segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A GUERRA NO AFEGANISTÃO



DE MAL A PIOR

Já há muito se sabia que a guerra no Afeganistão estava a ser perdida pelos americanos e seus aliados da NATO. Incrivelmente, Obama, que sempre se manifestou contra a guerra do Iraque, não teve a clarividência suficiente para se afastar gradualmente do Afeganistão. Pelo contrário, foi dizendo que essa era uma guerra para ser ganha e que os Estados Unidos e seus aliados se deveriam empenhar cada vez mais nesse objectivo.
Pode compreender-se que, durante a campanha eleitoral, face ao clima criado por McCain e H. Clinton, Obama não tivesse uma grande margem de manobra para “fazer a guerra” a mais esta guerra. Num país onde o complexo militar-industrial tem um peso enorme, frequentemente decisivo na condução da política americana, compreende-se que a hostilização da guerra do Afeganistão se prestaria a todas as demagogias e poderia custar-lhe a presidência da república. Mas daí à apologia da guerra, numa altura em que já havia sinais mais do que evidentes de que a sorte das armas estava a mudar, vai uma grande distância. Que agora se virará contra ele.
Os seus pedidos aos europeus de maior empenhamento não foram ouvidos em Berlim, nem em Paris. E, um pouco mais tarde, passaram também a ser muito incómodos para Londres, a primeira capital a, oficialmente, ter posto em causa a estratégia da guerra. Não que sem antes soldados britânicos desertores ou refractários o tivessem feito.
De facto, na Europa já ninguém acredita naquela guerra e todos querem livrar-se dela, salvo, porventura, Severiano Teixeira, o “grande guerreiro lusitano”.
Pois bem, agora também o responsável pelas tropas americanas no Afeganistão, general Stanley McCrysthal, vem dizer a Obama que a estratégia da guerra está errada. Que a guerra não deve ser feita para andar aos tiros aos talibãs, mas para proteger as populações dos talibãs!
Como nada disto faz o menor sentido e até faz lembrar, num contexto muito mais desfavorável, a estratégia contra-revolucionária posta em prática por algumas potências coloniais contra as guerras de libertação nacional, só resta à NATO constatar a sua derrota e tirar daí as consequências devidas. Ou seja, como vai a NATO e os seus guerreiros sobreviver a esta aventura?

OS EX-PCP: A PROPÓSITO DE UMA ENTREVISTA



O QUE OS MOVE

Não é nada fácil falar sobre este tema. Tenho amigos ex-PCP, vivos e mortos. Lidei de perto com muitos deles, quando ainda não eram PC, enquanto foram PC e depois de terem deixado de o ser. Outros, somente os conheci como PC e, depois, como ex-PC.
A gente a que estive mais ligado deixou o PCP, por vontade própria ou por imposição do partido, nos idos da perestroika, já muito perto do final da década de oitenta. Alguns deles eram amigos de longa data, com quem mantive relações pessoais e políticas muito estreitas, tanto antes como depois do 25 de Abril. Outros, só os vim a conhecer melhor quando, com Gorbachov, a União Soviética ia caminhando para o seu fim.
Quando, nesta época, uma onda de contestação interna “sacudiu” o PCP, alguns acalentaram a ilusão da formação de um novo partido. Um partido capaz de congregar amplos sectores da esquerda que não se reviam nem no PC, nem no PS. A produção teórica, porém, era quase nula. Havia uma consciência clara do que não se queria, mas era muito difuso e, eventualmente, pouco consensual, o projecto que se pretendia pôr em prática.
Alguns, como Zita Seabra e Veiga de Oliveira, estavam fundamentalmente empenhados em combater o PCP. Esse me parecia ser o seu único objectivo. Outros iam tacteando entre a defesa dos mesmos princípios através de diferentes meios operacionais e um agnosticismo próprio de quem sentia necessidade de um intervalo para fazer contas com a vida e consigo próprio. Outros ainda, veio-se a saber mais tarde, já tinham uma ideia muito clara do que pretendiam fazer. Apenas aguardavam a chegada do tempo próprio para a pôr em prática.
Vital Moreira foi o único que ensaiou, em textos aliás brilhantes, um começo de teorização sobre o que fazer. Textos que, hoje, provavelmente repudia. Outros escreveram memórias, relatando os factos com o mesmo espírito com que os viveram. Com seriedade e rigor, como Raimundo Narciso.
Breve no entanto percebi que o grande objectivo dos mais influentes, e também dos mais cínicos, era continuar a fazer política na crista da onda. Cavaco, por intermédio de Durão Barroso, tentou a aproximação a alguns deles. Que não chegou a concretizar-se, porque, entretanto, Guterres, a quem provavelmente terão feito chegar o interesse de Cavaco, negociou com eles um “protocolo” que lhes abria a porta a uma entrada em lugares elegíveis ou quase elegíveis nas listas do PS para o parlamento ou, noutros casos, para as autarquias.
Os grande impulsionador deste movimento foi Pina Moura, acompanhado pelos seus amigos mais próximos, e sempre muito acolitado, embora com pretensões de independência, por Judas.
De fora ficaram todos aqueles que, não sendo ex-PC e alguns (poucos) ex-PC, jamais aceitariam um acordo com o PS a troco de lugares, com total desprezo por qualquer compromisso programático.
Estava então muito claro o que pretendiam estes novos “independentes”do PS, mesmo aqueles que, tendo sucumbido à vontade dos mais fortes, acabaram por aceitar aquilo que sempre juraram repudiar. Queriam obter todas as vantagens que a política, pessoalmente, lhes pudesse trazer. Para trás, lá muito para trás, tinham ficado velhas ilusões e utopias, a que definitivamente punham cobro numa idade em que a ambição falava mais forte.
É certo que nem todos podem ser medidos pelo mesmo diapasão. Há quem tenha partido para esta “aliança” com o PS com grandes ambições pessoais e políticas, nomeadamente os que estavam convencidos de que com a sua grande capacidade de militância e métodos de trabalho trazidos do PCP rapidamente alcançariam uma posição de relevo no PS. Outros, mais modestos e, porventura, mais realistas, tentaram criar localmente a sua própria base de apoio com vista a uma menor dependência futura das cúpulas partidárias. Outros ainda, ingenuamente, acreditaram que o trabalho honesto e persistente os guindaria a um lugar de destaque e lhes asseguraria o respeito dos militantes.
O futuro, como em tudo na vida, se encarregou de clarificar as coisas. Os ingénuos, depois de aproveitado o efeito do corte com o PCP, foram sendo gradualmente dispensados e até, em alguns casos, humilhados. Os que foram capazes de construir a sua pequena base de apoio autárquica ou legislativa foram resistindo às oscilações das cúpulas e, com o tempo, acabaram por se integrar completamente no espírito do PS, nada os distinguindo hoje dos tradicionais militantes. Os mais ambiciosos, que acalentavam grandes esperanças, depois de anos de luta e de intriga, acabaram concluindo que, sem soldados, não se pode ser general. Daí que tenham partido para outros tipos de aliança. Tendo-se aproveitado dos lugares que chegaram a desempenhar, criaram fortes ligações à alta finança ou, quando o palco de actuação era mais restrito, como acontecia nas autarquias, ao capital e interesses imobiliários.
Por tudo isto não me espanta nada a entrevista de Pina Moura ao Expresso, como não me espantaria que outros, próximos dele, dissessem o mesmo, se, entretanto, a “roda da fortuna” os não tivesse relegado para fora da política. Ontem, derrotado o cavaquismo, a rivalidade com Jorge Coelho fazia todo o sentido. Hoje, na previsibilidade de não haver vencedores claros, o bloco central é o que melhor serve a sua “estratégia”. No fundo, num e noutro caso, são as “preocupações de governabilidade” que imperam.

sábado, 29 de agosto de 2009

O ACESSO DE TROPAS AMERICANAS A BASES MILITARES COLOMBIANAS




O SIGNIFICADO DO ACORDO

Nos últimos 15 anos os Estados Unidos descuraram relativamente as relações com a América Latina. Não se poderá dizer, como alguns afirmam, que a América se esqueceu do que se passava no pátio traseiro da sua casa e quando quis retomar as antigas relações já encontrou uma realidade muito diferente daquela com que estava a habituada a lidar.
A questão se não pode pôr bem assim. Durante a guerra fria, a América estava particularmente atenta a tudo o que se passava na América Latina, um continente vizinho do seu, e, com excepção de Cuba, cortou cerce qualquer veleidade de políticas não alinhadas ou hostis, qualquer que fosse o país que as tentasse. E não olhava a meios para o conseguir. A ditadura militar ou civil e o golpe de Estado foram as armas mais frequentemente usadas para subjugar os povos latino-americanos.
Com a vitória na guerra-fria e consequente exaltação da democracia representativa como forma legítima de governo, os Estados Unidos deixaram, por um lado, de poder apoiar por qualquer meio, com a mesma naturalidade com que antes o faziam, o acesso ao poder das corruptas oligarquias locais suas aliadas, e, por outro, como estavam extraordinariamente empenhados na exploração do sucesso no leste europeu e na própria área antes compreendida pela URSS, acabaram por dar prioridade a esta nova “conquista” de modo a torná-la tanto quanto possível irreversível.
Mais tarde, em consequência da “guerra contra o terrorismo”, a América teve de canalizar as suas energias para outras partes do mundo e empenhar-se em combates que desgastaram e continuam a desgastar uma parte considerável das suas energias.
E viu-se, mesmo para um grande país como a América, que não era fácil manter-se activo, com a mesma intensidade, em várias partes do mundo.
Estas as razões por que a América não pôde concentrar-se na América Latina com a mesma “atenção” com que antes o fazia. Depois, a relativa aleatoriedade dos processos eleitorais encarregou-se do resto. E, assim, vários países com objectivos e também com processos diferentes, foram saindo da órbita estritamente controlada pelos americanos.
O Brasil, como grande potência regional emergente, cioso de desempenhar um papel de relevo na América Latina, à revelia e sem a tutela de Washington, liderou a criação da União das Nações Sul-americanas, com propósitos integradores e de diálogo exclusivamente sul-americanos. Disso é prova o Conselho Sul-americano de Defesa, que tem por objectivo dar respostas conjuntas aos problemas de segurança regional.
Por outro lado, a Venezuela e os seus aliados, com a Revolução Bolivariana, deram uma forte machadada nas ambições político-económicas americanas de criação de uma grande zona de comércio livre, dominada pelo norte.
Por outras palavras, este profundo movimento latino-americano pretende pôr um ponto final na famosa doutrina Monroe, que regeu a política americana relativamente ao sul do continente no último século e meio e substituí-la por uma política que reforce a autonomia dos países do sul do continente e os torne verdadeiros sujeitos do acontecer histórico.
É neste contexto que tem de ser interpretados os acordos que permitem o acesso de tropas americanas a várias bases colombianas. Bem podem os americanos dizer que as bases só serão utilizadas para a luta contra o terrorismo e o narcotráfico, que na América Latina já ninguém tem dúvidas de que a Colômbia está actuando como cavalo de Tróia dos americanos. No fundo, as alianças extra-regionais que a ONASUL queria evitar, estão de volta pela mão de Álvaro Uribe.
Chávez é o protagonista ideal para justificar esta política. No fundo, a aliança entre os Estados-Unidos e a Colômbia não é verdadeiramente para combater Chávez, como inimigo principal, mas para socavar a independência da América-Latina, tal como ela se vinha manifestando e construindo nestes últimos anos.
Não será difícil prever que, perante este quadro, o Brasil tente a todo o custo impedir o confronto entre a Colômbia e a Venezuela, para evitar a constatação de fracasso da sua política regional e a Venezuela defenda posições mais radicais, certa de que a verdadeira independência não poderá ter lugar sem o afrontamento da América e seus aliados do sul.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

