sábado, 27 de fevereiro de 2010

OS PRESOS DA ETA EM PORTUGAL




DISCUTIR UM TEMA DIFÍCIL, MAS NECESSÁRIO

Não estou interessado em discutir juridicamente o assunto, tanto mais que ele não tem uma solução única. Apenas me interessa abordá-lo politicamente, sem muitas justificações, mas não sem quaisquer justificações uma vez que o tema é politicamente melindroso e presta-se, principalmente nos tempos que correm, a muito fáceis deturpações.
Não tenho, fora os casos de dominação colonial, nenhuma especial simpatia pelos movimentos nacionalistas. Sou mesmo pelas grandes federações, ou, se fosse possível, pela federação universal, como meio de alcançar a paz perpétua. Os fenómenos de exacerbado nacionalismo são na maior parte das vezes filosoficamente muito pobres, política e socialmente perigosos, de modo que o melhor é mesmo lutar contra eles.
Também é historicamente verdade que a independência é, na sua génese, um acto unilateral. Essa ideia, agora muito em curso, das independências pactuadas, não passa de uma tentativa de alguns dos mais fortes protagonistas da comunidade internacional manterem o status quo a qualquer preço.
A independência é um conceito de facto, que existe ou não existe, e que acabará por se impor ou não, supondo preenchidos os elementos integradores do conceito, em função dos reconhecimentos que consegue congregar. Se ninguém a reconhecer, aquela entidade que tem todas as características para ser um Estado, acaba, na prática, por não sê-lo em virtude de não poder entrar em relação com ninguém!
Também não me pronuncio moralmente sobre a forma como a independência se alcança: como ela é um facto e não um percurso teológico ou moral encetado na busca do bem, vale tudo desde que seja eficaz. Desde prender a mãe, até matar o amante da regente, passando pela defenestração dos “traidores” e por todos os ardis impostos pela natureza desigual das lutas em presença, tudo tem sido usado! Nessas lutas, como em todas as lutas, a maior parte das vítimas são sempre inocentes. E mesmo naqueles casos, como aconteceu com os movimentos de libertação das ex-colónias portuguesas, em que houve (fora os iniciais acontecimentos do norte de Angola) um cuidado extremo em não atingir os colonos, principalmente na sua integridade física, isso aconteceu muito mais por razões de eficácia do que por pretensas razões morais.
Dito isto, tenho alguma dificuldade em compreender, por razões políticas e históricas, que a justiça portuguesa se predisponha a entregar os (alegados) elementos da ETA presos em Portugal, por crimes praticados no território português, à justiça espanhola.
Certamente que Portugal não poderá ser um santuário da ETA e toda e qualquer actividade que tenha o pais vizinho como alvo deve ser reprimida. Em Portugal, não em Espanha. Insisto, por razões históricas e políticas, mas também porque em Espanha não existe um verdadeiro Estado de direito relativamente a estas matérias. A justiça espanhola não é independente (ela nem sequer é independente relativamente às lutas PSOE/PP, quanto mais em relação aos movimentos nacionalistas) e contrariamente ao que dizem certos “doutos peritos”, como o jubilado Embaixador Cutileiro, não existe em Espanha qualquer possibilidade de resolver esta questão democraticamente. Para a Espanha, resolver democraticamente esta questão, é aceitar a "Espanha" tal como a Constituição a define.
Pelas razões expostas, faço sinceros votos para que o STJ não confirme as decisões dos tribunais inferiores e para que o julgamento daqueles alegados elementos da ETA, bem como de outros, relacionados com os eventos de Óbidos, que venham a ser encontrados, sejam julgados em Portugal.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

EDUARDO MONDLANE




UMA DECLARAÇÃO SURPREENDENTE

Acabei de ouvir Duarte de Jesus, embaixador na reserva e actualmente docente universitário, dizer no jornal das nove, de M. Crespo, a propósito do seu recente livro – “Eduardo Mondlane – Um homem abater”, que havia da parte de círculos do regime (salazarista, claro) mais vontade de alterar a “política ultramarina” do que propriamente da parte da oposição.
Como de costume, lá vinha a referência (e a reverência do Crespo) a Adriano Moreira, como “grande reformador”.
Vou ler o livro rapidamente para depois me pronunciar com mais propriedade, mas mesmo sem o ler já estou com muitas dificuldades em perceber o que Duarte de Jesus andou a fazer entre 1935 (data em que nasceu) e 1974, para nos vir dizer em 2010 que havia no regime salazarista mais vontade de mudar a política colonial do que fora dele. A vontade era tão forte, que só mesmo pela força das armas foi possível pôr-lhe termo!
Não consigo perceber a quem se refere Duarte de Jesus: a Botelho Moniz e a Costa Gomes, bem como aos que com eles estavam conluiados para, daquela forma ingénua, correrem o Salazar e porem em prática uma política advogada pela administração Kennedy? Mas o que é que Adriano Moreira tem a ver com isto? Então não foi exactamente na sequência dessa “limpeza” feita por Salazar com a colaboração de Thomaz que Adriano Moreira foi Ministro? E antes disso, à data da abortada tentativa de Botelho Moniz, não era Secretário de Estado da Administração Ultramarina e não foi, depois de derrotado o golpe, promovido a Ministro do Ultramar?
E a quem se refere Duarte de Jesus quando fala da oposição? A Cunha Leal? Conhece ele os documentos, por exemplo, dos congressos do PCP sobre essa matéria?

SE...


AS SUSPEITAS DO SOL…

Está toda a gente (da oposição, claro) aparentemente muita preocupada com as eventuais mentiras do Primeiro Ministro. Não vou dizer que mentir ou falar verdade é, em política, rigorosamente a mesma coisa, porque na realidade não é. O que vou dizer é que é vulgar e corrente que os governantes mintam, como toda a gente sabe. Digamos mesmo que para a generalidade dos governantes a preocupação fundamental não consiste em não mentir, mas em não se deixar apanhar pela mentira. É assim em Portugal e em todo mundo, a começar pelo Estados democráticos onde reina o Estado de direito.
Digamos ainda que os governantes estão, de certa forma, numa situação semelhante à dos serviços secretos: fazem muitas coisas que não devem, mas se forem apanhados terão de responder por elas.
Mas já é qualitativamente diferente a situação de uma magistratura judicial conluiada com interesses privados ou com interesses particulares de pessoas públicas. Aqui o caso é muito mais sério: é que se isto acontecer ruem por completo as bases fundamentais em que assenta o sistema.
Por isso, para que não haja quaisquer dúvidas, o Parlamento deve, com toda a serenidade e seriedade, averiguar se as suspeitas hoje postas a circular pelo jornal “Sol”, e reiteradas na Comissão de Ética pelo seu director, são verdadeiras ou falsas.
Para isso, e uma vez que o que está em causa é a própria estrutura do regime, o Parlamento (ou seja, uma Comissão Parlamentar restrita e ajuramentada) deve ter acesso a todas as escutas relevantes e analisar se há ou não indícios seguros de que os “escutados” tiveram, a partir de determinada altura, conhecimento da situação em que se encontravam.
As consequências de nada fazer serão muito mais graves do que ter a coragem de averiguar o que se passou.

AS DECLARAÇÕES DE TEIXEIRA DOS SANTOS

FAZEM SENTIDO?

Não ouvi toda a intervenção de Teixeira dos Santos no Parlamento, apenas a parte transmitida nas televisões. É certo que talvez a pergunta de Guilherme Silva fosse desnecessária, mas a resposta de Teixeira dos Santos não é aceitável.
A solidariedade não se exprime com palmadinhas nas costas, nem com lutos de três dias. Exprime-se por actos. Às vezes penso o que teria feito o Marquês de Pombal aos economistas do nosso tempo se por impossível anacronismo os pudéssemos pôr a falar com ele nos dias seguintes ao do Terramoto de Lisboa sobre como orientar a reconstrução da cidade de acordo com os cânones do FMI.
É que esta casta de gente está a precisar de uma resposta à Marquês!

NÃO GOSTO DE TER A COMPANHIA DE FREITAS DO AMARAL



A PROPÓSITO DOS DESPACHOS DO PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA

Depois de ter lido o artigo de Freitas do Amaral na Visão desta semana sobre os despachos do Procurador Geral da República, indirectamente relacionados com o processo “Face Oculta”, dei voltas à cabeça para saber onde é que eu teria errado. É que não gosto de ter a companhia de Freitas do Amaral. Ele não é politicamente confiável, é pessoalmente volátil, e, mesmo juridicamente, está longe de satisfazer as minhas exigências na matéria. É certamente um estudioso esforçado, trabalhador, e isso são méritos que nem todos temos, mas falta-lhe claramente aquela inspiração, aquele golpe de asa, aquela “iskra” que ilumina o caminho de quem o lê ou de quem o ouve.
Por isso, voltei a ponderar se tudo o que aqui disse sobre os despachos do PGR se justificava. Desde a primeira hora que suspeitei, pelos comunicados que foram sendo publicados, que havia incoerência nos despachos e expus as minhas suspeitas. Depois, passei a exigir a sua publicidade, pelas razões que tenho vindo a expor e que nenhum dos argumentos aduzidos em contrário verdadeiramente contraria. Finalmente, pedi a intervenção do Parlamento, porque, como referi, a ele lhe cabe, em última instância, defender a separação de poderes.
Claro que Freitas do Amaral não diz bem o mesmo, mas isso é um problema dele, embora perfilhe uma conclusão aparentemente igual. Ele fala em acto político do PGR. Ora, como o PGR não tem competência para a prática de actos políticos no desempenho da investigação criminal (se é que a tem em qualquer outro domínio…), a questão que os despachos aparentemente levantam (pelo menos, enquanto não forem publicitados) só pode ser a da violação do princípio da separação de poderes.
Dito isto, acho que não vou mudar de opinião, apesar da companhia… Aliás, tenho outras, desde logo a do meu amigo VM, identificado, para evitar confusões, sem identificação, nos comentários deste blogue e que igualmente tem acompanhado esta matéria com comentários certeiros e pertinentes.
A propósito da intervenção do Parlamento, custa-me dizer, pelos vários amigos que lá tenho, que eu também pertenço ao número daqueles que não compreende a forma como os depoentes se dirigem, nas comissões para que são convocados, aos deputados, nem as reservas que muitas vezes exprimem para não se pronunciarem. Desde a arrogância de Belmiro de Azevedo, que marcou ele próprio a hora a que queria ser ouvido, até às palhaçadas do Crespo, passando pela petulância do Saraiva, já vimos de tudo um pouco. E o que vimos é inaceitável. Se a lei não permite aos deputados actuar de outra maneira, façam outra. Mas antes de a fazerem, por favor, estudem bem a matéria. Exemplos de “direito comparado” não faltam, a começar pelos Estados Unidos, Brasil, França…Mas não permitam que faltem ao respeito ao Parlamento como órgão máximo da soberania representativa!
Aditamento
Sem pretensões, mas por razões meramente pedagógicas. Freitas do Amaral começa o seu artigo da pior forma (e creio que não será tanto por desconhecimento jurídico - improvável - mas por ressentimento político - algo que só "eles" sabem porquê). Diz FA: "Houve ou não crime de atentado ao Estado de Direito? O PGR diz que não houve, porque faz uma interpretação restritiva do conceito..." É obvio que a questão não se pode colocar assim. Não sei o que o PGR disse, o que sei é que o PGR não tem qualquer competência para dizer se houve ou não crime. A competência do PGR limita-se o ordenar ou não a investigação por entender que houve ou não "indícios de crime". Portanto, se o PGR não pode dizer se houve ou não crime, menos ainda o poderá FA.
Certamente que nada disto impede que teoricamente se discutam os elementos constitutivos do crime de "Atentado ao Estado de direito" ou a interpretação deste tipo legal de crime. Mas não se podem confundir os dois planos, porque se não ainda se aumenta mais a confusão.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

AS INCRÍVEIS DECLARAÇÕES DA SENHORA FERREIRA LEITE



QUE ERA, JÁ SABÍAMOS, MAS TANTO, NÃO!

