeira decisiva, esquecendo-se que antes desta já houve outras dezanove cimeiras igualmente decisivas sobre a crise do euro. Diz-se também que é o euro que está em causa e que do seu fracasso resultará o fim da moeda única.

Tudo isto é muito importante mas nada disto é novo. Nem mesmo o previsível fim do euro. Que o euro era uma moeda mal construída já há muito se sabia, embora os primeiros oito, nove anos, da sua existência tivessem mascarado essa incontornável realidade. Todavia, a partir do momento em que na América rebentou a crise financeira, Outono de 2007, e as dificuldades de financiamento se agravaram, as fragilidades do euro foram-se evidenciando com a passagem do tempo a ponto de logo se perceber qual seria o seu mais que provável fim.

É preciso no entanto que se diga que a grande fragilidade do euro não é de natureza técnica, não se trata de uma falha de “construção técnica”, mas de natureza política. Mais: a falha de “construção técnica”, que agora já quase toda a gente reconhece, tem a sua origem numa questão política e não propriamente numa deficiente aplicação prática de conhecimentos teóricos.

O euro é uma construção política que obedece a duas ideias contraditórias, quase antagónicas entre si. De um lado, a ideia francesa de que somente uma moeda europeia poderia pôr fim à hegemonia económica alemã e à “tirania do Bundesbank”. Do lado alemão, entre a quase impossibilidade de manter o marco no quadro de uma Alemanha reunificada sem uma crispação de consequências incalculáveis na Europa, principalmente com a França, e a adopção de uma moeda comum, a Alemanha optou por se desfazer formalmente do marco, aceitando uma nova moeda tanto quanto possível parecida com aquela que tão orgulhosamente simbolizava o ressurgimento da "nação alemã".

A França, sem ter percebido completamente onde se metia, acabou por aceitar a “construção da nova moeda” moldada pela Alemanha, como se de uma vitória sua se tratasse, enquanto a Alemanha foi mantendo uma atitude relativamente vigilante (como logo se depreendia pelo acórdão do TC que apreciou o Tratado de Maastricht) que se foi intensificando, primeiro, à medida que ia ganhando consciência das enormes vantagens que o euro lhe proporcionava e depois com o agravamento da crise e das suas consequências.

Os demais países actuaram como é hábito neles. Os que tinham a suas moedas e políticas monetárias estritamente ligadas ao Bundesbank – Benelux, Áustria e Finlândia – entregaram-se como de costume nas mãos dos alemães de acordo com a velha máxima de que o “ que é bom para eles também será bom para nós”. A Inglaterra, como é seu hábito, sempre que “fatias” importantes de soberania começam a ser opostas em causa, “caiu fora” e deixou essa coisa do euro para os continentais. A Dinamarca e Suécia, aquela até mais do que esta, raciocinaram ao contrário dos que tradicionalmente estavam ligados ao marco – “quanto mais afastados estivermos da hegemonia alemã, melhor”. E não aderiram. A Irlanda aderiu para fugir à hegemonia da libra esterlina convencida como sempre esteve, desde que existe, que para ela nunca é bom estar do mesmo lado da Inglaterra, mesmo que para isso tenha de escolher amigos indesejáveis. Depois vem os do Sul: de todos os que alinharam, a Itália foi desde o princípio a que o fez com mais reticências. Como membro fundador da “Europa” tinha muita dificuldade em ficar de fora sem pôr em causa o projecto na sua totalidade. Desconfiada e sem entusiasmo, acabou por aderir certamente convencida de que não seria o euro que iria pôr termo às “especificidades italianas”. E ainda se está sem saber se enganou já que no inevitável “confronto” do euro com a Itália é bem mais provável que acabe por ser esta a manter-se tal qual é do que ser o euro a impor-lhe uma nova “fisionomia”, mesmo que isso leve ao fim da moeda única. Finalmente, vêm os Ibéricos e os gregos. Nos primeiros prevaleceu a “saloiice bacoca” de que tinham de estar no “pelotão da frente”, embora com propósitos diferentes de Portugal e Espanha, já tantas vezes caracterizados neste blogue – sumariamente, a Espanha para reencontrar na Europa a liderança (ou a co-liderança) perdida; Portugal por ver na Europa o seu novo “el dorado”. Com dois anos de atraso e uma taxa de câmbio aparentemente mais favorável que a de Portugal e a de Espanha, os gregos entraram com as “contas marteladas” na velha ideia de Ulisses de que sempre acaba por vencer o que for mais astuto. Há depois mais cinco que entraram muito mais tarde. Três deles são germanófilos de gema e sentir-se-ão sempre bem do mesmo lado em que estiver a Alemanha; os outros dois são ilhas mediterrânicas, uma delas muito ligada à Grécia, a outra à Itália. Se a Grécia e a Itália estavam no sistema por que ficar de fora, podendo entrar?

Como se está a ver há aqui muito pouca economia, muita política e nenhuma solidariedade. Só mesmo os ingénuos acreditaram que o euro era a expressão da solidariedade europeia e um novo e decisivo factor de integração e desenvolvimento económico.

Mas é preciso ser mesmo muito ingénuo para ter feito tábua rasa do que se passou na crise monetária de 1992/93. Por esta época já os países fundadores da União Monetária estavam ligados pelo Sistema Monetário Europeu (SME) que em 1987 substituiu a Serpente Monetária, a qual, tal como também veio a acontecer ao SME, soçobrou por não ter sido possível manter um sistema de câmbio fixo (com pequenas flutuações) das principais moedas europeias. O SME que assentava no mesmo princípio, embora com algumas diferenças relativamente à Serpente Monetária, por exemplo, a pequena flutuação permitida já não ocorria relativamente a cada uma das outras moedas, mas relativamente a um cabaz de moedas cuja expressão era o ECU – uma moeda virtual; e o estabelecimento de um mecanismo de solidariedade com vista à defesa recíproca das respectivas moedas integrantes do sistema, o SME, dizíamos, não resistiu aos movimentos especulativos de 1992/93, os quais, diga-se sem rodeios, só tiveram lugar (só poderiam ocorrer) por a taxa de câmbio de algumas moedas, quase todas, com excepção obviamente do marco, ser completamente irrealista. Tratava-se de moedas que, com a passagem do tempo, a fixidez dos câmbios ia sobrevalorizando tornando-se insustentável aos respectivos bancos centrais aguentar o seu valor. É claro que as culpas foram imputadas à Alemanha, por se ter recusado a baixar a taxa de juro (que ela subira para conter os efeitos inflacionistas da reunificação) e por se ter recusado a comprar ilimitadamente francos franceses para impedir a sua queda.

Estes factos são verdadeiros, mas o seu enquadramento exigiria largas explicações que neste contexto não podem ter lugar, ficando apenas como referência o facto de tudo se ter agravado por a direita francesa (Balladur) recém-chegada ao poder (Março de 1993), ainda com Mitterrand na presidência, ter arrogantemente tratado a Alemanha como se se tratasse de um país sem soberania monetária. A Alemanha, já politicamente fortalecida pela reunificação, reagiu como se impunha, deixou de comprar francos franceses e a moeda francesa afundou-se. Da taxa de câmbio quase fixa passou-se para uma margem de flutuação de até 15%, o que na prática correspondia à certidão de óbito do SME.  Já antes do franco, outras moedas tinham sido atacadas – a lira, a coroa dinamarquesa, a libra esterlina, a peseta e até o escudo – tendo os respectivos governos, para impedir o afundamento da moeda e o colapso da economia, procedido a várias desvalorizações e abandonado o SME.

