terça-feira, 15 de outubro de 2019

CONSIDERAÇÕES SOBRE A POLíTICA EXTERNA DE TRUMP


COMPARAÇÃO COM OS MANDATOS ANTERIORES

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Apesar de Trump ter sido eleito em 2016 e empossado como Presidente dos Estados Unidos em Janeiro de 2017, continuam a causar surpresa e muita perplexidade algumas das posições por ele assumidas no plano internacional. Todavia, o tempo decorrido e a prática desde então seguida no plano das relações internacionais já seriam suficientes para se tentar uma interpretação do que realmente se está a passar.

De facto, Trump tentou aproximar-se da Rússia com vista ao estabelecimento de uma relação que atenuasse a crispação existente entre os dois países como consequência quer do “cerco” que a Nato montou em redor das fronteiras norte e ocidental da Rússia quer das tentativas até agora falhadas de fazer o mesmo na fronteira sul e até nas fronteiras orientais, bem como consequência da resposta russa a estas manobras – a reintegração da Crimeia no território pátrio. Essas tentativas foram manifestamente boicotadas pelo “establishment” de Washington que lançou mão de toda uma série de insinuações para descredibilizar a acção do Presidente. Não obstante, toda essa oposição, a relação entre os dois países acalmou-se, contrariando assim parcialmente os interesses do complexo militar-industrial, que necessita, para poder crescer e prosperar, de uma relação com a Rússia sempre à beira do conflito, como potência militar mais poderosa depois dos Estados Unidos. A Rússia, porém, não representa na mundividência de Trump um concorrente, daí que situação, tal como está, o satisfaça, desde que a NATO não crie situações de facto que o obriguem a gastar dinheiro. Que é exactamente o que Trump não quer, embora esse objectivo apenas disfarce a pouca ou nenhuma importância que atribui à Nato, no quadro da sua concepção imperialista.

Um tipo de actuação semelhante passou-se nas relações com a Coreia do Norte. Depois de um período de grande tensão em parte provocado pelo nervosismo com que Kim Jong-un reagiu à eleição de Trump – ele também uma vítima da campanha americana anti-Trump que rapidamente se estendeu aos quatro cantos o mundo -, contra todas as expectativas Trump divisou naquele comportamento não apenas um oportunidade de negociação mas uma vontade de negociação que, se bem aproveitada, poderia vir a criar sérios problemas à China. Essas negociações, ou mais correctamente, essas conversas entre os dois dirigentes foram mais longe do que alguma vez tinham ido nos múltiplos contactos já tentados entre os dois países. Apesar de Trump não ter clarificado suficientemente a sua ideia e de, portanto, não ser fácil antever as possibilidades de êxito, o que parece não haver dúvida é que Trump foi boicotado, porque a ideia, mesmo que bem trabalhada, de uma desmilitarização da península da Coreia, é algo que o imperialismo americano da linha tradicional nem sequer pode ouvir falar. Aliás, não foi por acaso que Kim Jong-un disse que as negociações tinham de ser com Trump. O “dossier Coreia” não está fechado, longe disso, mas acalmou e pode ainda ter uma saída aceitável se Trump for reeleito.

Da América Latina nem vale a pena falar tão grande é a diferença que separa a política desta administração das antecedentes, quer com “amigos” e aliados quer com inimigos. Apenas de registar a forma como Trump conseguiu escapar à “cilada venezuelana”, montada por Bolton, Pence & C.ª. Sendo de esperar que uma escalada das sanções tenha em vista forçar uma negociação numa posição negocial mais favorável.

É contudo no Médio Oriente e no Afeganistão que o conflito entre a estratégia imperialista de Trump e a dos seus mais próximos antecessores é mais evidente.  O Médio Oriente, principalmente o Golfo, embora conserve uma grande importância estratégica, está hoje longe de representar para os Estados Unidos o mesmo que já representou há uns anos atrás. Mas nem por isso deixa de ser uma região onde Trump tem tido muita dificuldade em impor a sua política. O reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel está longe de ter o significado que inicialmente lhe foi atribuído. Significa fundamentalmente a garantia dos Estados Unidos à continuidade de Israel como Estado independente. Mas não significa maior envolvimento na região. Aliás parece mesmo ser a contrapartida de um menor envolvimento. Todavia, as dificuldades para esse menor envolvimento são notórias. É que de pouco vale dizer que o objectivo é mandar para casa todos os soldados americanos em serviço no Médio Oriente e depois reforçar as forças navais no Golfo e o contingente americano na Arábia Saudita com mais dois mil homens, mais uns tantos esquadrões de caças e um novo sistema de mísseis, justificado pelo recente ataque de drones a instalações petrolíferas. De pé permanece porém a ideia de que a guerra no Iémen não será ganha e isso levará inevitavelmente a retirada das proximidades do teatro de operações. Já na Síria parece em vias de consumação a retirada das tropas americanas do terreno, apesar das críticas que chovem de todos os lados.