As declarações que a presidente do PSD hoje fez a propósito da situação económico-financeira do país, num evento de uma organização estrangeira para que foi convidada, são a todos os títulos estúpidas.
Já sabíamos que a Senhora não prima pela inteligência, mas tanto não. Nós sabemos que para ela o que conta são os “valores”, as “convicções”, a “verdade”, enfim, aquilo de que se alimentam as almas simples e que terão como recompensa, prometida desde há dois milénios, o Reino dos Céus.
Mas vir dizer publicamente que a situação portuguesa é igual à da Grécia e fazer o elogio das agências de notação de risco, depois de os próprios “sacerdotes” das instituições financeiras relevantes – FMI, BCE, entre outros – terem dito o contrário, não pode deixar de ser interpretado como uma prova de insensatez.
É bom esclarecer desde já que não se trata de fazer a defesa de uma qualquer espécie de patriotismo, que, com toda a franqueza, continuo sem saber bem o que seja, já que me sinto muito mais próximo e solidário de uma brasileira, angolana ou alemã que partilhe algumas das ideias fundamentais que defendo do que da Sra Ferreira Leite, portuguesa como eu!
Agora, há duas coisas que a Senhora desconhece: a primeira tem a ver com a dívida e o défice. Por muitos que tenham sido os erros do governo socialista e do dela, a dívida e o défice vão muito para além dessa causa próxima e filiam-se em causas bem mais complexas comuns a todos os países desenvolvidos. Basta atentar no aumento vertiginoso da dívida pública dos países da OCDE, da União Europeia e da zona euro para se perceber que, com excepção da Alemanha, que resiste melhor do que os restantes, ninguém evita um crescimento exponencial.
Isto, ao contrário do que a Senhora pensa, tem causas comuns, umas, pelas quais ela, o PS e os demais governos dos países referidos são politicamente responsáveis, outras prendem-se com factores ainda mais complexos que têm a ver com o modelo de desenvolvimento dos países emergentes e do modo como se relacionam com os países desenvolvidos. Sim, o problema é grave, mas não é substituindo Sócrates por um Sócrates do PSD que ele se resolve.
Se a Senhora fosse como alguns outros economistas que regularmente nos aparecem nos ecrãs uma simples defensora do capital financeiro e estivesse a actuar em seu nome, ainda se compreenderiam as suas palavras. Mas não creio que se trate disso. Creio que se trata mesmo de ignorância.
A segunda razão pela qual as suas declarações são insensatas é que se o seu partido for governo proximamente e entretanto o capital financeiro e especulativo atacar sem dó nem piedade este país, como já fez com a Grécia e se preparava para fazer com outros, a situação em que o vai deixar ficar não será recomendável para ninguém.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

UMA DECISÃO INCOMPREENSÍVEL




AINDA A QUESTÃO DOS DESPACHOS DO PGR E PSTJ

Desde a primeira hora que venho aqui pugnando pela publicação dos despachos proferidos pelo PGR e pelo PSTJ sobre as escutas que acidentalmente envolveram o Primeiro Ministro e a propósito das quais foram extraídas certidões por os magistrados encarregados de dirigir a investigação do processo “Face Oculta” por, mal ou bem, terem detectado nelas indícios de crime.
Nunca aqui se disse que os portugueses tinham o direito de conhecer as escutas, embora se tenha dito que o PM, no seu próprio interesse, deveria ter-se disponibilizado para as tornar públicas ou para não levantar obstáculos à sua publicidade. Se o interesse que se pretende proteger é apenas o seu, enquanto cidadão, e o do seu interlocutor, igualmente como cidadão, parecia não haver qualquer obstáculo jurídico à publicidade das ditas, se aquele consentimento fosse dado por ambos.
Já sabemos que não foi. Sabemos que o PM não quer que as suas conversas sejam jornadas públicas, não por envolverem segredos de Estado, o que seria legítimo e independente da sua vontade, mas, pura e simplesmente, por serem privadas e como tal deverem continuar. À frente, pois!
Agora, o que não pode haver é justificação para as decisões judiciais que ordenaram o arquivamento de uma investigação ou que decidiram que ela não deveria ser feita não serem tornadas públicas. Não estudei o assunto juridicamente e desde já admito que pode haver alguma coisa que me esteja a escapar. Mas o que eu posso garantir, sem qualquer receio de errar, é que as justificações apresentadas pelo PGR para não dar a conhecer os seus despachos são infundadas.
Há alguma sentença, algum despacho, enfim, alguma decisão definitiva, seja ela de que natureza for, susceptível de produzir efeitos sem ser publicitada, nomeadamente nos casos em que é do interesse geral o seu conhecimento? Mais do que isso: a publicidade das decisões não tem apenas a ver com a sua eficácia, mas com a própria credibilidade da justiça. O que aconteceria, por exemplo, se as sentenças, mesmo que somente as proferidas em última instância, não pudessem ser conhecidas nos seus fundamentos e nas razões de facto e de direito que as justificam, e delas apenas se conhecesse por comunicação oral a decisão propriamente dita? Alguém acreditaria numa justiça destas? Algum Estado de direito seria compaginável com uma situação desta natureza?
Apenas certas decisões políticas (actos políticos, no sentido jurídico do termo) poderão não ser tornadas públicas, com base na famosa (e não menos odiosa) razão de Estado. Mas não é nada disso que aqui se passa, como muito bem se sabe. Aliás, os magistrados não praticam actos políticos, estejam ou não no exercício da função jurisdicional, mas apenas jurisdicionais ou, em certos casos, administrativos, se não actuarem no desempenho daquela função.
Portanto, a argumentação do PGR – de que os despachos contêm extractos das conversas interceptadas - não tem fundamento, porque muito mais grave é ou pode ser , para as pessoas envolvidas nos respectivos processos, o relato dos factos constantes das sentenças que os decidem, sejam elas absolutórias ou condenatórias, e nem por isso elas deixam de ser publicadas.
Apenas lamento que esta exigência, que aqui começamos por fazer, antes que alguém tenha falado nela, esteja agora a ser uma bandeira da direita.

OS NEGÓCIOS DA PT/TVI



O QUE NUNCA SE PODE ESQUECER

As notícias agora vindas a público permitem concluir que Moniz estava perfeitamente ao corrente do negócio que a PT estava em vias de concluir com a Prisa, e que foi por via dele, directa ou indirectamente, que Cavaco e Ferreira Leite foram informados do que se estava a passar.
Nada disto é crime como diz a Senhora presidente do PSD. O Presidente da República nada diz, porque muito provavelmente recebe as suas informações directamente do Espírito Santo, sendo legítimo que não queira expor publicamente fontes tão divinais. Também nada disto é crime nem tem nada de mal.
O problema é muito outro: é que tanto o Presidente da República como a Senhora Ferreira Leite e o PSD em geral se sentiam muito confortáveis com orientação noticiosa e editorial da TVI, nomeadamente o Jornal das sextas. Por isso, nada mais normal, dentro do conceito de liberdade de imprensa que defendem, que não quisessem ver alterada aquela orientação.
O mesmo se diga relativamente a JM Fernandes (que, por estúpido excesso de zelo, preparou a sua própria queda) e a Crespo.
Por todas estas razões, volto à minha: atacar Sócrates e as suas políticas (que, do ponto de vista da esquerda, sejam inaceitáveis), bem como a tentação que nele está sempre presente de pôr a comunicação social ao serviço do seu projecto político, é uma coisa. Outra, muito diferente, e absolutamente inaceitável, é defender Moniz, Moura Guedes, JM Fernandes ou Crespo.
Supor que se defende a liberdade de imprensa defendendo aqueles cavalheiros é uma ingenuidade em que nenhum democrata pode incorrer. Moniz, o homem que durante dez anos de cavaquismo orientou a comunicação social no sentido que se conhece, não ostenta nenhum título passado, nem presente, que o recomende como defensor da liberdade. Bem pelo contrário. O mesmo se diga dos outros três cuja acção, por mais recente, é de todos conhecida e dispensa comentários adicionais.
Insisto, deixo essa defesa aos “neo-democratas” que defendem a burka e outras liberdades do género e que, bem no fundo, estão para a democracia como os neo-liberais estão para a economia.

A CRISE ECONÓMICO-FINANCEIRA E O NEO- KEYNESIANISMO


SERÃO AS SIMPLES MEDIDAS ECONÓMICAS SUFICIENTES PARA SUPERAR A CRISE?

É dos livros que as medidas preconizadas por John Meynard Keynes para combater a Grande Depressão e salvar o capitalismo resultaram. A Grande Depressão foi vencida (é certo que há a guerra de permeio e a incógnita do que teria acontecido sem ela), o capitalismo salvou-se e nos países capitalistas avançados houve uma redistribuição da riqueza sem paralelo na história do capitalismo. Não interessa agora discutir quais as causas que com mais intensidade contribuíram para este último efeito. Foram certamente várias, e dentre elas, seguramente, a força do movimento operário, os sindicatos, o “espectro”que ameaçava o capitalismo, mais do quaisquer outras. Seja porém qual for a explicação dos historiadores económicos, a verdade é que aquele efeito se verificou.
A actual crise económica teve a sua causa próxima numa crise financeira ímpar na história do capitalismo. O capital financeiro, sem regulação nem submissão a qualquer poder, tornou-se fundamentalmente especulativo, assumiu riscos desproporcionados motivado pelo lucro fácil e imediato, e mergulhou o mundo, logo que a “bolha” especulativa rebentou, numa crise generalizada.
Impossibilitados de solver os seus compromissos por cessação de pagamentos da maior parte dos seus clientes - que, motivados pelo lucro fácil e pelas vantagens da especulação, igualmente assumiram compromissos muito superiores à sua real solvência -, os bancos, tanto os grandes como os de menor dimensão, foram num espaço muito curto de tempo entrando sucessivamente em falência e a maior parte deles ficando mesmo insolvente por o seu passivo ser incomensuravelmente superior ao activo.
Perante este cenário, duas alternativas se perfilavam: ou deixá-los falir ou resgatá-los com entradas massivas de dinheiros públicos.
A América começou por ensaiar a primeira alternativa, deixando falir o Lehman Brothers, mas face à dimensão da tragédia que falências semelhantes permitiam antever, rapidamente arrepiou caminho e ainda sob a administração republicana foi renegado o princípio da não intervenção (as falências seriam uma espécie de regeneração do sistema) e iniciado um plano de resgate em grande escala do capital financeiro, mediante transferências astronómicas de dinheiro concedido a custo zero ou a juro baixíssimo. A Europa, com reticências da Alemanha, acabou por seguir o mesmo caminho, tendo o BCE assegurado aos bancos, a juros baixíssimos, a liquidez de que necessitavam para evitar as falências.
Pouco tempo depois, os grandes bancos, tanto na América como na Europa, com as benesses recebidas a custo zero ou quase, rapidamente se reequilibraram aplicando o dinheiro assim recebido em operações altamente lucrativas.
À crise financeira seguiu-se, como acontece com os abalos telúricos cujo epicentro é no mar, um efeito tsunami sobre a economia real. E aqui a opção dos Estados já foi diferente. A crise económica acarreta desemprego, mais despesas sociais, eventualmente crescimento negativo, mas não põe em causa, nos tempos que correm, a existência do sistema. Por isso, apenas os sectores económicos mais significativos do ponto de vista das respectivas economias nacionais foram apoiados com ajudas de Estado, acreditando-se ou esperando-se que o “sistema” funcionasse relativamente aos demais sectores, isto é, que os bancos continuassem a financiar a economia em geral – os particulares, as pequenas, médias e grandes empresas.
Ora, este efeito não se verificou. Os bancos, pelo contrário, têm recusado em grande escala aquele financiamento com o argumento de que não podem correr riscos excessivos e continuaram, com dinheiro gratuito que receberam, a dedicar-se a operações especulativas que têm agora, na maior parte das vezes, os próprios Estados como alvo. Como os Estados tiveram que se endividar para resgatar o capital financeiro, para financiar alguns sectores nevrálgicos da economia e para atender ao grande acréscimo de despesas sociais motivadas pela crise, por todo o lado se assistiu a um crescimento do défice orçamental e da dívida pública. E, paradoxalmente, têm sido os bancos, ontem assistidos pelos Estados, que agora os estão financiando a um juro várias vezes superior ao que tiveram de pagar para beneficiar daqueles financiamentos. E se a esta perversão acrescentarmos a pressão que o capital especulativo está fazendo sobre os Estados desenvolvidos economicamente mais frágeis, logo se percebe que quem realmente está tirando vantagem desta especulação é o capital financeiro que, tendo sido o gerador da crise, é agora o grande beneficiário do endividamento que os Estados foram compelidos a contrair.
Por outro lado, o desemprego continua a aumentar, ou, na melhor das hipóteses, a não diminuir, as ajudas sociais tendem a baixar, o crescimento económico não existe ou manifesta-se a níveis baixíssimos e, na maior parte dos casos, não permite compensar o aumento de encargos financeiros contraídos pelos Estados, e finalmente, não se assiste a nenhuma redistribuição da riqueza, bem pelo contrário.
Logo, a questão que se põe é a seguinte: estarão as medidas neo-keynesianas adoptadas pelos Estados em condições de produzir hoje resultados idênticos aos que lhe são atribuídos na superação da Grande Depressão de 1929/32?
O keynesianismo teve em vista antes de mais nada salvar o capitalismo. Outros efeitos que então se verificaram tiveram muito mais a ver com o contexto político-social da época do que propriamente com as medidas económicas que foram adoptadas. Isto demonstra que só a política pode salvar a economia e não o contrário. Mas vai ser muito difícil ou quase impossível alcançar efeitos semelhantes aos que se verificaram a seguir à Grande Depressão. Os sindicatos estão fragilizados por todo o lado depois de anos a fio de ataques neo-liberais. O movimento operário e dos trabalhadores em geral, como movimento político de ruptura, perdeu força em todos os domínios, nomeadamente no político e no ideológico. O “espectro” que ameaçava o capitalismo desapareceu (até ver…) e os governos, mesmo quando sinceramente estrebucham contra as vilanias do sistema, não têm força política suficiente para se opor à maré que tudo submerge.
Se a isto se acrescentar o facto de a zona euro assentar em grande medida numa ficção que hoje se revela altamente perversa, pois torna difícil a recuperação das economias mais frágeis e simultaneamente deixa antever um cenário de quase catástrofe social para as que tiveram que a abandonar, depressa se concluirá pela irrelevância das pequenas variações das políticas de alternância democrática e que somente uma verdadeira ruptura sistémica poderia abrir novas perspectivas às economias afectadas pela crise.
Haverá força e vontade para tanto? A esperança nunca morre…

