AGORA É A OI, MAIS A
VIVO E A PT
Continuando a seguir o processo “Operação Marquês” pelo
Correio da Manhã – e não há até hoje nenhuma razão para considerar infundadas
as notícias nele divulgadas sobre as fases investigatórias por que este
processo tem passado – não pode deixar de considerar-se que se está perante um
processo completamente à deriva – um processo que tendo partido de uma ideia
vagamente apoiada em factos e não tendo, não obstante o tempo já decorrido,
sido capaz de se fixar num rumo relativamente seguro nem de coligir um conjunto
de factos processualmente credíveis e penalmente relevantes, se vai alimentando
de investigações ou pseudo-investigações que noutros contextos, inclusive
noutros países, vão sendo feitas.
Do ponto de vista jurídico já dissemos tudo o que sobre o
assunto havia a dizer. Na primeira hora e nas horas subsequentes. Tudo o que
então foi dito não apenas mantém actualidade, como viu essa actualidade reforçada pelo conhecimento que se vai tendo da investigação.
A tese de que de que a investigação partiu, completamente
sufragada pelo juiz de instrução criminal, se não mesmo mais do que isso, é
conhecida e logo foi evidenciada no nosso segundo escrito sobre este assunto.
A ideia base é esta: há aqui um tipo, que foi ministro e primeiro-ministro
deste país, que está, desde que deixou de exercer funções governamentais, a
viver manifestamente acima das suas possibilidades; além disso tem ar de
malandro, tem um grupo de amigos tão ou menos recomendáveis do que ele;
seguramente estará metido em quanta porcaria existiu durante os seus mandatos;
com base em alguns factos conhecidos, que serão amplamente difundidos pela
imprensa, fundamentar-se-á a sua prisão; e com ele na cadeia investigar-se-á toda
a sua vida, as suas amizades, os negócios em que participou em nome do Estado
português… e alguma coisa se há-de encontrar; como isto é muito complexo, poder-se-á
contar com o prazo de um ano, eventualmente de ano e meio, para fazer a investigação
e deduzir a acusação. Mãos à obra!
E assim se fez. Quem se der ao trabalho de coligir e enumerar
os múltiplos negócios sob suspeita, geradores de proveitosos réditos, e a
facilidade com que se deixam cair uns e se pegam noutros, chega inevitavelmente
a duas conclusões:
Primeira – Para recoltar todos esses proventos, quer pelo seu
número, quer pela sua magnitude, seria necessário dispor de uma poderosa
organização que manifestamente se não compadece com a omnipresença diligente de
um estimado amigo; logo, será necessário ampliar, e muito, a investigação;
Segunda – A frequente passagem de um tema para outro, a dificuldade
em se fixar num assunto, em estabelecer e fixar factos susceptíveis de
integrarem um tipo legal de crime, leva a investigação a saltitar de um negócio
para outro, com a ansiedade e o pânico típicos de um náufrago à deriva que
sente afastar-se cada vez mais da linha da costa – em resumo, está-se perante
um processo completamente à deriva.
Conclusão: Como tudo o que está sendo feito é absolutamente inaceitável
num Estado de Direito, como é hoje evidente que se prendeu para investigar, tem
de concluir-se, qualquer que seja o desfecho deste processo e não obstante as
decisões intercalares já proferidas (quase todas juridicamente lamentáveis),
que se está muito próximo de uma situação de “cárcere privado”,
convenientemente disfarçada pelo exercício de um poder discricionário
inconcebível em processo penal.