Portanto, e em conclusão, com os pressupostos políticos da “Europa” a moeda única não passa de uma ilusão. Os mais fracos, com a Grécia, a Irlanda e Portugal, podem manter essa ilusão porque não contam nada, mas quando a questão se puser a sério para a Espanha, como já se está a pôr, para a Itália ou para a França, o euro acabará.

terça-feira, 26 de junho de 2012

A ESPANHA CONTINUA A LUTAR



COM A ESPANHA RESGATADA TUDO SE COMPLICARÁ



A direita que governa a Espanha tem poucas semelhanças com a que está no poder em Portugal. A direita espanhola é nacionalista – aceita contrariada os nacionalismos locais e o multilinguismo -, soberanista – continua a fazer da independência nacional e da grandeza de Espanha um dos seus pontos de honra – e é apenas liberal qb. O próprio europeísmo da direita espanhola não nada a ver com o “europeísmo bacoco” daqueles que tendo perdido em casa, por amputação territorial, a noção de Pátria julgam poder encontra-la na Europa sem fronteiras. O europeísmo dela é como o das grandes potências europeias – subordinado à expansão e defesa dos interesses espanhóis tal como os interpreta. A Europa não é uma nova expressão da Pátria perdida, é um campo de reencontro de um domínio que se perdeu e de expansão da influência espanhola. Carlos V e Filipe II continuam na cabeça de qualquer espanhol que se preze.

Além disso é uma direita herdeira do falangismo e das várias nuances do fascismo que, tendo sido vitoriosa em casa, logrou passar incólume durante a Segunda Guerra e manter-se no poder, apesar das derrotas do fascismo e do nazismo na Europa, até finais da década de 70. Sem ter sido verdadeiramente derrotada quando aceitou "jogar o jogo democrático”, ela não teve que se descaracterizar para sobreviver, antes se manteve igual a si própria, com as limitações impostas pelas regras do jogo que aceitou jogar.

É essa mesma direita, internamente truculenta na sua linguagem e nos seus processos, que hoje estrebucha e resiste a deixar-se intervencionar pelos poderes que dominam Bruxelas, certa como está de que do afundamento de Espanha resultará a desagregação da própria Europa, na qual outros terão muito mais a perder do que ela.

Esta luta que a direita espanhola está travando, não sendo propriamente quixotesca, está porém longe de poder ser vitoriosa. A Europa é hoje – se é que alguma vez deixou de ser – um enorme campo de batalha onde se disputam influências e se defrontam hegemonias. A crise do euro tem-no demonstrado com mais evidência do qualquer outra crise.

O resgate do sector financeiro espanhol feito por via da responsabilização directa do Estado não vai desanuviar a situação na Europa. Pelo contrário, vai agravá-la. A dívida espanhola aumentará e com ela o défice, por via do respectivo serviço. Se a Espanha já estava na mira dos mercados, mais vai passar a está-lo depois do resgate. Agravar-se-á a situação financeira do país onde todos os dias se detectam novos buracos. Agora é o das auto-estradas concessionadas que não conseguem sequer angariar receitas para ir pagando a dívida que as financiou. Um após outro os países periféricos vão caindo, primeiro os mais pequenos, agora os grandes. Logo depois chegaria – se lá se chegasse – a vez da França. É o edifício europeu construído com pés de barro que aos bocados se vai desmoronando.       

O caso da Espanha é muito interessante, porventura mais do que o da Irlanda. É que na Espanha depois das turbulências causadas pela crise monetária de 92/93, em que houve três desvalorizações sucessivas da peseta, obviamente causadas por a paridade cambial estabelecida no quadro do SME ser completamente irrealista, como era a da lira italiana, a da libra esterlina e a do próprio escudo, a economia não deixou de crescer.  E foi continuando a crescer depois da adesão ao euro até 2010. A convicção de que a economia espanhola assentava em bases sólidas era tão forte que Zapatero até se recusou a admitir que houvesse crise! 

A economia crescia impulsionada pela chamada “bolha imobiliária” mas também por um investimento público em larga escala coroado de sucesso. E, todavia, quando mais a Espanha crescia…mais se afundava.

A economia pode ser uma ciência e certamente sê-lo-á com todas as limitações que acompanham as ciências sociais. Mas uma coisa de que todos nós hoje temos a certeza é de que os economistas nunca olham para a economia como tal mas antes baseados em factores irracionais que tendem a sobrevalorizar muito mais do que as evidências empíricas que os ajudariam a compreender a realidade. Pois não era evidente que o “progresso” da Espanha estava a ter como consequência a perda constante da competitividade relativamente àqueles que dentro da zona euro iam reforçando a sua?     

Há vários factores relevantes para a perda de competitividade, mas aquele que seguramente vai ser tido em conta, lá como cá, para tentar recuperar a competitividade perdida vai ser certamente o salário – o custo directo e indirecto do trabalho.

Como se vê não houve em Espanha, ao contrário do que aconteceu em Portugal, obras que tivessem sobreendividado o Estado ou cujos efeitos no PIB fossem quase nulos. Pelo contrário, a economia crescia e a dívida do Estado estava bem abaixo da média da dívida da zona euro e muito abaixo dos chamados critérios de Maastricht já que a maior parte dos investimentos públicos que o Estado fazia era financiada pela receita fiscal proporcionada pela construção civil. E todavia…

Esta crise não assenta portanto em culpas como alguns convictamente pretendem fazer crer, a começar pelos luteranos alemães. Isto é o capitalismo a actuar no contexto específico da “bolha monetária” criada pelo euro. O capitalismo não tem em vista proporcionar o interesse geral a partir da busca do interesse individual nem tão pouco assenta na famosa destruição criativa que Shumpeter teorizou e Greenspan tanto elogiou. O capitalismo assenta única e exclusivamente no lucro. Na busca incessante do lucro. E dessa busca e sua concretização decorrem depois múltiplas consequências as quais, a partir do momento em que a economia se liberalizou e globalizou, deixaram de ser tidas em conta pela razão muito simples de elas já não fazerem perigar a subsistência do sistema. Pelo contrário, a hegemonia alcançada pelo capitalismo fá-lo sair mais forte das crises que provoca porque por via dessa hegemonia pode agora recapitalizar-se ilimitadamente à custa dos contribuintes!

E é isto o que se está a passar na Europa onde o único problema que se põe é o da repartição dessa recapitalização pelos contribuintes. É mais uma vez a questão nacional a ditar as suas regras…


PATÉTICO CAVACO





UMA PRESIDÊNCIA FALHADA



Se as coisas continuam assim - e não há nenhuma razão para supor que vão mudar - Cavaco vai ter de passar o resto do mandato recolhido em Belém a gozar as várias reformas dos múltiplos empregos que, pelos vistos, o ocuparam durante a vida, apesar de a gente só lembrar dele como político desde 1980!

Conluiado com o Governo vai dizendo que há pouco espaço para mais sacrifícios, abrindo assim a porta a novas medidas de austeridade, com aquele ar de quem aceita contrariado a inevitabilidade do que tem de acontecer. Se durante os últimos tempos de Sócrates as medidas de austeridade serviram para ameaçar o governo – há limites para o sacrifício, dizia então Cavaco com o ar seguro de quem sabe qual é esse limite e de quem está disposto a não permitir que o ultrapassem - hoje o discurso sobre o agravamento generalizado daquelas medidas serve mais para atenuar o efeito de revolta que elas podem gerar do que para as contestar ou sequer as lamentar.
Por isso, Cavaco nem sequer chega a ter um discurso dúplice. Tem uma espécie de discurso naif mal construído de quem, apoiando sem reservas o que se está a passar, salvo quando lhe vão ao bolso a ele, pretende fazer crer que se mantém vigilante, procurando com as suas mansas palavras atenuar ou desencorajar o surgimento do tal sentimento de revolta que possa retirar a maioria dos cidadãos do estado letárgico em que se encontra.
Daí que não seja de estranhar que os portugueses mais esclarecidos sobre os seus direitos e sobre o papel que Cavaco desempenha lhe não perdoem esta tentativa de adormecimento popular por via das tais palavras com que os pretende amansar. Mais valia que Cavaco assumisse claramente o discurso do governo, causar-lhe ia menos danos e seria mais respeitado.
Assim, a actuação de Cavaco vai-se tornado patética, não obviamente do ponto de vista daqueles em quem as suas palavras provocam revolta, mas para os da sua área política que olham para ele com aquele misto de compaixão e distância de quem já não sabe como vai ser possível aguentá-lo até ao fim do mandato!

sábado, 23 de junho de 2012

PORTUGAL A CAMINHO DA GRÉCIA




CRÓNICA DE UM DESGRAÇA ANUNCIADA
<p>Vítor Gaspar</p>

O que toda a gente antecipava aconteceu: as receitas diminuíram apesar do aumento dos impostos. Toda a gente, vírgula, eles contavam e desejavam tudo o resto – queda da procura interna, desemprego, recessão – só não contavam que a quebra das receitas fosse tão comprometedora. Os talibans do neoliberalismo acreditam nas máximas que a Escola de Chicago lhes ensinou. Quando o resultado não é o esperado não é a teoria que está errada. É a realidade. Logo, há que corrigir a realidade. Como? Com mais austeridade para contrariar “o aumento significativo dos riscos e incertezas associados às perspectivas orçamentais”.
Pois, só que vai ser necessário continuar a corrigir a realidade já que o pior está para vir. No segundo semestre as receitas do IVA vão baixar ainda mais, por ser nele que se farão sentir os efeitos do confisco dos vencimentos.