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

SÓCRATES, FIGO E O CRIME DO PADRE AMARO




DA “IMPOSSIBILIDADE METAFÍSICA” À TEORIA DOS MILAGRES

Ficou célebre, até hoje, a resposta de Eça de Queiroz àqueles que no Brasil e em Portugal o acusaram, ou maldosamente insinuaram, de O Crime do Padre Amaro ser uma imitação do romance “La Faute de l’ Abbé Mouret” de Zola.
No seu estilo inimitável, Eça diz: “Eu tenho algumas razões para crer que isto não é correcto”. E depois aduz a prova sempre irrefutável das datas: O Crime do Padre Amaro foi escrito em 1871, lido a alguns amigos em 1872 e publicado em 1874, enquanto o livro de Zola foi escrito e publicado em 1874.
E Eça acrescenta: “Mas (ainda que isto pareça sobrenatural) considero esta razão apenas como subalterna e insuficiente. Eu podia, enfim, ter penetrado no cérebro, no pensamento do Sr. Zola, e ter avistado, entre as formas ainda indecisas das suas criações futuras, a figura do abade Mouret – exactamente como o venerável Aquiles, no vale dos Elísios, podia ver, entre as sombras das raças vindouras, flutuando na névoa luminosa do Lete, aquele que um dia devia ser Marcelo! Tais coisas são possíveis. Nem o homem prudente as deve julgar mais extraordinárias do que o carro de fogo que arrebatou Elias aos céus – e do que outros prodígios provados”.
Só que, como Eça meticulosamente explica, os dois romances são muito diferentes na sua estrutura e na trama romanesca. Enquanto o episódio central do romance de Zola é o “quadro alegórico da iniciação do primeiro homem e da primeira mulher no amor”, O Crime do Padre Amaro é “uma simples intriga de clérigos e de beatas, tramada e murmurada à sombra de uma velha sé de província portuguesa”.
E dito isto – conclui Eça – parece ficarem indicados e suficientemente lúcidos os motivos que tenho para não supor O Crime do Padre Amaro uma tradução mal feita de La Faute de l’ Abbé Mouret. E não insisto na diferença das datas apesar de ela constituir o que se chamava, creio eu, em lógica, uma impossibilidade metafísica, porque sou bom cidadão e o artigo sexto da Carta impõe implicitamente o dever de não descrer dos milagres”.

Dito isto, o que se conclui é que Sócrates não demonstrou, no que respeita a datas, a impossibilidade metafísica, de a sua conversa com Figo nada ter a ver com as conversas que alguns super boys do PS já tinham tido tempos antes com ele, exactamente para o mesmo efeito. De facto – e este foi mais um pormenor que escapou ao impreparado entrevistador de “Sinais de Fogo” – as conversas dos super boys do PS com Figo datam, pelo menos, de Junho, enquanto a entrevista do ex-jogador ao Diário Económico – que, segundo Sócrates motivou o contacto com Figo – é de Agosto. E o encontro entre ambos é de Setembro, aliás, simbolicamente no mesmo dia em que a Tagus Park assinou o contrato com a Fundação Luís Figo.
Portanto, Sócrates, ao contrário de Eça, não conseguiu provar a “impossibilidade metafísica”. Resta, assim, a segunda hipótese: a de Sócrates ter penetrado na mente dos super boys do PS e ter avistado, entre as formas difusas das suas tramóias futuras, a figura apetecível de Figo como seu apoiante eleitoral. Só que aí levanta-se uma dificuldade tão intransponível como a da “impossibilidade metafísica”: é que a Constituição da República, contrariamente à Carta, consagra a separação entre o Estado e as Igrejas, defende o Estado laico e não obriga ninguém a não descrer de milagres, seja bom ou mau cidadão. Menos ainda, quando se é agnóstico, como é o caso de Sócrates.
Logo, improvada a impossibilidade metafísica e arredada por arreigado agnosticismo do Primeiro Ministro a teoria do milagre, só resta esperar que, em nota oficiosa, quase normativa, Silva Pereira venha desvanecer as dúvidas que arreliadoramente persistem nas mentes agnósticas dos nossos dias.

SOBRE AS PRESIDENCIAIS




UM POST LEVE

Estava fora quando Nobre se apresentou em Belém como candidato presidencial. Nada a opor, nem nada de muito interessante a comentar, qualquer que seja o ponto de vista. Só não compreendi essa de ele poder “dividir a esquerda”. Para dividir é preciso que haja um divisor do qual resultará um quociente que, em princípio, será menor que o dividendo, a menos que o divisor seja zero. Não creio que a candidatura de Nobre, no que respeita à esquerda, ande muito longe desta última hipótese.
Nobre de esquerda? Por ter sido clandestinamente apoiado por Soares? Soares está um pouco como o Saldanha, que com oitenta anos ainda chefiava golpes. Só que Saldanha tinha tropas…e prestígio militar. Soares apenas tem uma tribo de anciãos que pouco se tem reproduzido, pelas próprias limitações da natureza.
Portanto, não será por aí que Nobre divide a esquerda. Só se for por já ter apoiado o PSD, o PS, a Causa Monárquica (ao que dizem) e, ao que parece, até o Bloco. Pois é. É que isto da sociedade civil, já não digo no sentido hegeliano do conceito (bem complexo), nem mesmo gramsciano (difícil de aceitar pelos leninistas), mas no sentido que Marx lhe deu, e que de certa forma se mantém, apesar das posteriores deturpações de alguns elementos fundamentais para a sua correcta compreensão, pressupõe sempre uma burguesia digna desse nome.
E sabe-se o que o Estado verdadeiramente começa por ser (e terá deixado de ser?) numa sociedade dominada pela burguesia. Mas obviamente que tudo se inverte quando é o Estado que domina a dita sociedade civil e a traz pendurada pelos subsídios que lhe concede para que ela faça as tarefas que ele, Estado, se demite de fazer. Quando assim as coisas se passam, vai-se sendo de esquerda, de direita, de centro, enfim, do que calhar… A vida é difícil!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

"SINAIS DE FOGO" - TAVARES SABE POUCO...



E ESTUDA AINDA MENOS

Muitas vezes criticámos os jornalistas, porque eles estão mal preparados, não aprofundam devidamente os assuntos, têm opções jornalísticas de gosto e interesse duvidosos, e ligámos, talvez preconceituosamente, essas sucessivas deficiências ao facto de muitos deles não terem educação universitária.
A verdade é que, hoje, muitos dos que aparecem nas televisões ou têm cursos universitários da especialidade ou têm cursos de outras áreas que, em princípio, até lhes poderiam trazer certas vantagens na abordagem de certas matérias.
Todavia, essas vantagens ou essa específica formação não se traduzem em muitos deles em nenhuma melhoria significativa na abordagem dos temas mais complexos. Ainda hoje isso se viu na entrevista que S. Tavares fez ao Primeiro Ministro, José Sócrates.
Não perfilho a tese de que Tavares estivesse interessado em fazer o “frete” a Sócrates, como alguns já disseram, sob o pretexto de que se tratava de uma conversa entre “camaradas socialistas”.
Tavares cultiva o discurso da arrogância, está habituado a falar só na televisão e, como diz o Jardim, a substituir os argumentos por uns “esgares de boca torta” feitos com muita convicção e nenhum conteúdo. Gostaria, por isso, de ter brilhado e, para utilizar a linguagem marialva do entrevistador, de “ter encostado Sócrates às tábuas”. Não o conseguiu em nenhum dos domínios abordados.
Ficou-se pela superfície na questão da Madeira, tentando entrar na intriga, quando havia assuntos muito mais sérios que a tragédia infelizmente levanta e que contendem com outras questões bem mais graves que interessam a toda a comunidade nacional e não apenas àquele círculo restrito que se ocupa da intriga política.
Depois, também não teve qualquer êxito naquele que aparentemente poderia ter sido o tema mais simples da entrevista, tanto pela situação em que Sócrates se encontra, como pelo facto de o entrevistador até ser licenciado em direito e, teoricamente, ter alguma vantagem na abordagem de alguns temas. Não o fez. A meu ver por incompetência. E até permitiu a Sócrates justificar a presença de um jovem “super boy” do PS na estrutura directiva máxima de uma das maiores empresas portuguesas. Obviamente, que quem parte do princípio de que a publicação das escutas pelos jornais e outros meios de comunicação social é ilícita dificilmente se poderá sair bem numa conversa que as tenha como tema. Então, mais valeria ter abordado a questão por outro lado. Pelo lado do que licitamente deveríamos conhecer e não conhecemos.
Enfim, na economia a conversa não abordou nenhum dos grandes temas que neste momento estão na ordem do dia de quem pensa criticamente sobre a situação económica, não apenas de Portugal, mas dos países capitalistas avançados. Ficar pelo TGV, sem dar consistência ao argumento, e fazer a defesa das teses neoliberais da diminuição dos impostos como remédio para sair da crise são contributos bem pobres para um tema de tão grande importância. E, claro, Sócrates debitou a vulgata neo-keynesiana, seguro de que não tinha interlocutor à altura de o contraditar. De o contraditar com perguntas inteligentes…e não com interjeições cheias de “auto-suficiência argumentativa”.
Sinais de fogo” nem de perto nem de longe estará à altura da capacidade polémica e crítica do A. que deu o nome ao programa.