QUEIROZ, O NÁUFRAGO



A CAMINHO DO ABISMO

Carlos Queiroz já deu sobejas provas de que é incompetente, tanto como treinador de equipas de clube como de selecção. A substituição de Scolari não era fácil, mas dificilmente poderia ter sido pior. Nisso Queiroz não tem qualquer responsabilidade, nem sequer a de aceitar um lugar para o qual não está capacitado, porque ele pensa que está. A culpa vai inteirinha para a Federação e para o seu inenarrável presidente, que há muito deveria também ter sido substituído.
Depois de Scolari, o mínimo que se exigiria era que a escolha tivesse recaído sobre alguém que percebesse o que é uma equipa de selecção, algo que nos dias de hoje não é uma realidade substancialmente diferente de uma equipa de clube, com a vantagem de, a cada momento, poder dispor de uma base mais ampla de recrutamento. Mas esta vantagem tem de ser administrada sabiamente, sob pena de se transformar numa grande desvantagem. Além desta capacidade, o seleccionador, em países como Portugal, tem de ser uma personalidade consistentemente independente e com provas já dadas nesse domínio. Enfim, tudo características que Queiroz não possui.
A recente convocação de Liedson é a prova do que acaba de ser afirmado. Queiroz actuou mais como um náufrago, que busca desesperadamente uma tábua de salvação a que se agarrar, do que como um comandante que sabe manter o sangue frio para encontrar o rumo certo para sair da tormenta.
Não se trata de fazer a defesa de qualquer tipo de nacionalismo retrógrado. Trata-se antes de fazer ou de recompor uma equipa. Está convencionado que as selecções nacionais só podem ser constituídas por cidadãos nacionais do país que representam. A nacionalização apressada de um jogador de futebol apenas ditada pelo objectivo ou, mais do que isso, a promessa, de ser convocado para a selecção do país cuja nacionalidade pode juridicamente obter, é uma verdadeira fraude à lei, independentemente de estarem presentes os requisitos formais que a permitem.
E estas coisas reflectem-se sobre a equipa, digam os jogadores o que disserem. Além de que Liedson tem todo o ar de se estar positivamente nas tintas para a selecção nacional, como de resto já esteve, em momentos chave, para o Sporting. Se tudo correr bem, ficará satisfeito; se correr mal, esse será seguramente o lado para o qual ele dorme melhor. Escolhendo um jogador que nada tem, nem terá, com a equipa, Queiroz despreza novos talentos que todos os anos despontam no futebol português e copia na própria selecção a pior política desportiva de alguns clubes.

AS ELEIÇÕES NO AFEGANISTÃO




MULTIPLICAM-SE AS ACUSAÇÕES DE FRAUDE

Já por várias vezes aqui falámos do Afeganistão e das suas eleições. Se a intervenção militar no Afeganistão se encaminha para um desastre dos americanos e dos aliados da NATO que com eles colaboram, a tentativa de legitimação do governo segundo processos típicos das democracias ocidentais não lhe fica nada atrás. Para além do que tudo isto tem de falso e postiço, há ainda a fraude eleitoral em grande escala, que órgãos de informação tão insuspeitos como o Washington Post ainda hoje denunciam.
O que é estranho é o silêncio cúmplice de todos aqueles que ainda há uns escassos dois meses protestavam, sem provas seguras, contra o resultado das eleições no Irão. A menos que o critério de aferição da verdade eleitoral seja a presença ou a ausência de manifestações dos prejudicados. Mas como fazer manifestações no Afeganistão, se a NATO até as simples festas particulares, como casamentos, tem impiedosamente bombardeado...sempre por engano, claro?

COMPROMISSO COM A VERDADE

DOCUMENTOS APREENDIDOS NA CASA DE DIAS LOUREIRO


Segundo a imprensa do fim-de-semana, foi descoberta na casa de Dias Loureiro uma porta de um compartimento oculto dentro do qual se encontravam documentos relevantes para o processo BPN.
Com estes poderosos auxiliares de memória, Dias Loureiro, finalmente, passará a dispor dos elementos de que necessita para assegurar e garantir processualmente o seu "compromisso com a verdade"!

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

STIGLITZ: ALGUMAS IDEIAS A RETER


À CONSIDERAÇÃO DO PS E DOS SEUS INTELECTUAIS ORGÂNICOS, FILIADOS OU NÃO

Diz Stiglitz que a retoma é uma ilusão. Que a crise vai ainda durar anos. Que as melhorias verificadas em certos países não são suficientes para acabar com a recessão.
Para a maioria das pessoas, há recessão quando se verifica uma elevada taxa de desemprego e quando é difícil encontrar um emprego. Para as empresas há recessão quando existem capacidades excedentárias”.
Stiglitz apela também ao desmantelamento dos grandes bancos para reforçar a transparência dos mercados.
Enfim, um discurso que apenas serve para reforçar o voto na direita ou para o desviar para o PCP ou para o BE. Por outras palavras, um discurso para hostilizar o PS. Os seus intelectuais que o digam…

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

O NOTICIÁRIO INTERNACIONAL

CHÁVEZ E A COLÔMBIA

As grandes agências internacionais de notícias do mundo capitalista ocidental e os órgãos de informação nacionais do respectivo espaço territorial sempre que têm de relatar factos relativos a países ou regiões não alinhados com a política ocidental deturpam completamente a realidade com total falta de pudor. Relativamente ao noticiário interno dos países de que são oriundas essas agências ou outros órgãos de informação, ainda é possível encontrar algum pluralismo, em virtude de representarem interesses diversos. Todavia, quando se trata de relatar factos respeitantes aos tais países não alinhados ou hostis, esse pluralismo desaparece por completo. E todos, mas todos, sem excepção, dão uma versão distorcida dos factos.
Toda a gente sabe que a Colômbia permitiu às forças armadas americanas a utilização de sete bases militares, numa verdadeira operação de cerco da Venezuela e, simultaneamente, privilegiando a instalação do poderoso vizinho do norte numa zona estrategicamente muito sensível – a Amazónia – onde confluem interesses da vários países sul-americanos, a começar pelo Brasil.
A cedência das bases militares pela Colômbia originou um intenso mal-estar não apenas nos países limítrofes, mas em toda a América Latina. Hugo Chávez tem denunciado com firmeza a atitude da Colômbia e dos Estados Unidos e tem interpretado o “cerco” como uma verdadeira declaração de guerra. Ontem, num acto público disse, no seu estilo, que não há lugar para mais abraços e que a Venezuela tem de se preparar para o corte de relações com a Colômbia.
Pois a dita imprensa ocidental noticia a posição da Venezuela dizendo que “Chávez faz subir a tensão com a Colômbia a três dias da cimeira ONASUR”.
Só falta concluir que a Colômbia “baixou” a tensão quando cedeu as sete bases aos americanos…

A IMPUNIDADE ABSOLUTA

ATÉ QUANDO?


Aqui há dois ou três anos o Futebol Clube do Porto “comprou” ao Nacional da Madeira um avançado, então muito cobiçado por outros clubes do continente. O dito jogador nunca se afirmou no Porto, apesar de ter jogado com alguma regularidade no primeiro ano da transferência.
Constatado o relativo fracasso, para as exigências do clube nortenho, o FCP propôs-se emprestá-lo a outros clubes para atenuar as despesas da contratação. Só que o jogador recusava-se a sair durante a vigência do contrato. Este ano o treinador disse-lhe abertamente que não contava com ele e pô-lo à treinar à parte. Mesmo assim o jogador insistia em ficar.
Até que, aqui há uns oito ou quinze dias, à saída de uma discoteca de Vila do Conde, acompanhado da mulher, apanhou um valente “arraial de porrada”, que o levou ao hospital com ferimentos diversos e traumatismo craniano.
A primeira declaração do jogador após o sucedido foi logo para dizer que não apresentaria queixa contra os agressores. Agressores que ele terá reconhecido.
Passado dias, o jogador aceitou ser emprestado ao Sporting de Braga.
O ano passado um outro jogador do mesmo clube, também “comprado” a um clube madeirense, rescindiu unilateralmente o contrato que o ligava ao FCP e negociou novo contrato com o Atlético de Madrid. Interrogado, mais tarde, pela imprensa portuguesa, acerca das razões que levaram à rescisão, o jogador esclareceu que, por se ter recuado a prolongar o seu vínculo contratual com o FCP, foi ameaçado de levar um tiro no joelho.
Ontem ou anteontem, à saída de um tribunal da área metropolitana do Porto, o carro que transportava o presidente do FCP atropelou um jornalista e desobedeceu à ordem de parar dada por um agente da PSP. No dia seguinte, nem o jornalista verdadeiramente tinha sido atropelado, aliás ainda ponderava se deveria ou não apresentar queixa, nem a PSP terá dado uma ordem explícita de paragem. Tanto o agente da polícia como o jornalista trabalham no Porto.
Muito sinceramente eu sugiro ao MP que sempre que tenha de investigar estes casos, que aos olhos de muita gente não passam da ponta do iceberg, destaque gente de fora, no velho estilo do juiz de fora. E que as equipas de investigação vejam atentamente os sete volumes da série “Os Sopranos”. Está lá tudo. Evidentemente, com outra violência. O emprego da violência é, de resto, uma questão de inteligência. Por que usar violência excessiva se os objectivos em vista podem ser plenamente alcançados de outro modo? É a aplicação inteligente do princípio da proporcionalidade…

terça-feira, 25 de agosto de 2009

O QUE O PS NÃO PRECISA


AS CERTEZAS DOS QUE MUDAM MUITO

Humilhado por uma derrota eleitoral sem precedentes, pior que a de Almeida Santos em 1985, e ressabiado pela inequívoca rejeição à esquerda e à direita dos seus pontos de vista, Vital Moreira é hoje uma personalidade politicamente inconveniente para o Partido Socialista. E o mais grave é que ele ainda não compreendeu. Como também não se tinha dado conta, antes e durante a campanha das europeias, que caminhava sem retorno para o abismo.
A tentativa arcaica, quase a roçar a argumentação do tempo da ditadura, a que empenhadamente se tem devotado nestes últimos anos da sua agitada e sinuosa vida política, de apresentar o PS como vítima de terríveis maquinações dos partidos à sua esquerda e, simultaneamente, único depositário dos grandes valores da esquerda, constitui hoje uma menos valia política e eleitoral para o Partido Socialista.
A fé ilimitada no mercado e nos seus “valores”, a confusão entre o Estado social e democrático e o Estado assistencialista e caritativo, a incapacidade de aceitação de um juízo plural na construção das modernas sociedades, o fanatismo demonstrado na defesa da auto-regulação capitalista, é tudo o que o PS não precisa, pelo menos, nesta fase pré-eleitoral. E é o que Vital Moreira tem para lhe oferecer!
Depois, a estafada argumentação tendente a fazer crer que o capitalismo moderno teve um devaneio neo-liberal do qual já está, felizmente, recuperado, a insistência na falsa ideia de que existe um modelo social europeu e de que a desregulamentação económica e financeira não faz parte da matriz comunitária, bem como a miopia política que não permite encarar a possibilidade de construção de outra Europa que não a saída do Tratado de Lisboa e seus antecedentes, retira qualquer viabilidade ao diálogo e acantona o PS, cada vez mais, nas práticas e concepções que verdadeiramente subjazem ao seu fracasso e acabarão por ditar a sua derrota.
De facto, o PS não perderá as eleições por o eleitorado escolher o BE e o PCP. O PS perderá as eleições por ter seguido uma política que constituiu uma verdadeira frustração para o eleitorado que nele acreditou e lhe deu o seu voto. O eleitorado de esquerda não muda de voto para entregar o poder à direita, mas para buscar novos actores que possam pôr em prática as política por que aspira!

