quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

INGOVERNABILIDADE OU DESRESPEITO PELA VONTADE POPULAR?

A TENTAÇÃO HEGEMÓNICA DOS PARTIDOS DO BLOCO CENTRAL

Diz-se com frequência que Portugal tem um problema de governabilidade, porque o sistema eleitoral não gera com facilidade um governo apoiado por uma maioria absoluta monopartidária saída das eleições. E aduz-se em defesa desta tese o facto de somente por três vezes os eleitores haverem conferido a maioria absoluta a um partido, duas vezes a Cavaco e uma vez a Sócrates.
Todas as demais experiências se consideram fracassadas, ou porque os governos minoritários não concluíram a legislatura (com excepção do I Guterres) ou porque as coligações acabam por sucumbir às divergências partidárias.
Face a esta “desgraça”, apenas se antevêem dois remédios: modificar o sistema eleitoral, favorecendo a criação de maiorias eleitorais artificiais sem verdadeira correspondência no voto popular ou limitar drasticamente a função legitimadora do Parlamento, circunscrevendo em apertados limites o espaço da sua acção fiscalizadora e censória.
Esta tese é perigosa, antes de mais porque é anti-democrática. Mas, além de perigosa, é racionalmente insustentável, porque na realidade não existe em democracia uma relação entre governabilidade e composição parlamentar. Se a tese acima exposta pudesse ser racionalmente demonstrada ela levaria fatalmente à conclusão de que a governabilidade só estaria assegurada em regime de partido único. Mais ainda: como o regime de partido único desprovido de instrumentos de coacção correria o risco de transferir os conflitos intra-sistemáticos para fora do sistema, isto é, para a rua, seria necessário acrescentar ao regime de partido único uma força de coacção tendencialmente destinada a eliminar o dissenso.
Tenho dificuldade em seguir uma demonstração que mistura elementos pretensamente factuais com proposições puramente ideológicas cuja introdução no discurso se insere numa lógica mistificadora destinada a perturbar a compreensão do problema. Por exemplo, afirmar que sem maiorias absolutas não se podem por “em ordem” as finanças públicas ou não se fazem “reformas importantíssimas” cheira-me exageradamente a “salazarismo democrático” para que tal argumento possa ser levado a sério.
O problema português, portanto, não é um problema de governabilidade, mas antes um problema de respeito pela vontade popular. O sistema eleitoral em vigor, embora proporcional, favorece os dois partidos mais votados e inutiliza milhares e milhares de votos dos partidos minoritários. Pois, mesmo neste quadro, altamente favorável aos partidos mais votados, que elegem cada um dos seus deputados com um número de votos muitíssimo inferior ao que os minoritários necessitam para eleger os seus, eles manifestam uma profunda incapacidade de respeitarem a vontade popular, mediante a constituição de alianças que lhes permitam o apoio suficiente na câmara para governar.
Não é o sistema que em si dificulta as coisas, tanto mais que sistemas iguais ou semelhantes ao nosso existem por essa Europa fora sem que este dramatismo da governabilidade seja permanentemente agitado. O que torna as coisas mais difíceis em Portugal é a tentação hegemónica dos partidos do bloco central e a sua nula capacidade para aceitarem democraticamente a repartição do poder. O defeito não é portanto do sistema, mas dos actores que nele desempenham um papel maior, cuja tentação hegemónica amiúde os afasta do respeito pela vontade popular.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

DANIEL BARENBOIM: A VOZ DA RAZÃO

QUE TERMINE A MATANÇA ISRAELITA EM GAZA

Daniel Barenboim tem dedicado a sua arte à causa da paz: procura através da música a harmonia entre os homens. Aqui há uns anos tocou Wagner, o músico maldito, pela primeira vez em Israel. Em 1999 fundou com o intelectual palestiniano Edward Said a West-Easter Divan, uma orquestra formada por jovens intérpretes israelitas e palestinianos. E sempre que as coisas se agravam lá se ouve a sua voz, protestando contra a injustiça e a barbárie.
Negando o que parece evidente, a sua tese assenta numa ideia muito simples: o conflito israelo-palestiniano não é conflito político como outros, em que se lute pela conquista de recursos ou de territórios. É um conflito humano que ninguém quer ver com as características que tem: ambos os povos têm a profunda convicção de que têm o direito de viver naquele pedacinho de terra. Trata-se de dois povos cujo destino está intrinsecamente interligado, não podendo haver solução que seja boa para um e má para outro. Portanto, não pode haver solução militar. A única saída passa por cada uma das partes admitir a posição da outra.
Este ano Barenboim terá a honra de dirigir o Concerto de Ano Novo de Viena. E foi em Viena, onde prepara o concerto, que Barenboim criticou duramente a matança de Gaza, como algo de “absolutamente inaceitável, de humanamente inaceitável”!

O HORROR DE GAZA


A HIPOCRISIA DO MUNDO OCIDENTAL


Em resposta a uns mísseis lançados pelo Hamas contra a potência ocupante, Israel desencadeou o maior contra-ataque de que há memória nas conturbadas relações israelo-palestinianas. Num território superpovoado por gente miserável, Israel não se inibiu de atacar todos os alvos considerados importantes, quaisquer que fossem as consequências para centenas de civis que vivem paredes meias com os militantes do Hamas. Indiscriminadamente, Israel mata crianças, mulheres, velhos, inocentes numa demonstração sem precedentes de impiedade e falta de compaixão. O mundo ocidental, que tão exuberantemente demonstra a sua cólera sempre que um qualquer pequeno ditador desfia os seus interesses ou viola aquilo a que chama direitos humanos, mostra-se completamente indiferente, se não mesmo compreensivo, face à barbárie israelita.
O que se está a passar em Gaza cavará um fosso ainda mais profundo entre o ocidente e o mundo muçulmano, que dará seguramente lugar a mais de vingança orientada pelo desespero de quem se sente só e sem protecção.
Enquanto o problema de Israel não for resolvido – insisto, o problema é Israel –, enquanto a chantagem do holocausto continuar a perturbar as nossas mentes, enquanto não formos capazes de desligar estes judeus dos que sofreram os horrores do nazismo, enquanto não formos capazes de afirmar que estes judeus que hoje governam Israel massacram, matam e condenam ao sofrimento milhares e milhares de pessoas com a mesma falta de compaixão e com a mesma impiedade dos nazis, enquanto não formos capazes de transformar este grito de revolta em acção o Ocidente nunca mais terá paz!

CAVACO ATACA FORTE

O CONFLITO ESTÁ INSTALADO

Tal como num casal há muito desavindo, qualquer motivo, por mais estúpido que seja, pode dar lugar às mais violentas consequências, também o Estatuto dos Açores serviu de pretexto para evidenciar o conflito latente que há muito se pressentia entre o Presidente e o Partido Socialista no poder.
O PS e os demais partidos parlamentares, consciente ou inconscientemente, aprovaram o Estatuto dos Açores com normas claramente inconstitucionais; Cavaco Silva, negligentemente ou propositadamente, não suscitou a fiscalização preventiva dessas normas ao Tribunal Constitucional. Preferiu fazer uma inusitada comunicação ao país, mal compreendida pela generalidade das pessoas; o PS, com as eleições dos Açores à porta, seguiu em frente e aprovou o diploma sem atender às reclamações de Cavaco. Desautorizado, Cavaco vetou o diploma. O PS, refém do PS regional, decidiu afrontar Cavaco e voltou a aprovar o diploma sem o alterar.
Cavaco, obrigado a promulgar o Estatuto, optou por lançar um forte ataque ao PS e a Sócrates, responsabilizando-os por cederem a interesses partidários em detrimento do respeito devido à Constituição. Acusou-os de deslealdade, de quebra de solidariedade institucional e de porem em causa o regular funcionamento das instituições.
Evidentemente, que neste conflito ninguém se lembra de responsabilizar a Assembleia da República porque toda a gente sabe que os deputados limitam-se a obedecer ao partido que os elege. A soberania não está na AR, mas nos partidos nela representados. Por isso, as palavras de Cavaco são contra Sócrates e contra o PS.
Depois do que aconteceu, Sócrates só tem duas saídas, qualquer que venha a ser a decisão do TC em sede de fiscalização sucessiva: ou inventa um candidato presidencial que possa derrotar Cavaco ou ganha as próximas legislativas por maioria absoluta. Se ficar com maioria relativa, e Cavaco permanecer no cargo, será feito em “picadinho”, não havendo “determinação” nem arrogância que lhe valha.

SOBRE O ATAQUE ISRAELITA


ALGUNS ESCLARECIMENTOS

Duas observações sobre o que foi escrito no postA represália judaica assenta na lógica nazi”e sobre os comentários.
Em primeiro lugar, em momento algum, neste blogue ou em qualquer outra parte advoguei a erradicação de Israel como Estado independente. Limitei-me a afirmar que a política de Israel é, além do mais, suicidária; se o mesmo rumo se mantiver cada vez serão menores no futuro as possibilidades de Israel coexistir no Médio Oriente com os vizinhos que tem, porque esses, Israel, por maior que seja o seu poderio, não os pode mudar. Basta que, por um daqueles movimentos imparáveis e imprevistos da História, o Egipto mude de campo para que tudo radicalmente se altere.
Em segundo lugar, não omiti que a represália israelita tenha tido como causa próxima o ataque palestiniano; propositadamente, não falei em culpas. É que Israel ocupa ilegalmente uma parte considerável do território palestiniano e por mais negociações que haja não manifesta a menor intenção de regressar às fronteiras reconhecidas pela ONU. Culpa de quem? De quem luta pela constituição de um Estado minimamente viável ou de quem, a qualquer preço, quer impedir o surgimento desse Estado?
Não falei de culpas, propositadamente, ainda por outra razão. Na verdade, há bons motivos para supor que com este ataque, feito nesta data e com a intensidade com que tem sido levado a cabo, mais do que neutralizar o Hamas (o que certamente não conseguirá), o que Israel verdadeiramente pretende é condicionar ou mesmo neutralizar qualquer iniciativa da nova administração americana. De facto, a violência do ataque e as suas sequelas entre os palestinianos e no mundo árabe ou mesmo muçulmano não vão permitir que, nos anos mais próximos, se regresse ao statu quo ante. Tempo mais do que suficiente para que o lobby judaico vá “trabalhando” a nova administração. E depois tudo recomeça praticamente de novo, como sempre tem acontecido nestes últimos vinte, trinta anos.
Em conclusão: Israel tem direito à existência e a comunidade internacional deve constituir-se garante desse direito, desde que Israel respeite o direito internacional e cesse a ocupação de todos os territórios que ilegalmente ocupa.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