POLITEIA - 2.º ANIVERSÁRIO



OS TRÁGICOS ACONTECIMENTOS DA MADEIRA


Faz hoje dois anos que este blogue se estreou. Pouco tempo depois, o “Público”, na rubrica da P2 “Blogues em papel”, publicou um post da Politeia sobre a Madeira.
O post comentava as declarações de Gama sobre a obra de Jardim. Compreendi Gama, apesar da distância que politicamente me separa tanto dele, como de Jardim. Quem conheceu a Madeira antes do 25 de Abril, ou logo a seguir, como foi o meu caso, não pode deixar de ficar impressionado entre a Madeira daquele tempo e a que existiu até sábado passado. De todos os pontos de vista. Desde o olhar interessado mas sempre enganador do turista até ao que resulta da análise dos indicadores económicos.
Deste último ponto de vista, a Madeira era, até sábado, a segunda região portuguesa com maior rendimento per capite; do ponto de vista do turista, necessariamente superficial e impreciso, a Madeira é do melhor que há na Europa, sem que nada no território português continental de perto ou de longe se lhe assemelhe.
O azar bateu-lhe à porta com uma violência pouco comum. Sinto o que se passou na Madeira com o mesmo sentimento com que acompanhei a devastação de Cuba por três ciclones quase seguidos aqui há dois ou três anos.
Espero e desejo que os governantes da Madeira saibam estar à altura das responsabilidades do momento e que mais à frente, quando a Madeira estiver reconstruída, possam dizer com orgulho:
Não há ventos que não prestem
nem marés que não convenham,
nem forças que me molestem,
correntes que me detenham.
Quero eu e a Natureza,
que a Natureza sou eu,
e as forças da Natureza
nunca ninguém as venceu
”.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

SÓCRATES VOLTOU A FALAR



HÁ MUITOS ASSUNTOS INTERESSANTES

De facto, há muitos assuntos interessantes que ficaram por tratar na semana de Carnaval. A “ajuda” de alguns Estados membros à Grécia não pode passar em claro, como em claro também não podem ficar, por razões diametralmente opostas, as declarações de Zapatero sobre a dívida e o défice. Mas para isso teremos tempo na próxima semana.
No regresso a Lisboa, ficam-me no ouvido as mais recentes declarações de Sócrates: não temos nada a temer com a divulgação das escutas.
Então, se não temos, vamos a isso. O Parlamento que lhe pegue na palavra e desempenhe o papel que lhe compete.
Mas, por favor, poupem-nos às declarações de Almeida Santos, Edite Estrela e C.ª.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

SÓCRATES FALOU E TUDO FICOU NA MESMA

NA VERDADE, NÃO DISSE NADA COM INTERESSE

Não se percebe por que Sócrates falou, ainda menos quando ouvido de longe. Realmente não disse nada. Nem sequer vale a pena perder tempo com a sua declaração. Não esclareceu nada. Quem antes o defendia, continuará a defendê-lo; quem antes o atacava, continuará a atacá-lo.
Já que Sócrates mantém as objecções a que se divulguem as escutas e o Parlamento tem alguma relutância em desempenhar o papel que neste assunto poderia ter, só resta continuar a exigir a publicidade dos despachos do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e do Procurador Geral da República sobre o processo “Face Oculta” e esperar que que, por outra via, se venha a saber o que, por agora, continua oculto.
É que “isto” ainda não acabou...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

ECOS DE LISBOA



POUCAS NOVIDADES

De Lisboa chegam poucas novidades. Sócrates realinhou o PS às suas ordens, como se esperava, nem que para isso tivesse de cometer, como teve, o supremo sacrilégio de convocar os órgãos do partido, há tanto tempo silenciados. Sem surpresas, Sócrates impôs a sua estratégia ao PS e o PS, obediente, aceita colapsar com ele.
Entretanto, na PT reina a confusão. Para além das declarações contraditórias dos seus dirigentes máximos, que nenhuma habilidade póstuma consegue harmonizar, assiste-se à inevitável queda do “Homem de Sócrates” na empresa. Mais um “apertão” e outros cairão.
Finalmente, Fernando Nobre anuncia na sexta-feira a sua candidatura a Belém. Os soaristas,digam eles o que disserem, “esfregam as mãos” de contentes. Mas, como irão ver mais à frente, não têm motivos para isso. Se a candidatura de Fernando Nobre constitui um sinal de dinamismo da sociedade civil, como já se ouviu dizer, isso só pode querer significar que a sociedade civil não existe, o que também não constitui motivo de espanto para ninguém, minimamente informado. Entre a sociedade dos subsídios e a sociedade política, viva a política.

A CRISE GREGA E AS FRAGILIDADES DO EURO

O QUE A CRISE MOSTROU

Para um simples observador, sem formação económica específica, a crise grega (e as suas imediatas repercussões em Portugal, na Espanha e na Irlanda) teve o condão de trazer à luz do dia as fragilidades do euro como moeda comum de dezassseis Estados membros da União Europeia.
Todavia, estas fragilidades não constituiram qualquer surpresa para meia dúzia de economistas nacionais e mais uns tantos europeus que desde há muito tempo vinham alertando para as deficiências da construção da unidade monetária dentro de um vasto espaço económico, muito assimétrico, regulado por instrumentos sem paralelo em qualquer outra união monetária.
A primeira reacção daqueles que nunca foram capazes de antecipar a crise por que estão a passar certos países da zona euro, e por reflexo o próprio euro, é a típica reacção policial: é preciso mais vigilância, mais controlo sobre as políticas orçamentais e sobre o endividamento dos Estados que fazem parte da união monetaria, estando subentendido que essa vigilância deve fundamentalmente exercer-se sobre os que já “prevaricaram” e levantam sérias suspeitas de reincidência.
Outros, um pouquinho mais ousados, já adiantam que o Pacto de Estabilidade e Crescimento, para evitar situações como as que se estão a viver, deveria atender a outros indicadores além do défice orçamental e da dívida. E por ai se ficam.
Mas já são muito mais raros aqueles que insistem na persistente existência de um desiquilíbrio estrutural entre os países da eurozona e que reconhecem a impossibilidade de tal desiquilíbrio se manter por tempo indeterminado, e, consequentemente, advertem para a impossibilidade de o problema se resolver apenas através de uma política orçamental fortemente restritiva, com drásticas restrições ao endividamento e sucessivas reestruturações da dívida.
Se há países da zona euro que, desde a sua fundação, crescem regularmente, salvo em períodos de crise generalizada, têm superavits comerciais, aumento de salários reais e não registam perdas de competitividade, enquanto outros não crescem ou têm um crescimento muito baixo, sempre inferior aos encargos que vão assumindo, perdem competitividade, não registam aumento dos salários reais e se vão endividando cada vez mais, algo está errado numa união monetária que ao fim de onze anos não conseguiu eliminar ou atenuar estes desiquilíbrios, antes os agravou, como agora se está ver, analisando a situação da generalidade dos países periféricos.
Como alguns economistas, poucos, vêm insistindo, a Europa, contrariamente ao que acontece nos EUA, não conta com um mecanismo suficientemente forte para redistribuir recursos, nem com uma política fiscal e laboral comum e nem sequer conta com uma mobilidade laboral suficiente para atenuar os desiquilíbrios. Não havendo, por outro lado, qualquer possibilidade de assegurar ganhos de competitividade mediante a desvalorização da moeda, alterando a taxa de câmbio, parece evidente que somente uma política alicerçada numa efectiva solidariedade política e económica poderá garantir a moeda única.
Entre nós, ninguém do establishment sequer levanta estas questões. Para os economistas do sistema, que estão bem na vida e que nutrem pelos seus compatriotas assalariados um desprezo tipicamente colonial, o problema só se resolve ”cortando” nos salários e nas reformas (baixos e médios), despedindo funcionários públicos e colocando o trabalho na completa dependência do capital. Não será por isso de admirar que tais economistas, apoiados pelo capital financeiro, de que são fiéis serventuários, continuem a ser chamados para altos cargos nacionais e internacionais. De estranhar seria que não fossem....
Mais grave, no plano da cidadania, é a posição daqueles intelectuais que, tendo abandonado o espírito critico e soçobrado às benesses e mordomias proporcionadas pelo regime, são hoje incapazes, tanto no ensino, como no plano da intervenção cívica, de questionar algo que possa suscitar dúvidas sobre o regular funcionamento do sistema. Pelo contrário, continuam a tecer loas ao Tratado de Lisboa e a enaltecer os méritos da União Monetária dando a entender, ou dizendo-o mesmo expressamente, que aqueles que criticam abertamente os instrumentos constitutivos da União Europeia e da União Monetária não passam de um bando de esquerdistas irresponsáveis ou de nacionalistas serôdios, incapazes de acertar o passo com as luzes do progresso proporcionado pela integração economica e monetária.
A Europa, a única Europa possível, é a deles...

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O QUE O PS AINDA PODERIA FAZER



O QUE O PS TEIMA EM NÃO FAZER

Pelas notícias dispersas que vão chegando, percebe-se que um sector do PS (o que se exprime), porventura representativo da opinião de muitos militantes, talvez até da maioria, está na disposição de se “deixar enterrar” com Sócrates.
Esse sector parece não compreender que há hoje em largos estractos da sociedade portuguesa e, inequivocamente, em toda a classe na classe política não afecta ao PS, uma clara rejeição de Sócrates. À medida que o tempo passa, ontem por umas razões, hoje por essas e mais outras, amanhã por todas essas e mais algumas, o PS vai perdendo terreno e cavando um fosso cada vez maior com uma parcela muito significativa daquele foi o seu eleitorado na última década.
Por razões explicáveis, embora pouco justificáveis, quem acabará por ganhar com tudo isso é a direita. E desta vez será mesmo a mais reaccionária e radical.
Esta antevisão de modo algum pode ser interpretada, sequer subliminarmente, como uma crítica aos partidos de esquerda que, por esta ou aquela razão, têm juntado o seu voto ao voto da direita para derrotar o Governo. Pelo contrário, ao PS é que cabe a responsabilidade de, face à análise do que se está passando, actuar de modo a inverter a situação.
Mas não, perante o discurso radical, reaccionário e perigosamente populista de Rangel, o PS em vez de se preparar para tomar medidas susceptíveis de reverter a situação, numa altura em que ainda talvez o conseguisse, prepara-se para defender o indefensável e colar-se reverencialmente ao lado de Sócrates na esperança de que um milagre acontecerá.
Quando o PS for relegado para a oposição por largo tempo, porventura com um peso bem inferior ao que nessa situação tem tido noutras ocasiões, o mais provável é que se desenvencilhe rapidamente de Sócrates e dos seus “boys”. Só que nessa altura já será tarde. Tarde demais.
Incentivar provocatoriamente a oposição a apresentar uma moção de censura, quando se sabe que interesses contraditórios impedem a sua aprovação pelas várias oposições, é mais um argumento a favor da direita, que, aproveitando-se da persistência do PS numa solução sem saída , não deixará de mais tarde invocar a responsabilidade de todo o partido e não apenas de Sócrates pelo estado em que o país se encontra(rá).
Ninguém responsável advogará uma substituição imediata: há um orçamento para aprovar e há “contas a prestar” a Bruxelas. Mas logo que estes passos incontornáveis da vida política portuguesa estejam dados, o PS deveria ter uma solução credível para o “caso Sócrates”, sendo obviamente de descartar todos aqueles que a ele estiveram ligados, outros que não tendo estado assim tanto apenas formalmente se desligaram para que, quem está de fora, suponha que a sua insaciável voracidade pelos negócios nada tem a ver com a política e ainda outros que desde há muito suscitam em certas forças políticas anti-corpos capazes de em pouco tempo os neutralizar.
A escolha teria que ser sábia e estrategicamente pensada de modo a neutralizar as alianças que a partir de Belém se preparam para governar o país...

domingo, 14 de fevereiro de 2010

QUEM VIOLA A SEPARAÇÃO DE PODERES?



