OS SUBSÍDIOS
Tanto em Portugal como na Europa se sabe que os inúmeros subsídios recebidos por cá, nos mais variados sectores de actividade, quer como ajudas de pré-adesão, quer posteriormente ao abrigo dos mais diversos pacotes, foram pessimamente aproveitados. Ou melhor, muitos deles foram aproveitados para fins muito diferentes daqueles a que destinavam. E muitos outros nem sempre ou quase nunca foram conscienciosamente aplicados. Mais importante do que alcançar um determinado resultado, era proporcionar uma boa oportunidade de negócio a quem ia ser pago, pelo menos parcialmente, por esse subsídio, como aconteceu em inúmeras obras públicas
Toda a gente conhece uma “história”…umas mais pequenas, outras…enfim…
É claro que os portugueses foram os principais prejudicados por estas “habilidades”, principalmente aqueles que estão agora a sofrer as consequências do défice estrutural da economia portuguesa, gravemente acentuado depois da adesão à CEE.
Os ladrões actuaram e actuam como todos os ladrões. Tanto mais à vontade quanto mais impunes se sentem. Os polícias é que têm de fazer o seu papel. E não fizeram, como se sabe. O governo, todos os governos desde a década de 80, nada ou pouco fizeram para controlar eficaz e punitivamente a aplicação dos subsídios.
Alguns dos casos mais escandalosos, como os relacionados com o Fundo Social Europeu, ainda foram a tribunal, mas não deram em nada. Na ausência de legislação específica e de uma prática administrativa consistente de controlo da aplicação dos subsídios, nomeadamente a avaliação dos resultados esperados, dificilmente pela via judicial se poderia esperar um resultado diferente do que realmente aconteceu. E ainda foi uma sorte que alguns dos principais suspeitos não tivessem vindo pedir uma indemnização ao Estado por ter posto em causa o seu bom nome.
Por outro lado, o Tribunal de Contas, que não estava minimamente preparado para controlar a concessão e a aplicação dos subsídios, também pouco ou nada fez.
Reinou a mais completa impunidade.
O controlo comunitário também era pouquíssimo eficaz fosse por incompetência burocrática fosse por perfídia política.
Esta impunidade não era porém exclusiva dos subsídios comunitários. Ela era também uma prática corrente na administração dos subsídios nacionais. Ninguém prestava contas do que recebia. Nem sequer mediante a elaboração de um simples relatório.
Aqueles que na administração pública se rebelavam contra esta prática eram mal vistos tanto pelo poder instituído como pelos beneficiários que, mal pressentiam a mínima suspeita de controlo, logo publicamente se queixavam de “o Estado estar cheio de burocratas que não deixam as empresas trabalhar, produzir riqueza”.
Este “regabofe” começou com o cavaquismo – antes havia pouco dinheiro para distribuir sistematicamente, salvo numa ou outra área tradicionalmente dependente – e foi-se sucessivamente agravando até hoje.
A única medida relativamente eficaz adoptada pelo cavaquismo, salvo o erro no segundo mandato, foi a de proibir o pagamento dos créditos sobre o Estado a quem fosse devedor do fisco ou da segurança social. Esta medida funcionou com eficácia em alguns sectores da Administração Pública; todavia, por maior que fosse o rigor da sua aplicação ela sempre deixaria impune e sem controlo a aplicação dos subsídios recebidos.
Mais tarde, muitíssimo mais tarde, o Tribunal de Contas passou a ser um pouco mais exigente, resultando dessa sua nova atitude um comportamento mais activo da Administração. Mas nunca houve nem há um verdadeiro controlo material da atribuição e da aplicação de subsídios, quanto mais não fosse conforme aos princípios do Estado de direito.
A gente do CDS, com Portas à cabeça, fez um grande barulho sobre o controlo dos subsídios atribuídos aos pobres, nomeadamente os recebidos a título individual, onde havia de facto alguma fraude, embora insignificante no plano dos grandes números. Mas nunca ninguém ouviu deles uma palavra que fosse sobre o controlo dos subsídios concedidos às empresas ou mesmo sobre os recebidos a título individual presuntivamente destinados a actividades económicas, como é o caso da agricultura.
E a razão é simples: é que ninguém, absolutamente ninguém, entre os “chamados partidos de governo”, está interessado em tocar nesse assunto…por razões óbvias. E a Troika, a famosa Troika, que se imiscuiu em tantas matérias onde não deveria ter voto, também não disse uma palavra sobre este assunto.
Tudo isto vem a propósito de uma notícia hoje publicada nos jornais sobre o destino geográfico e sectorial dos subsídios destinados à agricultura.
É que há uns tontos que acalentam a ideia de que os problemas de Portugal se resolvem fundamentalmente pelo incremento sem limites da actividade exportadora. A exportação, como toda a gente sabe, tem limites. E num país europeu como Portugal, com grandes limitações na produção de matérias-primas e de baixa criatividade tecnológica, esses limites são até muito evidentes, alguns mesmo inultrapassáveis. E também não vai ser com “pastéis de nata” que o problema se resolverá.
Mas já tem todo o sentido pensar num país que produza muito mais do que aquilo que produz, nomeadamente em áreas onde o aumento da produção representaria uma diminuição correspondente das importações.
Mais importante do que exportar, depois de atingido um certo patamar, seria diminuir as importações em consequência do aumento da produção interna.
Por isso é que faz todo o sentido um controlo apertado da concessão de subsídios, um controlo material estreitamente ligado à obtenção de objectivos. E nem sequer seria de pôr de parte, nestas áreas, a concessão de subsídios nacionais que permitissem às empresas competir, no plano interno, com as empresas estrangeiras.
E as regras da concorrência, perguntar-se-á? Bem, as regras da concorrência teriam de ser as mesmas que permitem às empresas espanholas exportar abaixo do custo de produção, como ainda agora aconteceu com o leite comprado pelo Pingo Doce e o Continente…