AS UNIÕES DE FACTO E O VETO DE CAVACO



AS DUAS LEITURAS

Se Cavaco não fosse de direita e se tanto pelos exemplos de vida como de governação não tivesse dado sobejas provas de que é um conservador, certamente que o veto com que hoje inviabilizou o novo regime das uniões de facto teria uma leitura muito diferente daquela que um largo sector da esquerda seguramente lhe vai atribuir.
Uma das leituras possíveis do veto de Cavaco é a que se fundamenta na visão conservadora do seu autor. Cavaco é manifestamente pelo casamento como modelo de organização familiar, logo dificultará tudo o que directa ou indirectamente possa proteger outras “formas de acasalamento”. Tem de reconhecer-se que se trata de uma argumentação exageradamente ad hominem que despreza, sem os refutar, os argumentos apresentados.
Se, pelo contrário, Cavaco fosse, já não digo um libertino, mas um libertário, ninguém duvidaria da sua argumentação e muitos tenderiam a ver nela uma exaltação da liberdade individual em matéria de relações pessoais. É que não se pode esquecer a “boutade” daqueles que, vendo o legislador rodear de tantos direitos e obrigações uma união, que, tanto quanto possível, se quer um espaço livre de direito, acabam dizendo: “Ora bolas, para ser livre tenho mesmo de me casar!”.
Numa sociedade como a nossa, a união de facto já não é mais hoje aquilo que começou por ser há muitos anos atrás. Não se pode olhar hoje para a união de facto com o mesmo espírito proteccionista com que ela poderia ser encarada no passado. Hoje, a igualdade dos que nela participam está a maior parte das vezes assegurada à partida. As situações de “sujeição” são muito mais raras. E a liberdade de quem em matéria de relações pessoais pretende poucos constrangimentos deve ser respeitada.
Por outras palavras, devemos fazer intervir o Estado na economia, tanto na produção, como na distribuição, segundo as necessidades de cada época, mas devemos evitar a sua intervenção excessiva nas relações estritamente pessoais.
Evidentemente, que a ingenuidade não deve ser nosso forte e todos temos consciência de que a fundamentação do veto não passa de um exercício de hipocrisia. Mas sendo a hipocrisia o tributo que o vício presta à virtude, não será de ter em conta a virtude que o veto também encerra?

EM DEFESA DO PROF. TEIXEIRA RIBEIRO



A PROPÓSITO DE UM ARTIGO DE J.M. JÚDICE

Tomando como pretexto a recente polémica sobre as putativas escutas a assessores da Casa Civil do Presidente da República, J. M. Júdice, em artigo publicado na passada sexta-feira no jornal “Público” (“Belém – São Bento: uma guerra sem quartel?”), desfere, sem citar o visado, um violento ataque contra Teixeira Ribeiro, já falecido, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (Economia Política e Finanças), Vice-primeiro Ministro do V Governo Provisório e Reitor da Universidade de Coimbra depois do 25 de Abril.
É um ataque pérfido, injusto e factualmente infundamentado e infundamentável.
Diz Júdice que, na primeira reunião geral de docentes da FDC (obviamente posterior ao 25 de Abril, antes não existiam), Teixeira Ribeiro acusou caluniosamente Afonso Queiró, ex-director da Faculdade, de lhe mandar escutar as chamadas telefónicas feitas a partir da sua extensão. Perante tal “ignomínia”, Queiró chorou, ele, que segundo o mesmo Júdice, “sempre protegera da polícia política os professores comunistas”. Ainda segundo o A. do artigo, aquele “foi um momento de charneira (para a faculdade), porque nesse ataque morreu a unidade que a caracterizava”. A partir daí segue-se uma série de graves insultos dirigidos a Teixeira Ribeiro.
Não há nada como contextualizar os factos e os actores, para bem os interpretarmos e compreendermos.
Teixeira Ribeiro era um professor rigoroso, austero, exigente, excessivamente legalista para o (nosso) gosto da época, com simpatias socialistas (uma espécie de “socialismo catedrático”), admirador de Oliveira Martins e Leonardo Coimbra, e até de Mário de Figueiredo, a quem reconhecia invulgares qualidades intelectuais; nunca foi um militante antifascista, embora sempre tenha apoiado, mais ou menos ostensivamente, os estudantes que lutavam contra o regime. Depois do 25 de Abril aderiu convictamente à Revolução. Participou no V Governo Provisório, na coordenação das pastas económicas, com o mesmo rigor e a mesma atitude com que ensinava Finanças Públicas.
Júdice, à época, era um activista de extrema-direita do Partido do Progresso, que veio mais tarde a ser ilegalizado (caso raro no pós-25 de Abril), interveniente na organização da manifestação da “Maioria Silenciosa”, aliás apanhado em flagrante delito contra-revolucionário, do qual se “safou” graças à benevolência de uma conhecida figura pública, hoje injustamente tida por “incendiário”…por se limitar a dizer em voz alta umas quantas verdades. A militância de extrema-direita do A. do artigo é, de resto, bem anterior à Revolução dos Cravos: como estudante militou contra Marcello Caetano, ao lado dos ultras do regime, fazia parte da Cidadela, cooperativa que albergava a extrema-direita coimbrã, e foi acusado de atacar livrarias que tinham à venda alguns poucos livros que a pseudo-abertura marcelista permitira publicar.
Afonso Queiró, professor da FDC, era uma alta figura do regime salazarista, cuja apologia fazia no seu ensino, embora a coberto de construções teóricas intelectualmente muito acima dos seus pares da época. Membro da Câmara Corporativa e rival de Marcello Caetano no ensino de Direito Administrativo, nunca aderiu ao marcelismo e parece ter vivido os anos que antecederam o 25 de Abril no pressentimento da “catástrofe” que se anunciava. Se conspirou ou não contra Marcello não o posso afirmar, mas já não tenho dúvidas em declarar que no exercício de funções políticas e politico-académicas nunca se poupou a esforços para fechar todas as brechas por onde gradualmente o regime se esboroava.
Nunca nos meus 7 anos de Coimbra (5 como estudante e 2 como docente) vi Queiró “mexer uma palha” para defender um estudante acusado pelas “autoridades académicas” ou preso pela PIDE. É falso que Queiró tenha protegido da polícia política professores comunistas. Pelo contrário, tomou a iniciativa de expulsar da Faculdade professores oposicionistas, como foi o meu caso, fazendo funcionar para o efeito um conselho de faculdade anómalo, segundo os usos da casa, já que essa era a única forma de assegurar a maioria que de outro modo lhe faltaria. E quase posso jurar que nunca ninguém viu, por motivos políticos, Queiró chorar durante o fascismo, salvo talvez na morte de Salazar!
É igualmente falso que a famosa “unidade da Faculdade de Direito” se tenha esboroado com as acusações de Teixeira Ribeiro. Em primeiro lugar, não há unidade com açaimos. Essa unidade não passava de uma ficção construída pelos salazaristas, para, além das demais forças da repressão, fazer calar os tímidos dissidentes. Mas mesmo essa falsa unidade deixou definitivamente de existir em 1969, primeiramente quando Queiró, prepotente e unilateralmente, alterou as regras dos examinandos durante a prática dos actos escolares, exactamente para proteger os fura-greves como Júdice e mais uns quantos e se deparou com a firme oposição de Teixeira Ribeiro manifestada abertamente perante os assistentes e demais professores simpatizantes com a greve. E, posteriormente, aquando da minha expulsão, proposta por Queiró e defendida pelos catedráticos de extrema-direita (Antunes Varela, Pires de Lima e Braga da Cruz) contra a defesa veemente da minha permanência na faculdade por parte de Teixeira Ribeiro, Ferrer Correia e Eduardo Correia.
Não participei na reunião de que Júdice fala, pois já estava expulso da faculdade há cerca de 5 anos, mas se eu tivesse de escolher entre o “choro” de Queiró e a palavra do criterioso e rigoroso Teixeira Ribeiro, eu não teria qualquer dúvida em subscrever esta última.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

CAVACO E O DESAFIO DE FRANCISCO ASSIS


FRASES DE ONTEM

A polémica sobre as putativas escutas de elementos da Casa Civil do Presidente da República pelo Governo, baseada na dupla suspeita de que assessores de Cavaco estavam colaborando na elaboração do programa do PS e de que o conhecimento do facto indiciava a vigilância dos ditos por parte de quem levantou a suspeita, foi ontem reactivada com uma importante declaração de Francisco Assis ao desafiar Cavaco a pronunciar-se sobre o assunto. De facto, é impensável que as declarações anónimas feitas ao Público por um membro da Casa Civil possam deixar de ter uma interpretação política que envolva Cavaco.
Conhecido como grande disciplinador e fervoroso defensor do secretismo dos assuntos de Estado, Cavaco, não tendo desautorizado publicamente quem, a coberto do anonimato, falou em nome de um importante órgão da Presidência da República ou, no mínimo, envolveu esse órgão numa grave acusação ao Governo, e ao manter o silêncio sobre as declarações do seu colaborador, dificilmente pode deixar de ser interpretado como concordante com o seu subordinado.
Obviamente, que o que está em causa não é a imparcialidade do Presidente da República, deste ou de qualquer outro, já que ela não passa de uma ficção em que ninguém acredita. Os Presidentes da República, este ou os anteriores, todos, com excepção de Eanes, ex-chefes partidários, não são imparciais. Aliás, se tivessem de ser imparciais não seriam escolhidos por eleição. A eleição divide, parte, assegura a vitória de uma parte contra a outra.
O que está em causa, agora e antes, é o exercício de funções no quadro das competências constitucionais. O Presidente da República no sistema político português não governa, nem exerce qualquer tutela sobre o executivo, salvo no caso de veto político (de reduzida eficácia prática, na maior parte dos casos, se o Governo tiver maioria absoluta no parlamento) e de exoneração, no caso extremo de irregular funcionamento das instituições. A tentação executiva do Presidente da República, deste ou de qualquer outro, deve ser implacavelmente combatida.

O AFEGANISTÃO E AS ELEIÇÕES



CRÓNICA DE UMA DERROTA ANUNCIADA


Qualquer que seja o resultado das eleições de hoje no Afeganistão, já não há qualquer dúvida de que a intervenção americana e seus aliados representa uma completa derrota das teses neoconservadoras sobre o relacionamento americano com os chamados “Estados párias”. De facto, a invasão do Afeganistão para “construção” de Estado de tipo ocidental, democrático e institucionalmente forte revelou-se um completo fracasso.
Não só o presidente eleito e presumivelmente reeleito para um segundo mandato é acusado de favorecer a corrupção e de estabelecer alianças com o que há de mais retrógrado no país, como do ponto de vista político-social os progressos (do ponto de vista ocidental) são quase nulos. O comércio da droga floresceu, a ajuda ao desenvolvimento não chega aos verdadeiros destinatários e o próprio governo em funções nem sequer tem capacidade política para impedir que em certas regiões do país vigorem leis atentatórias da dignidade humana. Com tudo isto se viram obrigadas a contemporizar as potências ocidentais cujos objectivos são cada vez mais confusos e variáveis.
Na Europa, desde há algum tempo, mas principalmente depois do relatório elaborado pela Comissão dos Negócios Estrangeiros da Câmara dos Comuns (RU), reina o maior cepticismo acerca do resultado desta intervenção. Pouco a pouco vai-se instalando a ideia de que os talibãs já ganharam a guerra. Os franceses estão maioritariamente contra a presença militar da França e Sarkozy já há muito deixou de dizer que a segurança do país passava pelo Afeganistão. Na Alemanha, sempre mais reticente, os liberais já advogam abertamente a retirada das tropas e um pouco por todo o lado cresce a convicção de que a continuação da guerra é inútil e está perdida.
Perante o atoleiro em que Obama se meteu, em grande medida por culpa própria, apenas restam os indefectíveis: Severiano Teixeira e JM Fernandes. Até Amado parece mais longe…