A VELHA DIREITA DÁ A RECEITA PARA SAIR DA CRISE



NA HORA DA VERDADE VALHA-NOS A SINCERIDADE

Quando tudo corre bem, quando os lucros sobem em catadupa, quando os negócios se multiplicam, quando o Estado não cessa de fazer encomendas cada vez mais vantajosas para quem as presta, a direita bem instalada esquece as suas origens, o seu passado militante ao serviço da ditadura e torna-se uma voz respeitada ao serviço da democracia. Os jornais asseguram-lhe periodicamente um espaço, as televisões reclamam o seu sábio comentário e tudo adquire um ar muito respeitável.
O pior é quando a crise estala e atinge proporções antes insuspeitadas. Os negócios passam de auspiciosos a ruinosos, tenta-se a todo o custo a ajuda do Estado para cobrir com a sua incomensurável generosidade os prejuízos sofridos e quando já se desconfia que nem assim as coisas voltam ao que eram, dá-se a receita para a combater. Com o mesmo à vontade com que ontem se conspirava contra Marcelo para restaurar Salazar. As medidas propostas não poderiam ser mais apelativas…nem mais sinceras:
Primeira – Trabalhar mais e ganhar o mesmo ou menos (e dá-se o exemplo: Américo Amorim trabalha mais de 10 horas por dia há mais de 56 anos; mas não se pergunta, como Brecht: “E não leva com ele, ao menos, um cozinheiro?”;
Segunda – Despedir trabalhadores (e mais um exemplo: é esse o modelo americano);
Terceira – Reduzir ou eliminar os prémios dos trabalhadores, os fringe benefits (assim é mais fino…) e os subsídios, como os de Natal e de férias;
Quarta – Auto-financiamento das empresas, ficando os empresários com as merecidíssimas reservas um pouco diminuídas (mas logo se reconhece que esta medida não pode, infelizmente, ser adoptada: eles estão nas lonas, não têm capital);
Quinta – Aumentar o endividamento bancário, atrasar o pagamento aos fornecedores, reduzir a qualidade dos serviços e, consequentemente, os custos (também neste caso, logo se reconhece que este caminho não pode ser trilhado);
Sexta – Reduzir drasticamente os custos de actividade do Estado, transferindo para os patrões os impostos pagos pelos trabalhadores e as contribuições para a segurança social, que os receberiam a título de empréstimo gratuito, isto é, sem juros (pelos trabalhadores digo eu, o nosso proponente diz que quem paga os impostos dos trabalhadores são os patrões!).
Comentários: Eu penso que o receituário proposto está relativamente incompleto, embora nada garanta que a adenda a seguir proposta necessite de aprovação para ser aplicada:
Primeira - O Estado deve garantir o capital dos grandes accionistas e a sua justa retribuição às taxas a que estavam acostumados, se necessário também à custa dos depositantes e dos pequenos accionistas;
Segunda – Aumentar os ordenados, prémios e demais benefícios dos executivos dos bancos e das grandes empresas monopolistas como estímulo indispensável ao relançamento da economia pela via do aumento da procura;
Terceira – Garantir, pela via das encomendas do Estado, aos grandes escritórios de advogados, se necessário em regime de exclusividade, um volume de negócios francamente superior ao do primeiro Governo Guterres.
ADITAMENTO
Para que não haja dúvidas: a proposta das seis medidas tem autor e é pública; a adenda é da minha lavra, embora me tivesse esforçado por ser fiel ao espírito do proponente.

domingo, 28 de dezembro de 2008

AS AFIRMAÇÕES DE CADILHE SOBRE O BPN


NACIONALIZAÇÃO POR MOTIVOS POLÍTICOS?

Num longo depoimento transcrito pelo Correio da Manhã, Miguel Cadilhe afirma que a nacionalização do BPN teve motivações políticas que nunca foram clara e completamente expostas aos portugueses.
Depois de mais esta explicação de Cadilhe sobre as propostas alternativas que apresentou ao Ministro das Finanças, fica-se a saber, sem qualquer espécie de dúvida, de que tanto as propostas da administração do banco, como a solução adoptada pelo Governo são lesivas do interesse dos contribuintes. E fica também cada vez mais claro, que a solução correcta teria sido a falência, cobrindo o Estado os depósitos, nos termos da lei e apenas nos termos da lei, na medida em que o activo do Banco e do grupo em que ele estava inserido não fosse suficiente para os honrar.
Por último, fica-se sem perceber o quer Cadilhe dizer com motivações políticas. Estas afirmações sem um mínimo de fundamentação, se fossem levadas a sério, abririam a porta a todo o tipo de especulações. Acho que, em vez de entrar nesse jogo, o mais aconselhável será exigir que Cadilhe se explique. Se ele nada mais disser sobre o assunto, não será muito difícil tirar a conclusão.

A REPÚBLICA CHECA NA PRESIDÊNCIA DA UNIÃO EUROPEIA



COMO SE COMPORTARÁ VÁCLAV KLAUS?

Depois de uma presidência muito activa de Sarkozy, segue-se a da República Checa, que apresenta como grande ponto de interesse o desempenho pessoal de Václav Klaus, presidente da república Checa.
Embora o seu papel seja fundamentalmente protocolar, dada a natureza parlamentar do regime, é com alguma expectativa que se aguardam as suas intervenções em actos em que, por força do protocolo, tenha de presidir.
Para começar, já decidiu que a bandeira comunitária não será hasteada no Castelo de Praga, sede da presidência da República Checa, “por lhe fazer lembrar a da União Soviética”.
Klaus é um liberal puro e duro. Admirador confesso de Margaret Thatcher e da política de Bush, tem-se distinguido por atacar com alguma violência verbal aquilo a que chama a fúria controladora de Bruxelas. É um campeão da luta anti-ecológica, nega que haja mudança climática e combate as energias alternativas considerando-as um grande sorvedouro de dinheiros públicos.
É igualmente contra o Tratado de Lisboa, responsabilizando-o por agravar ainda mais a desigualdade entre os Estados no seio da União. Por fim, considera a presidência de turno pouco importante, porque quem verdadeiramente marca a agenda são as potências que comandam a União Europeia.
Enfim, tudo aponta para que Praga nos próximos seis meses possa vir a ser cenário para alguns acontecimentos divertidos.

sábado, 27 de dezembro de 2008

A REPRESÁLIA JUDAICA ASSENTA NA LÓGICA NAZI



O MASSACRE DE GAZA

O que se está a passar na Faixa de Gaza não deixa nenhuma dúvida, para quem porventura ainda as tivesse, sobre os processos de actuação de Israel. Não se trata de uma reacção desproporcionada ao ataque palestiniano, como à primeira vista poderia supor-se. Reacções desproporcionadas têm frequentemente as grandes potencias sempre que os seus interesses são ameaçados ou atingidos. Os Estados Unidos e a Rússia têm nos últimos tempos reagido desproporcionadamente contra quem ataca pessoas e bens sob a sua protecção.
No caso de Israel, a lógica subjacente à retaliação é provocar um tal terror naqueles que lutam pela criação de um Estado palestiniano viável, através de uma resposta indiscriminada e em grande escala, provocando grandes massacres, que desencorajem futuras acções. Foi assim que os nazis actuaram nos quatro cantos da Europa. Em Lidice, em Lyon, em Praga, em Varsóvia, em múltiplos lugares da União Soviética. Mesmo assim perderam, foram derrotados e o nazismo erradicado até hoje da superfície da terra. A Israel, mais tarde ou mais cedo, vai acontecer o mesmo.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

PARA ANA JORGE O SNS SERVE PARA TRATAR OS DOENTES

A DEFESA DOS UTENTES


Ana Jorge tem um longo passado de dedicação ao serviço público. Como médica e como servidora do Estado. No desempenho das funções de Ministra tem-se distinguido pela defesa dos doentes e do Serviço Nacional de Saúde. Ela não é uma Ministra que imponha permanentemente restrições e sacrifícios com vista a uma mirífica felicidade futura. Ela preocupa-se também com o presente, com o curto-prazo e não há nada que necessite mais do curto-prazo do que a doença.
A recente portaria sobre os tempos mínimos é um bom exemplo de quem olha para as pessoas como uma realidade concreta e não como uma simples estatística.

GUANTÁNAMO E A UNIÃO EUROPEIA



A PROPOSTA DE LUIS AMADO



No próximo dia 26 de Janeiro a União Europeia vai discutir a proposta apresentada por Luis Amado sobre o acolhimento de presos de Guantánamo.
Contrariamente ao que foi veiculado por certos órgãos de informação nacionais e também norte americanos, não existe na UE uma predisposição de princípio para acolher em território europeu os detidos em Guantánamo que os Estados Unidos não conseguem incriminar. Na verdade, o que se passa é bem diferente: há quem seja radicalmente contra, há quem não tenha manifestado qualquer posição ou sequer opinião e há quem aceite uma posição europeia concertada.
Entre os que são manifestamente contra contam-se, pelo menos, a Holanda, a Dinamarca e a Suécia com argumentos muito próximos dos que aqui, neste blogue, foram adiantados: o problema foi criado pelos americanos, eles é que têm de o resolver. Não faz sentido que a Europa vá acolher incondicionalmente pessoas detidas por largo tempo num campo de concentração, sem que a justiça americana tenha pronunciado um veredicto.
Depois, há os que, como a Alemanha, estão disponíveis para encontrar uma solução no quadro da União Europeia; uma solução concertada entre os europeus e negociada com os Americanos.
A maior parte dos Estados da UE, porém, não se manifestou e qualquer observador atento perceberá que não será fácil concertar uma posição entre Estados que têm tido relativamente a esta questão, desde o seu início, posições tão diversas. Com efeito, há países que disponibilizaram o seu território para a instalação de centros de detenção, como a Polónia e a Roménia; há países que permitiram que o seu espaço aéreo ou mesmo os seus aeroportos fossem utilizados como pontos de apoio ao sequestro de prisioneiros em trânsito, como é o caso da Espanha; há países cuja colaboração com os americanos se suspeita mas que negam ter concedido qualquer autorização para a prática daqueles actos, embora seja certo ter o respectivo território sido utilizado para aquele efeito, como é caso de Portugal; e há, finalmente, países que nada têm a ver com Guantánamo e sobre os quais não recai qualquer suspeita, como é o caso dos países nórdicos.
Exposta assim a situação no quadro da UE, não deixa de levantar as maiores interrogações a posição assumida por Portugal. De facto, o nosso país não se limitou a apresentar uma proposta aos seus parceiros da União Europeia; Portugal aassumiu imediatamente o compromisso de receber os detidos e convidou os demais países a seguirem o seu exemplo. Esta posição da diplomacia portuguesa é a vários títulos lamentável. Vejamos porquê:
Em primeiro lugar, é lamentável internamente porque ela não foi concertada com o Presidente da República (e é bom não menosprezar ospoderes presidenciais em matéria de política externa); não foi concertada com as demais forças políticas representadas no Parlamento; e não foi minimamente debatida na sociedade portuguesa para se aferir do sentir da comunidade sobre uma matéria tão melindrosa.
Em segundo lugar, é inadmissível que Portugal, fazendo parte de uma organização como a União Europeia, com elevados níveis de integração, nomeadamente no que respeita ao livre trânsito das pessoas no espaço Shengen, tenha adiantado uma posição sem previamente a concertar com os seus parceiros. É caso para perguntar que compromissos tem Portugal com os Estados Unidos nesta matéria que o levam a assumir unilateralmnte posições em assuntos tão sensíveis, sem primeiramente os discutir no seio da organização em que está tão intrinsecamente integrado.
Em terceiro lugar, nem sequer é seguro que Portugal tenha condições diplomáticas para manter a sua proposta qualquer que seja a nacionalidade dos detidos. Há países, como a China, que já declararam que não aceitam que os seus nacionais sejam enviados para outros países.
Finalmente, é de uma completa falta de brio e de orgulho nacional que tendo sido Portugal comprometido e até humilhado nesta matéria pelos Estados Unidos, que utilizaram o território português para sobrevoo e escala de prisioneiros sequestrados, sem sequer avisarem o Governo do que estavam a fazer (como o Ministro os Negócios Estrangeiros não se cansa de referir), contrariamente ao que fizeram relativamente a outros, como a Espanha, seja esse mesmo Governo a oferecer-se aos Estados Unidos para lhes resolver um problema que eles próprios criaram. Há limites para tudo, até para este tipo de amizades...
...