COMO SE PODE SABER SE HOUVE OU VIOLAÇÃO?

Afastado de Portugal por uns dias, sem possilidade de seguir ao pormenor as vicissiudes da política caseira, resta a abordagem dos temas que não se alteram com a passagem do tempo ou os que tendem a permanecer actuais por longos períodos.
Entre os primeiros, tem ganhado algum relevo na vida política portuguesa o argumento usado pelo Governo e seus defensores de que não lhes compete comentar as decisões do Procurador Geral da República (PGR) e do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (PSTJ) proferidas a propósito do processo “Face Oculta” por respeito pelo princípio da separação de poderes.
Nada, portanto, mais actual do que tecer algumas breves considerações sobre a separação de poderes.
De uma forma simples, própria de um blogue, pode dizer-se que a violação do princípio constitucional da separação de poderes 1) tanto ocorre nos casos em o Executivo ou o Legislativo se ingerem no exercício da função jurisdicional, inibindo-a ou substituindo-a no desempenho da sua função, quer pré-determinando ou condicionando o seu exercício; 2) como nos casos em que o Judicial actua como legislador, ou seja, quando deixa de determinar-se por critérios especificamente jurídicos e passa a actuar com base em critérios de oportunidade política, mediante opções e valorações típicas do legislador; ou ainda quando se substitui ao Executivo, tanto na prática de actos que só àquele competem, principalmente mediante emprego de critérios de oportunidade, como quando se propõe fazer o controlo de actos que, pela sua natureza, escapam à sindicância dos tribunais (casos hoje raros, no actual estádio de evolução do Estado de Direito, mas ainda existentes, de que constituem exemplos paradigmáticos os “actos políticos” (não sindicáveis jurisdicionalmente) e os “actos discricionários” (parcialmente não sindicáveis).
A ingerência do Judicial no Legislativo não se traduz necessariamente na elaboração de normas de vigência permanente e ostensiva, como acontecia com o famoso caso dos Assentos, mas ocorre também com muita frequência naqueles casos em que o legislador, por razões várias ou, dito de forma mais abrangente, por opção política, deixa ficar certas assuntos fora do Direito, num espaço livre de Direito ou ajurídico, e os tribunais teimam em introduzi-las na esfera do jurídico, e tendem a dar-lhes uma resposta jurídica com base em critérios de oportunidade política, mediante a sua subsunção numa norma que criam para o efeito e que resulta implícita da decisão tomada. Mais grave ainda é quando o Judicial se afasta clara e flagrantemente da norma em vigor e motivado por considerações de outra ordem profere uma decisão unicamente baseada em critérios de oportunidade política, disfarçada de decisão jurídica.
Quem tem competência para garantir a separação de poderes e pôr cobro a situações deste género são os tribunais comuns, sejam judiciais ou de competência especializada; todavia, como a acção destes pode não ser suficiente para atingir aquele objectivo, depois de esgotadas as instâncias de recurso ainda resta o Tribunal Constitucional ao qual caberá, em última instância e ainda no plano jurisdicional, defender e garantir aquele princípio.
Todavia, em todos os domínios normativos e desde logo, por maioria de razão, no do Direito põe-se a questão de saber “Quem guarda o guarda?”. Este é um problema de difícil solução, irrespondível no plano jurídico e que apenas pode ser tratado filosoficamente no domínio das relações entre o Direito e a Força. Contudo, antes de lá se chegar, deverá admitir-se que, em situações excepcionais, de grave crise institucional, caberá ao Parlamento, como órgão democrático primariamente legitimado, fazer a defesa e a reposição do princípio.
Dito isto, genericamente, quanto ao modo como pode ser violado o princípio da separação de poderes e como se garante a sua eficácia, facilmente se perceberá que aquele princípio só poderá ser efectivamente controlado se os actos que hipoteticamente o infringem forem publicados e publicitados.
Se, por exemplo, as decisões judiciais não forem tornadas públicas tal como foram proferidas, acompanhadas dos fundamentos que as justificam, e delas apenas tivermos o rasto deixado pela sua execução nunca se poderá controlá-las e jamais se poderá se poderá saber se elas violam ou não o princípio da separação de poderes.
Como se já disse, vêm estas considerações a propósito dos despachos proferidos pelo Procurador Geral da República e pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (que anteontem ficámos a saber, para surpresa nossa, serem de natureza substancial) sobre os hipotéticos indícios de crime de atentado contra o Estado de direito.
Na própria defesa daqueles magistrados, do Estado de Direito e do princípio da separação de poderes, aqueles despachos e as respectivas fundamentações têm urgentemente de ser tornados públicos tal como foram proferidos. De outro modo, jamais se poderá evitar a suspeita de que eles foram proferidos com violação do princípio da separação de poderes.
De facto, não é aceitável que num assunto de relevante interesse público apenas se conheça a posição dos magistrados de Aveiro (procurador e juiz de instrução), que viram nas matérias averiguadas indícios da prática daquele crime, e não se conheçam os despachos dos dois altos magistrados atrás citados que não consideraram tais matéria merecedoras de qulquer averiguação
Como também aqui já se disse por mais de uma vez, a argumentação segundo a qual as decisões dos tribunais superiores se sobrepõem às dos tribunais inferiores de nada vale enquanto não se não conhecerem as decisões e os respectivos fundamentos de uns e de outros.
Para que este objectivo se alcance, vale a pena invocar aqui Montesquieu e a sua luta pela clarificação do direito ou, antes dele, a luta da plebe romana pelo conhecimento das normas que a regiam (luta da qual resultou a Lei das XII tábuas) como vale a pena sobretudo recordar a máxima kantiana, que via no secretismo, tão frequente no direito público, uma forma de ocultar a injustiça que não pode ser mostrada.
Portanto, quem defende a separação de poderes não é quem invoca os referidos despachos para ocultar o que se passou, mas quem pugna pela sua publicidade para saber o que se passou!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

NORONHA DO NASCIMENTO



PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Noronha do Nascimento é um magistrado acima de toda a suspeita. A sua honorabilidade nunca foi posta em causa por quem o conhece e muito menos o poderia ser com base em factos que a maioria das pessoas desconhece. De qualquer modo, o seu passado fala por si.
É óbvio também que Noronha do Nascimento nada tem a ver com as escutas da Face Oculta em que não intervenha o Primeiro Ministro, como interceptado fortuito. Tudo isto é claro, como desde o princípio aqui tem sido sublinhado.
Todavia, da sua intervenção como jurista pode haver discordâncias. Ele já as teve certamente noutras ocasiões e tê-las-á também neste caso.
A entrevista que hoje concedeu a Judite de Sousa contém um facto novo, que a entrevistadora, por não ter a preparação técnica adequada, não soube valorizar devidamente. Até hoje, a maioria das pessoas que, com rigor e responsabilidade, se pronunciou sobre a intervenção de Noronha do Nascimento supunha que ela tinha sido de natureza meramente formal: ou seja, que o Presidente do Supremo apenas se tinha pronunciado sobre a validade das escutas, em virtude de as mesmas não terem sido interceptadas sem a sua prévia autorização. Com efeito, o artigo 11.º, n.º 2, al. c) do Código Processo Penal estabelece que compete ao Presidente do STJ, em matéria penal, autorizar a intercepção, a gravação e a transcrição de conversações ou comunicações em que intervenham (…) o Primeiro-Ministro e determinar a respectiva destruição, nos termos dos artigos 187.º a 190.º do mesmo Código.
A propósito desta questão levantou-se, como se sabe, uma enorme polémica jurídica: havia quem defendesse a invalidade das escutas sempre que não tivessem sido previamente autorizadas pelo Presidente do STJ; havia quem defendesse a validade das escutas obtidas fortuitamente, limitando aquela autorização prévia apenas às escutas que tivessem os visados como alvo; e havia quem defendesse que as escutas sendo, em princípio, nulas, poderiam ser válidas se tivessem relevância criminal específica.
Nos artigos que aqui escrevemos defendemos esta última posição. Pois bem, hoje ficou a saber-se que a intervenção do Presidente do STJ não foi apenas formal, mas também substancial, já que ele se pronunciou tendo também em conta o conteúdo das referidas escutas. De facto, o fundamento da não validação das escutas não é a falta de autorização prévia nem a circunstância de não lhe terem sido presentes nas setenta e duas horas subsequentes, o fundamento é a sua irrelevância criminal
Juridicamente, esta tomada de posição significa que as escutas em que o Primeiro Ministro foi fortuitamente interceptado poderiam ser válidas. Ou seja, a sua validade ou invalidade não decorria da prévia autorização, mas do seu conteúdo.
Ora, ao actuar nestes termos Noronha do Nascimento assumiu a posição de juiz de instrução, por ter entendido que a competência que a lei lhe atribuiu nos termos do artigo acima citado o coloca na mesma posição em que está um qualquer juiz de instrução que, de acordo com o condicionalismo legal em vigor, tem competência para autorizar escutas.
Embora do ponto de vista jurídico esta interpretação constitua um inegável progresso na medida em que deita por terra a tese de que as escutas fortuitas a qualquer das personalidades enumeradas no artigo 11.º, n.º 2, al. c) acima citado são sempre nulas, ela deixa por resolver uma questão bem mais complexa que é a da sua compatibilidade com o disposto no n.º 7 desse mesmo artigo 11.º, que atribui competência ao juiz da secção criminal do STJ para, em matéria penal, praticar os actos jurisdicionais relativos ao inquérito, dirigir a instrução, presidir ao debate instrutório e proferir o despacho de pronúncia ou não pronúncia nos processos relativos ao PR, PAR e PM por crimes praticados no exercício das funções.
Na interpretação que aqui fizemos sempre tínhamos considerado que a competência do Presidente do STJ estava limitada às escutas que tivessem aquelas personalidades como alvo, não abrangendo as obtidas fortuitamente. Estas, segundo o ponto de vista que defendemos, seriam válidas ou não de acordo com a sua relevância criminal, competindo ao juiz de instrução (neste caso um juiz da secção criminal do Supremo) validá-las ou não.
Nada a opor à interpretação de Noronha do Nascimento desde que ela possa ser compatível com a disposição legal que atribui nestes casos ao juiz do Supremo a competência para dirigir a instrução.

EM PORTUGAL NADA ACONTECE?



