sexta-feira, 13 de setembro de 2013

A REUNIÃO DE VILNIUS


 

A FLEXIBILIZAÇÃO DO DÉFICE E A POSIÇÃO DO GOVERNO

 

Os ministros das Finanças reunidos em Vilnius (Lituânia) não aceitaram a revisão do défice “proposto” pelo Governo português. Diz a Ministra das Finanças portuguesa que não foi formulado qualquer pedido nesse sentido, frisando que o “ruído” que se tem feito à volta desse tema não corresponde a nenhuma posição formal do Governo e negando, também, que esteja em curso qualquer negociação.

É provável que dentro do Governo haja um outro ministro que defenda a flexibilização do défice. Mas não é essa seguramente a posição do Governo. Coelho, Maria Luís, Moedas e outros fáceis de identificar tudo farão para que isso não aconteça. Mais: se, por força da coligação e da necessidade que Paulo Portas tem de publicamente se justificar, o pedido vier a ser apresentado, Passos Coelho e Maria Luís tudo farão para o boicotar. Nem sequer é de pôr de parte a hipótese de enviarem para Bruxelas ou para Berlim uma mensagem contrária à formalmente apresentada.

O que interessa a Passos Coelho e a Maria Luís é responsabilizar o Tribunal Constitucional pelo incumprimento das metas e simultaneamente pressioná-lo relativamente às novas medidas que fatalmente ele vai ter de apreciar, criando-lhe um clima de público constrangimento que o iniba de aplicar a Constituição.

Essa é que é a “guerra” do Governo, a guerra que ele precisa de manter permanentemente na primeira linha das suas preocupações para poder continuar a fazer guerra aos portugueses, nomeadamente aos funcionários públicos e reformados.

É inacreditável, quase impossível de conceber, o estado a que este país chegou: ter no seu Governo o inimigo número um dos portugueses e de Portugal.

Algo, muito urgentemente, tem de ser feito para impedir que esta situação se mantenha. Algo, muito urgentemente, tem de ser feito para pôr cobro a isto!

A TROIKA, O GOVERNO E O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL


 

A COVARDIA E A PERVERSIDADE DA “EUROPA”

Segundo relatam os meios de informação, a Troika mostrou-se muita surpreendida pelo número de declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral que o Tribunal Constitucional português já julgou relativamente a medidas tomadas pelo Governo de Passos Coelho no quadro da “importante reforma do Estado” em curso em Portugal.

A Troika mostra-se surpreendida com este “poder executivo” do Tribunal português e Portas, pesaroso pelas eventuais consequências desta atitude da Troika, não deixou de manifestar aos deputados, na Comissão Parlamentar de acompanhamento do Programa de Ajustamento, as “interrogações e preocupações” causadas externamente pelos acórdãos negativos daquele Tribunal.

Como no post anterior se referia, este é o capitalismo dos nossos dias. Esta é a verdadeira matriz do neoliberalismo. O que interessa são os interesses do capital, a sua perpetuação e reprodução. O Estado de Direito não passa de uma simples figura de retórica para usar quando convém e como convém.

Por outro lado, é por demais evidente que as instituições que compõem a Troika estão ao serviço dos grandes interesses financeiros cuja política desavergonhadamente defendem e impõem.

Alguma destas instituições, ou algum dos mangas-de-alpaca que as integram teria a coragem de vir publicamente pôr em causa uma decisão, por exemplo, do Tribunal Constitucional Alemão? Ou algum deles teria a coragem de publicamente, ou mesmo em privado, pressionar aquele Tribunal ou os políticos alemães com vista à criação de um clima que levasse à inversão do sentido da jurisprudência para protecção e defesa de interesses inconfessáveis mas cujos titulares toda a gente conhece?

Para quem não se lembra: o Tribunal Constitucional Alemão (TCA) no acórdão em que apreciou o Tratado de Maastricht deixou bem claro que em matéria de soberania monetária os poderes de que a Alemanha se despojava em benefício da União Europeia não poderiam em caso algum ser ultrapassados. Dito juridicamente, não poderiam ser objecto de uma interpretação extensiva ou aplicados analogicamente a uma situação diversa, embora semelhante, à neles contemplada. Qualquer norma comunitária que viesse a ser aprovada fora dos estritos termos dos poderes alienados ou qualquer acto praticado pelos órgãos comunitários (neste caso, a Comissão) decorrente de uma interpretação que não respeite os estritos limites da transferência de soberania acordada não seriam reconhecidos pelo ordenamento jurídico alemão. No que concretamente se refere ao papel do Banco Central Europeu, o Tribunal foi muito claro: a função primordial do BCE, à qual todas as demais estão subordinadas, é assegurar a estabilidade dos preços.