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

O BISPO AUXILIAR DE LISBOA NA QUADRATURA DO CÍRCULO

UMA VISÃO MUITO SUPERFICIAL DA REALIDADE


A SIC Notícias tem vindo a transmitir durante a tarde um extracto da intervenção do Bispo Auxiliar de Lisboa no Programa Quadratura do Círculo, convidado, ao que suponho, a título excepcional por se tratar do último programa do ano.
Logo à noite, muito provavelmente, não verei o programa, por isso, fazendo desde já um comentário, corro o risco de não estar completamente inserido no contexto da intervenção daquele eclesiástico, de que apenas conheço o extracto que tem vindo a ser passado nos noticiários da "hora certa".
Acho, apesar desta limitação, que não há contexto que valha ao Bispo Auxiliar de Lisboa. Afirmar que a revolta dos estudantes de Atenas se deve a uma "falta de valores e de princípios", presumo que da juventude, nomeadamente estudantil, releva de uma superficialidade de análise com que não se contava numa pessoa que exerce um lugar tão importante na hierarquia da Igreja na diocese de Lisboa e, porventura, no país.
Se há seguramente razões bem mais profundas para tudo o que está a acontecer na Grécia do que a morte de um estudante, pela polícia, no princípio de Dezembro, elas não são certamente a tal crise de valores e de princípios da juventude. Que se pode esperar hoje de uma juventude academicamente preparada com licenciaturas e doutoramentos, se em geral no futuro apenas pode aspirar a empregos precários de 600 euros? Falta de valores de quem? Desta sociedade que em nome de uma competitividade desenfreada, tentada a qualquer preço, relega para o simples domínio das coisas as pessoas que trabalham por conta doutrem? Ou das pessoas que são vítimas deste sistema?
O ilustre prelado parece muito impressionado com os vidros partidos, as correrias nas ruas, os ingénuos ataques à polícia e muito pouco tocado pela sorte de uma juventura que encara o futuro com grande ansiedade e apreensão.Por favor, deixe esse tipo de comentários para os paulos dentinhos das televisões oficiais e analise a realidade com a profundidade que ela merece.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O ERRO IMPOSSÍVEL

A IMPUNIDADE DOS BATOTEIROS

É praticamente impossível que o lance do golo anulado ao Benfica no jogo de segunda-feira à noite contra o Nacional se tenha devido a um simples erro do árbitro ou ao critério por ele usado na interpretação da lei.
Erro não foi. O árbitro estava perto do lance e ele próprio, para que não houvesse dúvidas, primeiro por gestos e depois por palavras, se encarregou de explicar que o jogador que estava no chão tocou a bola com a mão, alterando a trajectória da bola.
É uma explicação que se aceita e eu até concordo com ela, mediante uma simples adenda, apesar das leis do International Board dizerem expressamente que somente há falta se houver a intenção de jogar a bola com a mão. Todavia, como é muito difícil aferir da intencionalidade do agente, mesmo no decurso de um julgamento, muito mais o será num jogo de futebol em que o juiz tem de decidir no momento com base no que vê. Por isso, aceita-se que um árbitro perfilhe como critério de interpretação da lei o princípio de que sempre que a bola toque no braço ou não mão haverá falta, desde que o braço não esteja completamente junto ao corpo. Dito de outra maneira: só não haverá falta se o braço estiver colado ao corpo, de tal modo que a bola se não batesse no braço bateria no corpo e sempre a sua trajectória seria alterada no mesmo sentido.
Não posso afirmar, apesar de ter visto a jogada várias vezes, que o jogador do Benfica que estava caído no chão tivesse braço completamente junto ao corpo. Pareceu-me que tinha, no momento em que a bola lhe bate, mas não tenho a certeza.
Vamos então admitir que o árbitro teve no instante, porventura por estar mais perto do lance, a certeza que eu não tenho, marcando consequentemente a respectiva falta.
Mas se este é o critério de interpretação que o árbitro usa como se pode explicar que um ou dois segundos antes ele não tenha marcado falta (penalty) por um jogador do Nacional ter alterado com a mão dentro da área a trajectória de uma bola jogada por um jogador do Benfica?
Não há outra explicação: o árbitro fez batota. E pior ainda: vai ficar impune por nada se provar...


A POSIÇÃO DO FMI SOBRE A CRISE

A ENTREVISTA DE OLIVIER BLANCHARD AO LE MONDE

A actual direcção do FMI, menos ligado à ortodoxia monetarista do que suas antecessoras, não tem dúvidas em aconselhar o aumento das despesas públicas pela via do investimento público como meio adequado para combater a crise.
O FMI, pela voz do seu economista chefe, Olivier Blanchard, vai mesmo ao ponto de afirmar que, se nada se fizer ou se o que for feito não for suficiente, se cairá numa grande depressão.
A via proposta pelo FMI pode ser a mais adequada para os chamados países ricos, mas para países como Portugal, de rendimento intermédio e com grandes desigualdades, os receios invocados relativamente à baixa de impostos não têm razão de ser, contanto que o Estado apenas baixe os impostos directos e esse benefício reverta exclusivamente a favor das classes com rendimentos baixos e médios. Como estes rendimentos são, em termos absolutos, muito baixos não se corre o risco de os beneficiários aforrarem o que deixam de pagar ao Estado. Vão seguramente gastá-lo, sobreendividados como estão.
Por outro lado, é preciso não esquecer que os investimentos públicos, se forem grandes, tardam a produzir efeitos. É preciso cortar alguns grandes e fazer vários pequenos.
E relativamente aos grandes é necessário dar prioridade àqueles que mais possam contribuir para combater a crise, tendo sempre presente que da crise só se sai, ou se evita uma situação ainda pior do que a que já existe, pela via do relançamento da procura.
Actuando assim atender-se-á às pessoas, em primeira linha, e combater-se-á eficazmente a crise. Se o Governo apenas estiver interessado nas empresas, melhor: nalgumas empresas não vai conseguir relançar a procura...embora vá certamente encher os bolsos dessas empresas....
Mas é certamente pedir demais a um governo como o nosso que esteja preocupado com quem trabalha. Um governo que ostenta o invejável troféu de ter aprovado uma norma do Código do Trabalho rejeitada por todas as forças politicas e por todos os juízes do Tribunal Constitucional
A favor somente os amigos do Governo: a CIP, as demais organizações patronais e os patrões que defendem que a competitividade da economia portuguesa apenas se consegue pela eliminação dos direitos de quem trabalha e consequente sobreexploração.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A CRISE ECONÓMICA E O DISCURSO DE SÓCRATES



O GRANDE INVESTIMENTO PÚBLICO NÃO RESOLVE A SITUAÇÃO A CURTO PRAZO

Na sequência das medidas tomadas para combater a crise financeira, o governo no quadro do chamado pacote comunitário tomou um conjunto de medidas para fazer face à crise económica. À que já ai está e à que ai vem.
A crise económica pode sintetizar-se nas palavras do Governador do Banco de Espanha que ontem aqui transcrevi: o mercado interbancário não funciona, os consumidores não consomem, os empresários não contratam, os investidores não investem e os bancos não emprestam.
O governo português assentou o seu plano de combate à crise numa retórica emprestada de Paul Krugman (que adiante analisaremos) e num conjunto de medidas entre as quais sobressaem como determinantes o grande investimento público. Estas medidas são fundamentalmente viradas para as empresas e quase nada ou muito pouco para as pessoas.
Se é certo que a superação da crise passa pelo relançamento da procura, tanto interna como externa, e sendo igualmente certo que a capacidade para influenciar o relançamento da procura externa é quase nula, temos de concluir que as medidas adoptadas pelo governo não vão a curto prazo contribuir sequer para atenuar a situação, uma vez que elas vão ter a curto e médio prazo um efeito diminuto sobre a procura interna.
O investimento público é certamente uma medida adequada numa conjuntura de completa retracção, mas isso não significa que todos os investimentos produzam o efeito esperado (um mau investimento é sempre um mau investimento, qualquer que seja a conjuntura) nem que os efeitos que deles se esperam se produzam a curto prazo: quanto maior for a sua complexidade e dimensão mais tardios eles serão.
O unilateralismo do governo no combate à crise económica não augura nada de bom. O governo deveria equilibrar o investimento público necessário, pequeno e grande, com medidas de outra ordem destinadas a garantir um acréscimo do poder de compra às camadas mais numerosas da população. Menos impostos directos para os rendimentos baixos e médios e mais medidas de natureza social para os directamente atingidos pela crise. Fazendo incidir o essencial da sua política no grande investimento público sabe-se antecipadamente quem vai ficar a ganhar e atende-se muito pouco a quem já está a perder.
Curiosamente ou talvez não, Sócrates tem acompanhado o anúncio das medidas governamentais de combate à crise de uma retórica assente naquilo a que se poderia chamar um extremo pragmatismo. Diz ele, em épocas de crise tem se actuar rapidamente porque o erro decorrente da inacção é sempre bem mais grave do que o erro resultante de se actuar mal. E depois acrescenta: nestas ocasiões temos de pôr de parte os nós ideológicos que nos enredam e fazer fluir o sistema com a intervenção do Estado.
Ideias interessantes estas que Krugman defendeu na América para obrigar Bush a actuar contra os seus fundamentos ideológicos. Mas ao serem retomadas linha por linha, conceito por conceito, pelo responsável máximo do “grande partido socialista português popular e moderado” nós ficamos a compreender que o constrangimento que tais medidas lhe causam apenas é superado pelos efeitos que delas se espera.

A CRISE FINANCEIRA E O SISTEMA BANCÁRIO PORTUGUÊS

POR QUE RAZÃO TEM A CGD DE SUPORTAR A MAIOR PARTE DOS ÓNUS?

O Governo tomou um conjunto de medidas destinadas a combater a crise financeira orientadas a dois objectivos: impedir a falência do sistema bancário e favorecer o crédito. Ainda é cedo para avaliar com rigor os efeitos de tais medidas, tanto mais que só muito moderadamente os bancos têm recorrido aos instrumentos que o Governo pôs à sua disposição para aquele efeito, mas o que já se está a passar levanta as mais sérias reservas acerca do modo como esta política está a ser conduzida.
Com excepção das grandes intervenções no BPN e no BPP, onde entrou dinheiro fresco, directa ou indirectamente proveniente dos cofres do Estado, as demais intervenções traduziram-se na concessão de garantias pessoais concedidas pelo Estado para facilitar a contracção de empréstimos no mercado interbancário.
Se as intervenções directas no BPN e no BPP, embora levadas a cabo de forma diferente, são altamente contestáveis porque nem a natureza nem a dimensão dos bancos em questão justificavam um tão intenso empenhamento do Estado, já as demais intervenções nos restantes bancos ou se revelaram insuficientes para atingir o fim em vista, como aconteceu com a Caixa, que apesar do aval do Estado não conseguiu no mercado internacional o empréstimo que pretendia, obrigando o Estado a um aumento do capital social de dois mil milhões de euros, ou, quando esse objectivo foi atingido, ficou por concretizar o fim que justificou a adopção desta medida: a concessão de crédito às empresas.
Hoje, começa a ser claro para todos que se os bancos não emprestam isso se não deve a um qualquer maquiavélico capricho dos banqueiros, mas a uma total falta de confiança no que vem a seguir. Os bancos emprestam para que o capital lhes seja devolvido com juros. Se, porém, o seu receio quanto ao futuro é total e ainda por cima estão eles próprios super endividados o mais natural é que se retraiam.
É neste específico contexto que a dualidade de critérios que tende a impor-se na banca portuguesa, onde há um banco público forte e vários bancos privados, é altamente perigosa para o interesse público. Sendo a Caixa Geral de Depósitos pressionada a emprestar, quer no quadro interbancário, quer no crédito empresarial, e a emprestar em sectores de actividade e em condições muito diferentes das que normalmente o faria, para suprir o vazio deixado pelos demais bancos, o governo corre o risco de exaurir a Caixa Geral de Depósitos e de a expor a um risco quer se pode tornar funesto para milhões de portugueses.
Já está provado, apesar de a procissão ainda ir no adro, que as intervenções pela via dos avales não resolvem qualquer problema e só agravam a prazo a situação dos portugueses. Se o Estado quer mesmo que os bancos emprestem dinheiro o que deve fazer é participar no seu capital social com acções preferenciais e participar na sua gestão como já se fez noutros países em crises bem menos graves. Neste momento, os bancos não têm alternativa: têm de aceitar. Mas se perceberem, e já perceberam, que podem parasitar a Caixa, directa ou indirectamente, manter-se-ão na retranca, expondo-se o menos possível.
Será possível que o Governo não veja isto?