Portugal está definitivamente no caminho da Grécia. Com uma enorme diferença: de Portugal ninguém fala; fala-se da Grécia, da Espanha, da Itália, mas de Portugal nem uma palavra, seja nas reuniões internacionais seja nos grandes meios de comunicação. O governo não tem que expor internacionalmente a degradante situação em que o país se encontra nem exigir novos caminhos, por um lado, porque conta com o apoio do “extraordinário povo português” para resolver tudo cá dentro e, por outro, porque age com o fervor ideológico próprio de um gauleiter.

E assim está tudo bem até que o “extraordinário povo português” desperte da profunda letargia em que está mergulhado…

quinta-feira, 21 de junho de 2012

NOTAS BREVES




SOBRE FACTOS CORRENTES



SUÉCIA – Quem te viu e quem te vê! Há mais ou menos meio século, a Suécia era a Pátria da liberdade e da verdadeira terceira via e não dessa coisa inventada por Guiddens, e aplicada pelo criminoso de guerra Tony Blair, destinada a encurtar o caminho para o neoliberalismo a coberto das “inovações inevitáveis” apadrinhadas pela social-democracia. Hoje a Suécia é governada por uma direita bem radical serventuária de Merkel, a cuja dominação ideológica se acolhe, sempre pronta a fustigar com um mal disfarçado racismo os “preguiçosos” países do sul. Mas não se fica por aí: Assange tem por certo que será entregue aos americanos se for extraditado para a Suécia, essa “arábia saudita das mulheres”, para ser julgado por uns pretensos crimes sexuais. Para tentar escapar a esse destino mais que certo, refugiou-se na Embaixada do Equador, em busca de asilo político. Ao que isto chegou: já se foge da Suécia! Valha-nos a compensação: perdeu-se a Suécia, ganhou-se o Equador. Até ver…



ESPANHA – Há alguma semelhança entre a Espanha e a Madeira? Geografias à parte, em tudo são parecidas. Em Espanha, tal como na Madeira, escondeu-se a divida e a situação financeira dos bancos. Aquando do resgate, Rajoy, tal como Jardim, apresentou-o mais como o resultado de pressões exercidas sobre ele do que de necessidades reais do país. E no que respeita à democracia parlamentar, é bom não aprofundar, caso contrário ainda terá de se concluir que a Madeira é um modelo invejável. Rajoy recusa discutir no parlamento a situação dos bancos intervencionados bem como a permitir que sejam ouvidos aqueles que os geriram. Chegou mesmo a proibir o anterior governador de Banco de Espanha de falar sobre o assunto. Mas há mais: adiou para o ano que vem o debate sobre o “estado da nação”! Jardim tem muito que aprender…

(Já agora uma “boutade” de Fraga Iribarne sobre Rajoy. Aqui há muitos anos atrás quando Rajoy começava a despontar, já bem trintão, como político promissor na Galiza, perguntaram a Fraga, então presidente da Xunta de Galicia, o que ele achava sobre a hipótese de Rajoy um dia lhe suceder. Fraga, surpreendido com a pergunta tanto mais que não contava largar o lugar tão cedo, respondeu: Sim, o rapaz tem hipóteses, desde que arranje uma mulher e aprenda galego. Mulher, Rajoy arranjou, pouco antes de suceder a Aznar. Galego, provavelmente não aprendeu. Mas também não lhe vai fazer falta).



ERC – Como se esperava a entidade reguladora para a comunicação social concluiu após “porfiadas e diligentes investigações” que Relvas não fez pressões ilícitas sobre o Publico nem sobre a jornalista Maria José Oliveira, a única vítima de toda esta história. Carlos Magno, o grande regulador destas questões da comunicação social, nomeado juntamente com dois outros impolutos reguladores, no caso impolutas, pelo PSD, concluiu o que tinha de concluir ou não fosse ele um velho e batido caminheiro nestas coisas da imprensa. Ele que já votou PC, apoiou Soares, depois a Aliança Democrática, transferindo-se no estertor desta, meio cá meio lá, para o novel liberalismo de Lucas Pires que em Ofir apadrinhou, para seguidamente…Não adianta continuar: ainda estamos muito distantes de 2012. E teríamos de os correr todos até Sócrates de quem foi confesso admirador até… Até, como de costume, voltar a saltar…

segunda-feira, 18 de junho de 2012

CONTINUA A TORTURA DO POVO GREGO



A DIREITA E SEUS COMPAGNONS DE ROUTE RESPIRARAM DE ALÍVIO



Se a Grécia não tem peso que se veja, se a sua depauperada economia não representa mais que 2% da economia europeia, se até o sempre fleumático Chancellor of the Exchequer, que formalmente nem é desta “guerra”, aconselhou a Grécia a deixar o euro, porquê tanta preocupação na Europa com as eleições gregas?

Porque de facto a Grécia tinha na mão a chave que permitia abrir novos caminhos para os povos da Europa que já estão sofrendo e vão continuar a sofrer na pele as consequências das políticas que fazem da manutenção do euro um caminho seguro para o empobrecimento do maior número em proveito de alguns, poucos, Estados e de camadas privilegiadas dos países mais endividados.

 Não vale a pena andar com muitos rodeios acerca desta crise. Ou a moeda e as políticas económicas da União Europeia, bem como a superestrutura política que a dirige são completamente reformuladas na base de um aprofundamento democrático em todos os planos, com vantagens mútuas e recíprocas, que afastem pelos seus princípios e pela sua prática a ideia de que os que estão pior apenas querem ficar melhor à custa dos que estão bem - e, francamente, não se vê nem se vislumbra como tal possa ser possível no contexto do capitalismo neoliberal dominado pelo capital financeiro e especulativo, todo ele empenhado em garantir a taxa máxima de exploração no mais curto espaço de tempo possível; ou este “arranjo” em que a Europa foi vivendo nestes últimos cinquenta anos tem de acabar. E nada melhor para o futuro de que o fim de um status quo arrogante, prepotente e iníquo se operar por via de convulsões sociais capazes de pôr em causa tudo o que até então era tido por mais certo e mais seguro.

Ora os gregos poderiam ter dado ontem um passo muito importante nesse sentido. No sentido de acabar com este beco sem saída em que a União Europeia se está transformando ou já se transformou mesmo. À parca democracia que existia no plano dos Estados, muito degenerada pela própria evolução da democracia representativa que nos últimos tempos tem caminhado a passos largos no sentido inverso ao do conceito democrático, juntou-se a ausência completa de autodeterminação popular no plano da União. Aqui, contrariamente ao que sempre começou por acontecer em qualquer federação ou para-federação, que para se erguer e institucionalizar sempre teve de fazer apelo aos mais lídimos princípios democráticos (independentemente de com o tempo os vir a respeitar completamente), fez-se exactamente o contrário: o que foi feito fazia-se nas costas do povo, que ficava totalmente à margem das decisões, tendo o processo de decisão sido sempre rodeado da maior opacidade.