No Afeganistão, as negociações de paz goraram-se aparentemente por culpa dos talibãs, embora actos da natureza do que provocou o rompimento das negociações, em princípio, não ocorram desinseridos de um contexto de boicote, de um lado ou do outro. De qualquer modo, a semente está lançada e mais mês, menos mês, as conversações acabarão por ser retomadas.

Quanto ao Irão, a questão complica-se por se tratar de algo que continua na agenda israelita como primeira prioridade. Todavia, se a intenção de Trump fosse fazer a guerra pretextos não lhe faltavam para a começar, mesmo sob a forma de retaliação. Mas também aí já se percebeu que não é esse o seu objectivo. O que parece movê-lo é a intenção de obrigar o Irão a renegociar o “tratado de não proliferação nuclear”, um tratado, diga-se, que não vinculava os Estados Unidos não obstante a assinatura de Obama.

Deste breve enunciado do que parece ser a política externa americana na administração Trump, a primeira grande diferença entre este presidente e os seus antecessores mais próximos é a que resulta de ele querer restaurar a grandeza (perdida) da América de dentro para fora e não o contrário. E daí decorrem logo uma série de consequências politicas. Nacionalismo económico por contraposição a uma globalização de cariz neoliberal que destruiu indústria americana, estava em vias de destruir a agricultura e iria ter graves consequências no próprio sector terciário por força da acumulação de capitais que aquela política gerava nos concorrentes, muitos deles "amigos" e aliados, da América. No plano externo, para fazer a defesa dos interesses americanos, Trump actua, não obstante uma ou outra fanfarronice (quase sempre para tirar vantagens negociais), quer pela via das sanções quer pelas das tarifas alfandegárias, consoante a importância e a força da contraparte (Irão, Venezuela, Cuba, Coreia do Norte, no primeiro caso; China e União Europeia, no segundo). A guerra, segundo Trump, dá prejuízo (e nisso ele tem indiscutível razão), e envolve a América numa teia de compromissos e situações da qual terá sempre muita dificuldade em sair. Daí que ele afirme que "uma grande potência não pode participar em guerras que nunca mais acabam". Esta frase, para quem a souber interpretar devidamente, ilustra uma estratégia que pressupõe um método de acção (atrás genericamente descrito) mas também uma forte ameaça, mais ou menos desta natureza: "Se nos obrigarem a ir para a guerra, então, com os meios que nós temos, ela será uma guerra rápida". Obviamente, que nada disto tem a ver com a estratégia imperialista de Bush, Cheney, Clinton, Obama & Cª, que é uma estratégia imposta pela complexo militar-industrial contra a influência do qual Eisenhower, no fim do segundo mandato, foi a primeiro a alertar. Não apenas por força desta influência mas também por tradicionalmente a via da presença militar ser aparentemente a que melhor salvaguarda o domínio. Ora, o que parece estar a levar a esta alteração de política é o efeito alcançado estar cada vez mais longe de ser o pretendido ou o esperado. Os Estados Unidos têm centenas de bases militares por todo o mundo, têm destacados milhares de soldados e perdem dinheiro, enquanto os que teriam a obrigação de financiar esse esforço de defesa o poupam, além de economicamente estarem mais fortes e mais concorrenciais. Esta ideia de assegurar a grandeza actuando de fora para dentro tem dado, segundo Trump, resultados muito negativos. E talvez Trump não conheça as últimas duas décadas da URSS, porque se as conhecesse mais reforçadas ficariam as suas convicções...