terça-feira, 18 de agosto de 2009

O PS E AS COLIGAÇÕES PÓS-ELEITORAIS


MAIS DO MESMO


É óbvio que tanto o PS como o PSD querem ganhar as eleições para que não venham a precisar um do outro para governar. São, à escala nacional, demasiado grandes para encarar como alternativa satisfatória a divisão do poder e tudo o que a ele anda ligado. Só que nesta contenda o PSD está mais bem colocado do que o PS: basta-lhe fazer maioria com o CDS para ter o essencial do que pretende; o PS, ou a obtém sozinho, ou vai ter que se aliar a alguém da direita para governar.
Esta inclinação do PS para a direita vem verdadeiramente desde a sua fundação e, principalmente, da sua génese. Com excepção de uns poucos elementos francamente solidários com os seus compatriotas, marcados por uma ideologia de feição igualitária de base moral, o restante PS sempre foi muito semelhante ao de hoje. Para a generalidade da gente do PS, antes, durante e depois do 25 de Abril, francamente importante era a institucionalização da democracia política representativa, a formação de partidos políticos, eleições regulares e o elenco das liberdades e direitos fundamentais de natureza política assegurados. Os direitos fundamentais económicos e sociais, bem como formas mais avançadas de democracia nunca passaram para o PS de uma pura retórica sem qualquer tradução prática ou apego de princípio.
E isto bastou e basta para distinguir o PS, antes e depois do 25 de Abril, dos partidos de direita, mas também não foi impeditivo da formação de alianças com aqueles mesmos partidos, mesmo quando essas alianças poderiam pôr em causa alguns dos princípios fundadores do PS, facto que por si só ajuda a perceber como pode funcionar o PS em situações limite.
A chegada ao PS, antes e depois do 25 de Abril, de elementos que tinham militado no PCP ou em grupos da extrema-esquerda dita marxista-leninista apenas agravou o pendor direitista do partido, como hoje muito bem se nota pelas posições dos que, oriundos desses sectores, continuam a ter um papel ideológico importante na conformação política do PS. De facto, os seus intelectuais orgânicos, tanto os filiados, como os que independentemente de qualquer ligação burocrática o apoiam, são gente marcadamente incapaz de abandonar aquela matriz. E quando o fazem é para acentuar ainda mais o tal pendor direitista do partido.
Ainda agora um deles vem tentar demonstrar por que não pode o PS aliar-se à esquerda, com base numa argumentação que na realidade nada prova e que apenas serve para reiterar a inamovível atitude política do PS desde a sua formação.
De todos os argumentos apresentados, apenas o primeiro faz algum sentido: o anúncio ou a admissão da viabilidade de uma aliança com o PCP ou o BE, ou com ambos, apenas serviria para afugentar o eleitorado “centrista” do PS. Aqui há duas grandes verdades, uma explicitada outra escamoteada. A verdade explicitada é a mais que provável perda de eleitorado do PS se houvesse aliança; a escamoteada é que o PS capta aquele eleitorado por ser o partido que é.
A partir daí nada mais interessa do ponto de vista argumentativo. Dizer que o PCP e o BE são visceralmente anti-PS ou que são partidos anti-europeístas não acrescenta rigorosamente nada à compreensão da impossibilidade de alianças. Como também não passa de pura música celestial a crítica a Guterres por falta de firmeza para justificar um novo governo de maioria relativa, bem como a tentativa de captar o eleitorado de esquerda com programas de direita, para alcançar uma maioria absoluta.
Estas posições do PS e dos seus intelectuais reforçam a convicção de que a aliança à esquerda somente é possível quando o PS perder a hegemonia eleitoral no seio da esquerda. Então, sim, a aliança será possível.

O "PÚBLICO", O PALÁCIO DE BELÉM E AS ESCUTAS


A CAMPANHA DO PÚBLICO

Não há dúvida: há muito nervosismo em Belém. E também não há dúvida de que o Público se aproveita desse nervosismo para entrar na campanha eleitoral.
A gente do PS suspeita, ou tem mesmo a certeza, de que gente de Cavaco participou na feitura do programa do PSD. Como a gente do PS soube disso, a gente não sabe. Mas sabe que há muitas formas de a informação circular e que até se pode dar (teoricamente) o caso de a suspeita não ter qualquer fundamento e a gente do PS que a pôs a circular saber disso. Pode. Mas também pode acontecer que a suspeita tenha fundamento. O melhor, então, é ouvir os círculos de Belém.
Pois os membros da Casa Civil do Presidente não estão com meias medidas: se o PS sabe dessa participação, é porque os traz sob escuta e vigiados. Tem que se reconhecer que esta é uma forma estranha de argumentar, a menos que com ela se pretenda confirmar aquela colaboração e simultaneamente arranjar uma desculpa para o desleixo de terem sido apanhados. Ou seja, é um tipo de contra-ataque que tende a desvalorizar o facto que está na origem do ataque e a passar o conflito para um nível de litigiosidade da qual já não se pode sair sem a vitória clara de um dos lados sobre o outro.
E é exactamente nesse plano que contam com a colaboração do jornal Público, que dedica ao assunto 4/5 da primeira página, em manchete de alto a baixo, mais as duas páginas seguintes. O Público não faz uma manchete descritiva, nem sequer interrogativa. O Público, com base nas declarações de um não identificado membro da Casa Civil do Presidente, sugere que a Presidência está ser vigiada pelo Governo. Ou seja, o Público sabe que um conflito institucional entre o Presidente e o Governo tende a favorecer o primeiro, qualquer que seja o motivo, mais ainda se esse conflito tem base um motivo torpe da responsabilidade de um dos lados.
O PSD lava as mãos, como Pilatos, e, como é óbvio, nega qualquer colaboração. Ou seja, tenta pôr-se à margem do conflito para tirar dele todo o partido possível, objectivo implicitamente prosseguido pelo Público e pelo membro da Casa Civil que lançou a suspeita. É tudo muito óbvio…

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A NACIONALIZAÇÃO DOS SECTORES ESTRATÉGICOS

UMA PROPOSTA ELEITORAL


Os partidos de esquerda, PCP e BE, propõem ao eleitorado a nacionalização dos sectores estratégicos da economia – banca, energia e, eventualmente, outros – como via de saída da crise. Sabendo-se, como se sabe, da responsabilidade do capital financeiro na eclosão da crise financeira e conhecendo-se, como se conhece, a incapacidade desse mesmo sector para apoiar a economia em geral, pelo menos enquanto se não reequilibra, é natural que os partidos de esquerda advoguem a sua nacionalização mesmo fora de um contexto de crise eminente das respectivas instituições.
As empresas dos demais sectores estratégicos, nomeadamente as energéticas, quer porque actuam em monopólio, quer porque apenas atendem aos seus próprios interesses - accionistas e executivos - justificam a nacionalização por se tratar de sectores vitais, verdadeiros serviços públicos, que devem por isso mesmo estar ao serviço de toda a colectividade e não apenas de uns quantos.
Tais medidas dificilmente deixarão de ser consideradas indispensáveis por todos aqueles que defendem o fim do neoliberalismo e a criação, em sua substituição, de um sistema económico verdadeiramente regulado. De facto, é uma grande ilusão supor que a economia se regula com entidades reguladoras “independentes” ou com reguladores do tipo “guarda Geleia”, como Constâncio. A economia regula-se com a intervenção do Estado no processo de produção de bens e serviços, eventualmente, na sua distribuição, e com gestores que à frente das empresas inequivocamente defendam o interesse público. A experiência passada, posterior a 1976, de gestores públicos ao serviço do capital privado, boicotando sistematicamente as empresas, endividando-as, desvalorizando-as e preparando o caminho para a sua privatização em condições ideais para quem se propunha comprá-las, é uma experiência que não pode ser repetida.
Também não pode constituir obstáculo à nacionalização as indemnizações dos accionistas e respectivas modalidades de pagamento. Embora, as modalidades concretas de pagamento acabem por ser influenciadas pelo contexto político em que ocorrem, há certamente um limite que em caso algum deverá ser ultrapassado, atentas as condições concretas em que ocorreram as privatizações: o Estado jamais deverá pagar um valor superior ao da aquisição acrescido dos investimentos realmente efectuados. E o pagamento deverá ser diferido no tempo.
É natural que haja quem tenazmente se oponha a qualquer nacionalização, mas a verdade é quem assim procede não adianta uma única razão intelectualmente válida de sustentação da respectiva tese. Em última instância são contra, porque a nacionalização vai contra os interesses privados. Por isso mesmo é que nacionalização é uma questão política e não económica!

COMEÇOU O FUTEBOL A SÉRIO


OS PRIMEIROS RESULTADOS

Com excepção do Benfica-Marítimo, houve grande equilíbrio nos jogos da primeira jornada, como os resultados atestam. Mesmo assim, o Porto livrou-se da derrota no último minuto do jogo por erro do árbitro e o Benfica, pela mesma razão, ficou, em princípio, privado da vitória a dois minutos do fim. Se fosse com o Sporting, mesmo a jogar como está (nada), teriam caído o Carmo e a Trindade, logo na primeira jornada.

domingo, 16 de agosto de 2009

CAVACO SILVA E A CAMPANHA ELEITORAL


O HOJE E O ONTEM

É difícil encontrar na história da democracia saída do 25 de Abril um Presidente da República que, face à proximidade de um acto eleitoral, tenha demonstrado tanta ansiedade quanta a que Cavaco Silva tem manifestado nestes últimos tempos.
Em minha opinião convergem aqui dois factores paradoxalmente contraditórios. Por um lado, o desvalor do acto eleitoral em si, como acto máximo da democracia representativa. As eleições são vistas por muita gente que fez a sua formação democrática no pós 25 de Novembro/75 como uma espécie de balbúrdia programada, perfeitamente desnecessária e a muitos títulos prejudicial, que só serve para desviar o país dos seus verdadeiros objectivos e interesses. Todavia, por força das convenções em uso, o acto tornou-se imprescindível para a legitimação de quem governa. Por outro lado, as próximas eleições, dadas as características muito particulares do contexto em que têm lugar, nomeadamente a sua proximidade das eleições presidenciais, acabam determinar ou, pelo menos, condicionar fortemente, o futuro político do Presidente.
Depois de uma convergência meramente táctica entre o Presidente e o Governo, imposta pela existência de duas maiorias e por uma opinião pública que dificilmente aceitaria outra atitude, o Presidente e o Governo começaram paulatinamente a divergir não apenas em consequência da diminuição da aceitação popular do governo Sócrates, mas também por a própria governação assentar em pressupostos cada vez menos aceitáveis por Belém. Mais grave ainda do que a divergência ideológica porventura existente, é o reconhecimento, por parte do Presidente, da sua incapacidade para influenciar o Governo.
Perante este cenário, agravado pela situação de crise, torna-se claro para qualquer observador minimamente atento que Cavaco passou a ter uma agenda executiva alternativa, que gostaria de poder pôr em prática por intermédio de um primeiro-ministro dócil e um governo reverente.
Com a chegada ao poder, no PSD, de M. Ferreira Leite, ficaram parcialmente criadas as condições para que aquele projecto se torne viável. Só falta que outra parte se concretize: a vitória eleitoral do PSD. Daí a ansiedade com que o acto eleitoral é aguardado.
Na verdade, do resultado do acto eleitoral parece depender o futuro político do Presidente da República. Se o PSD ganhar e fizer maioria com Portas, o Presidente, a contra-gosto, terá de “engolir” Portas, recandidatar-se-á e muito provavelmente “governará” como pretende nos próximos quatro anos.
Se o PSD ganhar com maioria relativa (com ou sem Portas), estamos perante a maior incógnita do nosso próximo futuro, já que duas hipóteses igualmente viáveis se perfilam. Uma, apoiada pela “esquerda” do PS e pelos sectores anti-Cavaco, defende a rejeição de qualquer governo minoritário PSD e a formação de um governo PS com o apoio dos partidos de esquerda (muito difícil de conseguir, nos termos que interessam ao PS). Outra, maioritariamente apoiada pelo núcleo duro do PS, defenderá a abstenção, com vista à criação do clima político que leve, a prazo, à dissolução da AR e o retorno do PS ao poder em condições confortáveis.
Em qualquer uma destas alternativas o PS defronta-se com uma incógnita de vulto: a agenda política pessoal de Cavaco. Recandidatar-se-á ou não a um segundo mandato? O mais provável é que Cavaco se recandidate com a promessa (ou ameaça) de dissolução do parlamento se os partidos não criarem condições para o funcionamento de um governo estável.
Na hipótese de o PS ser o partido mais votado sem maioria absoluta, não há menor dúvida de que formará governo e muito provavelmente governará até à eleição presidencial com a abstenção pontual da esquerda, não sendo de pôr de parte (hipótese pouco provável) a formação de uma coligação governamental com o CDS, desde este partido tenha os votos suficientes para assegurar a maioria absoluta. Perante aquele cenário (maioria relativa), o mais provável é que Cavaco se não recandidate, já que a eventual dissolução do parlamento pouco tempo depois da eleição presidencial corria o risco de funcionar contra si, por ser mais provável neste contexto a vitória do PS, e de se transformar numa espécie de deslegitimação da sua própria eleição. E como não é de acreditar que, política e caracteriologicamente, Cavaco tenha a capacidade suficiente para funcionar com um governo minoritário politicamente adverso, dada a consequência que poderia advir da dissolução do parlamento, o mais provável é que se não recandidate.

sábado, 15 de agosto de 2009

MAIS UMA DE CAVACO SILVA


AFINAL, COMO ENTENDE ELE A FUNÇÃO?