É PRECISO INVESTIGAR

Em Portugal nada acontece. Quando alguma coisa importante vem a lume, discute-se muito nesse dia e no seguinte, mas depois o assunto tende a ficar esquecido. E quem prevarica com alguma arte já conta com isso. Sabe que com meia-mentira aqui e com meia-verdade acolá acaba por se aguentar.
Por outro lado, a imprensa não tem o instinto dos grandes boxeurs. Em vez de se circunscrever ao ponto fraco e de não sair de lá até alcançar o KO, tende a dispersar-se numa miríade de ataques menores que permitem ao atacado responder e recuperar do ataque principal.
É um pouco assim que as coisas se têm passado na política e muito provavelmente assim continuarão a passar-se. E todavia os documentos trazidos a público pelo Sol na sexta-feira passada permitiam concentrar as “atenções” em dois ou três pontos fundamentais.
Em primeiro lugar, sobre os despachos do Procurador Geral da República. Ficou claro depois das revelações do Sol que, para além dos elementos decorrentes das escutas Vara/Sócrates, há outros elementos no processo “Face Oculta” que indiciam a hipótese de um crime de “Atentado contra o Estado de Direito”. Tanto os documentos apreendidos pelas investigações, como as conversas interceptadas entre arguidos daqueles processos ou entre arguidos e outras pessoas que não Sócrates, podem referir-se a factos que não são verdadeiros ou que não estão descritos com rigor, uma vez que tais documentos ou conversas envolvem, algumas vezes uma terceira pessoa, que não participa nas conversas nem na elaboração dos documentos. Mas a convergência de conversas no mesmo sentido exigiria, no mínimo, que houvesse uma investigação.
E sobre o que se passou não há dúvidas de nenhuma espécie: o PGR entendeu que tais factos não constituem indícios da prática do crime acima referido. E quanto a esta decisão também não resta qualquer dúvida de que o PGR errou. E trata-se de um erro grave, porque qualquer leigo percebe que os factos descritos indiciam a possibilidade daquele crime. O facto de se poder chegar à conclusão de que não houve crime não significa que a investigação se não faça. Porque somente fazendo-se se poderá saber se os indícios se confirmam ou não.
Logo, o PGR tem de se explicar muito melhor do que aquilo que já fez. E tem de se explicar perante a opinião pública e perante o Parlamento. Os deputados têm toda a legitimidade para quererem saber por que razão tais factos não foram investigados. A prossecução da acção penal não está na disponibilidade do Ministério Público. O MP tem a obrigação de a prosseguir sempre que nos termos da lei ela deva ser prosseguida.
Se a isto juntarmos as escutas das conversas entre Vara e Sócrates o assunto complica-se não tanto juridicamente, mas politicamente. E a razão é simples e baseia-se num raciocínio muito simples: se relativamente a factos que hoje são, em parte, do conhecimento público o PGR decidiu não investigar, quando o deveria ter feito, como poderemos nós saber se nas escutas daquelas conversas não há, pelo menos, factos tão relevantes quanto os anteriores? E esta é uma dúvida que nenhuma separação de poderes poderá dissipar. Porquê? Porque nós desconhecemos os factos sobre que recaiu o despacho do PGR…E, como já vimos, ele anteriormente enganou-se na qualificação jurídica de factos que mereceriam outra interpretação.
Diferente é a situação do presidente do STJ. Ao presidente do STJ não foi pedida uma qualificação jurídica dos factos, mas uma decisão sobre a validade jurídica das escutas. E embora se possa entender que o presidente do STJ não tinha que se pronunciar sobre a validade destas escutas, por não ser assunto da sua competência, ou entender que o assunto, sendo da sua competência, deveria ter tido uma resposta diametralmente oposta à que ele lhe deu, tem de se aceitar que ele possa ter uma posição diferente de qualquer das duas anteriormente referidas por se tratar de um assunto juridicamente muito controverso. De qualquer modo, é absolutamente necessário conhecer o despacho e a sua fundamentação.
Em segundo lugar, sobre o conhecimento ou desconhecimento dos negócios da PT por Sócrates. O Primeiro Ministro começou por dizer no Parlamento que não tinha conhecimento do negócio. Pelas escutas entretanto vindas a público logo se ficou a saber que Vara tinha achado aquela resposta deplorável. O PM nunca deveria ter proferido uma negativa tão rotunda nem tão ampla, como anteviu o avisado Vara.
Passado pouco tempo, logo que se tomou conhecimento da existência das escutas entre Vara e Sócrates começou a crescer o rumor de que elas versavam sobre aquele assunto. Mas era um simples rumor. Depois, à medida que se foram conhecendo mais pormenores do negócio, logo Sócrates se viu obrigado a matizar a sua posição, dando a entender que o Governo nada sabia e que ele como PM também não. A partir de sexta-feira passada ficou a saber-se, depois da transcrição de algumas escutas e de alguns documentos, que pessoas do inner circle político de Sócrates o davam não só como conhecedor do negócio, mas também como seu grande impulsionador.
Perante tais factos, Sócrates matizou ainda mais a sua posição e começou a dizer que oficialmente não sabia de nada, tendo a PT de certo modo corroborado essa posição. No entanto, percebeu-se depois que as datas invocadas por Sócrates e pela PT para comprovação do referido facto não coincidiam, o que levou o presidente da PT, confrontado com o assunto, a admitir que se tratou de um lapso da sua parte. Perante este sucessiva conformação de factos a um evento cujos reais contornos se desconhecem, também não resta a menor dúvida de que o assunto não pode passar sem investigação política. E na investigação política do caso ninguém pode deixar de perguntar a que título conhecia Sócrates o que afirmou desconhecer? Particularmente? Mas alguém fala com Sócrates a título particular sobre um negócio destes?

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

OS ESTADOS DA UNIÃO EUROPEIA "SALVARÃO" A GRÉCIA




OS ESPECULADORES AO ATAQUE

A situação financeira da Grécia não é certamente recomendável, mas ela não seria nada do que realmente é se o país não estivesse a ser vítima de um ataque especulativo, no qual intervêm como parceiros privilegiados do capital financeiro as agências de rating e os órgãos de comunicação social intimamente ligados ao capital financeiro, encarregados de criar diariamente, ao menor sinal da existência de dificuldades, um clima propício à subida continuada dos juros (em Portugal, e provavelmente na Grécia também, além destes, actuaram agentes locais do capital financeiro lançando diariamente o pânico nas televisões sobre a solvabilidade do país).
Neste ataque especulativo em larga escala não pode deixar de referir-se o facto de grande parte da dívida grega estar nas mãos de bancos europeus, ou seja, daqueles mesmos bancos que durante largos meses se financiaram junto do BCE à taxa de 1% e que agora estão a comprar a comprar títulos da dívida pública dos países periféricos do sul com rendimentos entre os 4% e os 6%.
A situação da Grécia levantava um problema complicado aos países da zona euro: ou nada faziam, como aparentemente os tratados comunitários impõem, e deixavam que fosse a Grécia a resolver os seus próprios problemas mediante recurso (inevitável) ao FMI; ou encontravam dentro dos Estados da zona euro, em colaboração com o BCE e a Comissão, embora sem a sua participação directa, uma solução que pudesse dispensar aquela intervenção.
A primeira solução, advogada pelo Reino Unido e pela Suécia, tinha para os países economicamente mais fortes da zona euro o grave inconveniente de descredibilizar o euro e animar os especuladores a um ataque concertado contra Portugal e a Espanha, o que não deixaria de ter consequências na própria solidez da moeda única.
Por isso, a Alemanha e a França já se terão entendido no sentido de encontrar para a Grécia uma solução que substitua a intervenção do FMI. Amanhã se verá em que termos.
A solução a encontrar não deverá, contudo, fazer esquecer que a crise que se abateu sobre as economias dos países periféricos é uma crise estrutural da qual dificilmente sairão enquanto prevalecer o actual modelo monetário comunitário. Como muitos economistas vêm desde há tempos advertindo uma moeda única sem que no respectivo espaço económico dessa moeda haja um orçamento digno desse nome, uma fiscalidade unificada e uma dívida pública europeia, numa palavra, sem que haja laços de solidariedade política, vai sempre trazer problemas de difícil solução para as economias periféricas menos competitivas.
A impossibilidade de recorrer á desvalorização da moeda levará esses países inevitavelmente (como já se está a ver) a recorrer a um abaixamento dos salários reais para não verem degradadas as margens de competitividade dos seus produtos. Quando ouvimos os nossos economistas do sistema, como João Salgueiro, Vítor Bento, Vítor Constâncio, etc, falar no crescimento económico do país pela via das exportações é disto que estão a falar – da degradação dos salários reais.

JULIA TIMOSHENKO E O SPORTING




DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS

Apesar de tudo Julia Timoshenko está numa posição um pouco melhor que a da Sporting, mas o espírito de ambos é o mesmo.
A ainda Primeira Ministra da Ucrânia tem um partido com assento parlamentar, um número não despiciendo de deputados e só perdeu as eleições por quatro pontos de diferença. Por este lado, está melhor do que o Sporting, que tem um presidente que não sabe o que há-de fazer, um conjunto de jogadores de pouca valia, foi eliminado de duas taças com goleadas e separa-o uma enorme diferença pontual relativamente ao primeiro classificado no campeonato.
Por outro lado, Júlia Timoshenko nunca reconhece as derrotas. Há sempre uma causa externa, que nada tem a ver com ela, que as explica. Nisso é igualzinha ao Sporting, que por mais goleadas que apanhe acha sempre que a culpa é do árbitro. Na Ucrânia a cultura de não aceitar as derrotas pode, no limite, pôr em causa a democracia; no Sporting, a mesma cultura pode, a prazo, acabar com o clube.
Por último, há uma diferença de peso entre ambos: Júlia Timoshenko é muito bonita e o Sporting não tem gracinha nenhuma!

O QUE AS PALAVRAS DO PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA NÃO ESCLARECEM



ESTA DECISÃO NÃO É IGUAL A OUTRAS

Depois da publicação na sexta-feira passada pelo semanário Sol dos despachos do Procurador de Aveiro e do Juiz de investigação criminal, bem como de extractos de conversas entre arguidos do processo “Face Oculta”, ficou a saber-se, sem qualquer margem para dúvida, de que os magistrados que têm a seu cargo aquele processo consideraram que havia indícios da prática do crime de atentado contra o Estado de Direito, nomeadamente contra os direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagrados.
A esta conclusão chegaram aqueles dois magistrados com base nos documentos apreendidos durante a investigação, com base nas conversas interceptadas entre arguidos do processo ou entre arguidos e outras pessoas e também com base nas conversas interceptadas entre Armando Vara e José Sócrates.
Ao contrário do que parece inferir-se das palavras do Procurador Geral, as certidões extraídas por aqueles magistrados e remetidas ao Procurador Geral para investigação não teriam apenas por base as escutas entre Vara e Sócrates, mas todos os demais indícios recolhidos durante a investigação.
O Procurador Geral tem-se referido sempre às escutas entre Vara e Sócrates para defender a tese de que com base nelas não deveria haver lugar a qualquer investigação, primeiro porque não indiciam qualquer crime e depois porque foram declaradas nulas.
O argumento apresentado por esta ordem – e é esta a ordem que consta do seu despacho – é juridicamente incompreensível. Porque, pondo-se a questão da validade das escutas, a primeira coisa sobre que tem de se decidir é se elas são válidas ou não. Se não forem, já não haverá lugar a qualquer juízo sobre a hipotética existência de indícios decorrentes dessas escutas.
E aqui começa o erro, mesmo para quem entenda que a questão da validade das escutas constitui um problema que não pode ser iludido. Mas há mais: é que há outros indícios, além dos revelados por estas escutas, como se demonstra pela documentação que o Sol publicou na sexta-feira passada. E quanto a estes indícios o Procurador não pode dizer, ou deixar subentendido como deixou nas declarações de hoje, que isso é da competência do Juiz de Aveiro. Não é. Nem o Juiz de Aveiro nem o Procurador de Aveiro têm competência para iniciar e superintender numa investigação que tenha por investigado o Primeiro Ministro, que, como aqui já se explicou várias vezes, goza de foro especial.
Portanto, o que os documentos publicados na última sexta-feira trouxeram de novo foi a certeza de que há outros indícios da prática daquele crime, além dos que resultavam (segundo a opinião dos magistrados de Aveiro) das escutas das conversas entre Vara e Sócrates. Só que esta investigação não pode ser iniciada pelos magistrados de Aveiro. Os crimes praticados pelo Primeiro Ministro no exercício de funções são julgados pelo Supremo Tribunal de Justiça e a instrução do respectivo processo cabe a um juiz da Secção Criminal daquele Tribunal.
Tendo por base estes factos, a argumentação do PGR, segundo a qual as decisões das entidades superiores prevalecem sobre as das inferiores, perde todo o sentido. Por duas razões muito simples: primeiro, porque o PGR não esclarece sem margem para dúvidas se a sua decisão versa sobre todos os indícios ou apenas sobre os indícios decorrentes das conversas interceptadas entre Vara e Sócrates; e depois, porque nos casos a que o PGR se refere como exemplo paradigmático do argumento invocado (“na minha vida fartei-me de ver as minhas decisões alteradas pelos tribunais superiores e também frequentemente alterei as decisões dos tribunais inferiores”) as pessoas têm acesso a ambas as decisões e aos factos que as justificam; dito de outro modo: têm acesso ao processo e às sentenças proferidas por cada instância e podem a partir daí fazer o seu juízo. Podem juridicamente concordar ou não, mas os factos estão lá, podem ser consultados pelos interessados.
No caso em discussão não se passa nada disso: a gente apenas conhece os despachos de Aveiro e os despachos do PGR, mas não conhece os factos que levaram o PGR a proferir um despacho diametralmente oposto aos proferidos pelos magistrados de Aveiro. E como agora se conhecem outros factos, igualmente indiciários, a que o PGR não deu qualquer relevância, fica a dúvida se o juízo sobre a irrelevância daqueles indícios não teria sido precipitado.
E é partir destas considerações que com toda a propriedade se poderá dizer que a argumentação jurídica que tem sido desenvolvida por Sócrates, pelo Ministro da Justiça, por alguns deputados do PS e pelo PGR, além de não resolver toda a questão jurídica, deixa sem resposta a questão política que as decisões jurídicas (e os factos conhecidos) inequivocamente levantam. E contra isto de nada valem os argumentos de separação de poderes. Respondendo esquematicamente a esta última questão, que, pela sua complexidade político-filosófica, exigiria outros desenvolvimentos, sempre se dirá que, para além dos eventuais mecanismos jurídicos que a lei consagre para atender a situações deste tipo, quando as decisões de entidades situadas na mais alta hierarquia das magistraturas levantarem dúvidas muito fundadas sobre a sua verdadeira natureza, será legítimo esclarecer essas dúvidas mediante recurso ao órgão que tem a legitimidade política primária de velar pela salvaguarda do Estado de Direito.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A ESPANHA CONTINUA DEBAIXO DE FOGO



