segunda-feira, 27 de junho de 2016

BREXIT:CONSEQUÊNCIAS




PARA ONDE CAMINHA A UE?



As consequências da saída do Reino Unido da União Europeia são imprevisíveis no mesmo sentido em que o futuro o é. Todavia, percebe-se pelas múltiplas reacções dos principais responsáveis da União Europeia quais seria as consequências que eles gostariam que se verificassem e pelas quais estão dispostos a lutar.

Têm-se dito que os “burocratas de Bruxelas” têm saído incólumes dos múltiplos calafrios por que a União Europeia tem passado. De acontecimentos graves que estão na iminência de acontecer mas que acabam por não se verificar. Este comportamento, se bem analisarmos o que agora se está a passar, não vale apenas para as angústias que antecederam o que acabou por não acontecer. Ele continuará a ser o mesmo, manter-se- á inalterável, mesmo quando o terramoto se desencadeia à vista de todos.

É isso o que está a acontecer com o resultado do referendo britânico. Entre as declarações raivosas dos que culpam os ingleses por tudo o que aconteceu e deixam pairar a ameaça de retaliação e a linguagem dúplice (como sempre) da diplomacia germânica dando falsamente a entender que é preciso respeitar e compreender o voto britânico, a linha que está subjacente a uns e a outros, e que acabará por impor-se se não for derrotada pela luta dos povos europeus, é a de que é preciso tratar a situação decorrente do voto britânico com toda a normalidade, como se nada de importante tivesse acontecido.

À direcção política da União Europeia, nomeadamente ao seu poder hegemónico, não lhe interessa aprofundar, nem sequer ao de leve, as causas do voto britânico. É preferível deixar essa tarefa à comunicação social de serviço que se encarregará de fazer passar a mensagem nos quatro cantos da Europa e do mundo que a decisão britânica assenta em pressupostos xenófobos, se não mesmo racistas, no bom estilo de uma eficiente divisão internacional do trabalho.

Ou seja, a direcção política fará, como já está fazendo, depois de uma ou outra intervenção ressabiada de broncos como Claude Juncker ou de políticos na reforma, agora especializados na traficância, como Felipe Gonzalez, um discurso tranquilo tendente a deixar consolidar a ideia de que nada de muito importante aconteceu, algo que não interferirá no futuro da Europa, encarregando a dita comunicação social da tarefa de fazer o trabalho sujo. Ou seja, imputando aos britânicos, ao seu egoísmo nacionalista, a causa do que aconteceu.

Claro que a prossecução desta linha política, que tende a tentar resolver a “questão britânica” o mais rapidamente possível, tem em vista deixar tudo exactamente como agora está. E enganar-se-á quem pensar que vai ser no seio do Conselho Europeu que vozes dissonantes se vão erguer no sentido de uma reforma das políticas que mais têm afastados os cidadãos da “Europa”. Essas vozes, se efectivamente existirem, estão condenadas ao mais completo fracasso, já que elas não interessam aos poderes hegemónicos. Serão vozes marginais, de países sem peso político no seio da União, logo abafadas pela linguagem burocrática ou pela passagem da discussão ao tema seguinte, deixando o que antes foi dito como um desabafo de ocasião.

A luta contra a União Europeia, contra a política da União Europeia, tem de ser feita fora das instituições comunitárias, no plano nacional, com as características próprias de cada país e as queixas específicas de cada um, de modo a ir-se ao encontro do que  é hoje o sentimento dos cidadãos relativamente à Europa.

Se essa luta não for feita neste plano, se ingenuamente se continuar a acreditar que é em Bruxelas que os nossos problemas vão ser resolvidos e quem diz os nossos diz os de Espanha, da França, da Grécia ou de qualquer outro país, a linha política que tende a fazer de conta que nada de importante aconteceu não só acabará por impor-se, como vai contribuir para reforçar ainda mais o poder que hoje comanda os destinos da União Europeia.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

BREXIT


 O QUE IMPORTA TER EM CONTA


 
 

Também acho que não vale a pena desenvolver grandes análises. A argumentação que antecedeu a votação do referendo britânico fala por si.