Cito de cor, mas o que vou referir ouvi no telejornal da boca do Presidente da República, com estas ou outras palavras.
Diz Cavaco que durante a campanha eleitoral não vai fazer declarações, a menos que se torne imperioso intervir. Tenho alguma dificuldade em compreender. Em primeiro lugar, por que não há-de o Presidente da República fazer declarações? As suas declarações tanto podem ser formais como informais, mas tanto umas como outras devem referir-se ao exercício das funções que desempenha e enquadrar-se nos poderes que constitucionalmente lhe competem. O Presidente da República não é um comentador dos actos do Governo e menos ainda dos da Assembleia da República ou do poder judicial, fora dos casos em que, relativamente aos dois primeiros (Governo e AR), tenha intervindo no quadro das suas competências. Também não é um comentador dos inúmeros factos que diariamente acontecem com interesse ou relevância política, salvo na estrita medida em que os ditos tenham a ver com o desempenho das suas funções. Por isso, não se percebe por que razão o Presidente se vai calar. Há alguma norma constitucional ou sequer alguma prática que imponha o seu silêncio durante o período eleitoral? Certamente que não. Portanto, Cavaco Silva não deve estar a referir-se a declarações que tenham a ver com o exercício das suas funções. E essas são, de facto, dispensáveis tanto durante o período eleitoral como fora dele.

CABO VERDE



A PROPÓSITO DA VISITA DA SECRETÁRIA DE ESTADO AMERICANA

De arquipélago paupérrimo, de grande interesse estratégico (sempre a guerra…), flagelado, durante o colonialismo português, por algumas fomes que ficaram na história, Cabo Verde é hoje um exemplo em África, por mérito próprio.
Normalmente, quando em África se fala ou se falava de um bom exemplo, de que o Gana era o caso mais paradigmático, queria fazer-se referência a um país que seguia sem tergiversações a cartilha neoliberal imposta pelas instituições de Bretton-Woods, com o apadrinhamento americano. Não foi por acaso que o Gana foi o primeiro país da África subsaariana visitado por Obama. E, todavia, o Gana, não obstante os muitos milhões ou talvez mesmo milhares milhões de dólares que ao longo destes últimos tinta anos lhe têm sido generosamente atribuídos, não passa de uma história de insucesso, se comparado com países de outros continentes que àquela época se situavam no mesmo nível de desenvolvimento e que hoje estão num nível incomensuravelmente superior.
Com Cabo Verde nada disso se passa. Cabo Verde venceu até hoje todos os grandes desafios que se propôs enfrentar e, seguro das suas capacidades, estabelece metas cada vez mais exigentes na sua caminhada para o desenvolvimento. Primeiro, foi a batalha da democracia representativa que venceu, apesar das difíceis condições materiais de que partia. Depois, tem sido a batalha do desenvolvimento, que gradualmente vai vencendo, apesar da escassez de riquezas naturais
Felizmente, que esta escassez não atinge o elemento humano, já que é a ele, ao seu engenho, à inteligência do homem cabo-verdiano que se deve o sucesso do país.
A recente visita da Secretária de Estado americana a Cabo Verde, país sem recursos naturais invejáveis pelas grandes potências, nem se dispondo a alienar as vantagens da sua posição estratégica à custa da perda da sua independência efectiva ou do respeito que deve a si próprio e ao seu povo, só pode querer significar o reconhecimento em que é tida internacionalmente a gesta do povo cabo-verdiano!
Ainda recentemente, um jornal chinês (não me recordo se a China Daily ou o South China Morning Post de HK), de fins de Julho, creio que na sequência da deslocação de uma delegação chinesa a CV, dedicava duas páginas à experiência cabo-verdiana e explicava por que razão a China tinha investido este ano em Cabo Verde mais que nos vinte e cinco anos anteriores. Parece que a velha aspiração de transformar o arquipélago num grande entreposto mundial de serviços vai gradualmente ganhando forma e sentido.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

AINDA AS LISTAS DO PSD/FERREIRA LEITE

AS DESCULPAS QUE A REACÇÃO ARRANJA

A entrada nas listas de candidatos, qualquer que seja o lugar, de pessoas acusadas da prática de crimes, ou até já condenadas, sem trânsito em julgado da respectiva sentença, é legal e tem até alguma tradição em Portugal. Não é, portanto, a legalidade ou a habitualidade da conduta o que está em causa.
O que está em causa, acima de qualquer outra razão, é a justificação que o respectivo partido ou candidato, no caso de se tratar de candidaturas independentes, apresentam ao eleitorado para fundamentar aquela escolha ou aquela decisão.
Se o partido ou o candidato apresenta a justificação básica: “nada na lei o impede”, o eleitor mais instruído logo percebe o que com essa justificação se pretende dizer. E o que se pretende dizer é o seguinte: nós não temos nenhum tipo de objecção moral a que nas nossas listas figurem criminosos, desde que ainda não condenados por sentença transitada em julgado, tanto mais que a função de julgar não nos cabe a nós, mas ao tribunal! E o que esta escondida argumentação deixa ainda mais escondido é a completa tranquilidade com que estas máquinas partidárias convivem com o crime.
Mas o que Ferreira Leite disse para justificar a inclusão de, pelo menos, um candidato já acusado de crime de fraude fiscal, foi que o dito candidato “não estava acusado de nada no exercício de funções públicas”.
Esta justificação nem sequer é hipócrita, como as anteriores. É estúpida!
Pois mesmo sendo estúpida, ela mercê o aplauso de um cronista do Público, que, embora não seja conhecido pela coerência das suas posições, nem por aquele mínimo de pudor que qualquer cidadão normal deve ter, vê na decisão tomada pela líder do PSD a “recusa do papel de juiz” e um exemplo de firmeza de que o partido claramente necessita!

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

A IBÉRIA E NACIONALISMO


PROVA DE MATURIDADE OU CONSEQUÊNCIA DA CRISE?

Tem causado grande perplexidade nos círculos nacionalistas portugueses o resultado das sondagens levadas a cabo em Portugal e em Espanha sobre a construção de uma Federação Ibérica.
Apesar das muitas páginas já lidas sobre nacionalismo não me sinto minimamente capacitado a falar sobre o tema. Posso apenas falar sobre as minhas inclinações pessoais, que se situam nos antípodas do sentimento nacionalista. Desde sempre, porventura muito influenciado pela rejeição do culto nacionalista com que a pequenez da ditadura salazarista cobria tudo o que era português.
A simpatia pelas correntes socialistas está certamente ligada às concepções igualitárias, mas negaria se não dissesse que um dos principais factores de sedução foi o seu internacionalismo.
Entre a nação e a democracia eu escolho, sem hesitação, a democracia. E como continuo a acreditar que a nação é em grande medida uma inimiga da paz e também de uma verdadeira democracia, sou naturalmente favorável a tudo o que leve ao aprofundamento da democracia e da federação em detrimento da nação.
Infelizmente não é este o sentimento partilhado pela grande maioria das pessoas e dos Estados. Apesar do sentimento que animou e anima as mais importantes federações que a história conheceu se filiasse num sentimento igualitário, logo a nação em que elas próprias se transformaram desmentiu o propósito que fundou o seu nascimento.
São também os egoísmos nacionais que em última análise inviabilizam o projecto europeu e o afastam cada vez mais dos objectivos dos seus fundadores.
Quando a Europa despertar desta deriva nacionalista e intergovernamental que a tem (irreversivelmente?) marcado desde o alargamento a leste, talvez já seja demasiado tarde para corrigir o rumo.
Sempre me fascinaram mais as grandes conquistas da humanidade, qualquer que fosse a nacionalidade do seu autor, do que as grandes glórias pátrias, quando de glorioso apenas tinham a acentuação ou a defesa do sentimento nacional.
É esse mesmo sentimento anti-nacionalista que me leva a rejeitar a arrogância castelhana e a sua intolerância em relação a tudo o quer ser diferente. Há quem apoie a constituição de uma federação ibérica por razões muito defensáveis de bem-estar económico e social e há quem veja nela uma excelente oportunidade para acabar de vez com a Espanha castelhana. Infelizmente, as condições concretas em que o seu surgimento poderia ter lugar só serviriam para acentuar ainda mais o domínio de “Castela” sobre toda a península. Por isso, mais vale aguardar por outro contexto...

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

CAVACO NÃO VAI À POSSE DO PRESIDENTE DA GUINÉ-BISSAU

TODAS AS DESCULPAS SERVEM

Antes do 25 de Abril, a Guiné era a mal-amada. Durante a luta de libertação, os portugueses apanharam lá muita “porrada”. Os “grandes cabos de guerra”, primeiro Schultz, depois Spínola, foram lá derrotados por patriotas guineenses que apenas queriam ser independentes e acabar com a dominação colonial. Quando Bettencourt Rodrigues chegou à Guiné, para substituir Spínola, coube-lhe confirmar a derrota. Mas fez questão de chamar, para o acompanhar no seu juízo, o clarividente Costa Gomes, que igualmente constatou o que ele próprio já há muito sabia.
Mal chegou a Lisboa, comunicou o resultado da sua visita a Marcelo Caetano. E logo a direita se pôs a congeminar uma maneira de largar a Guiné e manter o resto do “Império”. Ainda agora, na “Alvorada Desfeita”, Diogo de Andrade, pseudónimo sob o qual se esconde um reaccionário que não quis dar o nome, num verdadeiro ajuste de contas com a história, se esforça “literariamente” por demonstrar que tudo teria dado certo se tivesse havido mais firmeza da Cavalaria 7 no Terreiro do Paço e se, na sequência da derrota do 25 de Abril, a Guiné tivesse sido perfidamente abandonada. Sem ela o “Império” ter-se-ia mantido numa estrutura federal, com a colaboração de algumas elites africanas corruptas.
Mas a Guiné é ainda mal-amada pela direita portuguesa, porque foi lá que verdadeiramente se forjou o 25 de Abril. Sob a retórica demagógica de Spínola e da sua corte, bem aproveitada pelos oficiais democratas do quadro permanente e contrariada por largos sectores da oficialidade saída das universidades que lá prestava serviço, foi-se consolidando a ideia de que a derrota era inevitável e que a questão colonial somente poderia ser resolvida com uma mudança de regime.
O percurso da Guiné-Bissau, depois do reconhecimento da sua independência por Portugal, não tem sido fácil, apesar de, no começo, ter tido quase tudo a seu favor. Quando as ajudas de outros Estados e das organizações internacionais começaram a escassear, Portugal não apareceu nem com a convicção exigida, nem com programas suficientemente aliciantes, para se impor como grande parceiro do Estado guineense. No fundo, era a velha ideia do tempo colonial que voltava a fazer o seu curso. Tudo se tornou muito evidente, quando depois da deposição de Nino e da derrota das tropas senegalesas que foram em seu auxílio, Portugal se afastou e não respondeu afirmativamente a uma interessante proposta de Ansumane Mané para uma cooperação aprofundada em praticamente todos os sectores da economia e da administração pública guineenses. Colaborando com os franceses e com os burocratas de Bruxelas na realização imediata de umas eleições sem sentido, pelas condições e pelo contexto da sua realização, Portugal ajudou a entregar o poder a elementos irresponsáveis que mais não fizeram do que arrastar, como era previsível, a Guiné-Bissau para o pântano em que hoje se encontra e do qual muito dificilmente sairá.
E agora, depois de mais uma tentativa de normalização, Portugal mais uma vez simbolicamente se afasta, não estando presente, ao mais alto nível, na tomada de posse de Malam Bacai Sanhá.
Cavaco não poderia arranjar pior desculpa. Não ir à Guiné-Bissau à tomada de posse do novo presidente com a desculpa de que em Portugal se está em campanha eleitoral, além de ser uma ofensa para os guineenses, constitui um atestado de menoridade passado aos portugueses. No fundo, é sempre a mesma questão, o mesmo preconceito antidemocrático: as eleições são um tempo de anormalidade.
Que se pode fazer relativamente a pessoas que não aprenderam nem interiorizaram a cultura democrática na idade própria?

