MAS…A CONCLUSÃO É A MESMA
Não obstante a complexidade do conceito de património, que exigiria outros desenvolvimentos, qualquer jurista comum sabe que se pode falar de património em diversas acepções.
Num sentido muito amplo, o património compreende tanto o lado activo (direitos) como o lado passivo (obrigações ou dívidas), uns e outras, digamos para simplificar, avaliáveis em dinheiro.
Num sentido mais restrito, património significa a soma dos direitos avaliáveis em dinheiro pertencentes a uma pessoa – ou seja, o activo, com abstracção das dívidas
E, finalmente, no mais restrito dos sentidos, o património é apenas o chamado património líquido, ou seja, a diferença entre o activo e o passivo, que tanto pode ser positivo, como negativo.
Quando falámos de dívida, da dívida dos Estados, estamos a referir-nos à dívida pública (a devida pelo Estado propriamente dito e demais colectividades de direito público – municípios, regiões, etc.) e à dívida privada, ou seja, a contraída por todos aqueles que no país actuam ao abrigo do direito privado.
Embora quase só se fale da dívida pública, a razão de ser das grandes dificuldades por que passa a zona euro é o peso global das duas dívidas, sendo certo, como é, que, na maior parte dos países, a privada pesa muito mais do que a pública.
Mas há um outro aspecto da questão de quase não se fala e que é também muito importante: é o outro lado do património de cada um dos Estados devedores, o activo.
E este outro lado do património, quer se trate do património dos Estados quer do das pessoas ou das empresas, é constituído por coisas e por direitos (susceptíveis de avaliação pecuniária, evidentemente). Faceta que tende a ser negligenciada, salvo no que respeita à venda das coisas (privatizações), se os direitos de que se é titular não forem sobre o exterior. E a razão é simples: é que no contexto da actual crise, e apesar da existência de uma moeda única, o que é verdadeiramente importante é o que se deve ao exterior.
Mas se o que se deve ao exterior é importante, outro tanto se deverá dizer dos créditos que cada país tem sobre o exterior.
Conclusão: quando falamos da dívida de Portugal, da Grécia, da Irlanda e até da Espanha, estamos a falar de dívidas que, embora tenham um peso líquido inferior ao que normalmente vem assinalado, têm pouco a ver com as dívidas da Itália e da França e menos ainda com as da Finlândia e da Áustria, as quais têm um peso líquido muitíssimo inferior à percentagem do PIB com que sempre são referenciadas, porque todos estes cinco países têm, embora os três últimos mais que os dois primeiros, consideráveis créditos sobre o exterior.
E se avançarmos um pouco mais e falarmos das dívidas da Holanda, da Bélgica, do Luxemburgo e da Alemanha, então a conclusão a que se chega é que qualquer um destes países, não obstante o peso da dívida de alguns deles, como é o caso da Bélgica, tem, mesmo assim, um saldo liquido positivo considerável. O que lhes devem é muitíssimo superior ao que eles próprios devem.
Portanto, se dois terços – um pouquinho mais – dos países da zona euro têm um saldo líquido negativo e um terço, ou quase, um saldo positivo, a primeira conclusão que se tem de tirar é que não pode haver uma política monetária comum – a existir, ela acabará inevitavelmente por prejudicará uns e beneficiar outros.
Dentro de muito pouco tempo vários Estados acabarão reconhecendo esta evidência. Nessa altura, o euro acabará – embora possa acabar de uma forma aparentemente coordenada – e o fim do euro levará ao fim da União Europeia, como projecto impossível nas bases sobre que foi construído.
Ainda há bem pouco tempo se dizia que no plano político-institucional as três grandes contribuições que a Europa deu ao mundo foram o Estado nação (no sentido francês do conceito: o Estado fazer a nação), a Comuna de Paris e a União Europeia.
De todas, a única que continua por demonstrar poder viabilizar um mundo diferente – e muito melhor - é a Comuna de Paris…
3 comentários:
Embora de acordo com a forma de ver a dívida em si comentada, não estou de acordo com a conclusão: o euro não desaparecerá brevemente, antes pelo contrário terá a sua consolidação em toda a zona euro ( talvez noutros moldes, talvez mais federal.
Fiz link, meu amigo... deste e de outro post (é sempre difícil escolher quando a qualidade persiste e insiste em me deixar perplexa!!!) :))
Um abraço.
Mas a Comuna de Paris fracassou rapidamente! Como é possível supor que 'ilumine' a fórmula feliz de organizar a sociedade?
Enviar um comentário