 E poderíamos continuar, enfim. Quem supõe que Trump é um bronco, por ele ter dito que Joe Biden só é conhecido como político por ter andado oito anos a lamber o rabo a Obama, vai-se arrepender, mais tarde, de ter olhado para o mandato de Trump segundo as reacções pavlovianas que as centrais de intoxicação se encarregaram de veicular com muito êxito. Ou seja, quando alguém pronuncia "Trump", a essa palavra são logo associados um conjunto de adjectivos e outras qualificações depreciativas que imediatamente impedem o sujeito de pensar. Todavia, as coisas têm uma lógica…

PSD QUE FUTURO?


UM CAMINHO PROVÁVEL

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Anda meio mundo preocupado com o Chega, com o André Ventura, como se ele e o seu partido representassem a maior ameaça para a democracia. E não representam em geral, nem para a democracia portuguesa. São herdeiros ou continuadores de uma doutrina sem futuro e que já sofreu pesadíssimas derrotas. Portanto, não façam o favor de os promover, embora essas promoções os não transformem naquilo que eles nunca serão.
Perigosos para a democracia são os neoliberais. Alicerçados na liberdade sem limites, eles são o mais perigoso inimigo do nosso tempo para quem defende a democracia nas suas múltiplas vertentes. E são perigosos porque a sua doutrina permite-lhes o uso de uma retórica sugestiva, uma retórica que colhe com facilidade adeptos e seguidores ao identificar o Estado como o inimigo a abater. E o Estado é, como todos sabemos, pela sua natureza e composição mais palpáveis aquele que melhor se presta a ser interiorizado como inimigo mais óbvio.
Ora, é de admitir, neste complexo processo de reconstrução da direita portuguesa que inevitavelmente vai ocorrer, que o neoliberalismo venha a ser o caminho que o "novo PSD" vai trilhar sem concessões nem contemplações de nenhuma espécie.
A democracia neoliberal leva à mais perigosa corrupção (no sentido político do termo) do conceito de democracia na medida em que gera, a muito curto prazo, a criação de poderosas oligarquias que tudo dominarão, ou seja, ao "governo" de poucos votado à defesa e consolidação dos seus exclusivos interesses constituídos à custa do sacrifício dos restantes.
Portanto, o inimigo principal - atenção, um inimigo que verdadeiramente nunca foi derrotado - é a facção neoliberal do PSD se vier a tomar o partido, como poderá acontecer.

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

O BENFICA E ANDRÉ VENTURA


A POSIÇÃO QUE O BENFICA DEVERIA ASSUMIR
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Logo após a constituição do "Basta", que depois passou a "Chega", pedi no “facebook” (9 de Outubro 2018) que o Benfica se demarcasse de André Ventura e diligenciasse no sentido da sua substituição na CMTV.

Lamento, apesar de saber a data da publicação, não ter encontrado ainda esse texto no FB, um lugar onde tudo está e nada se encontra, mas escrevo agora este por ter mudado parcialmente de opinião.
O Benfica não pode nem deve demarcar-se ou aproximar-se de quem quer que seja por motivos partidários ou confessionais. Como clube apartidário e aconfessional, o Benfica não tem que se demarcar das posições político-partidárias dos adeptos que, noutro contexto, defendem na comunicação social o emblema do clube, seja no comentário desportivo, seja em qualquer outro tipo de programa.  

Todavia, os órgãos sociais do Benfica na reacção a um assunto, que se presta a todo o tipo de demagogias em que o futebol é fértil, não teriam nada a perder se, além de sublinharem a natureza apartidária e aconfessional do clube, acrescentassem algo do género: Sendo apartidário e aconfessional, o Benfica é, porém, pelo seu passado e pela sua prática, um clube popular e democrático que se revê nos valores e princípios fundamentais consagrados na Constituição da República.

Uma declaração deste género não violaria os estatutos, não atacaria ninguém, nem se aproximaria de qualquer posição político-partidária, escudada que estava na lei suprema do Estado. 

Se o Benfica ficar apenas pela apoliticidade e aconfessionalidade é pouco, já que esse era o argumento que durante o fascismo foi utilizado para manter o clube completamente à margem da política do Estado Novo.

sábado, 12 de outubro de 2019

O PS E AS “COLIGAÇÕES NEGATIVAS”


O QUE É POSSÍVEL ANTEVER
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Volta a ouvir-se com alguma insistência na comunicação social e nas redes sociais a “conversa fiada” das coligações negativas, espantalho que o PS agita sempre que está em dificuldades, como é o caso.