PRETO E A LÓGICA DA PRESIDENTE DO PSD

ELA FALOU E DISSE O QUE QUERIA DIZER


Mais uma vez a presidente do PSD falou e disse o que queria dizer. Disse que A. Preto, acusado num crime de fraude fiscal, podia ser candidato a deputado porque não estava acusado “de nada no exercício de funções públicas”.
Vejam só o azar do PSD. Se o Tony Soprano fosse português tinha lugar garantido nas listas. Ele que nem negócios tinha com o Estado!

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O DÉFICE FRANCÊS

PARA QUE CONSTE

O défice orçamental francês triplicou no primeiro semestre de 2009, 86,6 mil milhões de euros em fins de Junho contra 32,8 em igual período do ano passado. O aumento é atribuído ao plano de relançamento da economia e à quebra das receitas fiscais. O défice público este ano e no próximo ano, que, além daquele, abrange o da segurança social e o das colectividades locais, deverá situar-se entre os 7% e 7,5% do PIB.
A ver vamos como irá a Alemanha reagir a este e outros défices igualmente volumosos de países da zona euro. A existência de dois movimentos contraditórios na França e na Alemanha não augura nada de bom. É conveniente não esquecer que recentemente o parlamento alemão aprovou uma lei que estabelece o limite máximo admissível do défice federal e dos länders. E esses limites são muito baixos para a Federação (0,65%) e nulos (0%) para os länders. Embora a lei não seja de aplicação imediata, ela somente se tornará vinculativa em meados da próxima década, não deixa de constituir um sinal muito forte sobre como a Alemanha entende a moeda única.
A Alemanha vive desde Weimar sob o fantasma da inflação e da hiper-inflação, enquanto os EUA e alguns países europeus que sofreram as consequências da Grande Depressão têm a memória da deflação. Daí também as diferentes políticas adoptadas para combater a presente crise…

MADAME CLINTON SEM FAIR PLAY

A PROPÓSITO DE UM EPISÓDIO NO CONGO

A propósito de um crédito de milhões de dólares oferecido pela China, interrogada por um estudante sobre o que pensa Bill Clinton sobre o assunto, Hillary Clinton respondeu assim.
Uma resposta sem fair play de uma mulher sem classe

AINDA O GOLPE DAS HONDURAS


QUEM APOIA QUEM?

Raul Castro, durante a festa de posse do segundo mandato de Correa (Equador), confirma o óbvio: “Na América Latina ninguém dá golpe sem o consentimento dos Estados Unidos”.
Já aqui tínhamos denunciado a situação nas Honduras, apontando para um apoio inequívoco de certos círculos americanos ligados ao poder. Como diz Castro, não se trata de pôr em causa a boa-fé de Obama, nem a sua seriedade política. Trata-se de perceber como actua o poder americano.
E ainda agora a procissão vai no adro. Quando várias situações começarem a agudizar-se, no Médio Oriente, no Afeganistão, eventualmente na América Latina (Colômbia), se perceberá melhor como actua o poder americano.
Quanto às Honduras, de insucesso diplomático em insucesso diplomático, daqui a pouco estaremos no fim do mandato de Zelaya e o assunto ficará naturalmente resolvido…

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O MNE, GUANTÁNAMO E CARNEIRO JACINTO


DOIS CASOS NÃO ESCLARECIDOS

Continua sem se saber em que condições e com que estatuto serão recebidos em Portugal dois dos raptados pelos Estados Unidos na cruzada antiterrorista empreendida por Bush/Cheney, depois de uma longa detenção em Guantánamo.
Qual será o estatuto, em Portugal, destes dois detidos de Guantánamo? Serão refugiados políticos? Ficarão em Portugal ao abrigo do direito de asilo? Serão imigrantes? Estarão sujeitos a um regime especial de vigilância? Ficará a sua liberdade confinada ao domicílio? Poderão movimentar-se livremente e livremente circular no espaço Shengen? Poderão demandar os Estados Unidos por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes de uma prisão ilegal?
O MNE nada esclarece. E enquanto não o fizer todas as dúvidas serão legítimas.
Mas há outro assunto sobre o qual o MNE também nada esclarece apesar de insistentemente instado a fazê-lo: o caso Carneiro Jacinto.
Recapitulando: o Ministro dos Negócios Estrangeiros nomeou há cerca de quatro meses o sr. Carneiro Jacinto conselheiro de imprensa em Washington. Este sr. já no passado havia desempenhado funções idênticas na capital americana e em Paris. Desempenhou igualmente o papel de porta-voz do ministério sob A. Monteiro e Freitas. Fez-se passar por licenciado em direito pela Universidade Clássica de Lisboa sem o ser. No Anuário do MNE de 2004 figura no seu curriculum a licenciatura em direito pela FDL da Universidade Clássica. No Diário da República, nos despachos que lhe dizem respeito, o referido sr. é tratado por dr.
Como é possível que o MNE – um órgão máximo da administração central portuguesa - faça de conta que nada se passa, independentemente de a licenciatura ser ou não necessária para o desempenho do cargo? Como é possível que o MNE não conheça o curriculum deste sr., nomeadamente a sua passagem pela Presidência da República, no tempo do Dr. Mário Soares? Como é possível que o MNE albergue como seu funcionário um cavalheiro que se fez passar pelo que não é? Todos continuamos à espera de uma atitude do MNE.
Que estranhos poderes terá o dito cavalheiro para continuar completamente imune a mais esta situação?

domingo, 9 de agosto de 2009

A MORAL POLÍTICA DE CAVACO


IGUAL À DO PSD


Quem persiste em fazer passar a ideia de que há uma grande diferença entre o PSD e Cavaco, não tanto do ponto de vista ideológico, mas caracteriológico, no fundo o que está a tentar fazer passar é mais uma mistificação em que a política é pródiga.
Cavaco e PSD são uma e a mesma moeda, para utilizar uma linguagem mais próxima dos destinatários. Nem de outro modo faria sentido que fosse. Pois não foi Cavaco Silva presidente do PSD por mais de dez anos? E não foi o PSD e a restante direita que o elegeram? Tentar fazer passar a ideia de que entre Cavaco e a típica matriz do PSD (do PSD tal como todos o conhecemos, com os seus nomes sonantes, e tudo ao que aos mesmos anda ligado) há uma considerável diferença seria tão mistificador como tentar demonstrar que há uma grande diferença entre o PS e Mário Soares, Cunhal e o PCP ou Portas e o CDS/PP.
Cavaco na vida privada teve vários empregos, várias reformas, segundo os jornais, negociou com bancos geridos por gente do PSD, alguns deles a contas com graves problemas de justiça; na vida pública relativizou frequentemente o Parlamento (o que significa pouco apego aos mais genuínos princípios democráticos), governamentalizou a maioria parlamentar que o apoiava, foi sectário com os que o contestaram dentro do partido, apelidou de “forças de bloqueio” os contra-poderes institucionalmente consagrados, fez apelo ao “trabalho” em termos próximos do salazarismo (“Deixem-me trabalhar; deixem-me trabalhar”!) no sentido de que somente o trabalho político feito por ele era produtivo e o dos demais destrutivo e, por último, fartou-se de legislar em véspera de eleições, ele que agora como PR já fez um apelo a que não se legislasse e um lamento compungido por ter de trabalhar em férias!
Se em todo este conjunto de “virtudes” há algumas que são comuns aos partidos que têm estado no poder em Portugal, outras há que são típicas de um partido como o PSD. Um típico partido de direita, mentalmente rural e conservador, que perfilha propositadamente uma ideologia difusa, embora explícita na acção, tanto pelos meios como fins, mas que na sua própria apresentação pretende fazer-se passar por uma força que apenas se preocupa com os verdadeiros interesses nacionais, alheando-se da política e da politiquice dos partidos que só dividem. Ou seja, perante um povo politicamente inculto e de fraco apego democrático, faz passar a mensagem mais antidemocrática como uma virtude.
Cavaco interpreta e faz passar este entendimento da política ainda de forma mais nítida que o PSD, embora este, ultimamente, em virtude do primarismo político da sua dirigente máxima dele se aproxime, por nem sequer saber interpretar de outro modo a própria acção política.

HUGO CHÁVEZ E A COMUNICAÇÃO SOCIAL

MAIS UMA MENTIRA

Aqui há dias todos fomos surpreendidos por uma notícia das agências internacionais, repetida e comentada incessantemente pelos inimigos da Revolução Bolivariana, segundo a qual Hugo Chávez teria encerrado trinta e quatro estações privadas de televisão, hostis ao regime.
Trinta e quatro é um número impressionante, mesmo para um país com a dimensão da Venezuela, e esse simples facto deveria ter sido suficiente para nos pôr em guarda sobre o que na realidade aquela notícia seguramente encobria. Mas quase ninguém o fez. A direita – o mesmo é dizer aqueles que na Europa e nos Estados Unidos não admitem qualquer alternativa ao capitalismo tal como o praticam…e são quase todos – atacou a medida, considerada um atentado à liberdade de imprensa e de informação, e a esquerda encolheu-se um pouco sem saber bem como responder.
Para contextualizar um pouco a questão é conveniente sublinhar que Hugo Chávez, desde que está no poder (1998) – do qual houve a tentativa de o expulsar em 2002, com o apoio da Espanha de Aznar, da América de Bush, etc. – já se submeteu a catorze processos eleitorais, inatacáveis pelos observadores internacionais, não obstante a má vontade de muitos deles contra o regime. E é também bom que se saiba que, depois do fecho daquelas estações, 80% das rádios e televisões são privadas, 9% pertencem ao domínio público e as restantes aos sectores associativos e comunitários. Os media privados estão concentrados nas mãos de 32 famílias.
Por quê então o encerramento daquelas estações? Pela razão simples – válida em qualquer país do mundo, inclusive no nosso, onde processo semelhante já ocorreu aqui há uns anos – de que estavam em situação ilegal. Citadas para verificação do estado da concessão e actualização do respectivo processo, algumas delas ignoraram a citação, outras estavam completamente ilegais. Verificou-se, por exemplo, que havia concessões já caducadas, outras cujos concessionários tinham morrido e estavam a ser operadas por uma terceira pessoa, ainda outras estavam a emitir sem licença. Ou seja, aconteceu na Venezuela o que teria ocorrido em qualquer outro país do mundo: as estações a emitir irregularmente, seja por falta de concessão, seja por não terem solicitado a sua renovação no prazo legal perdem as respectivas frequências para o domínio público.
Por aqui se vê, como os inimigos externos e internos do regime, a começar pela Globovision – que apoiou o golpe contra Chávez, o boicote petrolífero do mesmo ano (2002), que chegou inclusive a lançar um apelo ao não pagamento dos impostos, que, mais recentemente, apoiou o golpe nas Honduras e continua diariamente a apelar, mais ou menos ostensivamente, ao golpe de estado – e a acabar nos media ocidentais, “fazem a notícia” sobre o que se passa na Venezuela.

sábado, 8 de agosto de 2009

CAVACO ESTUPEFACTO?


NÓS, CADA VEZ MENOS

O Sol diz que Cavaco está estupefacto por o seu mandatário à eleição presidencial não ter sido reconduzido no Conselho Nacional de Ética.
Daniel Serrão também não gostou das novas nomeações.
Se a notícia do Sol tem algum fundamento, é caso para dizer que quem está cada vez menos estupefacto com as interferências de Cavaco em assuntos que não são da sua competência somos nós.
Tanto a reacção de Cavaco, a ser verdadeira, como a Daniel Serrão, seriam em si boas notícias, se, infelizmente, não se desse o caso de o dito Conselho estar ainda muito aquém do que seria necessário para assegurar a representação de amplos estratos da sociedade portuguesa.

