A PROPÓSITO DO DEBATE
NA QUADRATURA DO CÍRCULO SOBRE A “RESOLUÇÃO” DO BES
Pacheco Pereira afirmou ma Quadratura do Círculo que a “resolução”
do BES foi imposta de fora para dentro. Não disse isto para defender o Governo.
Pelo contrário, para demonstrar a sua irrelevância. Há, porém, boas razões para supor que as coisas se passaram de forma diferente.
Como bem se sabe, a União Europeia, mais concretamente, a
Alemanha foi encarando e aceitando durante a crise do euro vários modos de
acudir à falência dos bancos para evitar o descontrolo completo da crise
financeira.
As primeiras medidas foram as de nacionalização, quase sempre
usadas pelos países mais poderosos; depois, aceitou-se a recapitalização por
parte dos Estados com dinheiro dos próprios Estados, obviamente proveniente de empréstimos
por eles contraídos no mercado de capitais; posteriormente, a recapitalização pelos
Estados com dinheiro de fundos constituídos pelos Estados-membros; a seguir,
adoptou-se relativamente a Chipre a medida excepcional de os bancos serem
salvos com dinheiro dos depositantes (evidentemente, porque o dinheiro
depositado nos bancos de Chipre não era de depositantes da zona euro);
finalmente, quando a situação dos grandes bancos e dos maiores países já estava
relativamente controlada, adoptou-se a “resolução”…que até Agosto de 2014 não só
não tinha sido aplicada em nenhum país como também a directiva que a consagrava
não tinha sido transposta pela maior parte dos membros da zona euro.
Esta solução foi pensada para os países mais fracos onde
ainda subsistissem problemas no sistema bancário.
Quando a crise do BES atingiu o ponto de não retorno, quando
já não era possível esconder por mais tempo o que se estava a passar, o Governo
e o Banco de Portugal que aguentaram a situação, porventura com a cumplicidade
da Troika, até à saída desta, viram-se confrontados com a necessidade urgente
de tomar uma decisão: nacionalização, recapitalização ou resolução.
A decisão que melhor servia os interesses políticos do
Governo era evidentemente a resolução. Era a melhor porque era a que mais
facilmente permitia fazer o confronto com a catastrófica decisão do governo
Sócrates de nacionalizar o BPN e era também a que demagogicamente facilitava
veicular a mensagem: “sem custos para os contribuintes”.
Para que esta solução se apresentasse como a única capaz de
actuar num curtíssimo espaço de tempo, era necessário que o BCE retirasse imediatamente
ao BES a qualidade de “contraparte elegível”, isto é, deixasse de o financiar.
Certamente que o BCE estava desejoso de estrear, nomeadamente
num país como Portugal, a sua nova forma de atacar a falência dos bancos,
impossível de pôr em prática num grande país ou relativamente a um grande banco
europeu. Para que o BCE concordasse com a solução que o Governo português
estava a encarar, bastaria que lha pedissem. E foi o que fizeram. Pediram ao
BCE que facilitasse a aplicação da “resolução” pelo Banco de Portugal, cortando
definitivamente o crédito ao BES.
Quem pediu? Obviamente, o Governo com o apoio do Governador
do Banco de Portugal.
Duas coisas mais: Primeira, passa pela cabeça de algum ser
pensante que o terceiro maior banco do sistema bancário português fosse riscado
de cena por decisão do Banco de Portugal? Segunda, passa pela cabeça de algum
ser pensante que semelhante decisão na Alemanha, em França, na Itália ou mesmo
em Espanha pudesse ser decidida pelo governador do respectivo banco central
nacional ou que nalgum destes países um banco com dimensão proporcional à do
BES fosse resolvido, quer por pressão do BCE, quer por decisão do governo desse
país?
Ultima questão: porque actuou deste modo Passos Coelho? Para
além das duas razões demagógicas e partidárias já acima referidas, a grande
razão subjacente à decisão de Passos/Maria Luís deve procurar-se no plano
estratégico evidenciado aquando de uma reunião de quadros do PSD em que Passos
declarou que o grande objectivo político do Governo era o de “democratizar a
economia”. “Democratizar a economia” consistiria na desregulamentação das relações
de trabalho – ou seja, patrões e empregados “democraticamente” colocados no
mesmo plano, sem protecções, nem privilégios à parte mais fraca – e na eliminação
dos velhos poderes fácticos que continuavam a desempenhar um papel
preponderante e altamente nocivo na economia portuguesa.
Esta a estratégia de Passos. E é à luz desta estratégia que
tudo se explica e compreende. E …depois continuem a dizer que ele não sabe o
que anda a fazer!