E porquê? Porque segundo a Lei Fundamental da Alemanha, na interpretação que dela faz o TCA, a inflação corresponde a uma expropriação sem indemnização. Situação que aquela Lei inequivocamente proíbe. Portanto, segundo aquele Tribunal, a prossecução pelo BCE de uma política monetária inflacionista, para, por exemplo, fomentar o crescimento económico, acarretaria uma expropriação das poupanças e das pensões de reformados alemães.

Se o Tribunal Constitucional Alemão ameaça declarar inconstitucional ou, dito de outro modo, inaplicável na Alemanha, ou, ainda de outra maneira, contrária aos tratados, uma eventual  actuação do BCE que promova a inflação, como pode a Troika “surpreender-se” se o Tribunal Constitucional Português declarar inconstitucional a norma legislativa que pura e simplesmente confisque uma percentagem das pensões de reforma dos reformados da função pública?

E ficamos por aqui, porque se continuássemos a descrever a jurisprudência do TCA relativamente aos tratados posteriores a Maastricht, nomeadamente o de Lisboa, muito mais haveria a dizer quanto ao papel – até hoje inatacável – do Tribunal Constitucional Alemão.

Aqueles que no estrangeiro, segundo Portas, estão preocupados com o papel do nosso Tribunal Constitucional e se interrogam sobre a sua actuação são seguramente os mesmos que nunca tiveram a coragem de publicamente se interrogar sobre a latitude com que o TCA interpreta os seus poderes relativamente ao direito comunitário. Ou seja, são a Europa na sua verdadeira e autêntica expressão: covarde e perversa sempre pronta a atacar o mais fraco para cair nas boas graças do mais forte.

Mas ninguém pode esquecer os que internamente tudo fazem para ir ao encontro dos anseios da Troika ou que se antecipam a esses mesmos anseios com propostas e medidas tendentes a cair nas suas boas graças. As medidas que eles estão tomando são de uma gravidade extrema. Temos que lutar contra elas. Temos de impedir que elas se consumem. Temos de nos defender delas por todos os meios. Pelos mesmos meios com que a lei nos autoriza a defender dos ladrões que nos assaltam a casa. Podemos impedi-los de consumar o roubo por via da acção directa. É óbvio que eles terão de ser julgados, mas tal como acontece com os ladrões vulgares só irão a julgamento aqueles que no legítimo exercício dos nossos direitos não consigamos neutralizar em flagrante delito…para nos defendermos!

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

11 DE SETEMBRO



HÁ QUARENTA ANOS

Há 40 anos o governo de Salvador Allende foi derrubado por um golpe de estado perpetrado pelas Forças Armadas chilenas com o apoio e a instigação dos Estados Unidos da América. Seguiu-se, como se sabe, um regime de terror durante 17 anos liderado por Augusto Pinochet, um dos mais ferozes ditadores da América Latina de todos os tempos, não apenas pelo número de vítimas que pesam sobre o seu regime mas acima de tudo pelo extremo desprezo com que lidava com a vida humana dos seus opositores políticos de esquerda.

Internamente, o golpe teve o apoio da direita chilena – a mesma que hoje está no poder e se recusa tanto semântica como politicamente a reconhecer a barbárie daquele período – e contou também com a conivência da democracia cristã que, apesar de avisada no dia anterior ao desencadeamento do golpe, se recusou a do facto dar notícia a Allende.

Para além da barbárie que ditadura de Pinochet representa no plano propriamente político pelo espezinhamento dos mais elementares direitos, como o direito à vida e à integridade física, o golpe de Pinochet e as quase duas décadas em que esteve à frente dos destinos do Chile constitui também uma experiência inovadora no plano económico e social.