TALVEZ ATÉ MAIS DO QUE A GRÉCIA OU PORTUGAL

A Espanha continua debaixo de fogo. Os especuladores do mundo inteiro já perceberam que a Espanha constitui um excelente filão para os seus apetites insaciáveis. Não é demasiado grande, nem demasiado pequena. Tem a dimensão ideal para não poder cair…
Quando o devedor é demasiado grande, o credor corre tantos riscos como o devedor. Se apertar muito, pode perder muito. Se o devedor for demasiado pequeno, o credor só tem vantagem enquanto o devedor resiste. Logo que a resistência cessa por impossibilidade da sua continuação, o credor corre o risco, se apertar muito, de ficar a perder, porque a probabilidade de os grandes deixarem o pequeno entregue a si próprio é muito grande. Se o devedor tem uma dimensão intermédia, como é o caso da Espanha, os credores estão na situação ideal. Podem apertar, porque o país não é demasiado pequeno para ficar entregue a si próprio, e também não é demasiado grande para que a sua ruína acarrete a ruína dos credores. O mais provável é que alguém venha em seu auxílio.
É infelizmente verdade que a gestão política de Zapatero não tem sido a melhor a partir do momento em que a crise se agudizou. Porventura por culpa da ministra que coordena as pastas económicas, Helena Salgado, porventura por culpa de quem dirige o governo, a verdade é que da cúpula política têm saído sinais contraditórios que os agentes do grande capital financeiro internacional logo amplificam e interpretam como indício seguro de desnorte da direcção política do governo.
É também verdade que grande parte da famosa “prosperidade” espanhola nestes últimos quinze anos assentava numa “borbulha imobiliária” que mobilizou capitais de todo lado, principalmente, da Alemanha e do Reino Unido, atraídos pela excelente remuneração que a especulação imobiliária lhes permitia alcançar. O que acabou por ter um efeito nefasto sobre toda a economia espanhola, nomeadamente do ponto de vista da sua competitividade. Fazer o ajustamento disto vai ser doloroso para o orgulho espanhol.
Simultaneamente, a crise espanhola também serve para demonstrar que tendo, por todo o lado, o capital financeiro ficado incólume, depois da crise que provocou no mundo inteiro, ele ai está novamente a impor impiedosamente as suas leis. Há uma óbvia incapacidade do sistema para se reformar e auto-regenerar. O capital financeiro está tão intimamente ligado a todos os sectores da vida económica e influencia tão decisivamente o poder político, que este, mesmo que tivesse vontade política para o domar e limitar, o mais que lhe poderia fazer era apenas umas “pequenas cócegas”. Dito de outro modo: quem manda no mundo globalizado é a grande finança e o capital especulativo. Não haja ilusões: dentro do sistema isto não se resolve!

A ANÁLISE DE PAUL KRUGMAN

VALE A PENA LER

No seu blogue, The Conscience of a Liberal, Paul Krugman analisa a situação dos Estados europeus que estão "debaixo de fogo" das agências de rating e dos entidades financeiras internacionais, embora incidindo a sua análise na situação da Espanha. E a conclusão a que se chega ...é que com o euro tudo se torna mais complicado para os países em questão, sem todavia deixar de considerar que o peso das economias da Grécia, de Portugal e da Irlanda no conjunto dos países do euro é diminuto. Mesmo incluindo a Espanha, não ultrapassa os 20%.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

FIM-DE-SEMANA:NOTAS SOLTAS



APERTA-SE O CERCO

Face Oculta: pela leitura da imprensa do fim-de-semana fica a perceber-se que Vara é mais inteligente do que Sócrates e politicamente mais hábil. Provavelmente, por não ser tão arrogante.
Candidatura de Alegre: Sócrates, com os sucessivos casos em que se vê envolvido, vai tornando mais difícil a vida à candidatura de Alegre; Almunia, ao permitir a Cavaco dizer o que disse, depois de já ter dito o que tinha dito, também acabou por ajudar Cavaco que, tranquilamente ou com uma boa dose de “valiuns matinais”, faz o possível por parecer sereno e consensual.
ETA – Para quem conhece a história da clandestinidade da grande maioria dos resistentes portugueses, inclusive dos que se dedicavam à luta armada (os mais reprimidos), não pode deixar de sublinhar a diferença de comportamento destes durante os interrogatórios relativamente ao de outros clandestinos do nosso tempo.
Ucrânia: Yanukovich, como se esperava, ganhou as eleições na Ucrânia, embora a diferença que o separa de Julia Timoshenko seja bem inferior à alcançada na primeira volta; Timoshenko bem pode “espernear”, mas pelas declarações dos observadores internacionais, da União Europeia e dos países da Europa ocidental, já se percebeu que o resultado está adquirido e nada o alterará; Obama bem pode queixar-se das hesitações dos europeus quando lhes solicita um facere, mas quando lhes recomenda um non facere pode ter a certeza de que será sempre obedecido.

O GOVERNO PS E A LIBERDADE DE IMPRENSA

TALVEZ TUDO SE COMPREENDA AGORA MELHOR

A liberdade de imprensa das sociedades capitalistas consolidadas deixa muito a desejar, como facilmente se percebe olhando para o panorama europeu e americano. Evidentemente, que outras sociedades noutros cantos do mundo não primam pela defesa e prática dessa mesma liberdade e por isso também não podem ser arvoradas em paradigma de quem aqui critica as suas limitações. Há, porém, uma diferença que não pode ser escamoteada: são as sociedades democráticas ocidentais que apresentam a liberdade de imprensa como imagem de marca da sua superioridade civilizacional.
A verdade é que para ter liberdade de imprensa é preciso ter dinheiro. Muito dificilmente um meio de informação pode ter uma linha editorial que não seja conforme à orientação da sua principal entidade financiadora. E quando isso não acontece é sempre por breves períodos de tempo.
Para que a linha editorial seja conforme à orientação da entidade financiadora, esta não precisa de ter no jornal ou na estação de rádio ou de televisão um fiscal ou um censor. Basta-lhe ter um director e uma equipa que dêem garantias de interpretar essa linha nas mais diversas situações do dia-a-dia.
Quando algum director se empenha ele próprio numa agenda politica que embora não contrarie no essencial a linha da entidade financiadora, mas seja susceptível de envolver o jornal ou estação de rádio ou de televisão numa “guerra permanente” com o poder, o que na lógica dos grandes cálculos empresariais se pode tornar prejudicial para os negócios da entidade financiadora, e ainda por cima o dito meio de comunicação, em si mesmo considerado, não dê lucro, mais dia, menos dia, e logo que haja um bom pretexto, o dito director será despedido.
É claro que as coisas se agravam quando é o próprio poder político a querer controlar a informação, seja directamente por intermédio de empresas sob o seu controlo, seja indirectamente por intermédio de empresas que embora não estejam juridicamente sob o seu controlo mantêm no plano da gestão relações muito estreitas com o poder.
Quando isso acontece, então as nossas sociedades democráticas ocidentais num assomo de hipocrisia difícil de igualar e não menos difícil de desmistificar clamam quase em uníssono contra a falta de liberdade de imprensa. Verdadeiramente não se trata de uma situação substancialmente diferente da anterior, mas porque está ligada ao fenómeno do poder político, cujo exercício nas sociedades democráticas ocidentais é por definição temporário e alternante, a questão assume foros de escândalo político por atingir um dos pressupostos míticos do próprio sistema: a alternância (que o não questiona).
Mas de um outro ponto de vista, do ponto de vista de quem questiona o próprio sistema e luta não por uma alternância, mas por uma alternativa, esta situação não é substancialmente diferente da anterior.
E é no fundo isto que explica por que razão o Partido Socialista promoveu a seguir ao 25 de Abril uma intensa campanha, dentro e fora do país, contra aquilo a que chamou a falta ou até inexistência de liberdade de imprensa, quando, como os factos historicamente demonstram, se estava a viver uma época sem paralelo em matéria de liberdade de imprensa. De facto, nunca neste país, pelo menos nos últimos oitenta anos, houve, sob todos os pontos de vista, tanta liberdade de imprensa como a que existiu entre 25 de Abril de 1974 e 25 de Novembro de 1975. O PS recorreu então a todas as mistificações, deturpando e inventando factos, para demonstrar que não havia liberdade de imprensa. Havia, mais do que nunca houve. Só que a orientação dominante da comunicação social, sem censura, nem fiscais, não correspondia à orientação que o PS lhe queria imprimir.
Hoje o governo PS (apesar de tudo tem, a este respeito, que se falar de governo PS e não de PS) vai muito mais longe do que foi no passado o PS - que estava fundamentalmente empenhado em impor uma alternativa ao rumo dos acontecimentos - e procura impedir ou dificultar a própria alternância. Imagine-se o que faria o Governo se o que estivesse a ser questionado fosse o próprio sistema, ou seja, a viabilização de uma alternativa!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