A famosa “coligação negativa” não passa de uma invenção do PS para justificar a sua incapacidade de, com as suas próprias forças, pôr em prática uma política de esquerda, por moderada que seja.

Obviamente, a esquerda terá de votar contra todas as medidas de direita que o PS pretenda pôr em prática. Assim será no futuro, como sempre foi no passado.

Se a direita, por oportunismo político, se junta à esquerda nesta rejeição, o PS só terá de se queixar de si próprio. De nem sequer ter conseguido manter a “aliança”, tácita ou não, que vinha mantendo com a direita, como aconteceu, por exemplo, no segundo governo Sócrates.

Apesar de o PS ser o que é, e raramente, pelas suas próprias forças, o que diz ser, a verdade é que o PCP nunca apresentou uma moção de censura a um governo PS, por mais que o tenha combatido no Parlamento e na rua.

Portanto, o grande responsável pelas ditas “coligações negativas” é o PS e não quem desde sempre demarca o terreno sem margem para dúvidas.

Se o PS não quer “coligações negativas” que faça uma política de esquerda ou demonstre capacidade para manter a direita aliada à sua governação.

Todos os governos minoritários do PS que não concluíram a legislatura (e somente dois a concluíram) foram, formalmente, derrubados pela direita. Mas nem assim o PS aprende…

Estas são as coordenadas. Quanto ao que neste momento se passa há factos conhecidos e quanto ao que se pode vir a passar não há factos, mas há algumas suposições indiciariamente fundadas.

O facto conhecido é que Costa vai conversar com todos com a mesma abertura, uma vez que não há acordos escritos que privilegiem esta ou aquela corrente, estes ou aqueles partidos. Mas conhecido é também um outro facto não menos relevante: Costa, já perto do fim da legislatura, tentou a propósito da contagem do tempo dos professores, provocar uma “coligação negativa”, convencido que estava das vantagens eleitorais que do facto poderia tirar. Acabou por não conseguir formar essa “coligação negativa” porque a direita na hora da votação “borregou”.

Desconhecido é o que realmente se vai passar, embora o que se vá passar dependa muito de Rio ficar ou não à frente do PSD.

Convém relembrar que o actual presidente do PSD quando se candidatou a este lugar disse que o seu objectivo, no imediato, não era ganhar as eleições, mas tirar o PS dos “braços” do Bloco e do PCP, facto que levou ao “divórcio” de Santana Lopes e à constituição da “Aliança”. Supondo que Rio não mudou de ideias, e nada permite supor que tenha mudado, o mais provável é que Rio não deixe “cair” o PS sempre que estejam em causa assuntos importantes, como o orçamento, por exemplo, quer pela via da abstenção quer pelo apoio directo, consoante a amplitude da negociação que tenha sido possível fazer. Todavia, à semelhança do que em outras ocasiões já aconteceu, logo que Rio pressinta que há no eleitorado uma mudança que lhe permita ganhar as eleições, não terá dificuldade em juntar o seu voto ao da esquerda, derrubando com a soma de ambos o governo.

Se Rio não ficar, o PS não vai ter vida fácil. E para se manter no poder vai ter de negociar com a esquerda, ou com parte dela, muito mais do que gostaria e do que estaria à espera.

quinta-feira, 10 de outubro de 2019

O LIVRE E A SUA DEPUTADA


OS LIMITES DO POLITICAMENTE CORRECTO
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Vivemos um tempo de profunda hipocrisia. Um tempo em que o que todos vemos é exactamernte o contrário do que nos pretendem mostrar. Um tempo em que o esbatimento das diferenças imposto pelo “politicamente correcto”, leva nos casos extremos às maiores crueldades, sempre justificadas, mesmo quando não são reconhecidas, apesar da sua evidência, por o comportamento que as dita se julgar alicerçado numa superioridade moral, social e política, e se considerar completamente indiferente às suas consequências tanto para aqueles cujas diferenças pretendem esbater como para a sociedade em geral destinatária involuntária desses comportamentos.  