O meio perverso que foi servindo de base à consolidação deste caminho foi o dinheiro. Tudo foi sendo comprado: sectores inteiros do aparelho produtivo; autonomia de decisão em questões económicas fundamentais com base nas famigeradas regras da concorrência sempre entendidas no sentido da concentração capitalista; enfim, a própria soberania. E tudo a direita vendeu sempre bem acompanhada pelos conhecidos companheiros de percurso. Uma venda iníqua que deixava, como deixou, o vendedor sem meios de alguma vez poder economicamente aproximar-se do comprador.

Por isso, não adianta supor que isto se resolve com reformas titubeantes e demoradas. Não será a mutualização da dívida, nem mesmo a reforma do BCE que vão resolver os nossos problemas. Eles têm sem dúvida uma expressão monetária mas a sua origem está no “sub-solo” e no “solo” da economia real. Enquanto estas questões não forem democraticamente resolvidas, os problemas manter-se-ão. Mesmo que episodicamente se atenuem ressurgirão com mais força e sempre mais difíceis de resolver.

Muitos pensam que parte ou mesmo a totalidade dos nossos problemas se resolveriam se o BCE desempenhasse um papel semelhante ao da reserva federal americana. Provavelmente não teríamos os problemas que temos no plano monetário ou não os teríamos com a mesma intensidade, mas teríamos outros, semelhantes àqueles com que os americanos se debatem. Copiar a América no plano económico – e é inequivocamente nesse sentido que a União Europeia se orienta desde há mais de uma dezena de anos – não é solução, independentemente das conjunturais divergências, mais aparentes do que reais, entre defensores da austeridade e do “crescimento” neoliberal. É quase tudo igual. É bom não esquecer que o êxito do New Deal e das doutrinas keynesianas não esteve apenas no relançamento da procura por via de investimentos públicos, mas fundamentalmente na redistribuição dos rendimentos. Basta atentar no caso português destes últimos dez anos para logo se perceber que a utilização daquele meio sem o outro, ainda por cima no contexto altamente desigual do espaço económico europeu, não constitui solução.  

Por tudo isto teria sido da máxima importância que um partido completamente diferente de todos aqueles que têm governado a Europa tivesse chegado ao poder pela via eleitoral. Não chegou. A Europa respirou de alívio, diz-se. Diz-se, mas é falso. Quem respirou de alívio foi o capitalismo!

sábado, 16 de junho de 2012

A UNIÃO EUROPEIA E A GUERRA FRIA




A DESCOBERTA DE PAULO RANGEL




Paulo Rangel, ex-líder parlamentar do PSD, candidato à presidência do partido nas últimas “directas” e actual deputado ao Parlamento europeu, suspeita que a verdadeira causa dos quase setenta anos de paz na Europa talvez não tenha sido a “construção europeia”, mas a Guerra Fria.

Grande suspeita a de Paulo Rangel, ele que durante tantos anos esteve convencido de que “o grande factor de promoção da paz e de prevenção da guerra no continente tinha sido a construção europeia”.

Num primeiro impulso poderia supor-se que esta descoberta de Rangel, ainda que sob a forma de simples suspeição, estaria relacionada com a atenuação da obsessão anti-socrática que democraticamente o asfixiava, impedindo-o de pensar serenamente.

Mas não. O mal é certamente mais profundo e tem a ver com mitos, com a dificuldade que as pessoas têm em se libertar dos mitos. E um desses mitos é o papel de Adenauer no pós guerra.

Em poucas palavras: derrotado o III Reich na Segunda Guerra Mundial pelas potências aliadas e dividido o território da nova Alemanha em quatro zonas de ocupação, reproduzidas na capital do Reich, apesar de esta se encontrar territorialmente incorporada na zona de ocupação soviética, foi, por força do antagonismo entre os aliados ocidentais e a União Soviética, criada em 1949 a República Federal da Alemanha. Cerca de cinco meses depois, e esgotadas que estavam as hipóteses de consensualizar a reunificação da Alemanha, os soviéticos criaram a leste a República Democrática  Alemã (RDA).

A divisão da Alemanha e, dentro dela, a de Berlim são a imagem perfeita da divisão do mundo em dois blocos antagónicos e marcam também, simbolicamente, o início da Guerra Fria.

A leste, a RDA seguiu o caminho das demais “democracias populares” instaladas nos territórios dos países conquistados pelo Exército Vermelho na sua caminhada vitoriosa até Berlim, alguns deles aliados da Alemanha nazi e outros, apesar de ocupados, com fortíssimo índice de colaboracionismo. Sem mácula quanto a alianças ou colaboracionismo apenas a Polónia e o território da actual República Checa, com excepção obviamente dos sudetas que eram alemães.

A oeste, naquela que veio a ser a República Federal da Alemanha, instalou-se da noite para o dia a democracia de tipo ocidental. Ela, que tão vilipendiada havia sido desde Bismarck, foi aceite com a naturalidade de quem havia vivido um simples pesadelo e que agora acordava para uma vida diferente, feita de presente, com esperança no futuro e total esquecimento do passado. Todos a oeste se tornaram “democratas”, com excepção daqueles que foram “apanhados” pelas medidas de desnazificação. E poucos foram, pois, como as tropas americanas de ocupação muito bem disseram, com aquela ingenuidade de quem ainda se não tinha apercebido do papel que doravante iriam passar a desempenhar no mundo, se todos ou quase todos eram nazis ou cúmplices do nazismo, quem poderia assegurar a administração da Alemanha senão aqueles que tinham colaborado com Hitler? O que doravante era importante era integrá-los numa nova ordem – uma ordem a que eles aderiram sem dificuldade pelo imenso traumatismo que a tétrica aventura hitleriana acabou por lhes causar e também pelo medo que tinham do comunismo soviético.

E foi assim que antes do famoso “milagre económico” alemão se deu o “milagre democrático”. E foi  também assim que o anterior inimigo se transformou em “aliado”. Nada agora se assemelhava ao que aconteceu depois da Grande Guerra. Não havia “Versalhes” nem ocupação da Renânia pelas tropas francesas para pagar as indemnizações de guerra. Havia apenas um desejo fecundo de colaborar no combate ao inimigo tão próximo e sempre presente a leste.

Por outro lado, a destruição causada pela guerra foi de tal ordem que a reconstrução da Alemanha, financiada por crédito muito barato dos Estados Unidos, exigia muita mão-de-obra, acabando por reabsorver sem qualquer dificuldade os cerca de doze milhões de refugiados que se tinham acoitado no território da recém criada RFA. Por isso, a reconstrução nas excelentes condições em que se verificou gerou crescimento e assim, pela primeira vez na Alemanha, democracia era sinónimo de prosperidade. Bona não era Weimar!

E o que se passava no plano estritamente político? Adenauer que subiu ao poder em 1949 e nele se manteve até 1963, aproveitando-se das fricções cada vez mais fortes entre os dois mundos, aderiu à NATO, o que não deixava de ser uma raridade para um país cuja constituição proibia qualquer tipo de militarismo e manteve dentro dela durante largos anos – desde os anos finais de Truman, os oito da presidência de Eisenhower e dois de Kennedy – uma atitude belicista e agressiva relativamente a leste. Sentindo as costas quentes e fazendo parte, como ele próprio dizia, da maior aliança militar da história, ele achava que a questão da reunificação da Alemanha – e para Adenauer a reunificação pressuponha a recuperação das fronteiras de 1937! – e do comunismo eram assuntos que, em última instância, acabariam por ser resolvidos por via militar.

Os prospectos turísticos alemães até à primeira metade da década de sessenta representavam a Alemanha com as fronteiras anteriores ao Anschluss, com a indicação de que se encontravam sob ocupação militar os territórios que não estavam sob administração da RFA. Ou seja, tudo se passava para Adenauer como se não tivesse havido guerra ou como se a guerra fosse algo estranho à Alemanha.