A ENTREVISTA DE PACHECO PEREIRA



OU A CRISE DE UMA DIREITA QUE NÃO ACERTA COM O RUMO

A entrevista de Pacheco Pereira ao Público/Rádio Renascença/RTP2 não nos traz nada de novo. O mesmo sectarismo de sempre, os mesmos ódios e os mesmos amores.
Como Pacheco Pereira está muito embrenhado na campanha anti-governo não lhe sobeja muita lucidez para analisar o efeito Alegre sobre o PS. Qualquer que seja ou venha a ser a acção de Alegre - ficar no partido (a mais provável), criar um partido (quase improvável) ou juntar-se ao Bloco num qualquer tipo de coligação permitido por lei (hipótese insusceptível de avaliação neste momento) – os seus efeitos sobre o PS serão diminutos nas legislativas, supondo relativamente semelhante à de hoje a situação económico-social por altura das eleições.
Todavia, se a crise económica se acentuar dramaticamente em 2009 ninguém está em condições, neste momento, de fazer previsões. Tudo pode acontecer. Até o que não se espera. Evidentemente, que o governo fará tudo o que estiver ao seu alcance para, até às eleições, atenuar os efeitos da crise. Mas há efeitos que o governo não pode de todo evitar, como um aumento considerável do desemprego no sector privado, e há efeitos que tenderão a verificar-se mal grado a actuação do governo, por manifesto erro de algumas das suas políticas económicas.
Depois vem os amores de estimação: dizer que Manuela Ferreira Leite tem qualidades políticas raras releva do surrealismo político. Nada no seu passado político, enquanto governante, nem no seu presente, como dirigente partidária, deixa perceber onde estão essas qualidades políticas raras. Pode a Senhora ser uma pessoa estimável, para quem a conhece na sua vida privada, mas nada do que até hoje fez na vida pública ou até do que mostrou saber lhe confere a atribuição daquelas qualidades.
Finalmente, a análise da figura do Presidente da República é feita em termos que nos fazem lembrar outros tempos. Tempos em que o chefe era o supremo guardião do interesse público. O impoluto e clarividente definidor desse interesse. Pacheco Pereira tem memória curta. Muito curta. As críticas que hoje se podem fazer a este e a outros governos socialistas na condução dos assuntos económicos são exactamente as mesmas que há dez anos se podiam fazer ao cavaquismo. É caso mesmo para perguntar quem leva a melhor nessa disputa…

AS PALAVRAS DO GOVERNADOR DO BANCO DE ESPANHA



A MAIOR CRISE DESDE A GRANDE DEPRESSÃO


As palavras de Miguel Angel Fernández Ordóñez, governador do Banco de Espanha, espelham bem o que é a actual crise: “O que estamos a viver tem dimensões históricas, com características globais, porque ninguém se livra dela. Tem uma enorme intensidade. A desconfiança é total. O mercado interbancário não funciona, e geram-se círculos viciosos: os consumidores não consomem, os empresários não contratam, os investidores não investem e os bancos não emprestam…”

BOLÍVAR FOI ASSASSINADO?


HUGO CHÁVEZ VAI INVESTIGAR

A versão oficial da morte de Simon Bolívar na noite de 17 de Dezembro de 1830, em Santa Marta, Colômbia, apontava como causa a tuberculose.
Hugo Chávez duvida. Suspeita que tenha sido assassinado por inimigos ao serviço dos Estados Unidos, da Inglaterra e de Espanha. A comissão encarregada de investigar as verdadeiras causas da morte do Libertador não descarta a hipótese de exumar o cadáver, depositado no Panteão Nacional de Caracas.
Os espanhóis, que ao abrigo da lei da memória histórica tem aberto fossas comuns, exumado corpos há muito sepultados, quer para conhecer a identidade dos mortos quer para apurar as causas da morte, ficaram muito nervosos com esta ideia de Chávez, que consideram pura demagogia.
Chávez insiste que o objectivo é democratizar a memória colectiva nacional.
A Colômbia reage mal por não ser chamada a colaborar e desvaloriza: “Se eles nem sequer são capazes de investigar os crimes actuais, que investigação vão fazer do que se passou há 178 anos”?

domingo, 21 de dezembro de 2008

O ESTATUTO DOS AÇORES



OUTRAS CONCLUSÕES

Dizer que Cavaco tem razão, mas que actuou mal foi o que aqui fizemos desde a primeira hora. Hoje, a situação evoluiu e o que interessa comentar já não é aprovação pela AR das normas cuja vigência Cavaco não suporta, mas os comentários dos que comentam aquela aprovação.
Eu sempre entendi que o Presidente dispunha de duas vias institucionalmente adequadas para se manifestar contra as normas que, segundo a sua opinião, punham em causa o equilíbrio de poderes constitucionalmente consagrados: uma, era o recurso ao Tribunal Constitucional em sede de fiscalização preventiva; outra, o veto político acompanhado da respectiva mensagem à AR.
Como se sabe, o Presidente não fez uma coisa nem outra. Optou por, na véspera das férias, anunciar uma comunicação ao país que horas mais tarde interpretou com um dramatismo excessivo e desproporcionado à importância do assunto em causa.
Ninguém o compreendeu, desde os partidos aos media, passando obviamente pela generalidade da população. E, a partir dai, ficou a perder. O que antes era simples e podia ser corrigido sem grande dificuldade tornou-se difícil e irreversível. Desnecessariamente, o Presidente somou uma derrota que poderia ter evitado.
Mas tudo isto já estava aqui dito em várias ocasiões e só vem novamente à baila em virtude de certas afirmações feitas por renomados constitucionalistas, em cuja argumentação vislumbro o desnudamento do sistema político português. De facto, afirmar que o Presidente actuou correctamente por ter questionado politicamente uma norma tida por manifestamente inconstitucional em vez de procurar a sua censura pela via judicial e culpar seguidamente o PS por uma aprovação apenas justificável pela subjugação do partido aos interesses políticos regionais assenta na pressuposição de que o órgão de soberania Presidente da República tem uma legitimidade acrescida relativamente aos demais, nomeadamente àquele que, tal como ele, retira a sua legitimidade do voto popular. Mas significa mais. Significa algo que não costuma ser dito, mas que a partir do momento em que entra como elemento normal de argumentação não permite mais tomar a sério a estrutura de poderes em que assenta a Constituição.
Culpar o PS, em vez de ver no acto de confirmação do diploma pela AR uma afirmação da sua legitimidade democrática, significa, no fundo, reconhecer que a Assembleia não goza de autonomia e exerce as suas funções à ordem do partido maioritário. Significa aceitar que na AR vigora um regime de soberania partidária e não de soberania popular. Por outro lado, diminuir o papel do Tribunal Constitucional não lhe confiando a resolução de um litígio que afecta o equilíbrio de poderes, que é um litígio tipicamente jurídico, significa igualmente não reconhecer àquele órgão a independência necessária para actuar com isenção.
Não vou negar estas duas conclusões subentendidas naquela argumentação. O que vou é dizer que o seu reconhecimento tem de levar a uma reforma do sistema político português e não apenas a uma rejeição da decisão tomada pela Assembleia da República. Uma reforma que dê lugar á eleição de representantes que verdadeiramente respondam perante quem os elegeu e não perante o partido que os incluiu nas listas, sem prejuízo de este maior controlo da actividade parlamentar pelos eleitores não significar a eliminação ou diminuição da representação adequada das minorias. E ainda uma reforma do Tribunal Constitucional que aponte para um recrutamento dos juízes completamente independente dos partidos representados no Parlamento.

UMA NOTINHA SOBRE O PROCESSO CASA PIA


À CONSIDERAÇÃO DE QUEM DECIDE

Os portugueses em geral compreenderiam muito mal que Carlos Silvino fosse condenado como “angariador de clientes” e simultaneamente o seu testemunho sobre a identificação desses mesmos clientes fosse desconsiderado por falta de credibilidade!

O PRÓXIMO CONGRESSO DO PS E A SUA ALA ESQUERDA



CONFIRMA-SE QUE O IMPORTANTE É “MANTER AS PONTES”


Confirma-se que a chamada ala esquerda do PS não quer apresentar qualquer moção alternativa no próximo Congresso.
O partido vai ficar muito virado para as tarefas da governação, o país está em crise, as eleições à porta, portanto o importante é “manter as pontes” com Sócrates, tanto mais que não há sinais de que certas personalidades venham a ser afastadas!
Assim, é que se faz política…

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O ESTATUTO DOS AÇORES

MAIS UM COMENTÁRIO

Quando a gente pensa que já está tudo dito sobre os Estatutos dos Açores, eis que surgem novos motivos de interesse para justificar o comentário.
Em primeiro lugar, as declarações de Eanes. Com o seu comentário, Eanes acaba por dar razão a Pires Veloso. Um obscuro major alcança a Presidência da República sem ninguém ter percebido porquê. Nem antes, nem depois do exercício dos mandatos. Exercendo o poder em períodos difíceis, sem nenhuma experiência democrática nem política, sempre sujeito a múltiplas influências, Eanes nunca conseguiu afastar do exercício da função presidencial a ideia da sua experiência mais próxima: comandante de quartel. Em consequência de alianças de circunstância, sempre instrumentais por parte de quem lhas prestava, Eanes foi somando vitórias e derrotas, acabando por ser derrotado quando ficou só e já sem préstimo. Podia ter aproveitado o tempo entretanto decorrido para aprender como funciona o sistema político português. Pelos vistos, não percebeu. Continua na mesma.
Em segundo lugar, as declarações de Manuel Queiró sobre o voto do CDS. Estas declarações fazem jus ao que aqui escrevi sobre a recente debandada do CDS. Queiró, como membro destacado da ala mais próxima da génese do partido e da ideia que presidiu à sua formação, tem dificuldade, por razões ideológicas, em compreender a estratégia de Portas. Isto, apesar de ele próprio, numa altura em que Cavaco tinha reduzido o CDS à sua ínfima expressão, ter protagonizado no Parlamento, mercê de uma série de equívocos, um dos ataques mais violentos a Cavaco, como Primeiro-ministro, e ter depois sido ele próprio alvo de uma demolidora resposta de Cavaco.
Em terceiro lugar, a espantosa atitude do PSD, que, acusando o PS de guerrear o Presidente da República, absteve-se na votação…

O NOTICIÁRIO DA TVI À SEXTA-FEIRA



UMA LOCUTORA COM AGENDA PRÓPRIA

Quem se dê ao trabalho de ver o jornal da TVI à sexta-feira fica certamente com a ideia de que a apresentadora tem uma agenda política própria, frequentemente inconsistente, mas sempre muito afirmativa. Não se conhece em nenhum outro lado, não apenas aqui, um jornal tão subjugado aos pequenos caprichos e às orientações políticas da apresentadora, nem se percebe como é que a estação permite uma coisa daquelas.
Este espectáculo atinge o paroxismo na parte final do jornal quando entra em cena Pulido Valente para comentar os temas da semana. Como a dita apresentadora tem dificuldade em o acompanhar, embora nunca prescinda de o fazer com trivialidades e banalidades, o comentador, vendo o seu discurso frequentemente interrompido, tenta às vezes salvá-la sem contudo prescindir de concluir o que quer dizer. E ela, coitada, insiste, insiste sempre com aquela teimosia de quem sente necessidade de nos evidenciar que não está a compreender o comentário.