Vem isto a propósito de Joacine Katar Moreira, eleita pelo círculo de Lisboa, pelo Livre, como deputada à Assembleia da República nas últimas eleições legislativas.

Se há uma actividade onde a palavra vale ouro, essa actividade é a política, tal como hoje se faz. Dada a indiscutível predominância dos meios de comunicação na política, os políticos esforçam-se por tornar a sua voz sedutora, desde a tonalidade, à colocação, passando pelo timbre e por uma dicção muito cuidada, de modo a torná-la mais agradável, cativante, cientes de que a forma como se exprimem é tão, ou mais importante, do que o conteúdo do que se exprime. E se há na política um lugar onde isso é mais importante do que qualquer outro, um lugar onde os grandes dotes oratórios valem ouro, esse lugar é o Parlamento.

Ora, o Livre e o Rui Tavares, como todos os sacerdotes do “politicamente correcto” – a suprema hipocrisia da política – querem-nos convencer que aquelas faculdades não têm nenhuma importância. E de facto nada haveria a dizer se um partido abdica de fazer passar persuasivamente a sua mensagem por ter escolhido uma pessoa com outras qualidades para ele tão ou mais importantes do que aquelas.

Acontece, porém, que não é isso que se passa com Joacine Katar Moreira. Nem jamais aqui se faria qualquer crítica por o Livre ao tê-la escolhido haver prescindido do modo mais comum de fazer passar a sua mensagem. Pôr as coisas nesses termos, seria, no caso concreto, juntar o utilitarismo à hipocrisia. O que se passa é algo muito diferente. A deputada do Livre é portadora de uma enorme deficiência da fala que praticamente a impede de se exprimir, tanto mais quanto mais desesperadamente porfia fazê-lo.

É penoso, extremamente penoso, ver alguém cuja missão é transmitir uma mensagem, permanentemente incapacitado de o fazer por força de uma deficiência que parece insuperável por maior que seja a vontade e o esforço, já não dizemos para a superar, mas para a atenuar.

A exibição pública permanente daquela enorme deficiência não constitui da parte dos que a encarregam de falar em público, nem dos que a escutam, um acto de humanidade que passa meritoriamente sobre a diferença como se ela não existisse. Bem pelo contrário,  parece-me de profunda desumanidade aquela permanente exibição de um inglório esforço físico e psíquico para tentar superar o insuperável, como acontece com todos os comportamentos que vulgarizam o sacrifício humano, auto ou hetero- infligido, qualquer que ele seja.

O que pretende o Livre quando expõe assim impiedosa e permanentemente uma pessoa cuja deficiência inspira a mais nobre compaixão? Não seria possível atribuir outras tarefas partidárias igualmente nobres a Joacine que a poupassem a este sacrifício permanente e para quem a escuta com a melhor boa vontade? Parece-me um comportamento cruel imposto pelo politicamente correcto numa conjugação de factores aparentemente ideais para sublinhar a tal pretensa superioridade acima referida.

Por mais que o Livre nos queira convencer da justeza do seu comportamento e por mais que eu me esforce por o tentar compreender, não posso deixar de me lembrar, por mais que me queira esquecer, dos que, nos meus tempos de criança, exibiam nas feiras e romarias populares os aleijões e as mais terríveis deficiências de seres humanos num cortejo de desgraças e de miséria onde à compaixão se aliava uma profunda repulsa de quem se tornava espectador involuntário daquele penoso espectáculo.   


domingo, 6 de outubro de 2019

SOBRE OS RESULTADOS ELEITORAIS DE OUTUBRO DE 2019

O QUE PARECE EVIDENTE 
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Se antes de conhecidos os resultados eleitorais já era certo não ser repetível a solução política da última legislatura, ela tornou-se agora evidente, depois de conhecidas as projecções e os primeiros resultados.
De facto, a situação política é hoje completamente diferente da de então. Há quatro anos, O PS para ser governo e para ver um seu elemento indigitado para primeiro ministro necessitava de um acordo que lhe garantisse a maioria parlamentar já que a direita no seu conjunto tinha mais deputados que o PS.
Agora, conforme já depreende das projecções, O PS para formar governo e ter um seu elemento indigitado como primeiro ministro não necessita de exibir nenhum acordo, já que ganhou as eleições e, além disso, tem mais deputados do que o PSD e o CDS juntos.
Portanto, o mais provável, na impossibilidade de o PS responder afirmativamente às exigências dos seus aliados de véspera, é que qualquer um deles, neste contexto, comunique ao PS que não inviabilizará a investidura do seu governo, a menos que o programa contenha propostas inaceitáveis ; quanto ao futuro, logo se verá em função das múltiplas propostas que o PS apresentará ao Parlamento durante a legislatura. Ou seja, apoiar as que for de apoiar, votar contra as que for de votar contra ou abster-se relativamente às que se não enquadrem em nenhuma das duas anteriores situações.
Creio que esta é a solução que mais conforme aos resultados eleitorais e a que melhor defende os interesses da esquerda.