Não adianta num simples post estar a multiplicar os factos que comprovam a natureza revanchista da República de Bona sob Adenauer, como por exemplo, a exigência, já esquecida por quase todos, de serem colocadas em território alemão armas nucleares sob a direcção do governo de Bona, exigência a que somente a partir de Kennedy se colocou um ponto final definitivo. E que dizer da famosa aliança com a França que os propagandistas da Europa tanto apregoam como a verdadeira génese desta enorme confusão que é hoje a “construção europeia”? Para se ser rigoroso com a História não pode deixar de dizer-se que há intenções bem diferentes de ambos os lados do Reno: enquanto para a Adenauer, decepcionado com a posição americana e com as tentativas protagonizadas por Kennedy de um entendimento a Leste que estabilizasse o status quo saído da Guerra, a aliança com a França era a possibilidade de manter viva na Europa a política de força tão do seu agrado e de garantir a “barragem contra o bolchevismo”; para De Gaulle, pelo contrário, ela era entendida como uma ponte de diálogo com o “outro lado” e, acima de tudo, um modo de fugir à tutela americana e marcar uma posição de liderança da França na Europa ocidental.

Como se vê, quimeras de um lado e do outro. No fundo a Europa continuava a ser governada por gente muito marcada pela Guerra e que continuava a pensar ainda segundo os cânones anteriores ao grande conflito.

Do lado da Alemanha, Adenauer acaba por ser afastado para ser substituído pelo chamado pai do milagre alemão, Herhard, pelo qual o anterior Chanceler nutria um não disfarçado desprezo como político. A este seguiu-se Kiesinger e a grande coligação com os social-democratas de Willy Brandt.

Pode dizer-se que a política externa de Bona não se alterou, apesar da mudança de intérpretes, desde a fundação da RFA até à chegada de Willy Brandt. Somente com ele, primeiro, como ministro dos Negócios Estrangeiros e depois como Chanceler é que a RFA aceitou inequivocamente as fronteiras saídas da Segunda Guerra Mundial e iniciou uma política de entendimento a leste, não apenas com a URSS e os Estados mais traumatizados pelo passado recente da Alemanha – Polónia e Checoslováquia – mas também com a própria RDA.

Portanto, o que efectivamente assegurou a paz na Europa foi a Guerra Fria e o entendimento americano-soviético quanto ao status quo saído II Guerra Mundial. A Comunidade Económica Europeia, embora represente um estadio superior de cooperação entre Estados, foi mantendo no seu seio um conjunto de ambiguidades nem sempre bem disfarçadas pela liderança da Europa e das relações desta com os EUA e com a URRS que somente a Guerra Fria, a partir de Kennedy, mas consolidadamente a partir de Nixon, atenuou e fez esquecer.

De facto, a Alemanha começou por se esquecer de que tinha perdido a guerra e quando já se tinha esquecido de que se tinha esquecido de que perdera a guerra recebeu uma prenda inesperada de Moscovo. A França, apesar de duplamente derrotada na guerra (primeiro a França legítima,  depois a de Vichy) e de ter conseguido  sair do conflito com o estatuto de potência vitoriosa - indiscutivelmente devido à acção de De Gaulle -, é que nunca se esqueceu de que Alemanha havia perdido a guerra e assim actuou durante os anos da Guerra Fria. Só quando esta acabou e a Alemanha se reunificou é que os conflitos voltaram a surgir com a intensidade que hoje têm, sendo o primeiro de todos a crise monetária de 1992/93. Mas isso já será “conversa” para outro post.


quarta-feira, 13 de junho de 2012

O GOVERNO E A ORTODOXIA





É PRECISO PÔR COBRO A ISTO
Vítor Gaspar insiste na "disponibilidade total" para consenso com o PS



Como aqui tantas vezes se tem dito um fanático não renega a sua crença por um minuto que seja, mesmo que essa episódica renúncia lhe possa trazer uma apreciável vantagem conjuntural.

É por isso que o Governo nada fará para alterar os termos do Memorandum da Troika, seja quanto a prazos, seja quanto a custos, seja ainda quanto a alívio ou atenuação das medidas neles constantes, porque qualquer alteração iria atrasar ou mesmo pôr em causa a mudança de sociedade que acima de tudo o Governo tem em vista. Como frequentemente tem sido dito, o programa do Governo, embora tomando o Memorandum como base, está para além dele, portanto não faria sentido alterá-lo numa direcção contrária ao do seu próprio programa.

O Primeiro Ministro tem-no dito de forma muito clara, embora com a abstracção suficiente para que a generalidade das pessoas se não aperceba bem do que ele está a falar e até tenda a entender exactamente o contrário do que ele quer dizer. Estamos a promover a maior transformação da sociedade portuguesa desde há mais de cem anos, diz Passos Coelho. Essa transformação visa pôr em prática, como se sabe, no plano económico e, como consequência deste, nos demais, aquele tipo de economia que os clássicos do liberalismo não tinham conseguido institucionalizar completamente no fim do século XIX.

Para avaliar o fervor ideológico com que esta transformação está sendo operada basta atentar nos dois exemplos seguintes.

A contra-revolução monetarista iniciada na década de setenta do século passado e depois muito potenciada pela aliança com as ideias neo-conservadores diz que quando o desemprego aumenta os salários baixam e o emprego volta a subir. Gaspar e a Troika continuam francamente apreensivos, como ainda hoje se viu, por esta máxima da economia neoliberal não estar a verificar-se. Como a doutrina não pode estar errada então vai ser necessário alterar a realidade para que aquela se cumpra na plenitude. Já o A. Borges o tinha dito e Gaspar também, apesar de enganosamente desmentidos pelo Primeiro Ministro. Para que não haja dúvidas, Gaspar voltou a dizê-lo hoje: é preciso que alguns salários desçam.

Outro exemplo: os professores afirmam que as provas de matemática dos alunos do 4.º e 9.º anos foram propositadamente dificultadas para demonstrar que os anteriores programas e métodos de ensino na disciplina estavam errados

Atenção: esta gente é perigosa. Vai ter que se pôr cobro a isto, antes que isto nos destrua!

sábado, 9 de junho de 2012

A ESPANHA NÃO RESISTE À PRESSÃO DA ALEMANHA





RESGATADOS

Depois de muitas semanas de resistência, a Espanha vai ter de claudicar. Ciente da desgraça que se abateu sobre a Grécia, a Irlanda e Portugal, o governo espanhol tentou e ainda está a tentar por todos os meios evitar o resgate nos mesmos termos em que ele ocorreu nos três países citados. Não é somente a perda de soberania que está em jogo. É também o colapso por muitos anos da actividade económica resultante das medidas de austeridade que a Alemanha e seus satélites associam à concessão das verbas emprestadas.

Em consequência da crise financeira outros países já tiveram de socorrer os bancos com dinheiros públicos. Mas há uma diferença de vulto consoante esses países pertencem ou não à zona euro. Se estão fora, como é o caso do Reino Unido, para já não falar dos que não pertencem à União Europeia, como a Islândia e os Estados Unidos, a recapitalização dos bancos que por opção política se decide não deixar falir faz-se com fundos injectados pelos respectivos bancos centrais. Se, porém, o país se situa na zona euro o BCE está proibido de injectar directamente esses fundos, cabendo aos respectivos Estados solicitá-los ao fundo resgate, responsabilizar-se pelo seu reembolso e aceitar um pesado condicionalismo macroeconómico.

É exactamente isto que a Espanha quer evitar. Primeiro tentou fazer a recapitalização através de títulos da dívida pública directamente emitida para o capital dos bancos. Como porém o BCE se opôs a aceitar esses títulos em garantia da concessão de empréstimos correspondentes ao seu montante, a Espanha tentou que o empréstimo fosse feito directamente aos bancos pelo  “fundo de resgate”. Também não conseguiu. Essa hipótese está proibida pelo regulamento do fundo e também pelo tratado do mecanismo que o vai substituir. Tenta agora desesperadamente que o empréstimo seja feito ao FROB – um fundo público espanhol de reestruturação bancária – com omissão da palavra resgate e com condicionalismo mínimo fora do sector financeiro.