Creio, todavia, que a questão de fundo que determinou o voto na Inglaterra (ou seja, Reino Unido) foi a democracia. O nosso voto na Europa vale ou não vale alguma coisa? Não vou perder tempo a responder, invoco apenas o palavreado mil vezes repetido do sr. Jeroen Dijsselbloem, presidente do Eurogrupo, um agrupamento que nem sequer existe juridicamente, para se perceber o que vale o nosso voto.

Dir-se-á: essas queixas temo-las nós e outros como nós; não os ingleses. Sim, é verdade. Mas também é verdade que os ingleses têm outras queixas. E por que razão é que as nossas queixas hão-de ser mais importantes que as queixas dos ingleses?

O que os britânicos querem ou não fazer com a democracia é um problema deles. Independentemente de estarmos de acordo ou não. Essa ideia de que temos de ser nós a dizer o que os outros devem fazer com a democracia é uma ideia relativamente recente, posta em prática por Georges Bush, em cumprimento da cartilha neoconservadora. Mas será preciso voltar a enunciar os mandamentos da filosofia neoconservadora para percebermos até que ponto ela se entranhou numa certa esquerda (e pour cause…atenção às origens)? I

Este é o pressuposto objectivo. Que como todos os pressupostos tem antecedentes. Graves e consolidados antecedentes que fazem os povos desacreditar do actual projecto europeu. De um projecto que tendo sido apresentado como um projecto solidário e de cooperação recíproca se transformou num projecto de domínio hegemónico dos mais fortes contra os mais fracos.

Esta consolidação gerou consequências de muita ordem, de espécie diversa, algumas perversas. Como os fenómenos sociais antes de se produzirem não se podem levar ao laboratório para saber como se vão produzir, temos que partir do que acontece quando não somos capazes de prever com a devida antecedência o que poderá vir a acontecer.

E é nesta fase que estamos. E diz-me o conhecimento político que tenho das coisas que a presença da Inglaterra na União Europeia era por todos (quase todos) os que dela fazem parte e até dos que não fazem – uns por umas razões, outros por outas – a garantia de que ela nunca se transformaria numa Europa germânica. Garantia que nenhum outro país da União Europeia poderá dar. É certo que depois de alcançado o mercado único – construído e totalmente orientado na sua construção pela Inglaterra – os britânicos se foram gradualmente distanciando do projecto europeu nas suas demais vertentes. Isto lhes bastava e por aqui se ficavam, talvez por terem percebido mais cedo que os demais que o famoso “aprofundamento” dificilmente deixaria de se transformar num proljecto de domínio, logo de potenciais conflitos. Nunca quiseram saber da moeda única, principalmente depois da experiência do SME, nem nunca morreram de amores por uma circulação indiscriminada de pessoas.

Se esta sempre foi a ideia de Europa que os ingleses perfilharam, pode dizer-se que ela se consolidou ainda mais depois da reunificação alemã, isto é, depois de não terem conseguido evitar a reunificação alemã.

E daqui parto para a derradeira consequência: como não acredito numa “Europa” sem os ingleses, como não acredito numa Europa entregue aos alemães, a Europa vai-se desmembrar a pouco e pouco, ficando o projecto que agora existe como um projecto falhado e falido. Isto tem consequências más, inevitavelmente, mas também tem consequências boas: vai pôr-se termo a um projecto irreformável que estava conduzindo países para a degradante situação de protectorados e largas, muito largas, camadas da população dos países europeus para a proletarização e precarização sem direitos nem perspectivas em consequência de uma cada vez mais desigual distribuição dos rendimentos entre o capital e o trabalho.

O fundamentalismo democrático esgrimido por uma certa esquerda contra o BREXIT, além de ser de matriz neoconservadora, goza da companhia da direita plutocrática “defensora da Europa e dos direitos sociais” , como ontem à noite na “Quadratura do Círculo”,  Lobo Xavier se encarregou de ilustrar, mostrando-se muito preocupado com a sorte dos trabalhadores ingleses que iriam (na altura ainda não se acreditava na vitória do “leave”) ficar sem a protecção da Europa.

Para terminar, Augusto Santos Silva está a ser entrevistado na RTP sobre este tema. Deveria pura e simplesmente reproduzir as palavras do Primeiro Ministro e não louvar-se nas do sr. Juncker, um imbecil.