NA VÉSPERA DE ELEIÇÕES LEGISLATIVAS


SOBRE AS ELEIÇÕES DE AMANHÃ

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Muito se tem especulado sobre como será o “day after” se o PS ganhar as eleições sem maioria absoluta. Dizem uns que se o PS fizer maioria com os deputados do Bloco dificilmente haverá acordo por o PS não querer ficar nas mãos do Bloco, quer esse apoio seja parlamentar, quer de coligação governamental. Dizem outros que mais fácil seria o acordo com o PCP se o número de deputados de ambos os partidos fossem suficientes para fazer maioria. Outros, finalmente, colocam a hipótese de o PS governar sozinho, como já fizeram Soares, Guterres e Sócrates.

A minha análise da situação é um pouco diferente. O que me parece é que, sejam quais forem os resultados eleitorais do BE e da CDU, a menos que se trate de uma verdadeira catástrofe para um deles, a Costa só restam duas saídas: ou tentar um acordo semelhante ao desta legislatura ou governar com a abstenção e o apoio de Rio, consoante os casos.

De facto, o PS nas sete vezes em que governou sem maioria absoluta nunca governou sozinho. Em dois acasos governou em coligação com a direita, uma vez com o CDS, outra com o PSD. Em quatro, governou sem coligação com o apoio da direita, salvo num ou noutro caso, de relativa pouca importância, em que beneficiou do apoio pontual da esquerda. Em cinco destas seis situações os governos não concluíram a legislatura, ou por a direita ter rompido a coligação ou por a direita ter derrubado o governo no Parlamento. Em todos os casos em que a direita derrubou o Governo, quer por rompimento da aliança, quer por votação no Parlamento, o PS perdeu as eleições subsequentes. Sem maioria absoluta, o PS somente por duas vezes concluiu a legislatura, uma vez por Guterres, outra por António Costa. De ambas as vezes, a confirmarem-se as sondagens, o PS ganhou as eleições legislativas subsequentes. 

Este é o quadro histórico. Das duas hipóteses acima referidas, a ter em conta depois de conhecidos os resultados das eleições de amanhã, a que me parece menos provável é a de um acordo à esquerda. Esse acordo, a existir, nunca seria com apenas um partido. Não só por essa não ser a hipótese que mais interessa ao PS, nomeadamente no caso de esse partido ser o Bloco, mas também por nenhuma das duas forças políticas da esquerda – BE e CDU – estar verdadeiramente interessada num acordo que deixe a outra força de fora a concentrar nela a capitalização do descontentamento governativo.

Independentemente destas considerações, os últimos tempos têm demonstrado que as exigências à esquerda iriam subir de tom e teriam de ser satisfeitas para poder haver acordo. O que desagrada francamente ao Partido Socialista porque sabendo que o próximo contexto económico-financeiro será diferente para pior do desta legislatura de forma alguma lhe convém ficar “atado” a partidos que lhe dificultarão ou até inviabilizarão o cumprimento da ortodoxia financeira comunitária. Convém-lhe, portanto, arranjar um parceiro mais compreensivo e que comungue das mesmas preocupações. E a saída para esta situação, que nunca seria una saída sem antes se assistir a uma imputação de responsabilidades à esquerda por ter inviabilizado uma solução semelhante à actual, seria a de um acordo com Rui Rio, governando o PS com a abstenção ou o apoio do PSD, consoante os casos.