Entretanto, enquanto estas linhas estavam sendo escritas, a “Espanha foi resgatada”. Cem mil milhões. Infelizmente, os governantes espanhóis não apresentam o empréstimo como um resgate e antes como um empréstimo diferente dos que foram concedidos à Grécia, à Irlanda e a Portugal. Ou seja, a solidariedade dos governantes espanhóis é nula. Em vez de apresentarem o resultado das suas negociações – que ainda se desconhecem quais sejam – como uma vitória relativamente às políticas restritivas, apresentam-nas antes como uma vitória sobre os países que estão nas mesmas condições da Espanha. Perante este quadro não será de admirar que nos três países intervencionados cresçam as vozes contra a diferença de tratamento e se crie um clima de hostilidade relativamente a Espanha.

Veremos como cá o assunto começa por ser tratado pelo governo português e seus acólitos. Mais uma vez há todas as razões para supor que tentarão, também eles, diferenciar a situação espanhola das restantes. Ainda agora mesmo o inefável Paulo Dentinho, correspondente vitalício da RTP algures na Europa, explicava aos portugueses que a crise da Espanha é muito diferente das outras, é uma crise bancária, logo…etc. e tal.

Mais desenvolvimentos hoje ou amanhã…

sexta-feira, 8 de junho de 2012

AS PROPOSTAS ANTI-DEMOCRÁTICAS DE ANGELA MERKEL






HOLLANDE DESAFIA BERLIM E BRUXELAS



Merkel na entrevista que ontem concedeu à cadeia pública de televisão alemã - ARD – deixou muito claro qual a sua ideia para o futuro da Europa. Disse que a Europa não precisa apenas de União Monetária, mas também de mais união política e fiscal de modo a que haja políticas orçamentais comuns. E simultaneamente deixou um aviso: tem que se admitir que se vá abrir ainda mais a forquilha entre os dois grupos de uma Europa a duas velocidades. Quem não quiser avançar não pode impedir que outros o façam, citando como exemplo a eurozona. Por fim, reiterou o princípio que desde o início da crise tem norteado o seu ideário político: crescimento e consolidação das finanças públicas são as duas faces da mesma moeda. Não pode haver crescimento sem consolidação das finanças públicas, embora esta não baste para assegurar aquele: é preciso também pensar na competitividade.

E aqui está em poucas palavras o credo político da Alemanha na União Europeia. Da Alemanha e não apenas da coligação no poder em Berlim, já que estas ideias são no essencial sufragadas pelo SPD.

Quando Merkel reclama mais união política e fiscal no fundo o que está a dizer é que as regras ditadas pela Alemanha devem aplicar-se a todos os países que fazem parte da zona euro. Ela não tem uma única palavra nem apresenta qualquer proposta no sentido de assegurar maior democraticidade às decisões da União Europeia. Merkel sempre se sentiu confortável com o pseudo-directório que constituiu com Sarkozy no qual ela gizava as grandes diretrizes de política económica e financeira, deixando a Sarkozy o encargo de as defender e explicar. Por outro lado, a ameaça que decorre das suas palavras também só pode ser entendida numa perspectiva anti-democrática. Quem não quiser mais integração, deverá abandonar a zona euro, contanto que se mantenha no mercado único. Por outras palavras, quem não aceitar mais integração pode sair da União Monetária desde que mantenha as fronteiras abertas para a entrada dos produtos alemães.

Entretanto, do outro lado do Reno, Hollande adopta algumas medidas emblemáticas manifestamente destinadas a desafiar o essencial da política germânica para a União Europeia. Uma dessas medidas tem a ver com a prometida revisão da política de segurança social posta em prática por Sarkozy. A partir do próximo 1 de Novembro os franceses que tenham descontado 41,5 anuidades para a segurança social podem reformar-se aos sessenta. Ainda no mesmo sentido, a ministra da Segurança Social anunciou que o novo sistema vai oferecer vantagens especiais às mulheres que tenham sido mães e aos desempregados de longa duração. A ideia do governo francês, a concretizar por via de outras políticas, é a de que se pode caminhar no sentido da consolidação orçamental sem renunciar a nenhuma das conquistas do estado social. Equilíbrio orçamental sem austeridade, portanto. Evidentemente que vai ser necessário repor a justiça fiscal pondo os ricos a pagar a crise e não o contrário que é exactamente o que está acontecendo nos demais países da zona euro. Para se compreender o que isto quer dizer: em França, Sarkozy com as isenções fiscais que concedeu aos ricos deixou de cobrar entre 70 mil milhões e 110 mil milhões de euros (números do Tribunal de Contas francês). Há, portanto, muita margem fiscal para ir buscar dinheiro onde ele existe sem necessidade de onerar brutalmente os rendimentos mais baixos como se está a fazer por todo o lado.

Aliás, e para terminar, quem conhece as políticas do New Deal sabe que foi isto que Roosevelt fez na América depois de 1932, onde os rendimentos mais elevados chegaram a ser tributados com taxas de 90%!


MINEIROS ASTURIANOS - SOLIDARIEDADE


A TRADIÇÃO DE LUTA ASTURIANA



Se em Espanha há uma região onde os trabalhadores têm plena consciência da importância da luta como forma de alcançar os seus objectivos, essa região é indubitavelmente as Astúrias. Sempre assim foi ao longo do século XX, antes, durante e depois de Franco, e volta a sê-lo agora numa Europa semi-adormecida e incapaz de se opor eficazmente às políticas de austeridade, todas elas, sem excepção, destinadas a reforçar a taxa de lucro do capital.

Nas Astúrias, como de costume, a luta dos trabalhadores não se traduz num rosário mais ou menos barulhento de lamentos contra as políticas que lhes são impostas. A luta na Astúrias tende sempre a ser a resposta adequada à violência institucional que se abate sobre os trabalhadores. E mais uma vez assim está a ser. Os mineiros entraram em greve no dia 23 de Maio. Desde então têm-se confrontado quase diariamente com a polícia em recontros frequentes, têm cortado estradas e autoestradas com barricadas e passaram a contar desde domingo com a greve dos trabalhadores dos transportes. Uma greve total, sem serviços mínimos, que continua paralisando completamente todos os transporte da região.

Enquanto o governo não repuser as ajudas ao sector mineiro, a luta continuará. Uma luta pelo posto de trabalho, certamente, mas também uma luta contra o neoliberalismo  e pela manutenção do tecido produtivo nacional.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

CAVACO, A SAÚDE E OS SALÁRIOS



COMO SERIA FÁCIL FAZER-SE ENTENDER

Quem ouve Cavaco e conhece as sondagens de opinião relativas à avaliação dos políticos rapidamente se apercebe que ele sofre com a incompreensão dos portugueses. Gostava de ser amado, admirado pelos portugueses anónimos que diariamente o vêem na televisão. Acha certamente que esta incompreensão é fruto da acção de espíritos perversos que deturparam o sentido e o significado da compra das acções à SLN, da troca da Mariani pelos terrenos da Coelha e, pior que tudo, da pérfida interpretação do episódio das reformas.

Por isso esforça-se por ser simpático. Dizer coisas que agradam ao grande número, como: não é baixando os salários ou com salários baixos que se ganha competitividade. Ou que a saúde é um direito fundamental e que seria inaceitável que os portugueses sem recursos económicos não pudessem ser tratados nos hospitais.

Pois, só que malta não acredita naquelas palavras. A malta até sabe que aquelas palavras querem dizer o contrário do que parece. Pois se quem não tem recursos deve ser tratado de graça, quem tem deve pagar. Não é o que se deduz? Só que se isto for assim o SNS acaba. E esse entendimento não é contrário à Constituição?