GUANTÁNAMO: TÃO CONTENTES ESTAMOS


VAMOS RECEBER DOIS SÍRIOS


Depois de porfiados esforços, o Governo português vê finalmente recompensada a persistência com que desde há cerca de um ano se propõe receber presos de Guantánamo para ajudar os americanos a resolver um problema complexo. O empenhamento posto nesta questão só é comparável ao que se põe na resolução de um problema próprio. E não será? Algo que afecte a honra e o bom nome dos Estados Unidos não é algo que afecta por igual a honra dos seus amigos? Tão amigos que se propõem acolher prisioneiros que nenhum dos cinquenta estados americanos aceitou receber! Esta amizade capaz de fazer pelos outros aquilo que eles próprios não são capazes de fazer por si corre sempre o risco de se confundir com servilismo. Lembra muito a velha atitude dos criados que estavam dispostos a servir os seus senhores com uma diligência que ia muito para além daquela que punham na gestão da sua própria vida e que até irritava os próprios amos por se sentirem um pouco constrangidos perante tanta subserviência.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

O TRATADO DE LISBOA



AINDA O ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ALEMÃO


Não deixa de ser com alguma estranheza que se assiste a um completo silêncio, tanto da parte dos políticos como dos académicos e até dos muitos comentadores que pululam neste país, sobre o acórdão do Tribunal Constitucional Alemão (TCA) que apreciou a constitucionalidade do Tratado de Lisboa.
Dos políticos, principalmente dos que não querem fazer ondas sobre o Tratado susceptíveis, nem que seja só hipoteticamente, de questionar a sua constitucionalidade compreende-se o silêncio. No fundo, é a mesma atitude que levou à rejeição do referendo. Mas dos demais, dos que questionam a democraticidade da construção europeia, do Tratado de Lisboa e até a sua constitucionalidade, estranha-se o silêncio, tanto mais que aquele acórdão abre a porta a novos e interessantes desenvolvimentos no plano político.
Já dos nossos constitucionalistas, infelizmente, pouco há a estranhar depois do processo de revisão das suas próprias posições que alguns deles (os mais interventivos) empreenderam para ficarem mais a la page com a moda dos tempos.
Quanto aos comentadores, pouco haverá a dizer: a matéria não se presta ao comentário fácil e exige algum esforço, logo…tudo normal.
A notícia que as agências divulgaram e que depois passou em quase todos os jornais primava pela simplicidade e tinha em vista transmitir uma mensagem muito clara: o TCA não considerou o Tratado inconstitucional, embora tenha estabelecido algumas exigências ao Parlamento Alemão para o ratificar. Como os políticos e seus acólitos somente estavam interessados na primeira parte, tomaram a segunda à conta de umas bizarrias do ordenamento jurídico alemão não extrapoláveis para os demais Estados. Nada mais errado, pois também neste caso o diabo está nos detalhes.
Começando pelo princípio: a convicção com que se fica é a de que o Tratado de Lisboa é inconstitucional face ao ordenamento jurídico alemão (e, obviamente, face a outros, desde logo, o nosso), só que uma decisão dessa natureza iria causar um tal terramoto político, susceptível de desmoronar quase por completo a arquitectura anti-democrática em que assenta a construção europeia, que o Tribunal resolveu ficar-se por uma espécie de compromisso tido por suficiente para salvaguardar, nesta fase, o essencial do estado de direito e a soberania do povo alemão consagrados na Lei Fundamental.
Certamente que esta posição do TCA não caiu do céu, nem pode justificar-se apenas pelo texto do Tratado de Lisboa. No fundo, o Tratado de Lisboa apenas agrava os vícios anti-democráticos constantes dos demais textos constitutivos, os quais, embora não tivessem passado incólumes no crivo daquele tribunal, não constituíram no contexto político da época em que foram aprovados uma ameaça à soberania alemã. De facto, o que está em causa é isso mesmo: enquanto a Alemanha, juntamente com a França, exerceu um papel dominante na Europa em todos os domínios relevantes para o Estado alemão, os tratados, por mais transferências anti-democráticas de soberania que fizessem, não punham de facto em causa a soberania alemã. Com o alargamento a questão passou a pôr-se de outra maneira e os episódios vividos a propósito da guerra do Iraque fizeram soar na Alemanha as campainhas de alarme. Dito de outra maneira: a Alemanha não aceita que os Estados comunitários situados a oriente do seu território tenham uma política externa, nomeadamente (mas não só) em relação à Rússia, contrária aos interesses alemães. E com o alargamento da União e da NATO viu-se que isso era possível. Logo, tornou-se necessário tomar medidas. E são essas medidas que o TCA exige sejam tomadas para que o Tratado possa ser ratificado.
É difícil num texto deste género explicar o sentido profundo do acórdão do Tribunal de Karsruhe, mas da sua leitura fica a ideia de que ele abre a porta a uma declaração de inconstitucionalidade do Tratado de Lisboa, evitada no último instante por um conjunto de exigências, alguma delas dificilmente compatíveis com o actual estádio do direito comunitário.
Num outro post, mais tarde, quando as circunstâncias o permitirem, far-se-á a enumeração das principais conclusões do acórdão e das disposições constitucionais com elas directamente relacionadas.
O acórdão, pela tibieza com que abordou certas questões e pelas conclusões que se recusou a tirar, foi muito criticado pela esquerda, que via na sua rejeição uma excelente oportunidade para se construir uma Europa realmente democrática.
Vale a propósito citar as palavras do Prof. Karl Albrecht Schachstschneider: “Há mais de 50 anos, Karl Jaspers predizia uma passagem “da democracia à oligarquia dos partidos, e depois da oligarquia dos partidos à ditadura”. O acórdão do tribunal constitucional abre a porta a uma ditadura da UE. Não há, a partir de agora, senão uma solução: uma viragem radical de direcção. A oposição ao Estado centralista que a UE é deve unir-se. É necessária uma alternativa no Bundestag. Esta oposição poderia tirar vantagem do facto de o acórdão pedir uma participação parlamentar em matéria de política europeia. O seu objectivo não seria certamente colaborar na formação deste Estado centralista. Tratar-se-ia mais do seguinte: um povo que queira construir uma Europa europeia deve pedir a sua saída da EU e impor novos tratados. Só os povos são qualificados para realizar o direito. Uma política desta envergadura necessita de consultas populares”.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

CARNEIRO JACINTO: LICENCIADO EM QUÊ?


A COMPLACÊNCIA DO MNE

Já aqui, por várias vezes, se fez referência à pouca vergonha que se passa no MNE em matéria de nomeações para o exercício de funções técnicas no quadro externo do ministério. Reina a maior arbitrariedade e não se encontra outro critério para as inúmeras nomeações feitas por este Governo, tanto por Freitas, como por Amado, que não seja a mais completa subjectividade de quem decide. Para que se não pense que se trata de palavras irresponsáveis, sem qualquer correspondência com a realidade, a lista dos nomeados, desde que este Governo tomou posse, consta de processos intentados contra o ministério e pode ser publicada, se necessário.
O número de nomeações e os motivos que lhes subjazem seriam só por si preocupantes, se outras razões houvesse. Mas há: Freitas do Amaral, armado em grande defensor do rigor das contas públicas, saneou cerca de vinte técnicos em exercício de funções no quadro externo, com o argumento de que se tratava de uma medida imposta pela “austeridade orçamental”. Breve se concluiu que tal argumento nada tinha de verdadeiro, pois o número dos que a seguir foram colocados nos mesmos e noutros lugares lugares corresponde grosso modo ao triplo dos saneados.
Nesta sua função saneadora, Freitas foi acolitado por um tal Carneiro Jacinto, porta-voz do Ministro ou seu assessor de imprensa, que recorreu a todos os meios habituais neste género de práticas para, demagogicamente, dar à opinião pública uma imagem completamente deturpada da realidade.
A história desse cavalheiro está contada aqui e logo, na história que então se contou, se duvidava abertamente das habilitações literárias que o dito assessor publicamente ostentava. Dizia-se licenciado em direito pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, apesar de contemporâneos seus garantirem que nem sequer o antigo 5.º ano tinha completo.
Recentemente a revista Sábado (23/07/09) apurou que não existe na FDL qualquer registo com o seu nome, sequer como aluno. Interessa, portanto, saber como aparece no anuário diplomático do MNE e em diversas nomeações publicadas no DR o dito cavalheiro identificado como dr., ou seja, licenciado.
A questão tem toda a razão de ser, já que o dito cavalheiro voltou a ser nomeado para o desempenho de funções técnicas no quadro externo do MNE por despacho recente do Ministro.
Já não está em causa mais uma nomeação, nem as escandalosas razões que, segundo o próprio em entrevista ao DN, teriam estado na sua origem. O que está em causa é a nomeação de alguém que dolosamente ostenta habilitações que não tem. O MNE nada faz e aceita com a maior tranquilidade esta situação. Alguém terá de apresentar uma participação crime no Ministério Público para esclarecer o assunto, já que do MNE não há certamente nada a esperar, tal a intimidade entre o visado e o ministério.

A GRIPE A EM ESPANHA



MAIS UMA MORTE DE ESTRANGEIRO

Até ontem havia 1536 casos de gripe A identificados em Espanha. Morreram 8 pessoas, metade das quais estrangeiras.
Há algo de estranho nesta estatística. Pode ser uma simples coincidência. Mas se eu adoecer em Espanha, quero ser tratado em Portugal.

AS LISTAS DO PSD ÀS LEGISLATIVAS


AS LIMITAÇÕES DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA


Se dúvidas houvesse sobre as graves limitações da nossa “democracia representativa”, aí está a feitura das listas eleitorais no PSD para o comprovar.
Que responsabilidade, que representatividade poderão ter os deputados eleitos à Assembleia da República se os eleitores não têm uma única palavra sobre a sua escolha? Se nem sequer a opinião das famosas “bases” é tomada em conta?
Não, os portugueses não escolhem pessoas nas eleições legislativas. Escolhem partidos e, quando muito, exprimem uma preferência pelo chefe deste ou daquele partido relativamente aos demais.
Uma Assembleia completamente submissa às cúpulas partidárias que a escolheu não é uma Assembleia representativa. É uma assembleia sem qualquer compromisso com o eleitor. Os deputados respondem perante o partido, não perante o povo.
Temos de acabar com isto, se queremos ter algum controlo sobre os nossos representantes.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

RASMUSSEN: A AMBIÇÃO DO "GUERREIRO"