A INTRIGA JORNALÍSTICA OU A ALA ESQUERDA À DERIVA



AINDA O PRÓXIMO CONGRESSO DO PS

Todos sabemos que existem jornalistas relativamente especializados na intriga política. Uns fazem intriga na esquerda, outros no PS, outros ainda na direita.
A jornalista que no Público tem por missão promover a chamada ala esquerda do PS, de Pedroso e companhia, dizia anteontem que este sector do partido teme uma inflexão de Sócrates ao centro; ontem, o receio já era de uma inflexão à direita. Em qualquer caso estava fora de questão, para a dita ala, afrontar a liderança ou sequer apresentar uma moção alternativa no congresso. Nesse sentido, as palavras de Paulo Pedroso, transcritas entre aspas, em discurso directo, para quem essa hipótese era completamente”destituída de sentido”.
Hoje, essa mesma jornalista, deixa de parte as inflexões – enfim, também já não tinha mais nenhum espaço para onde ir -, mas afirma que aquele deputado é visto, juntamente com outros, como um dos potenciais autores de uma moção estratégica de esquerda.
Ou seja: anteontem, para esse mesmo deputado, se eram verdadeiras as palavras que ela pôs na boca dele, essa hipótese era completamente destituída de sentido, hoje, segundo a jornalista, a apresentação de uma moção alternativa já é uma hipótese muito viável.
A efemeridade das notícias de jornal fazem com que seja completamente normal negar ontem o que hoje se confirma, porque o que realmente interessa é o efeito produzido por essa mesma efemeridade no momento em que a notícia é publicada.
Todavia, para quem se der ao trabalho de ligar o antes e o depois, o que parece depreender-se de toda esta intriga é a que a dita ala esquerda está com receio que Sócrates não a coloque nas listas em lugar elegível ou no lugar de destaque a que julga ter direito.


A INVESTIGAÇÃO JUDICIAL EM ESPANHA SOBRE GUANTÁNAMO



O QUE SE ESTÁ SABENDO


Em Portugal já se sabe como é: O Ministro dos Negócios Estrangeiros já garantiu que não há nem no MNE no MD documentos semelhantes ao que em Espanha foram publicados pelo El País.
Em Espanha, ontem foi a vez de Miguel Aguirre de Cácer, diplomata que recebeu o conselheiro militar espanhol e autor do documento “muito secreto” publicado pelo El País, ser ouvido pelo juiz da audiência Nacional, que investiga os presumíveis delitos de sequestro e tortura em voos da CIA.
O diplomata confirmou a autenticidade dos documentos publicados e confirmou que houve uma autorização política, adoptada nas instâncias superiores, para o pedido formulado pelas autoridades americanas, embora não saiba quem a concedeu.
Depois, o juiz quis saber por que razão estavam os americanos a pedir autorização para aterrar em Espanha em caso de emergência se, nessas circunstâncias, qualquer aeronave pode fazê-lo, mediante simples comunicação às autoridades locais de aviação. O diplomata explicou que o Convénio de Defesa entre os Estados Unidos e a Espanha exige uma autorização especial para os aviões que transportem “passageiros ou carga que possam ser controversos para Espanha”. Esta resposta só pode querer significar que tanto a Espanha como os Estados Unidos já sabiam que os prisioneiros em rota eram matéria controversa para Espanha.
A resposta do diplomata e a conclusão que dela se retira só são importantes porque, poucos dias antes, altos responsáveis do PP disseram que “àquela época não se tinha consciência da natureza ilegal daquela transferência de prisioneiros”.
Por outro lado, o diplomata também esclareceu que a questão não foi tratada no Comité permanente Hispano-Americano, que é a sede própria para tratamento de todos as matérias relacionados com o Convénio de Defesa, em virtude da natureza eminentemente política do assunto.
Mas há mais: o diplomata confirmou que aqueles assuntos, dada a sua natureza, não costumam ser tratados por escrito. Daí que não seja de estranhar que não haja qualquer pedido por escrito dos EUA, nem tão-pouco uma resposta, por escrito, de Espanha, concedendo a permissão para as escalas ou para os sobrevoos.
O documento escrito que há é o do diplomata aos seus superiores, obviamente para transferir a responsabilidade em assunto de tanta gravidade e melindre. Perguntado ainda porque qualificou a informação de “muito secreta”, respondeu que com isso não pretendia ocultar a colaboração espanhola, mas garantir o segredo da transferência dos presos para Guantánamo.
Lá, como cá, para não citar o ditado popular, que agora pode ser tido por politicamente incorrecto, um mentiroso apanha-se nos detalhes: Essa transferência era pública, tanto assim que o El País a anunciou na sua primeira página no dia 10 de Janeiro de 2002!
Quer dizer, se o assunto tivesse sido directamente tratado com o ministro não teria deixado rasto.

O CONGRESSO DO PARTIDO SOCIALISTA E A SUA ESQUERDA

O QUE TEME A ESQUERDA DO PS?

No artigo de quarta-feira do Público sobre o congresso do PS dizia-se que a ala esquerda do PS teme uma inflexão do partido ao centro… Na minha ingenuidade, eu supunha que esse “receio” fosse motivado por novas linhas de rumo a traçar pelo congresso do próximo ano. Mas depois compreendi que não era bem por isso, mas mais por Ana Gomes muito provavelmente não figurar na lista de deputados ao Parlamento Europeu, podendo, contudo, ser convidada a candidatar-se à presidência da Câmara de Sintra.
Hoje, em artigo assinado pela mesma jornalista, ficou a saber-se que Ana Gomes nunca se disponibilizou para uma candidatura autárquica em Sintra, embora não exclua, se o partido assim o desejar, ser candidata em ambas as listas – autárquicas e europeias. O provável afastamento da deputada socialista das listas do Parlamento Europeu, onde se tem notabilizado na defesa de várias causas, entre as quais a clarificação do transporte por território português de prisioneiros com destino a Guantánamo, principalmente quando essa clarificação aponta no sentido do envolvimento do governo de Durão Barroso, será tido como uma inflexão do partido à direita.
Como se depreende do que vem de ser dito e do mais do que adiante se dirá, a política da dita esquerda do Partido Socialista é mesmo uma coisa muito complexa. Se estes hipotéticos factos e porventura outros semelhantes a estes são indícios que justificam o receio de uma inflexão do partido ao centro ou à direita, isso só pode querer significar que actualmente o partido se situa à esquerda. Mas vamos admitir que estamos a fazer uso de uma lógica formal muito redutora e que as coisas podem ser vistas de outra maneira. Vamos admitir que essa dita esquerda do PS está realmente descontente com o rumo que o partido tem tomado e que aqueles hipotéticos factos são indícios de que no futuro essa inflexão ao centro ou à direita pode ser ainda mais acentuada.
Aceitando como boa esta tese, o que seria normal nestas circunstâncias é que os militantes do partido aproveitassem o congresso como momento apropriado para fazer valer a defesa dos seus pontos de vista, defendendo-os em moções submetidas à votação partidária. E como o PS tem um congresso daqui a mais ou menos dois meses lá teríamos em breve a tal excelente ocasião para debater os tais projectos alternativos. Só que chegados aqui deparamo-nos com uma dificuldade de monta: o próximo congresso terá como principal finalidade a consagração da liderança de Sócrates e o lançamento do ciclo eleitoral de 2009, pelo que não são desejáveis nem debates, nem moções de estratégia alternativas que questionem a política do governo.
E como, pelos vistos, quem define a natureza do congresso é o secretário-geral do partido, lá fica inviabilizada a possibilidade de aquela esquerda se mostrar. É o que nos explica o inefável Paulo Pedroso, membro dessa dita ala, certamente com receio de que não estivéssemos a compreender bem o que se está a passar. Diz ele então: “Não é possível que alguém presente uma moção e outras pessoas façam alterações. Tem de ser moções autónomas e aprovadas em alternativa”.E conclui: “ Só faria sentido haver uma moção autónoma se fosse claro que não era um desafio à liderança e se houvesse um clima partidário de abertura ao debate sobre a renovação programática”. Como não é esse o caso, a apresentação de outras moções seria “destituído de sentido”.
Seria menosprezar os leitores tirar a moral da história. Mas já não constituirá menosprezo este simples desabafo: Que falta nos faz em Portugal um partido social-democrata! Como o passado não se pode reverter para que a história pudesse ser diferente, resta-nos acreditar que, num parto muito fora de época, embora a partir da mesma génese, algo de semelhante ainda possa surgir…

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

GUANTÁNAMO: EM ESPANHA A EMBAIXADA AMERICANA RESPONDE A PERGUNTAS

E EM PORTUGAL, POR QUE NÃO SE PERGUNTA?

A publicação pelo El Pais de documentos secretos relacionados com os voos de e para Guantánamo tem permitido conhecer interessantes pormenores sobre o modo como o assunto foi tratado no seio do governo espanhol. Mas tem permitido também saber que a Embaixada americana em Madrid responde a perguntas sobre este assunto como as formuladas pelo actual ministro das Relações Externas, Miguel Moratinos.
O ministro quis saber se determinado avião fretado pela CIA fez escala em território Espanha no dia tal e a embaixada respondeu, confirmando essa escala.
Não sei se em Portugal perguntas semelhantes já foram feitas, mas presumo que não o terão sido nem serão porque contrariamente ao que se passou em Espanha não há notícia, segundo os actuais responsáveis políticos portugueses, de que tenha sido feita qualquer diligência junto do Governo português pedindo autorização para esses voos. Portanto, se os voos não foram autorizados a que propósito se iria agora fazer perguntas?
E quanto aos voos ocorridos na vigência do governo seguinte, Durão Barroso, também não fará sentido fazer qualquer pergunta, tanto mais que ele é actualmente Presidente da Comissão Europeia e constituiria uma grave irresponsabilidades estar a levantar esse problema agora, Amadus dixit.

O PARLAMENTO EUROPEU CHUMBOU A DIRECTIVA LABORAL

UM COMPASSO DE ESPERA NA ESCALADA NEOLIBERAL

Apesar de aprovada por larga maioria no Conselho, a directiva das 65 horas semanais não logrou impor-se no Parlamento Europeu. A distância entre as cúpulas partidárias e os deputados, bem como a relativa autonomia de que muitos deles gozam nos respectivos contextos nacionais, foram decisivas na votação que rejeitou por larga margem a proposta do Conselho e da Comissão.
O Governo português não pode deixar de lamentar esta decisão, tendo em conta o seu voto no Conselho. Que é, neste caso, um típico voto de cobardia política. A abstenção num assunto que visava uma mudança radical de paradigma só pode significar apoio, envergonhado, sem coragem para o assumir.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

MAIS UNS QUANTOS ABANDONARAM PORTAS

SERÁ ASSIM TÃO GRAVE?