O COMPROMISSO HISTÓRICO, JARDIM E A SITUAÇÃO POLÍTICA PORTUGUESA



O QUE FAZ FALTA

Alberto João Jardim surpreendeu ontem os portugueses ao admitir, face ao que se passou na Assembleia da República para a aprovação da Lei das Finanças Regionais, a possibilidade de algo semelhante ao “compromisso histórico” italiano da década de setenta como solução para a grave crise política, económica, financeira e social em que o país está mergulhado.
O compromisso histórico italiano tinha como protagonistas o Partido Comunista Italiano, independente de Moscovo e defensor de uma via democrática e parlamentar para o socialismo, e a ala esquerda da democracia cristã. Ambos tinham como inimigos, que minavam o futuro democrático da Itália, os grupos armados de extrema-esquerda, nomeadamente as Brigadas Vermelhas, os neo-fascistas e o crime organizado (vulgo Mafia) estreitamente ligado a amplos sectores da democracia cristã, a outras formações políticas e contando ainda com a colaboração da CIA, que desempenhou durante o período de hegemonia democrata-cristã um papel muito importante em todos os domínios da política italiana.
Do lado do PCI o grande impulsionador foi Enrico Berlinguer que, na revista Rinascita, em quatro artigos que fizeram história, propôs, na sequência do golpe chileno, à Democracia Cristã um entendimento programático de incidência governamental, que eliminasse o anterior conventio ad excludendum (do PCI no governo), e que contou com o apoio da ala esquerda da Democracia Cristã, nomeadamente do presidente Aldo Moro e do Secretário Benigno Zacagninni.
Como se sabe, a experiência acabou mal: rejeitado pelos Estados Unidos e pela direita da Democracia Cristã, nomeadamente Giulio Andreotti, exactamente no dia em que ia apresentar no Parlamento a propsta de participação dos comunistas no governo Aldo Moro foi sequestrado no centro de Roma e depois assassinado numa acção nunca completamente esclarecida mas onde há fortes razões para supor que de uma ou outra forma estariam envolvidos todos os grandes inimigos do compromisso histórico.
Sem Aldo Moro na democracia Cristã, o PCI retirou o apoio ao Governo de Solidarieda Nacional presidido por Giulio Andreotti e terminou uma experiência que verdadeiramente nem começou.
Há condições em Portugal para algo semelhante, entre os dois partidos de direita e os dois de esquerda, todos com assento parlamentar, e, neste momento, com maioria absoluta no Parlamento?
Há na acção dos quatro partidos um denominador comum que nesta legislatura já serviu, por mais de uma vez, depois de negociações verdadeiras e próprias, para derrotar o Partido Socialista. E esse denominador comum é a rejeição absoluta e completa de Sócrates como chefe do governo. Os quatro partidos podem não ter condições políticas para o destituir neste momento, mas sabem, e com eles a maioria da população, que Sócrates é hoje uma fonte permanente de problemas e de crispação da sociedade portuguesa.
Também já se viu que o PS “vai para a cova” com Sócrates. O partido não tem tão cedo força moral e política para se libertar de Sócrates. E não há igualmente dúvidas para ninguém que Sócrates e a sua gente – e por arrastamento o Partido Socialista – constituem hoje o grande problema do país. Em todos os domínios. Primeiro que todos, o da credibilidade, e depois Sócrates é um factor permanente de agravamento do défice e da divida, da situação política, económica, financeira e social do país.
Há assim uma inequívoca convergência nos partidos políticos da oposição e da maioria dos portugueses no sentido da rejeição de Sócrates. Só que, para governar, é preciso muito mais do que isso. É preciso um acordo de governo.
Não seria impensável um acordo de governo por três anos baseado em metas claras e acções concretas, negociadas ano a ano, com prevalência para a criação de emprego, apoio social, cessação do programa de privatizações, suspensão dos investimentos inúteis ou desnecessários nos próximos anos, ataque generalizado ao despesismo e ao desperdício e por ai fora.
Não seria impensável conversar sobre o assunto. Explorar as suas potencialidades. Mas há muitos preconceitos e muitos problemas. Os preconceitos não têm solução: normalmente morrem com quem os tem. E às vezes até se transmitem. Os problemas podem ter solução, embora um deles, o PSD, seja de solução muito difícil. A falta de uma liderança respeitada e consensual tornaria qualquer conversa muito precária.
Não seria impensável, mas seria muito, muito difícil concretizar o que quer que fosse, além do mais porque os portugueses e os seus políticos não têm a cultura do compromisso…
Aditamento:
Depois de ter escrito este post, tomei conhecimento deste artigo sobre a actuação da CIA na Itália e as responsabilidades na morte de Aldo Moro.
Sabe-se hoje que a CIA teve um papel determinante na política italiana durante todo o período da chamada I República Italiana, que vai do pós-guerra até 1993. A CIA colaborou intimamente com grupos de extrema direita, alguns dos quais nascidos sob o seu impulso, como a famosa loja maçónica de Gelli, P 2, e o Gladio, mantinha excelentes relações com a mafia siciliana (aliás, desde o desembarque das tropas americanas na Sicília em 1943), obviamente com amplos sectores da democracia cristã, e também com grupos de extrema esquerda, como as Brigadas Vermelhas, que infiltrou. Em virtude dos grandes resultados eleitorais do PCI, por duas vezes esteve eminente durante aquele período um golpe de direita sob o alto patrocínio da CIA e da NATO.
Ao que os arquivos hoje revelam somente, durante o curto período que durou a Presidência Kennedy é que houve algumas alterações na política americana relativamente à Itália, mesmo assim muito boicotadas pela CIA, pelo Departamento de Estado e pela NATO.

A GRAVE SITUAÇÃO DO PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA




AS DÚVIDAS SOBRE AS RAZÕES QUE FUNDAMENTARAM O DESPACHO DE ARQUIVAMENTO

As peças vindas a público este fim-de-semana do processo “Face Oculta” deixam ficar Pinto Monteiro, Procurador Geral da República, numa situação muito delicada.
É que não adianta nada argumentar no estilo Marinho Pinto para o ilibar das graves responsabilidades que sobre si recaem dizendo que despacho de arquivamento por ele proferido já transitou em julgado e que todo este alarido não passa de uma forma de torpedeamento daquela decisão. E não adianta, porque já não se está a discutir a solução para uma questão jurídica controvertida. O que agora se está a discutir é uma questão política decorrente de uma decisão jurídica.
E a questão política é muito fácil de equacionar: dois magistrados que têm a seu cargo a investigação criminal do “Processo Face Oculta” entenderam, pelos elementos de prova recolhidos durante a investigação a seu cargo, que havia indícios graves do crime de atentado contra o Estado de Direito e nessa conformidade extraíram as respectivas certidões e enviaram-nas ao Procurador Geral para instrução do respectivo processo, já que, sendo o indiciado quem é, só pode ser julgado pelo STJ competindo a cada juiz das Secções Criminais daquele tribunal dirigir a instrução, presidir ao debate instrutório e proferir o despacho de pronúncia ou não pronuncia.
Como os indícios parecem indiscutíveis, a questão que hoje se põe ao PGR é a seguinte: em qualquer outro processo, que não envolvesse personalidades sujeitas a foro especial, em que houvesse indícios de crime com a mesma força indiciária dos existentes no processo “Face oculta”, teria o PGR, ou qualquer procurador ou agente do MP, ordenado o arquivamento do processo?
A opinião pública em geral pensa que não. E a opinião pública jurídica especializada pensa exactamente o mesmo que a opinião pública em geral.
O refúgio na invalidade jurídica dos indícios não é argumento. Não é argumento porque segundo a melhor opinião tais indícios foram obtidos de forma juridicamente válida; não é argumento porque o próprio PGR emitiu sobre a substância dos indícios, abstraindo da questão da validade, um juízo de avaliação sobre a sua hipotética força probatória; e não é argumento finalmente porque a investigação poderia sempre fazer-se mesmo que os indícios tivessem sido juridicamente colhidos de forma invalida, já que, nesse caso, o que seria inválido era a sua utilização probatória e não o conhecimento que via deles se obtém.

O PS TEM UM PROBLEMA DE DIFÍCIL SOLUÇÃO



AS FINANÇAS REGIONAIS SÃO UM PRETEXTO

Desde o 25 de Abril que o PS tem um problema de difícil solução. O PS é no espectro político português um partido de centro. Mas não é um partido de centro como muitos outros existentes por essa Europa fora. Na Europa, os partidos de centro têm normalmente à sua direita e à sua esquerda partidos que disputam entre si a primazia eleitoral. Umas vezes, raras, estes partidos obtêm a maioria absoluta. Na maior parte das vezes alcançam apenas a maioria relativa e para governar precisam de fazer coligações. Os partidos de centro são frequentemente chamados a participar nessas coligações, tanto à esquerda, como à direita.
Em Portugal, o PS disputa desde sempre a primazia eleitoral com um partido à sua direita. E como é claramente um partido de centro, que se faz passar por partido de esquerda, tem uma espécie de impossibilidade congénita em se aliar formalmente a quem quer que seja. Porque se se aliar com um partido à sua direita, perde parte do seu eleitorado de esquerda que se considera traído por essa aliança. Se se aliar à esquerda, perde parte do seu eleitorado de direita que vê nessa aliança uma viragem relativamente a tudo o que tem sido a história do partido.
Esta lógica só foi infirmada por duas vezes, em ambos os casos por Mário Soares, por um curto espaço de tempo, mas, mesmo assim, com péssimos resultados para o partido.
A primeira, numa aliança com o CDS, depois de derrotado no Parlamento o governo minoritário PS, e numa altura em que o sistema político vigente ensaiava os primeiros passos e o Presidente da República se preparava para assumir a responsabilidade pela formação de governos de iniciativa presidencial. Mário Soares, parlamentarista e anti-militarista convicto, não hesitou na aliança com a direita para evitar aquilo que ele temia ser um forte indício de sidonismo.
A segunda, com o PSD, depois do colapso dos governos da Aliança Democrática e da vitória eleitoral do PS por maioria relativa, na constância de uma grave económica e financeira. Desta vez Mário Soares sabia que um relativo sucesso de uma política de ajustamento macro-económica, embora arrasasse o partido, o deixaria a ele em boas condições para uma candidatura com êxito à presidência da república. E por isso não hesitou em fazer a aliança.
Das duas vezes que fez alianças à sua direita o PS foi eleitoralmente arrasado, principalmente da segunda vez, embora Mário Soares lograsse alcançar o objectivo pessoal a que se propusera.
É esta lógica interna do PS, imposta pela sua natureza partidária e pelo imaginário que lhe está associado, que realmente impede entendimentos estáveis com outros partidos. Depois de alcançada a primeira maioria absoluta com Sócrates, a situação agravou-se e o PS já só sonha com a sua repetição. Se já antes tinha imensas dificuldades em concluir acordos estáveis, mais dificuldade tem agora. Por outro lado, a feição autoritária e pouco dialogante do Primeiro-ministro agrava a situação.
O episódio da alteração da lei das finanças regionais é ridículo e mostra até que ponto o PS está disposto a ir. É de facto ridículo que o PS fale em despesismo, em falta de solidariedade, irresponsabilidade e outras coisas mais quando se propõe aprovar um orçamento que continua a apostar em vultosos investimentos, inúteis nos próximos anos, apenas para satisfazer as suas clientelas empresariais. É inacreditável que um governo, que se propõe privatizar empresas lucrativas para o Estado para as entregar em exploração ao capital privado em regime de monopólio, fale de despesismo a propósito da alteração da lei das finanças regionais. É inadmissível que um partido que hipotecou e que continua a hipotecar o país com parcerias público-privadas (o Estado fica com o risco e com os encargos financeiros ou a sua garantia e os particulares com os lucros), transferindo anualmente milhões de euros para o capital privado protegido, venha falar agora de despesismo a propósito da alteração da lei das finanças regionais. Parcerias cujas obras teriam ficado incomparavelmente mais baratas se tivessem sido feitas pelo Estado. É vergonhoso que um governo que vai assumir responsabilidades de milhares de milhões de euros num banco vigarizado pelos seus administradores e negligentemente vigiado pelo supervisor dramatize uma despesa que não ultrapassa 0,035% do PIB!
De facto, o grande problema deste país é o Partido Socialista, agora perigosamente agravado com direcção política de Sócrates.