Dando uma chance a Cavaco: se quer dar às suas palavras um sentido que não deixe dúvidas que não promulgue a reforma do código laboral, que faça um discurso formal contra as reformas da saúde ou vete os diplomas legais que as formalizam. Que diga expressamente que o SNS é um serviço universal e tendenciamente gratuíto.

Se fizer isto, depois voltaremos a falar…


quarta-feira, 6 de junho de 2012

AINDA A RECAPITALIZAÇÃO DOS BANCOS




O FACTOR NACIONAL NO DESENVOLVIMENTO DA CRISE



Mais do que uma ingenuidade é um erro de dimensões incomensuráveis supor que o factor nacional não desempenha nesta crise um papel de primeiro plano. Sabendo nós o que se passou antes de 1914 numa fase de desenvolvimento do capitalismo historicamente semelhante a esta – sem analogias exageradas e menos ainda de anacronismos – em que o capitalismo se debatia no mundo ocidental com a ameaça crescente do socialismo, é difícil não compreender que a apregoada solidariedade do grande capital, nomeadamente do capital financeiro e especulativo, numa época em que se debate com um grau de ameaça próximo do zero, não ceda lugar a uma visão nacionalista, como a crise europeia eloquentemente demonstra.

Voltemos à recapitalização dos bancos. Está em curso na União Europeia, muito por força do que desde há um mês se passa em França, um movimento que a cada dia que passa ganha mais aliados, tendente a permitir que o chamado “fundo de resgate” – a partir de 1 de Julho, Mecanismo de Estabilização Financeira (MEF) – possa emprestar dinheiro directamente aos bancos, retirando os Estados do circuito, como hoje impositivamente acontece. Diz-se na imprensa europeia, e dizem-no abertamente os actuais governantes espanhóis, para impedir que se caia na desgraçada situação em que estão a Grécia, a Irlanda e Portugal.

A proposta foi ontem adiantada por Olli Rehn, vice-presidente da Comissão responsável pelas Finanças e conta com o apoio de Durão Barroso. Fora da Comissão, ao nível dos Estados – e esse é o plano que verdadeiramente interessa – a proposta tem o apoio da França, da Itália e da Espanha, para só citar as maiores economias da zona euro depois da Alemanha. E até se pode dizer que os ditos mercados reagiram bem a esta proposta, assim como aos passos dados no sentido criação da união bancária, como de resto seria de esperar.

Pois bem, esta proposta que visa fortalecer o capital financeiro, embora assumindo ele próprio as responsabilidades pelo seu resgate, depara-se com a oposição declarada da Alemanha que não parece disposta a ceder um milímetro naquilo que desde o início da crise tem sido a sua imagem de marca: dinheiro somente a troco de soberania! A Alemanha quer fazer intervir os Estados como mutuários para lhes impor um severo condicionalismo traduzido como bem se sabe num conjunto de medidas semelhantes às já foram impostas aos países intervencionados, a partir daí transformados em verdadeiros Estados -vassalos.

A Espanha, pese embora a gestão atabalhoada que tem feito da crise do sistema financeiro nacional, não abdica da sua posição, confiante em que esta caminhada à beira do abismo acabará por ser travada por quem, em última instância, tiver mais a perder. Uma estratégia muito semelhante à do Syriza feita com outra linguagem, outros protagonistas, mas com os mesmos objectivos, embora servindo internamente interesses não inteiramente coincidentes.

Numa altura, portanto, em que na União Europeia se está pondo em causa um tratado que ainda nem sequer entrou em vigor, é inacreditável que o Governo Português tenha pressurosamente avançado com a ajuda aos bancos exactamente no momento em que, como tudo indica, poderiam ser eles a tratar da sua própria vida. Este comportamento do Governo português revela também a importância que para a direita do radicalismo neoliberal que nos governa tinha a intervenção estrangeira como modo de facilitar a transformação estrutural da sociedade, independentemente dos prejuízos nacionais que tal intervenção pudesse causar.

Portanto, as coisas são mais complexas do que parecem. Nesta crise há quem, condicionado por reflexos nacionalistas, sendo de direita, actue do mesmo modo que a esquerda e há também quem privilegie o internacionalismo para mais facilmente impor um programa de direita. Quem, porém, não tem dúvidas acerca da interpretação dos interesses nacionais numa perspectiva hegemónica – e não apenas puramente defensiva como alguns ingenuamente supõem – é a Alemanha, da mesma forma que outros, como a Espanha e a República Checa, para citar apenas os mais evidentes, a ela se opõem na defesa de interesses nacionais contrapostos, não obstante as identidades ideológicas dos respectivos governantes.

terça-feira, 5 de junho de 2012

A RECAPITALIZAÇÃO DOS BANCOS



QUEM PAGA?



 Sabe-se – e sobre isso não há qualquer dúvida – que foram os sistemas financeiros americano e europeu que estiveram e estão na origem da presente crise. Claro, que a crise que rebentou em 2007, na América, assim como a de 1929, embora tenham tido ambas a sua causa próxima no capital financeiro, têm no capitalismo liberal e na profunda desigualdade de distribuição de rendimentos a sua causa mais profunda. Certamente que as crises são diferentes, principalmente nas suas consequências, mas isso não significa que não tenham causas comuns.  

Mas voltemos à actualidade. Foi a falência do sistema financeiro – umas vezes ostensivamente exibida, como aconteceu com a falência de grandes bancos na América e de outras instituições financeiras de objecto múltiplo, mas também na Islândia, na Inglaterra, na Irlanda, na Holanda, na Bélgica, enfim, por toda a Europa; outras escondidas com a cumplicidades dos Estados e dos famosos reguladores, como se está a ver na Espanha, na Itália, na Grécia, em Portugal, em França, enfim, mais uma vez em quase toda a Europa – que levou à falência dos Estados e transformou a dívida pública no centro de todas as atenções da zona euro.

A esta causalidade acresce, para agravar brutalmente a situação, a receita posta em prática para combater a crise, inspirada na pura ortodoxia neoliberal, com o propósito de aproveitar a situação existente para uma transformação estrutural da sociedade em que vivemos. Uma transformação que, não obstante todos os meios de que hoje se dispõe e dos extraordinários progressos alcançados pelas modernas sociedades, visa colocar o trabalho exactamente na mesma situação em que se encontrava há século e meio. No passado, isso acontecia em nome da acumulação primitiva, ou seja da necessidade de acumular capital que, juntamente com outras formas de rapina como a exploração colonial, permitisse a criação da massa crítica necessária aos profundos investimentos que o desenvolvimento do capitalismo impunha. Hoje, é em nome da competitividade que por toda a Europa o capital defende e tenta, até agora com relativo êxito, diminuir drasticamente os custos unitários do trabalho para aumentar brutalmente as margens de lucro, a exploração e a desigualdade social.

É neste contexto, muito sumariamente traçado, que os bancos estão a transferir para os cidadãos em geral, mas com fortíssima incidência nos rendimentos do trabalho, os prejuízos que acumularam em consequência de operações de altíssimo risco que proporcionaram lucros elevadíssimos aos seus executivos e aos especuladores, mas também em consequência dos financiamentos no sector imobiliário, ele também altamente especulativo, que obviamente colapsou mal estancou a fonte de financiamento que o alimentava, já para não falar nos empréstimos que contraíram para financiar o consumo e outras actividades que em nada beneficiaram as respectivas economias.

Estas diversas causas do colapso do sistema financeiro não têm a mesma incidência em toda a zona euro, nem as mesmas causas a mesma intensidade em todos os países. A bolha imobiliária, por exemplo, está particularmente presente na Irlanda e em Espanha, embora tenha reflexos em todo o sistema financeiro europeu.

E nem sequer se ouse dizer como alguns insinuam e os mais desavergonhados afirmam que foram os Estados que faliram os bancos. Esse argumento é falso, já que o activo constituído pelos créditos sobre os Estados continua a ser o mais seguro de todo o sistema financeiro, seja ele representado por títulos da dívida pública, seja por créditos sobre o sector público empresarial. Não só nenhum desses empréstimos ou títulos deixaram de ser pagos na data do vencimento, como uma parte considerável desses activos – os títulos da dívida pública – têm permitido aos bancos aceder aos leilões do BCE dando-os em garantia do dinheiro que recebem. Dinheiro que recebem a 1% e aplicam a taxa várias vezes superior.