Os jornais e as televisões deram grande relevo à debandada de mais uns quantos militantes do CDS-PP, dias depois de Paulo Portas ter sido reeleito presidente do partido.
Alguns dos que exprimiram publicamente os motivos desta dissidência falaram em incompatibilidade de projectos e num insuportável poder pessoal, enquanto obstáculo à formulação programática de causas compatíveis com a génese do partido, como razões fundamentais da dissidência.
O CDS nasceu num contexto muito específico da Revolução de Abril (fase que antecedeu o 28 de Setembro), impulsionado por certos sectores das Forças Armadas que entendiam que era preciso dar expressão política aos herdeiros e apoiantes de antigo regime que aceitassem jogar o jogo democrático.
Ninguém melhor colocado para o fazer do que o camaleónico Freitas do Amaral, que passou de discreto, mas convicto, apoiante do salazarismo a fervoroso entusiasta de Marcelo Caetano, de quem foi, de resto, discípulo dilecto, para logo a seguir ao 25 de Abril o renegar com a convicção suficiente de quem nas funções de Conselheiro de Estado se voluntariava para redigir algumas das leis fundamentais dos primeiros passos da Revolução. O partido, concebido “rigorosamente ao centro”, para espantar eventuais conotações, logo se tornou “socialista personalista”, quando a Revolução se acelerou, para depois ir gradualmente ocupando o seu espaço natural à medida que o espectro da revolução se esfumava, até se tornar num verdadeiro partido de direita no quadro da coligação com o PPD, Aliança Democrática.
A partir da perda do poder, que ocupou, minoritariamente, por duas vezes nos dez primeiros anos da democracia, primeiro, em coligação governamental com o PS, depois, em coligação eleitoral com a PPD-PSD, o partido, ao qual entretanto se tinham acoitado todos os herdeiros do salazarismo, entrou numa crise profunda, com sucessivas mudanças de liderança, de estratégia e até de bases programáticas, da qual verdadeiramente nunca mais saiu, apesar do sopro vital trazido por Paulo Portas.
Após a partida de Freitas do Amaral, derrotado por uma estratégia sem sentido, embora num quadro político-eleitoral com poucas alternativas, o partido oscilou entre um liberalismo no plano económico, defendido por Lucas Pires, que, embora politicamente oriundo do salazarismo, nele lucidamente via o novo campo de expansão da direita, e um certo retorno ao passado mais remoto protagonizado por Adriano Moreira que sempre se valeu do sua pretensa dissidência com Salazar para politicamente se afirmar em democracia, até se situar durante um longo período no populismo de Manuel Monteiro, que Portas no Independente apoiava, atacando os demais.
Com a substituição de Monteiro por Portas, num quadro de traições mal disfarçadas, o CDS voltou a oscilar no rumo a seguir, muito em consequência de uma conjuntura político-eleitoral subsequente ao cavaquismo que não lhe dava a mínima possibilidade de se afirmar como força de poder. E dentro dele, não obstante a hegemonia cada vez mais marcante de Portas, continuavam a subsistir três linhas que conviviam sem se aceitarem, mas também sem forças para se guerrearem: os liberais; os passadistas; e os que, liderados por Portas, procuravam tudo o que fossem nichos eleitorais de mercado onde pudessem afirmar-se e somar votos, desde os feirantes aos ex-combatentes passando pela exaltação da insegurança e da soberania num discurso muito próximo da xenofobia, embora ditado por razões puramente eleitorais.
No momento em que a primeira experiência socialista pós cavaquista claudicou, a estratégia de Portas, puramente baseada na busca do poder, resultou e o PSD foi obrigado a entender-se com ele, não obstante o belicoso contencioso existente, principalmente com os amigos e apaniguados de Cavaco. Falhada ao fim de três anos esta hipótese de permanência do poder, mais por culpa do PSD do que do CDS, que nunca abriu brechas na coligação apesar de ter passado por momentos muito difíceis, Portas “emigrou”, sem nunca verdadeiramente se ausentar e acabou por entregar internamente o poder aos herdeiros distanciados do passado. Mas por pouco tempo. Por pressão da sua gente, que via os lugares em perigo no quadro de uma nova disputa eleitoral, Portas regressou e percebendo, por um lado, que o PSD está completamente “entalado” e sem margem de expansão pela política desta nova experiência PS, e, por outro, que a usura do poder e os efeitos da crise podem erodir parte do eleitorado que assegurou a maioria absoluta ao PS, prepara-se para ser novamente poder, desta vez em coligação com o PS. Para tanto apenas precisa de mais alguns votos e nada mais.
As doutrinas passadistas dos que agora saíram e de outros que ainda lá ficaram não lhe fazem qualquer falta até às eleições. Se as coisas lhe correrem bem, de que doutrinas precisa Portas para governar em coligação com o PS? Precisa apenas é DE lá chegar e quanta menos gente passadista do CDS tiver, tanto melhor.

O PRÍNCIPE E O POVO

OU O DILEMA QUE MÁRIO SOARES NUNCA SUPEROU

Durante séculos, salvo talvez os sofistas, no específico contexto da democracia ateniense, o poder sempre foi visto, estudado e analisado pelo lado do príncipe. O que era um bom governo? Um bom governo era o que sabia conservar o poder por muito tempo sem convulsões sociais nem revoltas. E mesmo os que execravam a tirania, no sentido clássico do termo – poder sem título ou sem respeito pelas leis –, como certos pensadores católicos medievais, mais do que defender o povo da usurpação ou das arbitrariedades do soberano, o que eles verdadeiramente pretendiam era a estabilidade do poder e a sua aceitação pelos súbditos.
Foi preciso percorrer um longo, muito longo, caminho, para que os pensadores políticos passassem a pôr no primeiro plano das suas preocupações os direitos do povo. Isto aconteceu na Europa em épocas diferentes, aliás consequência das diferentes fases das lutas populares. Na Europa continental ocidental, esta forma de encarar o poder pelo lado do povo começa com o Iluminismo, mas somente ganha corpo e se impõe com a Revolução Francesa.
De então para cá, está adquirido, no plano teórico, que o poder reside no povo, mas no plano prático ele continua a ser frequentemente pensado a partir do ponto de vista de quem o exerce.
Mário Soares muitas vezes se defronta com este dilema sem sequer se dar conta de que ele existe. Aceitando sem discutir que Mário Soares se preocupa com o povo, ele sempre entende que são os grandes líderes políticos – o vanguardismo dele fica-se, todavia, pelos clássicos da social-democracia – que asseguram ao povo os direitos que ele merece. Ou é a crise financeira que ocorre, porque não houve grandes políticos que a tivessem sabido evitar; ou é que da crise financeira se não parte para a construção de um novo paradigma económico, porque não há lideranças fortes que o imponham; ou é a revolta dos jovens gregos que exprime o desencanto de uma sociedade que não pára de precarizar-se e de marginalizar-se porque não há governantes na Europa capazes de abrir novos rumos e perspectivas mobilizadoras …e por aí adiante.
O problema é que as lideranças exprimem os diferentes níveis de conflito e de poder que uma sociedade encerra. E se, pelo lado do povo, se vive um período de grande fragilidade ideológica, incapaz de superar a reacção primária do “quero viver melhor”, e uma profunda incapacidade de acreditar e lutar por um projecto alternativo de poder, tal a força do poder ideológico dominante, não há liderança que lhe valha. Por isso, acho que o Dr. Mário Soares faria melhor se começasse a ver o problema por baixo e a travar os seus combates ou estimulá-los a partir de baixo, aceitando sem reservas as consequências dessa atitude.

O MODERNO SOCIALISMO


QUE MAIS HÁ PARA VENDER?


Quem lê os teóricos do Partido Socialista – os teóricos do Partido socialista são poucos ou nenhuns, mas sempre há aqueles que, embora não sendo oficialmente PS, dele estão muito próximos por opção recente – frequentemente se depara com o uso de adjectivos como moderno, novo e outros do género para caracterizar a actuação governamental do nosso PS. Primeiro, defenderam a “moderníssima tese” de que o socialismo já não comportava a componente económica. Isso eram coisas do velho socialismo, dos conservadores. Modernamente, o que conta são as regras do mercado, diziam. Depois, foram monetaristas ortodoxos durante todo o tempo em que a crise económica apenas habitava a economia portuguesa. Quando ela passou a ser geral, voltaram, em palavras, ao keynesianismo. Por fim, respeitaram à risca o “consenso de Washington” e desregularam tudo quanto havia para desregular e privatizaram quase tudo o que havia para privatizar.
Quase… porque esta gente que nos governa pede meças aos fautores do “consenso de Washington”. É que eu creio que nem o FMI, nem o Tesouro americano impuseram como princípio ortodoxo cujo incumprimento determinaria a excomunhão do infractor a venda e oneração de bens culturais imóveis do domínio público ou a privatização do seu uso. Mas o “moderno socialismo português” vai fazê-lo, porque essa coisa de monumentos nacionais só serve para dar prejuízo. São coisas do velho socialismo. Hoje, o “moderno socialismo” põe essas coisas à venda pelas vias do direito privado!

A EUROPA DAS 65 HORAS DE TRABALHO SEMANAL

AFINAL, O QUE É O NEOLIBERALISMO?

A directiva que amanhã vai a votos no Parlamento Europeu sobre a duração do tempo de trabalho constitui, pelo simples facto de já ter sido aprovada pelo Conselho, o mais completo desmentido de todos aqueles que até hoje se têm empenhado em negar a natureza neoliberal da União Europeia. Se isso já era evidente antes desta directiva – na verdade, tudo o que na Europa constitui mercado é impositivo e todo o que constitui social é facultativo – depois dela fica claro que se iniciou um novo ciclo de desmantelamento do Estado social, através da derrogação de princípios que antes eram, no plano nacional, imperativos. É disso que se trata e é isso o que está em jogo.
Se a directiva for aprovada deixa de fazer sentido a afirmação de que a Europa é um espaço de mercado e um espaço de protecção social. Passa a ser apenas um espaço de mercado. E como espaço de mercado que é, a negociação colectiva deixa de fazer sentido e o que passa a vigorar é a negociação directa entre o empresário e o trabalhador, doravante considerados com idêntica capacidade negocial. A partir de agora, as leis laborais, que antes eram estatais, passam a se europeias, não para consolidar direitos, mas para derrogar princípios internamente imperativos.
Antes de prosseguir interessa esclarecer que a directiva que amanhã vai a votos esteve durante largo tempo bloqueada no Conselho por oposição da Espanha, da França e da Itália. Com a chegada ao poder de Berlusconi e de Sarkozy tudo se modificou. Na última votação, somente a Espanha e a Grécia votaram contra. A Bélgica, Chipre, Malta, Portugal e Hungria abstiveram-se.
A nova directiva, impulsionada pelo Reino Unido e pelos países do antigo bloco de Leste, permite a “liberdade de opção”, podendo a jornada de trabalho alargar-se até às 60 ou 65 horas semanais, consoante os casos, desde que patrão e trabalhador individualmente cheguem a acordo.
Há alguma regra que ilustre melhor do que esta o princípio de que é da prossecução do interesse individual que resultará, por obra de uma mão invisível, o interesse geral?
Com esta directiva a Europa regride um tempo anterior a 1919, quando a Organização Internacional do Trabalho (OIT) fixou o máximo de 8 horas para a jornada laboral e de 48 para a semana de trabalho.
ADITAMENTO
Este post era para ser publicado ontem, mas por culpa da PT não pôde sê-lo. As empresas fornecedoras de serviços, principalmente quando actuam em monopólio, tripudiam sobre os direitos dos clientes: cobram-lhes um serviço que não prestam e mesmo depois de avisadas das anomalias que impedem o seu normal fornecimento frequentemente alegam desconhecimento do que lhes foi comunicado. Se um cliente paga uma assinatura e o serviço a que essa assinatura respeita não é prestado, por facto imputável ao prestador, há a obrigação de devolver o que foi pago, mais os danos que a sua suspensão causou. Pois, pois, mas como é que isto se consegue? Indo para tribunal, ou seja, os grandes prestadores de serviços ficam impunes se o Estado não for capaz de pôr em prática uma forma expedita de ressarcir os consumidores. Mas estamos sempre caídos no mesmo. Para isso seria necessário um governo que não idolatrasse as empresas privadas e nos tempos que correm isso é muito difícil…

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O CONGRESSO EXTRAORDINÁRIO DOS MAGISTRADOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO



O ESSENCIAL E O ACESSÓRIO SEGUNDO A CONJUNTURA


Não estou documentado sobre o Congresso extraordinário dos magistrados do MP que anteontem decorreu no Estoril, salvo o que li nos jornais.
E também não pretendo com este comentário menosprezar as críticas que nele foram feitas sobre as possibilidades de instrumentalização que a proposta do novo estatuto porventura encerre.
Agora o que sinto como cidadão é que essa luta dos magistrados do Ministério Público pela defesa do Estado de Direito democrático aparece muitas vezes associada a vantagens de natureza corporativa. Insisto: não quero com isto dizer que essas vantagens, como a questão da inamovibilidade, não andem intrinsecamente ligadas á defesa da independência da magistratura. O que pretendo é afirmar que sinto não haver grande sensibilidade social para as acolher, enquanto os magistrados do Ministério Público forem somando fracassos em processos de grande exposição mediática.
E também não ajuda nada a magistratura do MP a constante apresentação de desculpas da mais variada espécie para aqueles fracassos, algumas bem pueris, nem entrevistas como as que recentemente foram concedidas por alguns, ou algumas, das figuras mais conhecidas dessa magistratura.
O que verdadeiramente se espera do MP é coragem e, principalmente, mais competência técnica na condução dos processos a seu cargo.

