O PREVISÍVEL ACONTECEU
Donald Trump acaba de cancelar a cimeira com a Coreia do Norte por neste momento a considerar inapropriada.
Modéstia à parte, mas só quem não percebe nada de relações
internacionais poderia supor que os Estados Unidos estariam interessados em negociações sérias com vista à desnuclearização da Península da Coreia. Depois de um período de ameaças
recíprocas entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos, em grande medida ditado
por do lado norte-coreano se ter percebido que as ténues conversações em curso,
vindas da administração anterior, estavam sem qualquer hipótese de prosseguir
na vigência da nova administração americana, nomeadamente depois de exoneração
do Secretário de Estado Rex Tillerson, e quando a passos largos se caminhava
para o abismo, a Coreia do Norte surpreendeu o mundo ao enviar uma numerosa
delegação aos Jogos Olímpicos de Inverno, que em Fevereiro deste ano se
realizaram em Pyeongchang, na Coreia do Sul.
Para
este aparente volte face não terá sido indiferente a posição da Coreia do Sul
que, vendo a guerra, de consequências incalculáveis, a abeirar-se a passos
largos do seu território, terá, seguramente à revelia dos Estados Unidos,
diligenciado junto dos seus "irmãos" do Norte no sentido de alguns
gestos simbólicos de ambas as partes deverem ser feitos para atenuar a tensão e
criar um clima favorável ao recomeço das negociações.
O
que se conhece, do que se passou depois, deixa perceber que a actual liderança
da Coreia do Sul estava interessada numa solução pacífica do conflito coreano.
A cimeira entre os dois chefes de Estado de cada uma das Coreias terá superado
as espectativas, criando um clima francamente favorável ao abaixamento da
tensão e da procura de uma solução para o conflito, embora do lado americano
logo se tivesse percebido que eram muitas as reticências a um acordo que pudesse
satisfazer ambas as partes.
Como
é óbvio, não podendo os Estados Unidos aparecer aos olhos da opinião pública
internacional interessados na manutenção de um clima conflitual entre as
duas Coreias, viram-se obrigados, depois da ultrapassagem que a Coreia do Sul
lhes fez, a proferir algumas palavras apaziguadoras e, inclusive, a dizerem-se
dispostos a um acordo de desnuclearização da Península da Coreia. Todavia, pelo
que se passava em Washington, tanto no Congresso, como na Casa Branca, seja por
intermédio do conselheiro nacional de segurança, John Bolton, seja por via do
vice-presidente, Mike Pence, seja por obra do novo secretário de estado,
Mike Pompeo, bem como do errático presidente, Donald Trump, logo se percebeu
que o acordo de paz a que os americanos estavam dispostos a dar o seu
assentimento não andaria muito longe de uma capitulação pura e simples da
Coreia do Norte.
É
natural que a Coreia do Norte tenha compreendido isto desde o primeiro momento,
sem prejuízo de ter querido testar até onde iam realmente as exigências
americanas. Temendo que as palavras proferidas em Washington pudessem
não estar a ser devidamente compreendidas por todos os intervenientes no
conflito coreano, os americanos não tiveram dúvidas em comprometer directamente
a Coreia do Sul, exigindo a realização de manobras militares conjuntas nas
vésperas da hipotética cimeira entre Donald Trump e Kim Jong-un.
Depois
das ameaças mais ou menos veladas ou ostensivas de elementos da administração americana, com "provas
dadas" no relacionamento com outros países, ficou claro aquilo que já se
sabia e que vale tanto para a administração Trump como valia para a
administração Obama - os Estados Unidos não aceitam uma Península coreana desnuclearizada,
embora, o obviamente, aceitem a capitulação mais ou menos incondicional da
Coreia do Norte.
Infelizmente,
o que se está passando na Coreia não representa nada de novo. É apenas mais uma
manifestação da política imperial americana. Da política que passou a
hostilizar a Rússia, cercando-a, depois de ter percebido que não a poderiam
"domesticar" ; da política que invadiu o Iraque; da que criou o caos
na Líbia, depois de ter derrubado Kadhafi; e da que se prepara para criar
um conflito de proporções inimagináveis no Médio Oriente, se atacar o Irão.
Para
terminar, apenas sublinhar que a agressividade americana à escala planetária
tem subido de tom na razão inversa da sua incapacidade para dominar o mundo. E
isto é muito grave e não augura nada de bom...