O argumento de que os bancos são demasiado grandes para falir fez com que o Estado por todo os lado entrasse com o dinheiro necessário para os salvar. O modo como isso se tem feito também não é uniforme. Depende do grau de democratização das respectivas sociedades. Se as sociedades são democraticamente fortes, o Estado, embora “meta o dinheiro”, vê-se obrigado a criar simultaneamente condições de acesso à gestão do banco e de retorno relativamente satisfatórias, participando obviamente do capital social na medida dos capitais que proporcionou.

Pelo contrário, se as sociedades em que o fenómeno ocorre são democraticamente frágeis, como é o nosso caso, e se os respectivos governos actuam como agentes do capital financeiro, as operações de capitalização estão revestidas da maior opacidade, exactamente para se não saber que o Estado não impôs condições satisfatórias de retorno do capital investido, não participa da gestão nem tão-pouco passa a integrar o respectivo capital social na medida do contributo prestado.

Ou seja, neste tipo de sociedades em que do regulador aos respectivos governos todos actuam como agentes do capital financeiro reúnem-se facilmente as condições necessárias para um saque gigantesco. Saque em que as famigeradas “Troikas” se não metem, pois como agentes descarados que são do capital financeiro internacional nada têm a opor ao “fortalecimento” do sistema financeiro.

Este é um dos tais casos em que não basta apenas protestar, como se fez no BPN e no BPP, é preciso que o Ministro das Finanças ou o Primeiro Ministro expliquem “tim tim por tim tim” o que estão a fazer com o dinheiro dos portugueses. E os portugueses não querem saber muito, querem apenas, sem ambiguidades ,saber: a) quanto e a que bancos emprestaram; b) causas e natureza desses passivos; c) natureza jurídica da intervenção do Estado; d) condições de retorno (tempo e remuneração) do capital investido.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

PASSOS CONTRADIZ GASPAR?



E QUEM ACREDITA?
Passos contraria Borges e recusa "desvalorização adicional dos salários" (DE)

Depois da chuva de críticas que caiu sobre as palavras de Borges, inclusive de algumas das famosas bases do PSD e do CDS, que tem que tomar as suas precauções relativamente a tudo que não seja estritamente oficial, Passos Coelho, aparentemente, mas só aparentemente, não confirmou as palavras de Gaspar, que havia seguido Borges, embora dizendo o mesmo de outra maneira. Disse Passos Coelho que tal como já tinha afirmado no Parlamento na semana passada o “Governo não está a preparar baixas dos salários em Portugal”. E a seguir exemplificou com aquilo que o Governo já fez aos reformados e aos funcionários públicos para dar a entender que o que lhes fez já chega.

A verdade é que este desmentido não desmente nada: primeiro, porque o facto de Passos dizer que o “Governo não a está a preparar” não significa que não decida o amanhã ou depois de amanhã  fazer o contrário; e em segundo lugar, porque mesmo que a sua afirmação tivesse a amplitude que não tem – abranger todos o salários e não apenas os dos funcionários públicos e as reformas – nada garante que Passos não esteja a mentir como repetidamente tem feito desde que é presidente do PSD e Primeiro Ministro.

Nada do que até hoje foi dito pelo Ministro das Finanças deixou de se fazer. O que acontece é que o sector do Governo com um mínimo de sensibilidade política (Passos e Relvas) já percebeu que se continua a apertar muito lá se vai “o extraordinário povo português”. As coisas têm de ser feitas com uma certa cadência e na hora própria. E esta ainda não era a hora própria de Borges falar – coisa que Borges não percebe por ser um refinadíssimo (ver post anterior) que ganha dezenas de milhares de euros por mês e nem sequer lhe passar pela cabeça que é exactamente no mês de Junho que centenas de milhares de cidadãos portugueses estão a ser vilmente espoliados dos salários e reformas a que têm direito!

A CONFERÊNCIA DE IMPRENSA DE VÍTOR GASPAR




O QUE IMPORTA SUBLINHAR
Government nationalize banks to save economy (Express)



Deixando de lado as parvoíces da generalidade dos comentadores encartados que após cada conferência do Ministro das Finanças nos flagelam com explicações e justificações estúpidas e cretinas sobre o que ele disse, que já não paciência para ouvir, e sem entrar em linha de conta com o óbvio que consiste em considerar um êxito aquilo que cada dia mais agrava a economia e a vida dos portugueses – êxito cuja justificação está no facto de estarem a ser dados passos seguros no sentido da construção de uma sociedade esclavagista de tipo novo – o que importa verdadeiramente sublinhar são duas coisas da maior gravidade que passaram relativamente despercebidas depois da conferência de imprensa.

A primeira, para a qual já aqui chamámos múltiplas vezes a atenção dos leitores, é a de Gaspar mais uma vez ter reafirmado com toda a convicção um dos grandes mandamentos da ortodoxia neoliberal extrema: o relançamento da economia faz-se pela “melhoria” da oferta e não pelo estímulo da procura.

E a segunda é a de que há que diminuir os custos unitários do trabalho para assegurar a competetividade da economia.

As duas questões estão intimamente ligadas e ambas visam a construção da tal sociedade esclavagista de tipo novo.

Pela primeira, o que Gaspar quer dizer é que o Estado não vai de modo algum animar a economia com investimentos em infra-estruturas físicas ou sociais. O que significa que mesmo os tais project bond que a Comissão anda a preparar em Bruxelas juntamente com o BEI não serão acolhidos em Portugal ou se o forem terão de ser adaptados àquele princípio. Tudo o que cá se fizer para "promover o crescimento" será exclusivamente pelo lado da oferta – é claro que esta oferta estará privilegiadamente virada para o estrangeiro (exportações) tanto mais que estando a procura nacional deprimida pelas razões conhecidas poucas possibilidades ela terá de aceder àquela oferta. E a oferta que visa o mercado interno por via da substituição de importações não passa de uma miragem relativamente à maior parte dos produtos pelo tempo que isso leva a consumar-se, se é que com estas políticas alguma vez se vai consumar. Portanto, para Gaspar, o caminho certo é seguro para o crescimento é a austeridade

Pela segunda, intimamente relacionada com a primeira, Gaspar o que em última instância diz que vai fazer é diminuir os salários e se necessário for “estoirar” com a segurança social, baixando a TSU ou outros encargos.

Gaspar e Borges, a mesma luta, portanto. Com uma relevante diferença: Borges fá-lo por ser um refinadíssimo (ver post anterior); Gaspar, por ideologia, logo muitíssimo mais perigoso.

Em Portugal está a fazer-se com eleições o que no Chile para ser levado à prática precisou de um Pinochet. De facto, o “extraordinário povo português” é mesmo uma raridade sociológica!

Em Espanha, Rajoy mantém um duríssimo braço de ferro com a Alemanha quanto à intervenção que ele está recusando e a Alemanha exigindo para para libertar o dinheiro para os bancos, ou seja, "dinheiro por soberania", não apenas por orgulho nacional, mas também porque ele sabe que se, depois do que já fez nas despesas sociais, tocasse nos salários e nas reformas, como a Troika iria exigir, não poderia governar. Enquanto cá esse é um problema que se não põe.

Digamos as coisas como elas são: Gaspar é um dos mais perigosos e nefastos ideólogos do neoliberalismo. Mesmo que Gaspar entenda que esse é o caminho para o BEM - e relativamente aos fanáticos devemos sempre acreditar que eles são sinceros – essa é mais uma razão para que todos os meios, sem excepção de nenhuma espécie, sejam congregados com vista ao derrube desta gente. A História demonstra que não há nada mais perigoso no Homem do querer fazer o BEM. Milhões e milhões de pessoas foram durante séculos sacrificadas a esse pretenso objectivo supremo!
Fora com eles!!!