terça-feira, 25 de agosto de 2009

AS UNIÕES DE FACTO E O VETO DE CAVACO



AS DUAS LEITURAS

Se Cavaco não fosse de direita e se tanto pelos exemplos de vida como de governação não tivesse dado sobejas provas de que é um conservador, certamente que o veto com que hoje inviabilizou o novo regime das uniões de facto teria uma leitura muito diferente daquela que um largo sector da esquerda seguramente lhe vai atribuir.
Uma das leituras possíveis do veto de Cavaco é a que se fundamenta na visão conservadora do seu autor. Cavaco é manifestamente pelo casamento como modelo de organização familiar, logo dificultará tudo o que directa ou indirectamente possa proteger outras “formas de acasalamento”. Tem de reconhecer-se que se trata de uma argumentação exageradamente ad hominem que despreza, sem os refutar, os argumentos apresentados.
Se, pelo contrário, Cavaco fosse, já não digo um libertino, mas um libertário, ninguém duvidaria da sua argumentação e muitos tenderiam a ver nela uma exaltação da liberdade individual em matéria de relações pessoais. É que não se pode esquecer a “boutade” daqueles que, vendo o legislador rodear de tantos direitos e obrigações uma união, que, tanto quanto possível, se quer um espaço livre de direito, acabam dizendo: “Ora bolas, para ser livre tenho mesmo de me casar!”.
Numa sociedade como a nossa, a união de facto já não é mais hoje aquilo que começou por ser há muitos anos atrás. Não se pode olhar hoje para a união de facto com o mesmo espírito proteccionista com que ela poderia ser encarada no passado. Hoje, a igualdade dos que nela participam está a maior parte das vezes assegurada à partida. As situações de “sujeição” são muito mais raras. E a liberdade de quem em matéria de relações pessoais pretende poucos constrangimentos deve ser respeitada.
Por outras palavras, devemos fazer intervir o Estado na economia, tanto na produção, como na distribuição, segundo as necessidades de cada época, mas devemos evitar a sua intervenção excessiva nas relações estritamente pessoais.
Evidentemente, que a ingenuidade não deve ser nosso forte e todos temos consciência de que a fundamentação do veto não passa de um exercício de hipocrisia. Mas sendo a hipocrisia o tributo que o vício presta à virtude, não será de ter em conta a virtude que o veto também encerra?

1 comentário:

anamar disse...

Gostei , Correia Pinto!
Abracinho
:))