PAULO PEDROSO E GUANTÁNAMO



“UMA NOTÍCIA QUE NOS ORGULHA”


Já aqui tivemos oportunidade de referir a comunicação de Ana Gomes aos membros do Parlamento Europeu apoiando a iniciativa de Luis Amado. Já vimos também que Ana Gomes parece mais interessada em facilitar a vida à nova administração americana e em apoiar a direcção do PS em vésperas de eleições para o Parlamento Europeu do que propriamente em defender os direitos dos presos de Guantánamo. E se, de caminho, puder atacar Durão Barroso, tanto melhor.
Agora o que não estávamos à espera era que Paulo Pedroso também aplaudisse o apoio de Ana Gomes à iniciativa de Amado, a ponto de afirmar que se trata de “uma notícia que nos orgulha”. Não porque da chamada “esquerda” do PS se não possa esperar tudo, mas tão-somente por uma questão de inteligência e, vá lá, de um mínimo de coerência.
É que, tal como os prisioneiros de Guantánamo que não foram julgados nem sobre cuja conduta recaiu qualquer acusação, também Paulo Pedroso esteve preso preventivamente por suspeita de crime infamante sem que a essa prisão se tenha seguido qualquer acusação. E tal bastou para que Paulo Pedroso tivesse considerado gravemente atingida a sua reputação, a ponto de haver deduzido um pedido de indemnização contra o Estado, não obstante não haver qualquer evidência de que a prisão tenha sido ilegal ou tenha excedido o tempo legalmente previsto.
Imagine o Paulo Pedroso como ele se sentiria, considerando-se inocente, se durante a sua prisão preventiva um governante “socialista” de um país amigo viesse propor ao Governo português a sua disponibilidade para o receber no seu país, a fim de livrar o Estado português do imbróglio em que se metera?
Aposto que quem gostava de ler o post de Paulo Pedroso era Catalina Pestana…

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

A AMNISTIA INTERNACIONAL E A PROPOSTA DE LUIS AMADO



SEMPRE ESTÁVAMOS CERTOS


Hoje a secção portuguesa da Amnistia Internacional deu a conhecer sua posição sobre proposta de Luis Amado. Concorda com a vinda dos prisioneiros para Portugal, apenas após julgamento. Diz a secção portuguesa da AI que se houve pessoas que estiveram presas durante tanto tempo sob suspeita de crime grave tão grave devem ser julgadas e declarada a sua inocência. Somente depois Portugal os deve receber. Isto para que perante um assunto de tamanha gravidade tudo não fique num:Desculpem lá, enganamo-nos!”
Fica assim muito claro que, sob a capa de uma acção humanitária, a proposta de Amado não passava de mais um frete à Administração americana, como tantos outros que no passado foram feitos. E fretes fazem também aqueles que, como Ana Gomes, se apressaram a pedir o apoio internacional à proposta do Ministro.
Como é óbvio estávamos certos!

PEÇO DESCULPA POR VOLTAR A GUANTÁNAMO



AFINAL, O QUE PRETENDE ANA GOMES?


Afinal, o que pretende Ana Gomes, deputada pelo PS ao Parlamento Europeu, quando trata dos “voos da CIA”: acusar Durão Barroso pelo sobrevoo e escala de prisioneiros em território português ou defender os prisioneiros e denunciar as práticas criminosas daqueles que se arrogam o direito de julgar e classificar o comportamento dos demais Estados em matéria de direitos do Homem?
Lendo o que escreve no seu Blogue, eu sou levado a supor que a sua principal preocupação é acusar Durão Barroso. Sou completamente alheio às desavenças maoistas que possa ter havido entre ambos, mas já não posso ser insensível à obstinada deturpação da verdade num assunto de tanta gravidade como o dos prisioneiros de Guantánamo.
Deixemos falar os factos. Sabe-se hoje que o primeiro voo com prisioneiros a bordo sobrevoou o espaço aéreo português no dia 11 de Janeiro de 2002. Sabe-se também que no dia anterior um conselheiro militar da Embaixada americana em Madrid contactou o Governo espanhol, pedindo-lhe permissão e conivência, na passagem desses voos por território espanhol. Sabe-se ainda que no relato feito pelo diplomata espanhol que o recebeu se diz que o conselheiro militar americano lhe comunicou que diligências idênticas à que ele estava a fazer estariam naquela altura a ser feitas noutras capitais de países sobrevoados (Portugal é um desses países).
Sabe-se indiscutivelmente que no dia 10 de Janeiro de 2002, Jaime Gama era Ministro dos Negócios Estrangeiros e Luis Amado Secretário de Estado da Cooperação e dos Negócios Estrangeiros e que nessas funções continuaram até à tomada de pose de Durão Barroso, como Primeiro Ministro, em 6 de Abril desse mesmo ano. Durão Barroso exerceu essas funções até 17 de Julho de 2004, dia em que foi empossado Santana Lopes, que se manteve em funções até 12 de Março de 2005, data em que José Sócrates tomou posse do cargo que hoje ocupa.
Também é indiscutível que Martins da Cruz foi Ministro dos Negócios Estrangeiros de Durão Barroso até 9 de Outubro de 2003, dia em que foi substituído por Teresa Patrício Gouveia, a qual se manteve no cargo até ser substituída por António Monteiro, ministro de Santana Lopes. Com Sócrates, Freitas do Amaral foi ministro dos Negócios Estrangeiros até 1 de Julho de 2006, data em que foi substituído por Luis Amado, que exerce o cargo até hoje.
Sabe-se também que na vigência de todos estes governos numerosos aviões militares americanos e aviões fretados pela CIA sobrevoaram o espaço aéreo português e alguns nele fizeram escala. E sabe-se que muitos deles transportavam prisioneiros. O que não se sabe é se algum governo concedeu autorização para aqueles voos sabendo que neles se transportava prisioneiros. Ou melhor: sabe-se que o actual Governo não tem conhecimento de que qualquer anterior governo tivesse conhecimento do transporte de prisioneiros naqueles voos. E sabe-se também, garante-o o actual Ministro dos Negócios Estrangeiros, que nos ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Defesa não existem documentos idênticos aos que foram publicados em Espanha pelo El País.
Mas então, se é assim, como é que Ana Gomes afirma expressamente, no seu blogue, que o Governo de Durão Barroso decidiu dar luz verde “à passagem e aterragem em Portugal de aviões fretados pela CIA e de aviões militares americanos carregadinhos de prisioneiros destinados a Guantánamo e às prisões secretas para onde o Presidente Bush decidiu “deslocalizar” a tortura”?
Que garantias é que Ana Gomes nos pode dar acerca da veracidade destes factos? E que garantias é que ela tem de que tal autorização não foi concedida anteriormente ao governo de Durão Barroso? E que garantias é que ela nos pode prestar de que tal autorização, a ter sido dada, não foi e é do conhecimento dos governos que se sucederam a Durão Barroso?
Ana Gomes deve provar com factos o que afirma. Se tem apenas uma suspeita, e é razoável que todos a tenhamos, vai ter também que explicar por que razão tal suspeita apenas incide sobre um dos governos envolvidos e não sobre todos.
Desde já a advirto que não vale como prova o facto de Durão Barroso ter apoiado a invasão do Iraque nos termos em que o fez. Sampaio e Guterres também apoiaram, e mais do que isso, participaram na intervenção da NATO na Jugoslávia. Ambos os factos constituem graves violações do direito internacional, constituindo a intervenção na Jugoslávia o primeiro grave precedente, desde a II Guerra Mundial, de uma intervenção militar à margem da Carta das Nações Unidas.
E, por favor, não nos venha com razões humanitárias unilateralmente invocadas. A história dos agressores está cheia de invocações de razões humanitárias, desde as intervenções do Império Britânico no Império otomano até Hitler na Checoslováquia e Mussolini na Etiópia.
O únco princípio válido nesta matéria é o de que sem a autorização das Nações Unidas todas elas são ilegais. Caso contrário, cai-se numa posição idêntica à de Martins da Cruz sobre a guerra do Iraque: "Nós até gostaríamos que as Nações Unidas permitissem a invasão, mas se elas não forem capazes de decidir teremos de actuar nós"...

O FORUM DAS ESQUERDAS



QUE CONSEQUÊNCIAS?


Tanto quanto à distância percebi, o Forum das Esquerdas reuniu gente do Bloco, os chamados Renovadores Comunistas, o Movimento Intervenção e Cidadania, animado por Helena Roseta, alguns independentes de esquerda, alguns militantes do PS próximos de Manuel Alegre e um ou outro comunista.
Da intervenção de Alegre, parece deduzir-se a intenção de ir a votos com as ideias que saírem do Forum. Como a principal força do Forum das Esquerdas já vai a votos, só há mais duas formas de dar cumprimento àquela intenção: ou formar mais um partido, ou construir uma coligação eleitoral com todos os componentes do Forum. Por razões logísticas, burocráticas e organizativas o mais provável, se a intenção vier a cumprir-se, é a formação de uma ampla coligação eleitoral liderada pelo Bloco de Esquerda, nos termos em que isto seja legalmente possível.
Seja uma ou outra a via, que consequências decorrerão para as demais forças políticas, nomeadamente para o PS, da intenção anunciada por Alegre?
Marcelo Rebelo de Sousa, hoje à noite, nas “Escolhas de Marcelo”, considerou o dia histórico, pelas alterações que pode trazer ao quadro eleitoral com que se contava para as próximas eleições. Previu que o PS, que já tinha a maioria absoluta tremida, a poderá perder, e que o PSD ainda poderá vir a ser o partido mais votado em consequência da perda de votos do PS para a esquerda. Admitiu ainda que Alegre optou por não se recandidatar à Presidência da República, deixando, assim, Cavaco mais à vontade.
Não tenho por certo que esta previsão se confirme, caso, insisto, a intenção de ir a votos por parte de Alegre se confirme.
Em primeiro lugar, é indiscutível que Alegre desempenha no PS um papel de fixação de um certo eleitorado do partido situado à esquerda, principalmente em épocas de contestação da política do governo. Mas eu não creio que este eleitorado seja assim tão numeroso, nem que esteja disposto a votar massivamente noutra força política em caso de cisão de um ou dois notáveis. A história do PS demonstra que o partido nunca perdeu para a esquerda, mesmo quando é governo, mas sempre para a direita. A saída de Alegre e mais uns quantos notáveis, sempre muito poucos, arrastaria consigo alguns votos, porém insuficientes para causar grave dano ao PS. Maior seria o dano para o Bloco e muito mais reduzidamente para o PC, se Alegre formasse uma nova força política com a qual fosse a votos. Como esta hipótese não é nada provável, inclino-me a supor que a ida de Alegre a votos numa coligação com o Bloco não resultaria num acréscimo significativo de votos dessa frente eleitoral e redundaria, em caso de relativo desaire, na desagregação a prazo curto do próprio Bloco.
Agora, percebe-se melhor a intervenção de Jerónimo de Sousa no Congresso do PCP. Prevenindo várias hipóteses, o PC fez o que fazem todas as organizações que se regem por princípios: reforçam a ortodoxia para evitar a desagregação ou até a simples dispersão. Por outras palavras: Jerónimo actuou à Bento XVI. Pelo seguro…
Quer isto dizer que a Esquerda está condenada a ser oposição e que não pode aspirar ao poder? Claro que pode e deve, mas para isso necessita de ser maioritária. Infelizmente, não o será tão cedo, porque a sociedade portuguesa é politicamente muito reaccionária.