A NATO NO AFEGANISTÃO

Apesar de todas as críticas que diariamente vêm a lume sobre a intervenção da NATO no Afeganistão, inclusive da insuspeita Comissão de Assuntos Exteriores da Câmara dos Comuns, o novo Secretário-Geral da Nato, Anders Fogh Rasmussen, nada modesto nas suas ambições, quer que a NATO alcance o seu potencial pleno como pilar da segurança global, desde logo com uma vitória no Afeganistão, onde “permanecerá pelo tempo que for necessário”.
Como há muito se antevia e como agora começa a ser também evidente para alguns líderes europeus, a presença militar da NATO no Afeganistão está condenada ao fracasso. A ausência de uma estratégia clara e a recusa da sua presença pelos afegãos, retiraram qualquer sentido à acção da aliança Atlântica naquele longínquo território. Pelo menos, desde 2006, ano a partir do qual o número de militares ocidentais mortos não cessou de aumentar, que se pressente o desastre.
Bem pode a NATO rodear-se de “sábios” para a dotar de um novo conceito estratégico que sirva de divisa, doutrinal e militar, para a sua acção no século XXI, que tal conceito de nada e para nada lhe servirá se a Aliança for obrigada a retirar-se do Afeganistão como já antes, no séc. XIX, se retiraram os ingleses, ou, no séc. XX, os soviéticos.
Não falta mesmo quem preveja o seu gradual enfraquecimento e eventual extinção, face à pouca ou mesmo nenhuma vontade de os Estados europeus mais influentes (de que o recente exemplo do Reino Unido é o caso mais frisante) participarem no esforço de guerra do Afeganistão na medida solicitada por Washington. A teoria das alianças conjunturais, defendida na América pelos ultras de Bush poderá, paradoxalmente, ter tantas mais possibilidades de ser posta em prática quanto mais se ampliar, no novo conceito estratégico da NATO, a sua área de intervenção.
E, então, os “guerreiros” Rasmussen, Severianos e tutti quanti terão que quedar-se sós e desamparados nas suas ambições belicistas. Eles serão os rostos ridículos da derrota…

terça-feira, 4 de agosto de 2009

ESPANHA: UMA JUSTIÇA DESPRESTIGIANTE

MAIS UM CASO


A Secção Penal do Tribunal Superior de Valência decidiu por dois votos contra um arquivar o processo instaurado ao Presidente da Comunidade Valenciana, Francisco Camps, e a três altos responsáveis políticos daquela Comunidade, todos do PP, por suspeita de suborno (em espanhol cohecho: delito que consiste em uma autoridade ou funcionário público aceitar ou solicitar uma dádiva para praticar ou omitir a prática de um acto).
A história é conhecida e foi muito “badalada” em Espanha nos últimos meses. Pode dizer-se, sem exagero, que quase há cerca de um ano o assunto é notícia de primeira página no El País.
Apurou-se, sem margem para qualquer dúvida, que Camps recebeu várias prendas (fatos de marca, relógios, pulseiras, etc.), avaliadas em milhares de euros, de empresas que concorreram e ganharam concursos públicos. Há, por outro lado, fundadas suspeitas de que aqueles factos não passem da ponta de um iceberg muito volumoso, já que as ditas personalidades estão sendo também investigadas por corrupção.
As ofertas foram todas feitas pela mesma empresa que beneficiou de dezenas de adjudicações, muitas delas sem concurso. E embora o Camps tivesse negado os presentes e alegado tratar-se de bens pagos com o seu dinheiro, a verdade é que não conseguiu provar, por facturas, uma única compra, nem nas lojas onde tais compras foram realizadas há o menor vestígio (mesmo testemunhal) de tais bens terem sido pagos pelo Presidente da Comunidade.
Pois, apesar da prova produzida nos autos, o ilustre tribunal sentenciou que as ditas autoridades podem aceitar presentes das empresas que tem em curso processos de adjudicação nas administrações sob a sua responsabilidade, contanto que as pessoas beneficiadas não participem directamente nos respectivos processos de adjudicação!
Qualquer jurista sabe perfeitamente que as proibições penais relativas a actos desta natureza têm em vista impedir o condicionamento das decisões públicas de modo a garantir o princípio da imparcialidade.
Da decisão cabe recurso para o Supremo. Mas o observador estrangeiro não resiste a concluir: em Espanha já se sabe como é, metendo políticos, ganha ou perde quem tiver maioria no tribunal….

ISALTINO MORAIS


SETE ANOS DE PRISÃO EFECTIVA E PERDA DO MANDATO


Não tenho por hábito falar de mim neste blogue. A literatura do eu não é o meu forte. Não digo que não leia algumas memórias ou biografias. Claro que sim, de gente que teve influência nos destinos da humanidade. Fora disso que interesse têm as historietas presenciadas durante uma vida, mesma que digam respeito a gente conhecida? No fundo, o que tornará notáveis ou não essas pessoas são os seus actos do domínio público. Sejam políticos, artistas, escritores, desportistas, enfim, o que forem. A “petite histoire” que tanta curiosidade suscita sempre me pareceu mais vocacionada a vangloriar quem a conta, dando-se ares, do que a ajudar a caracterizar o sujeito da “história”.
Tudo isto para dizer que Isaltino Morais foi meu aluno em 1976/77, na difícil cadeira de Teoria Geral do Direito que, não obstante o nome, era uma Teoria Geral da Relação Jurídica (de direito privado). Foi um ano decisivo na história da Faculdade de Direito de Lisboa, à qual eu não pertencia, nem com a qual tinha quaisquer afinidades. Os professores colaboracionistas (e em Lisboa eram quase todos…) foram saneados e com eles os que não eram uma coisa nem outra. A Faculdade ficou decapitada e entregue à “Revolução Cultural” maoista, na versão portuguesa MRPP.
Como os poucos professores que ficaram não tinham condições políticas para pôr a Faculdade a funcionar como uma verdadeira escola adaptada aos princípios democráticos saídos do 25 de Abril, foi constituída uma espécie de comissão mista (cujo verdadeiro nome não me lembro qual era, mas era qualquer coisa como Comissão para a Recuperação da FDL) constituída por professores de Coimbra e de Lisboa, que, entre outras tarefas, tinha a seu cargo a constituição de um corpo docente que pudesse dar expressão àquela aspiração. Foi nesse contexto que eu fui convidado para leccionar a dita cadeira de direito civil, depois de já ter recusado regressar a Coimbra, donde tinha sido expulso em 1969.
O convite foi-me feito por Mota Pinto, na Brasileira de Coimbra, em Dezembro de 1976, já com as aulas (as que havia) a decorrer. Hesitei, não respondi logo. Ele continuou a insistir e então ficou acordado que primeiramente falaria com os alunos e só depois tomaria uma decisão.
Lá pela segunda semana de Janeiro apresentei-me no anfiteatro da FDL, onde nunca tinha entrado, para apurar se tinha condições para continuar uma experiência donde tinha sido afastado há mais de 7 anos. Disse aos alunos: “Pediram-me para vos dar esta cadeira, mas eu só o farei se vocês estiverem de acordo com certos pressupostos muito simples de enunciar: acabaram as passagens administrativas; acabaram os trabalhos colectivos para avaliação de resultados definitivos; haverá uma prova escrita, em princípio eliminatória; e prova oral para os alunos que, segundo o meu critério (não havia qualquer regra sobre esta matéria) tenham de a prestar, critério que tratarei de objectivar ao longo do ano. Estou disponível para prestar todos os esclarecimentos e justificar os pressupostos enunciados, mas com toda a franqueza que deve existir entre nós desde já vos digo que não vou sair muito do que acabei de enunciar”.
O acolhimento não poderia ter sido mais entusiástico. Toda a gente não só concordou, como insistiu em me fazer compreender que era mesmo isso o que desejava.
Guardo excelentes recordações dessa turma. Porventura a melhor que alguma vez tive. Empenhadíssima no estudo, com excelentes alunos, hoje, muitos deles, a exercerem funções da mais alta responsabilidade.
Isaltino também lá estava. Inteligente, passou com uma boa nota no contexto de uma bitola muito exigente. Acabado o curso só esporadicamente o encontrei, em restaurantes ou locais do género. Sempre muito agradecido por eu ter contribuído para que ele pudesse ter tirado um curso a sério.
Claro que gostava que nada tivesse acontecido ao Isaltino, antes e depois de ir a tribunal…

domingo, 2 de agosto de 2009

AS ONG (ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS)



O QUE SÃO E QUE INTERESSES SERVEM AS ONG

Apresentando como imagem de marca a independência dos Estados e a representatividade de sectores da sociedade civil, as organizações não governamentais, que se multiplicaram nas últimas décadas do século passado, desempenham hoje um papel muito importante em variadíssimos domínios da actividade humana. Dizendo-se independentes e representatitavas da sociedade civil, mas sendo apoiadas pelos Estados, algumas exclusivamente, por organizações internacionais e por empresas transnacionais, que tipo de organizações são estas que até já aspiram a participar na “governação mundial”?
Em voltairenet.org Julien Teil procura dar uma resposta a partir do estudo de um caso – a organização caritativa CARE.

ZECA AFONSO



SEM ELE TUDO TERIA SIDO DIFERENTE


Zeca é um dos raros casos em que se pode afirmar sem receio de exageros que, sem ele, tudo teria sido diferente. Teria sido diferente a resistência ao fascismo a partir da década de sessenta. Teria sido diferente a luta do movimento estudantil. Teria sido diferente a festa do 25 de Abril.
Ninguém como ele soube dar sentido à luta pela voz, pela música e pela poesia das suas canções. Zeca é o cantor por excelência da liberdade e da fraternidade. Mas também o músico. Ele, ao que se diz, que nem música sabia!
Zeca Afonso nasceu há 80 anos, mas a sua obra sempre jovem, sem cedência a qualquer tipo de compromisso, é hoje e continuará a ser no futuro o grande exemplo de juventude.

sábado, 1 de agosto de 2009

ESTATUTO DOS AÇORES: AINDA SOBRE A DECISÃO DO TC


AS DECLARAÇÕES DE ALBERTO MARTINS

Tenho alguma dificuldade em compreender as palavras de Alberto Martins, quando, em nome do PS, reagiu à decisão do TC. Dizer que o PS respeitará a decisão do TC é uma frase vazia de sentido. Que hipóteses práticas, fácticas, tinha o PS de a não respeitar? A declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral torna-se eficaz com a sua publicação em DR. A partir daí as normas em questão são erradicadas do ordenamento jurídico e para todos os efeitos carecem de validade, se não mesmo de existência. Portanto, por aqui não se vê como poderia o PS desrespeitar a decisão.
No plano fáctico, a quem compete a não aplicação das normas controvertidas é ao PR, que, como se sabe, nunca esteve de acordo com a sua existência. Portanto, não as aplicará.
Ainda no plano fáctico, que hipóteses teria o PS de desrespeitar a decisão do PR de não aplicação dessas normas, no caso de dissolução da Assembleia Legislativa Regional? Considerar a ALR não dissolvida? Mas como, sem o concurso dos demais partidos nela representados? Ou seja, este é um dos tais casos em que o PS, queira ou não queira respeitar a decisão do TC, não tem qualquer hipótese prática de impedir a sua aplicação. Logo, não faz qualquer sentido dizer que a respeita. As normas em questão já não pertencem ao ordenamento jurídico português …e é tudo!

UMA NOTA SOBRE O PROGRAMA ELEITORAL DO PS

AS PALAVRAS E OS ACTOS

Se é cada vez mais evidente a preocupação do PSD em não se comprometer com o que quer que seja e notório o silêncio que guarda sobre matérias melindrosas, em que claramente se esforça por nunca as abordar, não apenas para não afugentar potenciais eleitores, mas também para não ser amanhã acusado de mentir aos portugueses, no quadro de um entendimento muito generalizado que vê na mentira apenas a afirmação contrária à verdade com a intenção de induzir em erro, já o mesmo se não poderá dizer do programa do Partido Socialista. Admitindo, que ele não tem por objectivo enganar os eleitores, todas as propostas que o PS pretende pôr em prática, se continuar a ser governo, estão lá.
Por esse lado o programa não pode ser atacado. Há clareza no prometido. E até há algumas medidas interessantes, impensáveis no programa do PSD. O problema que este programa levanta é o que lá não está e se contava que estivesse. Quem ouviu Sócrates no Parlamento, em fins do ano passado, no pico mais alto da crise financeira, perorar contra o neoliberalismo e a redução do papel do Estado, esperaria encontrar algum eco dessas palavras no programa eleitoral para a próxima legislatura. Em vão o procurará. Nenhuma nova política é proposta neste importante domínio. Tudo continuará, portanto, na mesma.
Se o PS supõe que reforça o poder do Estado na economia, adjudicando por ajuste directo ou até por concurso grandes obras públicas, fornecimentos ou serviços em modalidades de financiamento altamente vantajosas para o grande capital e ruinosas para o futuro dos portugueses, está redondamente enganado. Ou se mantém intacto o seu programa de nacionalizações ou de continuação das famosas parcerias publico-privadas, na saúde, nas obras públicas ou noutros domínios da economia, o que na realidade estará propondo é a continuação das velhas políticas, fazendo tábua rasa das lições do passado.
É até caso para perguntar se entre esta forma de “intervenção” do Estado na economia e a não intervenção de Bush, desregulando sem acrimónia e isentando os ricos do pagamento dos impostos que deveriam recair sobre as suas actividades, esta segunda não é mais transparente e mais “equitativa” do que a primeira.