terça-feira, 17 de novembro de 2009

A VIOLAÇÃO DO SEGREDO DE JUSTIÇA




QUE DIZER DAS PREOCUPAÇÕES QUE SE OUVEM?

Não sou muito sensível às violações do segredo de justiça e menos ainda aos lamentos de alguns políticos. Não me vou pronunciar como jurista, não só porque domino muito mal os meandros do processo penal, mas também porque me interessa muito mais emitir uma opinião como cidadão, digamos: política, do que tecer considerações sobre o modo como está ou deveria estar regulado na lei o segredo de justiça.
O segredo de justiça é muito importante para defender o êxito da investigação, nomeadamente em certo de tipo de crimes e quando se procura a sua prova por certos meios. Não creio que a liberdade de imprensa e a livre expressão do pensamento tenham constituído um obstáculo à defesa destes interesses, tanto mais que as violações do segredo de justiça mais frequentes têm ocorrido depois de as autoridades policiais ou judiciárias terem dado público conhecimento da existência das investigações e dos processos em curso.
Há ainda a salvaguarda do bom nome das pessoas envolvidas nas investigações, valor cuja defesa tem sido muito encarecida por certos comentadores e, obviamente, pelos políticos directamente visados ou em vias de o poderem ser. A verdade é que não há praticamente notícias que consubstanciem a violação do segredo de justiça de pessoas comuns. Só quando a personalidade atingida alcança uma certa notoriedade, nomeadamente política, é que a imprensa pode estar interessada na publicação de factos, que lhe digam respeito, em segredo de justiça.
É certo que a exposição na praça pública de factos desonestos ou indecorosos relativos a uma pessoa lhe causará danos em qualquer caso e mais ainda se forem completamente infundados. Neste última situação, a personalidade atingida tem sempre à mão, num regime democrático, os meios judiciais ao seu alcance para promover a reparação do dano. Não sendo esse o caso, embora o dano exista à mesma, entre a não publicação da notícia e o interesse em dos factos se dar público conhecimento, deve sempre prevalecer a defesa deste segundo valor, sem a protecção do qual a democracia ficaria drasticamente diminuída de uma das suas principais armas.
A circunstância de os factos relatados nem sempre se poderem judicialmente provar não significa que não possam, em muitos casos, ser verdadeiros, nem muito menos significa que eles, no estado em que se encontram, não permitam fazer um juízo ético-político das personalidades a que são imputados.
É o caso das escutas telefónicas: as conversações transcritas na imprensa, desde que não se trate de uma montagem ou de uma truncagem – factos que até hoje nunca ocorreram, nas ditas violações do segredo de justiça -, podem não ser suficientes para fazer a prova do crime que indiciam, mas, sendo verdadeiras, a sua publicação revela-se sempre de grande utilidade por a partir delas se tornar possível alcançar uma imagem muito rigorosa da personalidade em questão e esse ser mais um meio de que o cidadão comum se pode servir para fazer o seu juízo político sobre a dita personalidade. É que não se pode escamotear o facto de as personalidades políticas procurarem hoje obsessivamente as luzes da ribalta e de elas próprias se exporem, mais do que qualquer outra pessoa, para cativarem a simpatia e a adesão dos cidadãos comuns. A publicação de factos que directamente lhes digam respeito é mais uma forma de as escrutinar e de as manter sob as luzes da ribalta, agora sem o seu comando nem o seu controlo. Por outras palavras, é o reverso da medalha do jogo que elas querem jogar.

1 comentário:

Anónimo disse...

Ora aqui está um comentário certíssimo, embora não politicamente correcto...
É a questão do conflito de deveres.
Nestes casos, apetece dizer: 'Abençoada quebra'...
Parabéns pela coragem.
CA