domingo, 14 de dezembro de 2008

AINDA A QUESTÃO DE GUANTÁNAMO



A PROPOSTA PORTUGUESA


Apesar do acolhimento relativamente favorável com que algumas organizações de defesa dos direitos do homem e certas forças políticas receberam a proposta sobre Guantánamo apresentada pelo ministro português aos seus homólogos da União Europeia, não vejo que haja razão para alterar uma vírgula ao que aqui foi dito, mas antes para acrescentar mais umas quantas.
Em primeiro lugar, não pode esquecer-se que o Governo português não primou pela colaboração com as entidades oficiais e não oficiais que investigaram o chamado caso dos voos da CIA. Mais do que colaborar, o Governo português esteve empenhado em afirmar que não tinha conhecimento do que se passara ou estava a passar. Depois, também não foi particularmente activo na condenação de Guantánamo ou de Abu Grahib e nem sequer se tem conhecimento das diligências que tenha feito junto das autoridades americanas, quer para protestar pela passagem por território português de prisioneiros sequestrados, quer para exigir garantias de que eventos semelhantes não voltariam a ocorrer.
Por isso, quando o Ministro diz que este era o momento politicamente adequado para a apresentar a proposta, a conclusão que nós retiramos é a de que as razões que levaram agora à sua apresentação são exactamente as mesmas que antes ditaram a sua não apresentação. Agora, a proposta é bem-vinda pela nova administração americana, antes ela seria mal vista pela administração em funções. Em ambos os casos o que verdadeiramente se pretende é agradar.
Se o Governo português ainda quer desempenhar um papel positivo nesta matéria deveria colaborar activamente nas investigações dos chamados voos da CIA e desde já garantir que apoiará juridicamente os prisioneiros de Guantánamo que vier a receber, assegurando-lhes patrocínio judiciário adequado contra os sequestradores.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

LUIS AMADO NÃO PÁRA DE NOS SURPREENDER



GUANTÁNAMO UMA QUESTÃO DIFÍCIL DA COMUNIDADE INTERNACIONAL?


Por mais longe que a gente esteja e por mais que imagine até onde pode ir o fervor atlantista dos nossos políticos, eles não deixam mesmo assim de nos surpreender.
Luis Amado, que manifestamente está mais empenhado no futuro da relação transatlântica do que em pensar a Europa em função dos seus próprios interesses, revelou-nos hoje que enviou uma carta (mais uma!) aos seus homólogos da União Européia e também ao sempre muito solícito Javier Solana sobre o papel que Europa pode desempenhar no encerramento de Guantánamo, por esta ser uma das questões difíceis com a comunidade internacional se defronta! E, mais do que isso, declara que Portugal está disponível para receber presos de Guantánamo!
Em primeiro lugar, eu pensava – e estou certo de que muita gente pensava o mesmo – que Guantánamo era uma grave questão que os americanos têm de resolver o mais rapidamente possível. Pensava até que nada melhor para testar a nova administração americana sobre questões fundamentais, como o respeito por princípios elementares do direito internacional, do que a celeridade com que ela for capaz de resolver essa grave afronta aos direitos do homem que Guantánamo representa. Admito que os Estados, cujos governos colaboraram com os americanos nesta grave afronta, possam também ter algumas responsabilidades, mas isso somente depois de pronunciados individualmente aqueles membros do governo e da administração que, no exercício de funções, praticaram actos criminalmente puníveis.
Em segundo lugar, a que título e em que condições está Portugal disponível para receber os seqüestrados de Guantánamo? Se os americanos têm problemas jurídicos, eles que os resolvam. Aliás, só por ironia se pode afirmar que os seqüestrados de Guantánamo constituem um problema jurídico!
Em terceiro lugar, esta pressa, este afã de mostrar serviço ao presidente de turno, mesmo antes de ele, como tal, se pronunciar, até seriam ridículos se não fossem reveladores de uma mentalidade que infelizmente ensombra o normal desenvolvimento das relações da Europa com a América.
A União Européia tem problemas graves para resolver no próximo Conselho Europeu: o combate à crise econômica; o futuro do plano Barroso; o desemprego, enfim, o que todos sabemos e Luis Amado, em vez de contribuir para a resolução destes e outros graves problemas com que a UE e os seus Estados membros se defrontam, desde logo o nosso, faz propostas para resolver os problemas dos americanos!
A União Europeia com estes políticos não vai longe...

POR QUE NÃO LEVAM OS DEPUTADOS SUAS FUNÇÕES A SÉRIO?




UM CASO QUE DÁ QUE PENSAR



Como toda a gente sabe, o absentismo é uma prática corrente entre os deputados à assembléia da República. Alguns tentaram mesmo exportar essa prática para o Parlamento Europeu, com algumas habilidades à mistura, mas tiveram que se resignar a um controlo mais intenso. Todavia, em Portugal, a cada passo lá surge a notícia de que não há quorum ou de que um elevado número de deputados está ausente.
Como frequentemente aqui temos dito, o sistema de representação parlamentar existente entre nós e tipo de democracia representativa que temos potenciam aquelas situações. Verdadeiramente, o deputado não sente que deva o seu lugar ao eleitor, mas antes ao partido que o integra numa lista fechada em lugar elegível. Por essa mesma razão o deputado também sabe que não está no Parlamento em representação do povo, mas do partido pelo qual é eleito.
Este regime de soberania partidária limita drasticamente a liberdade do deputado e torna-o individualmente pouco responsável pelas decisões ou deliberações do Parlamento.
Não se pode certamente dizer que entre o sistema de representação parlamentar que temos e o absentismo parlamentar haja uma relação de causa e efeito, mas pode seguramente afirmar-se que este sistema não cria no deputado os mesmos vínculos de representação parlamentar que um outro sistema criaria. E prova de que as “instâncias superiores” não são muito sensíveis a estas questões, para além do barulho de ocasião, é a proposta ontem apresentada por um vice-presidente do AR para combater o absentismo: deixar de haver plenários à sexta feira!

OS REMÉDIOS PARA COMBATER A CRISE



DEFENDEM HOJE O QUE ONTEM NEGARAM



Portugal, como todos sabemos, está mergulhado numa grave econômica vai para oito anos. O crescimento tem sido muito baixo ou mesmo nulo. Durante os anos de crise os trabalhadores em geral tem sido fustigados com perdas consecutivas do poder de compra, em conseqüência de uma diminuição progressiva do salário real, com perdas acumuladas significativas.
Principalmente a partir do Governo Barroso, alguns advogaram um aumento do investimento público como meio de superação da crise. Essa política foi terminantemente recusada pelos economistas do governo e pelo próprio Primeiro-Ministro, que, fieis a uma política monetarista, sempre entenderam que não era por essa via que a crise se debelava. O PS, uma vez chegado ao governo, insistiu com mais ênfase na mesma idéia e vendeu aos portugueses a ilusão de que uma vez equilibradas as contas públicas, de acordo com a ortodoxia do Pacto de Estabilidade e Crescimento, uma nova era de crescimento e prosperidade se abria para todos.
Quando as contas estavam razoavelmente equilibradas à custa de uma tributação elevada sobre o consumo e os rendimentos do trabalho e de uma compressão dos salários mais baixos e numerosos, uma grave crise financeira deflagrou na América, que rapidamente se estendeu a uma parte significativa da Europa sob a forma de crise econômica em que, entretanto, se transmutara. Perante o grave cenário de recessão que ameaça estender-se a todo mundo, embora as receitas nos países afectados divirjam, muitos continuam a entender que as velhas receitas keynesianas constituem o remédio mais adequado para a combater.
Paul Krugman repete em artigos de jornal, o que já defendia nos seus manuais de economia, ou seja, que as hesitações de Roosevelt, no final do primeiro mandato (1936), sobre o investimento público e a sua preocupação com o equilíbrio orçamental, iam deitando a perder todo o esforço anteriormente feito para combater a crise, não fora, pouco depois, o relançamento da economia proporcionado pela guerra.
Hoje não falta nas hostes do PS quem defenda um aumento do investimento público. Mas é caso para perguntar: o que mudou assim tão significativamente entre nós para que agora passasse a ser bom o que antes era mau? Desprezando durante anos uma política de crescimento, mesmo que conseguida à custa de algum défice e de alguma inflação, o governo infligiu à maioria da população um enorme e inútil sacrifício. Actuando sempre na pressuposição de que no longo prazo emergiriam as vantagens da sua política, o Governo, agora tão keynesiano, esqueceu-se que uma das mais importantes contribuições teóricas de Keynes relativamente aos economistas clássicos foi a importância dada ao curto prazo. Tanto mais que, a longo prazo estaremos todos mortos...

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

AS AJUDAS DE ESTADO À ECONOMIA



AS GRANDES DIFERENÇAS ENTRE AS AJUDAS AMERICANAS E AS PORTUGUESAS


Nunca é fácil escrever em Portugal sobre as ajudas de Estado à economia, entendendo-se aqui o conceito não necessariamente com a extensão e sentido que tem no direito comunitário.
De uma maneira geral tudo fica guardado no segredo dos deuses e mesmo quando as coisas correm mal, como freqüentemente acontece, raramente se sabe depois como as coisas se passaram antes. O Parlamento não as fiscaliza, porque a bancada parlamentar que apoia o governo, qualquer que ele seja, não está lá para o fiscalizar, mas para o apoiar. O que é normal, porque a sua subsistência na próxima legislatura depende das cúpulas partidárias que dominam o governo. E a oposição, quando realmente está interessada em fiscalizar, e, no seu conjunto, nem sempre está, nada pode fazer dado o constante bloqueio da maioria às suas propostas.
Mas na América sabe-se que Carter, no contexto de uma grave crise da indústria automóvel, fez passar no Congresso um considerável apoio financeiro, que a salvou da crise e lhe permitiu viver com desafogo até finais do ano passado. Mas sabe-se também que este apoio foi retribuído e que a indústria automóvel devolveu ao governo cerca de três vezes o que este lá pôs.
Agora, sabe-se também que o apoio, que Obama esta a negociar com o Congresso, da ordem dos quinze mil milhões de dólares, está sujeito a várias condições, que vão desde uma mudança de paradigma que permita a viabilização daquela indústria a longo prazo, até à devolução com juros do que lá for investido. Nem de outro modo poderia ser. O dinheiro não é do Governo, mas do povo.
E em Portugal alguém me sabe explicar em que condições foi prestado o apoio que na semana passada Sócrates anunciou com pompa e circunstância? E será que alguém se preocupou com isso? Terá um jornalista, um que fosse, levantado esta questão?

MINI-CIMEIRA DA UE EM LONDRES



A AUSÊNCIA DE ANGELA MERKEL


A reunião de Londres sem a presença da Chanceler alemã abre um precedente perigoso na vida da União Européia. Como toda a gente sabe, sem a Alemanha a União Europeia não existe. E menos ainda o euro. Mas a UE existe sem o Reino Unido e o euro também.
Que o “saltitante” Sarkozy tenha a pretensão de fazer uma mini-cimeira sem Merkel é apenas mais uma manifestação do seu conhecido voluntarismo político. Que o Reino Unido esteja sempre disponível para minar a parceria franco-alemã, igualmente se compreende tanto no quadro da sua visão geoestratégica da Europa em geral como da União Europeia em particular. Agora, que Durão Barroso se preste a participar numa mini-cimeira sem a presença da Alemanha só se compreende no contexto de uma acentuada desorientação política.
Acossado por certos sectores do Parlamento Europeu e por alguns políticos com provas dadas ao serviço da União Europeia, acusado de fragilidade política e de falta de liderança em época de crise, dependendo de Sarkozy para a sua reeleição, Barroso optou pelo que lhe pareceu ser capaz de contribuir para a salvação do seu plano.
Só que a Alemanha não é pressionável, por isso na próximo Conselho Europeu manter-se-ão todas as reservas que Merkel tem vindo desde a primeira hora a manifestar. E Barroso ficará sozinho com o seu plano e cada um tratará de si, consoante as exigências das respectivas economias.