Não só é essa a solução que mais interessa ao "PS que conta", como é também a saída mais condizente com o contexto económico-financeiro esperado, além de coincidir com o interesse de Rio e para a satisfação do qual expressamente se candidatou. Rio sempre disse, quando concorreu à presidência do PSD contra Santana Lopes, que não se candidatava para ganhar as “próximas” eleições (as de amanhã), mas para tirar o PS dos braços do Bloco e do PCP. O que levou, como se sabe, ao “divórcio” de Santana Lopes e à criação da Aliança. Só que esta "saída", que é muito provavelmente aquela pela qual o PS vai “entrar”, é a que deixa nas mãos de Rio a marcação das próximas eleições, aquelas para cuja vitória Rio verdadeiramente se candidatou.

Como pode o PS "cair" nisto? Exactamente pelas mesmas razões que o levaram nas seis das sete vezes anteriores em que foi governo sem maioria absoluta a pretender o apoio da direita e a por ela ser derrubado por cinco vezes.

"PAIS DA DEMOCRACIA"


INDIGNAÇÃO
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É, de facto, motivo de grande indignação essa coisa dos "pais da democracia".
Tenham vergonha, meus senhores!
Se pais a democracia tem, eles só podem ser os que passaram a vida a lutar por ela e os corajosos militares do MFA que a 25 de Abril de 1974 saíram dos quartéis para a implantar.
Que pais da democracia podem ser os que viveram a juventude de braço dado com o fascismo ou os que tendo tido a ténue possibilidade fazer alguma coisa por ela nas instituições do regime salazarista logo fugiram e desertaram ao menor contra-tempo?
Pudor, meus senhores, pudor!

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

O QUE CONVÉM NÃO ESQUECER


EM VÉSPERAS DE ELEIÇÕES E SEMPRE
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A direita, depois de aprovada a Constituição, arreganhou os dentes, ostensivamente, por duas vezes:
A primeira foi na eleição presidencial de 1980; Soares Carneiro, guarda-mor do campo de concentração de São Nicolau, apoiado pela AD de Sá Carneiro e Freitas, tinha por objectivo explícito revogar a Constituição por referendo; a vitória do General Ramalho Eanes, apoiado pelo PS de Zenha e Sampaio e pelo PCP bem como pelos milhões de portugueses que nele votaram, garantiu o essencial da Revolução de Abril.
A segunda foi na eleição presidencial de 1985 disputada entre Freitas do Amaral, apoiado pelo PSD, pelo CDS e por todos os nostálgicos do fascismo, e os defensores da democracia consagrada na Constituição, representados na segunda volta por Mário Soares.
Depois destas duas vitórias consecutivas nas eleições presidenciais, a direita não mais ousou, mesmo quando venceu, pôr em causa a democracia saída do 25 de Abril, consagrada na Constituição de 1976!


terça-feira, 1 de outubro de 2019

A REVOLUÇAO CHINESA


SEPTUAGÉSIMO ANIVERSÁRIO 
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Comemora-se hoje o 70.º aniversário da Revolução Chinesa, data do nascimento da República Popular da China, proclamada em Pequim por Mao Tze Tung, em 1 de Outubro de 1949, depois de derrotadas as tropas do Kuomintang comandadas por Chiang Kai Shek.
A Revolução Chinesa é das quatro grandes Revoluções da época contemporânea – Americana, Francesa e Russa - aquela que obteve êxitos mais grandiosos em menos tempo. Não obstante ser uma civilização antiquíssima e ter sido porventura durante muitos séculos a maior economia do mundo, a China era desde meados do século XIX, por via das conquistas dos países ocidentais e dos “tratados injustos” que lhe foram impostos, um país humilhado e miserável.
Com a Revolução Chinesa, liderada pelo Partido Comunista, a China, depois de avanços e recuos, certamente suportados por grandes sacrifícios, tornou-se num país moderno, próspero, confiante no futuro, com um crescimento económico sem paralelo em qualquer outra parte do mundo, que caminha a passos largos para se tornar dentro de muito pouco tempo na primeira economia mundial.
Desmerecer a Revolução Chinesa por se pretender que ela adopte os chamados “valores ocidentais” seria tão absurdo como esperar que o Ocidente adopte “os valores chineses” depois de perdida a sua hegemonia a nível mundial.
São esses feitos que hoje aqui se comemoram na sua genuinidade e na sua inigualável grandeza na esperança de uma frutuosa cooperação internacional entre Ocidente e o Oriente.