Mais de meia década antes da contra-revolução neoliberal de Thatcher e Reagan, o Chile tornou-se o primeiro país a pôr em prática uma política económica radical de matriz neoliberal, apadrinhada e assessorada pelos “rapazes de Chicago”, sob a égide de Milton Friedman, para quem a questão das liberdades políticas, a começar pela liberdade de escolha, também hoje tão presentes na pseudo-democracia de qualquer “crato” de ocasião, não representavam absolutamente nada.

O Chile sobre o qual ainda hoje pesa densamente o “fantasma vivo” de Pinochet em toda a sua dimensão (política, económica, social e militar) continua sendo um caso que não pode ser esquecido pela actualidade do seu exemplo nos aspectos que mais interessam nos dias que correm.

Mais do que ingenuidade de Allende quanto à fidelidade das Forças Armadas ao regime democrático e aos juramentos constitucionais, mais do que a depreciação da importância da Guerra Fria na concreta situação geoestratégica em que actuava, mais ainda do que a conclusão tão rapidamente tirada pelo euro-comunismo de Enrico Berlinguer que passou desde então a reclamar uma ampla base social de apoio para que a construção do socialismo em liberdade pudesse ter êxito, a grande lição que se tira do golpe de 11 de Setembro de 1973 é a de que o capitalismo, seja na feição marcadamente imperialista de defesa da sua zona de influência, seja sob o domínio hegemónico do capital financeiro e especulativo, não hesita em utilizar os meios necessários ao seu dispor para defender o status quo quaisquer que sejam as consequências dessa defesa e quaisquer que tenham dce ser os meios para o conseguir.

A retórica hoje amplamente divulgada de defesa das “liberdades e da democracia” não passa de um mero expediente político conjuntural favorecido nas últimas duas décadas pela ausência de alternativa política consistentemente organizada capaz de pôr efectivamente em causa o modo de produção capitalista, pois como a realidade amplamente demonstra qualquer pretexto é bom para que o capitalismo logo despreze os direitos e as liberdades que diz defender.

Um imenso, incomensurável, “big brother” pesa hoje sobre os cidadãos nacionais e estrangeiros, sobre os Estados aliados, amigos ou simplesmente integrantes da comunidade internacional, sobre as empresas concorrentes, sobre as organizações sociais e políticas, a pretexto da defesa contra as acções, falsas ou verdadeiras, perpetradas pelo “jihadismo”, esse aliado objectivo do moderno capitalismo neoliberal, com o qual convive numa teia de cumplicidades e de retribuições ainda muito difícil de perceber em toda a sua extensão nos tempos que correm e mais difícil ainda de ser apreendido pela consciência universal dos que efectivamente lutam por uma real alternativa ao actual sistema capitalista fomentador da desigualdade em grande escala, da marginalização política e social, da eliminação dos direitos sociais, enfim, da destruição dos valores democráticos universais.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

A LIMITAÇÃO DOS MANDATOS AUTÁRQUICOS


 

A DECISÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

Como aqui previ – e era muito fácil prevê-lo – o Tribunal Constitucional considerou elegíveis os candidatos autárquicos com quatro, cinco – os que fossem – mandatos consecutivos, contanto que tivessem sido desempenhados numa autarquia diferente daquela a que agora concorrem.

E era fácil prever a decisão, apesar de a lei dizer exactamente o contrário do entendimento que o Tribunal lhe deu, porque só por manifesta falta de senso o Tribunal se iria meter numa “guerra” que não é dele nem verdadeiramente lhe cabe a ele regulá-la (politicamente).

O objetivo último da lei é combater as consequências resultantes da velha, milenar, máxima de que o “poder corrompe”. Ao longo da História a questão da limitação dos mandatos foi várias vezes tratada e algumas vezes aplicada. Mas nunca houve uma aplicação minimamente durável sem um amplo consenso. Ora, o TC rapidamente percebeu que houve partidos que aprovaram a lei com reserva mental, outros que lavaram as mãos depois de a terem aprovado e outro que ora sim, ora não consoante o local.

Perante isto, numa matéria desta natureza, que decisão poderia um tribunal político tomar senão a tomou?

Há assuntos bem mais importantes com que o TC se tem de preocupar. Por que desgastar-se num assunto completamente minado e eivado de ciladas?